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PSEUDONEUROSES DO TIPO BASEDOW Primeiro, um exemplo casuístico:

No documento Viktor Frankl - Teoria e Terapia Das Neuroses (páginas 109-114)

I TEORIA DAS NEUROSES COMO PROBLEMA

A) PSEUDONEUROSES DO TIPO BASEDOW Primeiro, um exemplo casuístico:

Terapia de escolha Di-hidroergotamina Desoxicorticosterona Cálcio, di- hidrotaquisterol, ácido glicérico do o-metoxi-fenil

A paciente em questão sofre há cinco anos de severa agorafobia. Está se tratando com uma psicanalista, que não é médica, há meio ano. Encerrou o tratamento simplesmente porque não teve qualquer sucesso terapêutico; muito pelo contrário, as depressões até se aprofundaram. Do ponto de vista

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objetivo, a paciente apresentava tremor nos dedos e nas pálpebras; a tireoide está aumentada de maneira difusa e o metabolismo basal é +44%. A paciente recebeu di-hidroergotamina parenteral e já no dia seguinte relatou que a injeção "fez milagre": "Nunca teria pensado': ela disse, "que avançaria tanto em tão pouco tempo': Depois de mais algumas injeções, ela está livre do medo e percebe, entre outras coisas, que os sonhos terríveis, que a faziam sofrer no passado, agora "terminam bem". ''A psicanalista havia interpretado os sonhos, mas eles continuavam assustadores': ela diz com ironia.

Claro que no caso de sucessos terapêuticos assim, é preciso prestar aten­ ção e saber se não se trata de efeitos sugestivos. Embora um efeito sugestivo não seja desonroso, sempre desorienta o clínico. Para o profissional não é necessário nem possível descartar um efeito sugestivo de antemão no tratamento ou excluí-lo posteriormente na avaliação do sucesso do tratamento. Mas ele precisa se pre­ caver em relação a isso, e é evidente que os casos que baseiam nossa exposição das pseudoneuroses somatogênicas mais importantes só foram incluídos quando tinham sido tratados anteriormente com outros medicamentos e só responderam favoravelmente à medicação específica - ou, por outro lado, quando foram trata­ dos posteriormente com outros medicamentos e só haviam respondido favoravel­ mente à medicação específica. Também é claro que os pacientes não estavam a par do que lhes era ministrado ou até imaginavam estar tomando outro medicamento. Propositalmente deixamos o paciente acreditar que estava recebendo o medica­ mento que, segundo suas indicações, lhe fizera tão bem. Mas pode também haver a situação inversa, na qual o paciente (com ou sem razão) teme quaisquer efeitos de uma injeção e é tomado por um temor dos efeitos colaterais ou posteriores da me­ dicação. Caso exista essa antissugestão, o efeito terapêutico positivo da medicação específica (não esperado pelo paciente) se torna ainda mais patente.

Na sequência, vamos tratar de dois casos atípicos, que apesar de tais atipi­ cidades fazem parte da zona de pseudoneuroses do tipo Basedow. O primeiro é atípico, pois a sintomatologia era mista, composta pela síndrome 1 (grupo do tipo Basedow) e da síndrome 2 (grupo do tipo Addison). A terapia teve de ser combi­ nada e mirar de maneira concentrada os fatores patogênicos.

É

lógico que entre

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esses fatores também estava a reação psíquica da paciente (ou de sua· neurose rea� tiva), fazendo com que a terapia adequada, multicausal, pudesse ser apenas uma terapia simultânea somatopsíquica.

Judith K. (Policlínica Neurológica, ambulatório 376/ 1 955; hospital 1 779/ 1 955), paciente de 37 anos, sofre há treze anos de agorafobia severa; na infância, foi muito medrosa: medo de fogo e de terremotos; há treze anos não sai à rua sozinha por medo de desmaios e tonturas; também evi­ ta aglomerações, o que - além da indicação de "sensação de estrangula­ mento na gargantà' - aponta menos para uma direção agorafóbica do que para uma claustrofóbica. Há quatro anos a paciente não é mais capaz de ficar sozinha em casa. Queixa-se também de pressão na região do coração, diarreias, micção frequente e tremedeiras; apresenta sensibilidade à mu­ dança do tempo e em relação aos ventos. Já se consultou com um famoso colega da área, já passou por uma hipnose, uma narcoanálise e recebeu vários eletrochoques numa clínica psiquiátrica - entretanto, nenhuma des­ sas medidas obteve sucesso. Nos últimos tempos, teve perda de peso de consideráveis 22 kg; pesa agora 47 kg. O metabolismo basal já foi de +50%. O eletrocardiograma indica uma leve lesão do miocárdio. Do ponto de vista terapêutico, tentou-se, desde o início, no sentido de uma terapia simultânea somatopsíquica, combinar a condução psicoterapêutica da paciente com medicamentos específicos. Esses últimos-deveriam preparar o terreno onde a psicoterapia pudesse ser desenvolvida. O caso apresentava, como já foi dito, traços agorafóbicos e claustrofóbicos; classificamos esses últimos no geral com o grupo tetanoide das doenças pseudoneuróticas, assim como já afirmamos que os psicocorrelatos monossintomáticos dos estados ago­ rafóbicos muitas vezes25 ocultam (ou apontam, no caso do especialista) um estado do tipo Basedow. Então, pelo fato de esse caso também apontar na direção tetanoide, resolvemos ministrar, ao lado da di-hidroergotamina,

25 Evidentemente que em tudo isso não se deve achar que toda agorafobia é uma pseudoneurose somatogênica, no sentido que a entendemos.

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também miosina E, depois que fomos capazes de demonstrar26 que esse ácido glicérico do o-metoxi-fenil consegue reduzir o medo (pseudo)neu­ rótico de casos de distúrbios "funcionais" (no sentido que entendemos).

O efeito desse tratamento medicamentoso duplo, completado pela psico­ terapia (segundo o método da intenção paradoxal) foi o seguinte: no 1 3º dia do tratamento hospitalar, a paciente - que havia treze anos não saía sozinha de casa - foi capaz de ir de Hernals (onde mora) até a policlínica; no 1 7º dia, ela foi sozinha ao cinema depois de vinte anos; no 18º dia, visitou pela pri­ meira vez na vida um salão de café (ela sentiu apenas "medo do medo': mas que logo se dissipou). Na 4ª semana de sua presença na clínica ela atravessa a cidade na garupa da moto do marido e também anda sozinha num bonde lotado (cuja lotação já deveria horrorizá-la de antemão, por motivos claus­ trofóbicos). Quando ela recebe alta da internação, depois de um período total de tratamento de quatro semanas, ela se sente como que "renascidà: Sem que tivesse de tomar mais quaisquer medicamentos, a paciente se man­ tém sem queixas também durante o período de controles periódicos; nessa ocasião, acontece também de ela retomar o contato sexual com o marido - após uma carência de quatro anos. Citamos isso apenas porque queremos ressaltar como seria errôneo construir a etiologia de tal neurose baseando-se na abstinência sexual, enquanto, na realidade, é o oposto: a carência sexual (não a causa) é mero efeito da (pseudo)neurose, assim como a reabilitação sexual de nossa paciente é um efeito (secundário) de nossa terapia.

Vejamos agora um segundo caso, também atípico, pois se apresentava o sintoma 3 (grupo tetanoide) , mas o efeito terapêutico deveu-se à terapia indi­ cada via de regra para os casos típicos de pseudoneurose do tipo Basedow - a di-hidroergotamina.

Margarete Sch. (Policlínica Neurológica, ambulatório 364 1 / 1 953; hospi­ tal 677/ 1 953), paciente de 39 anos, diz sofrer há vários anos de um medo crescente do qual é acometida quando fica em ambientes fechados; ela

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também não tolera nenhuma peça de roupa muito justa. Há quatro sema­ nas, ela tomou uma injeção no dentista, sofrendo em seguida uma severa excitação de medo; sentiu taquicardia - que se manteve mesmo com as me­ dicações prescritas pelo médico, como quinino, digitalis e luminal. Por fim, a paciente se queixa de sensação de opressão e globus. Enquanto esse últi­ mo é tantas vezes interpretado erroneamente no sentido histérico, somos da opinião de que ele pode ser avaliado da mesma maneira na direção tetanoide como o sentimento de opressão e sufocamento. Nossos pacientes costumam relatar dificuldades em inspirar profundamente.

No que se refere ao caso em questão, revelou-se uma proporção de potássio-cálcio de 20,7:8,8 - suspeita no sentido tetanoide -, enquanto o metabolismo basal era de apenas +4%. Dessa maneira, tínhamos direito de suspeitar de uma afecção de um distúrbio larvado funcional vegetativo e endócrino do grupo tetanoide e, por essa razão, receitamos uma medicação "de cálcio e também miosina E; apesar de todas essas ações terapêuticas, não houve qualquer efeito terapêutico. Por outro lado, as doses de di-hidroer­ gotamina 45 funcionavam "muito bem': Curiosamente, a paciente se sentia "muito cansada" durante meia hora logo depois de cada injeção, queixando­ -se de tonturas e enjoos. Caso isso fosse apenas um efeito sugestivo, se trata­ ria de uma antissugestão, ou seja, a paciente teria esperado, no máximo, um agravamento de seu estado. Mas não foi assim; logo tudo isso sumiu, e seu estado objetivo melhorou, assim como a taquicardia.

Além disso, a paciente fez um tratamento logoterapêutico, que foi direcio­ nado (no sentido da intenção paradoxal) contra seu medo de ter medo. Quando veio a nós, a paciente estava num estado de máxima agitação ansiosa, pois tinha medo de enlouquecer. Ou seja, a paciente reagia com uma "psicotofobià' às di­ versas queixas que interpretamos (em nossa terminologia) como uma doença funcional. Já não podemos falar de uma mera doença funcional, já que temos de caracterizar o quadro, em sua totalidade, como uma neurose reativa. Em poucas semanas, a paciente ficou livre de quaisquer distúrbios e se manteve assim du­ rante todos os anos que se passaram, desde seu tratamento hospitalar conosco.

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Escolhemos propositalmente dois casos atípicos para prevenir o uso do es­ quema teórico para realizar uma prática esquemática.

Por fim, vale a pena citar que o empirismo clínico reforça que a agorafobia e a claustrofobia pseudoneuróticas podem ser relacionadas de maneira tão específi­ ca com as pseudoneuroses do tipo Basedow e do tipo tetanoide (respectivamente), que conseguimos chegar a um diagnóstico diferencial (e a indicação da terapia específica), a partir de uma pergunta-teste, mesmo nos casos em que não se con­ tava com uma ou outra fobia manifesta. Procuramos distinguir uma agorafobia ou claustrofobia latentes ao perguntar ao paciente o que mais o abalaria: ficar sozinho em meio a uma praça vazia ou ter de se sentar no meio de uma fileira de um cine­ ma lotado? A mera disposição claustrofóbica ou agorafóbica possível de ser testada assim é tão significativa para a pseudoneurose coordenável que, a partir dos resul­ tados dos testes, podemos também escolher a terapia correspondente.

B) PSEUDONEUROSES DO TIPO ADDISON

No documento Viktor Frankl - Teoria e Terapia Das Neuroses (páginas 109-114)