• Nenhum resultado encontrado

A prova bilateralmente diabólica e as prováveis soluções para a resolução da prova dos fatos

CAPÍTULO IV – ÔNUS DA PROVA

4.10. A prova bilateralmente diabólica e as prováveis soluções para a resolução da prova dos fatos

assim (SILVA; REIS, 2013, p.3) corroboram para essa afirmação “[S]e os temas de prova são, por regra,

temas difíceis, particularmente difícil é o tema da prova difícil.” São preocupações que atingem não só as partes que podem sofrer com as regras estáticas do ônus a prova, mas também ao julgador, que se depara com alegação não cabalmente comprovada, mas cuja prova não é razoável exigir.

Haverá situações que a prova do fato é impossível ou muito difícil para ambas as partes, sendo bilateralmente diabólica. Os Autores (BESSA; LEITE, 2016, p.143) destacam que “ocorre um grande

problema quando a prova é bilateralmente diabólica, ou seja, quando a prova do fato é impossível ou extremamente difícil para ambas as partes. Nessa hipótese não há possibilidade de distribuição dinâmica do ônus da prova.” Em tais casos não cabe ao juiz manter o ônus da prova com aquele que alegou o fato, tampouco invertê-lo na fase de saneamento (ou probatória), para atribuí-lo a seu adversário. Para situações como essas, afirma (DIDIER JR., 2015, p.116) que “ao fim da instrução, o juiz pode não chegar

a um grau mínimo de convicção, e uma das partes deverá arcar com as consequências gravosas deste seu estado de dúvida – afinal, é vedado o non liquet.”

Quando o magistrado estiver diante de uma prova duplamente diabólica algumas soluções podem ser adotadas, dentre essas soluções pode-se utilizar a prova indiciária, a prova por amostragem ou ainda a chamada probatio levior, muito semelhante à prova prima facie, assim ensinam (SILVA; REIS,

2013, p.14.),”[O]utro instrumento de reacção à prova difícil é trazido pela degradação ou abaixamento

141 Cfr. Acordão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Apelação Cível 1.0363.15.003546-9/001, Rel.VASCONCELOS LINS, 18ª CÂMARA CÍVEL, julgado

69

do grau de convicção necessário acerca da correspondência entre o relato e a realidade de um facto para que a decisão o passa aceitar como verificado para, com base nessa conclusão decidir. Estamos em cheio no domínio da probatio levior.” Significa dizer em outras palavras, que estaria o magistrado autorizado a realizar “o abaixamento do grau de convicão”, diante de certos fatos cuja a prova é difícil, reputá-los ocorridos com base num juízo de aparência, calcado nas máximas de experiência. (DIDIER JR;

BRAGA; OLIVEIRA, 2015, p.115)

A fim de definir a regra de julgamento (ônus objetivo), cabe ao juiz verificar ao fim da instrução qual das partes assumiu, segundo (MARINONI, 2005, p.122) o “risco da inesclarecibilidade”, submetendo-

se a uma decisão desfavorável. Para este autor, nestes casos, o juiz não poderia escolher manter o ônus da prova com a parte inicialmente onerada, tampouco inverter para onerar o adversário. Estaria o magistrado sujeito a uma situação em que não teria argumentos favoráveis à adoção de nenhuma das posturas. Ainda que não forme a sua convicção, o non liquet é vedado e, uma das partes suportará as consequências do seu estado de dúvida.

Se o fato insuscetível de prova for constitutivo do direito do autor: a) e o autor assumiu o risco inviabilidade probatória (inesclarecibilidade), o juiz, deverá na sentença aplicar a regra geral do ônus da prova – regra de julgamento (art. 373º do NCPC Brasileiro) e dar pela improcedência; b) mas se foi o réu que assumiu o risco, o juiz deve, no momento depois da instrução e antes da sentença inverter o ônus da prova e intimá-lo (o réu) para que se manifeste, para, só então, dar pela procedência. (DIDIER

JR; BRAGA; OLIVEIRA,2015, p.116).

Nos moldes do direito vigente, a Autora (FERNANDEZ, 2013, pp. 832-833) entende que “a garantia

do direito à tutela judicial efectiva e a imperiosa necessidade de os tribunais não se demitirem da tarefa de compor o litígio de forma justa exigem que, perante as descritas dificuldades probatórias estes admitam a atenuação do grau de prova exigível ao onerado para que determinado facto seja dado como provado. Quer isto dizer que, nestes casos, (prova objectiva ou subjetivamente difícil) exigir a produção de uma prova stricto sensu equivale a negar o direito à tutela efectiva à pare com ela onerada.”

Desta forma, entende-se que exatamente porque a existência da prova diabólica é muitas das vezes o seu principal fundamento, a redistribuição do ônus da prova não pode implicar uma situação que torne impossível ou excessivamente oneroso à parte arcar com o encargo que acabou de receber, conforme afirma (THEODORO JUNIOR, 2015, p.895) "[...] se uma das partes se acha em situação que lhe

permite demonstrar as afirmações formuladas em sua defesa, sendo verossímil a narração dos fatos invocados pela parte contrária, é razoável que o juiz redistribua o encargo probatório afetando aquele que se acha em melhores condições de esclarecer o quadro fático da causa. Mas, se a dificuldade ou

70

impossibilidade atinge igualmente a ambas as partes, sua superação não poderá ser buscada pela técnica da distribuição dinâmica do ônus da prova. Ao prevalecer semelhante critério, estar-se-ia imputando ao novo destinatário do encargo a chamada prova diabólica, pois de antemão se estaria decretando sua derrota processual, visto que desde logo se teria exigido dele missão impossível de ser cumprida."

As regras das distribuição dinâmica do ônus da prova não podem ser interpretadas como limitadoras ao poderes instrutórios do juiz, porque o direito processual moderno visa que o juiz exerça seus poderes instrutórios em prol de uma solução justa que satisfaça o direito material pretendido. Cabe ao juiz assumir a direção material do processo para que seja preservado a igualdade entre as partes e a efetividade processual. Ampliar os poderes instrutórios do juiz é a garantia de um juiz ativo na formação do conjunto probatório, conferindo efetividade as garantias constitucionais do processo.

O direito moderno visa a justa composição do litígio, é preciso uma solução diferente para cada caso, cabe ao juiz atuar de forma eficaz, assim assevera (CAVALCANTI, 2014, p.85) “[O] magistrado deve

ser sensível à atenuação do grau de prova exigível ao onerado ou, até mesmo, inverter o ônus probatório quando a solução mostrar-se adequada para solucionar o conflito com retidão. Exigir a produção de prova diabólica, tendo levado a cabo a rígida e inflexível distribuição estática do art 342º do CC, é o mesmo que negar o direito à tutela jurisdicional efetiva à parte onerada, tolhendo o seu direito fundamental à prova, expressa garantia de um Estado social e constitucional de direito.”

Por todo o exposto, sem a menor pretensão de esgotar este conteúdo e reiterando a necessidade de estudos mais aprofundados do tema em comento, se a prova for duplamente diabólica, impossível para ambas a partes, o juiz não poderá inverter ou dinamizar o ônus da prova. Todavia, o tribunal não poderá desistir precocemente de compor o litígio do modo mais justo possível, ainda que esteja diante de extrema dificuldade probatória. Inexistindo regra específica para o caso, a solução para a prova diabólica bilateral será regida pelo art. 373º do NCPC Brasileiro. O ônus incumbe ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito e, ao réu incube o ônus da prova quanto a existência do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor. As circunstâncias deverão ser avaliadas de acordo com as máximas da experiência, observando o caso concreto.

71

CAPÍTULO V - ÔNUS DA PROVA E ARTICULAÇÃO COM OS SISTEMAS