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L’affaire Dreyfus: panfletários antidreyfusards

QUADRO EVOLUTIVO DO POSICIONAMENTO DOS JORNAIS Janeiro

processo Esterhazy Fevereiro 1898: Processo Zola setembro 1898: suicídio Cel. Henry agosto setembro 1899: processo de Rennes

Data eventual conversão ao dreyfusismo Le Petit Journal A2 A A Le Petit Parisien A3 R I Le Journal A3 R A Le Matin A3 R I Le Gaulois A3 A A Le Soleil A1 R D Junho 1898 L'Autorité A1 A A La Libre Parole A1 A A L'Intransigeant A1 A A La Patrie A1 A A L'Éclair A1 A A L'Écho de Paris A2 A A La Presse A1 A A La Croix A1 A A La Liberté A3 R I Le Temps A3 R D Junho 1899 Le Figaro A3 R D Junho 1898 Le Journal des Débats A3 R I Le Siècle D D D Janeiro 1898 L’Aurore D D D Outubro 1897 Les Droits de l’Homeme D D D Janeiro 1898 Le Radical R D D Setembro 1898 Le Rappel R D D Agosto 1898 La Petite République A4 D D Junho 1898 La Lanterne A4 D D Maio 1899 La Fronde D D D Dezembro 1897

A tendência da imprensa política burguesa e dos grandes jornais informativos de silenciar justificava-se pelas importantes manifestações de rua e pelas prisões realizadas nos primeiros quinze dias após o artigo de Zola – J’accuse!. Esse contexto conduzia ao temor de que as agitações resultassem na revisão do processo. Manter a ordem parecia ser uma exigência, assim se firmou, entre os veículos de maior circulação, o pacto de impor silêncio sobre o assunto.

A derrota da França em 1871 acarretou a perda de parte de seu território – a região da Alsácia-Lorena – o que gerou um sentimento nacionalista e a consequente valorização das forças armadas. A confiança na justiça militar foi reforçada, tendo esta desempenhado papel fulcral ao longo processo. Contudo, um fato não fora previsto: Émile Zola atreveu-se a atacar, a repreender o irrepreensível.

O desejo de se manifestar minimamente, a veneração à Pátria, a disposição à manutenção da ordem, a valorização da coisa julgada e a estima pelo Exército constituem elementos essenciais que permitem julgar o comportamento da mídia antidreyfusista, referenciada na tabela de Janine Ponty (1974) como: A1; A2; A3; A4. Na capital, os órgãos de imprensa. tanto republicanos de centro como os três grandes jornais de notícia, compartilharam a necessidade de se calarem diante do episódio Dreyfus.

A posição dos moderados – jornais não violentos – segundo Janine Ponty (1974) destaca-se pela abertura à direita, impulsionada por Le Gaulois de Arthur Meyer. Em Paris, a imprensa monárquica permanecia relativamente nuançada, uma posição que, conforme Ponty (1974), é difícil de classificar. Le Soleil de Edouard Hervé, jornal realista, transforma-se de não violento em fantoche antissemita, quase próximo do que Ponty (1974) classificou como A1. Paul de Cassagnac do L’Autorité, com um posicionamento paradoxal, por diversas vezes se contradiz deixando seus leitores confusos. Esse jornal posicionava-se acima de tudo como antirrepublicano. Mais do que , como um acusador, denunciava a proteção que governo oferecia a Dreyfus. Para L’Autorité, o caso Dreyfus era somente um pretexto para julgar negativamente o Exército, o único a sentar no banco dos réus. A República vinha a ser a negação das forças armadas.

Le Petit Journal e L’Êcho de Paris figuravam entre os jornais de tendência nacionalista, possuíam como inspiração a exaltação do Exército o que trazia à luz um grande ódio dirigido a quem chamavam de prussiano Dreyfus, deixando claro

sua hostilidade ao judeus. La libre Parole de Drumont, L’Intransigeant de Rochefort e La Croix fizeram do episódio Dreyfus exclusivamente uma questão judaica ainda que a luta antissemita ultrapassasse tal caso.

Os socialistas eram patriotas, um patriotismo que evocava a Grande Revolução. Dreyfus era um oficial superior, um burguês e da categoria dos Rothschilds, exploradores dos pobres, portanto capaz de vender, sim, segredos de Estado, por esta razão os socialista não poderiam se comprometer com sua defesa. O sentimento nacional, a luta de classes e o antissemitismo combinaram-se para explicar, no primeiro momento, o posicionamento dos socialistas.

No início de 1898, a politização do episódio Dreyfus estava em pleno andamento. Com o passar do tempo Le Figaro e L’Autorité mostravam sinais de recuo em sua posição antidreyfusard, admitindo a revisão do processo, alinhando-se a Le Siècle, desde a primeira hora, um periódico revisionista, logo dreyfusista. Esclarece Ponty (1974) que os jornais revisionistas e dreyfusards eram de esquerda; já os de esquerda radical não estavam convictos dos argumentos de Picquart e de Zola. Na província, as personalidades progressistas; socialistas e radicais desconfiavam da campanha pela revisão do processo Dreyfus, porque a associavam ao caso do Panamá.

Verdadeiramente, quase todos antidreyfusards não violentos (A3) tinham por característica a defesa da ordem e o respeito à legalidade, com exceção jornal Le Gaulois. Esses jornais legalistas principiaram um movimento de mudança de posição, erguendo a bandeira da necessidade de revisão do processo. Iam se opondo, mês a mês, aos antissemitas e aos nacionalistas, sendo comum encontrar, em suas análises, pontos que julgavam coincidentes com movimento boulangista. Os jornais não violentos na reversão de suas opiniões jogavam força em um debate puramente formal, ou melhor, jurídico, fugindo das discussões religiosas com o objetivo de não fragilizar a República.

Jules Cornély, em Le Figaro (L'Affaire Henry, 1898), em 2 de setembro de 1898, descreve o coronel Henry como um infeliz diabo, mais vítima do que o herói cantado por Drumont, Rochefort e Judet e muito menos criminoso insensível a serviço do Estado-maior.

Muito combativa, a imprensa a favor de Dreyfus não conseguiu o sucesso esperado. Em Paris, com apenas oito jornais em um universo de 55 e, na província,

com um único, alcançava apenas 8% dos leitores. Le siècle; L’Aurore; Les Droits de l’homme; Le Radical; Le Rappel; La Lanterne; Le Petite République; La Fronde; Le Réveil du Nord eram quotidianos célebres, entretanto frágeis em sua tiragem.

Somente La Petite République alcançava a tiragem de 100.000 exemplares. Convertido à causa de Dreyfus por Jean Jaurès, passou, nos meses de maio e junho de 1898, do antidreyfusismo ao dreyfusismo. O jornal socialista ganhou centralidade no cenário da imprensa parisiense ao fazer o debate sobre o antissemitismo e ao sacudir a classe operária diante do martírio do burguês Dreyfus. No mês de agosto, Jaurès publicou um conjunto de artigos os quais, conforme Ponty (1974), compuseram uma bela façanha jornalística.

Esses textos abordaram as principais questões relacionadas ao processo de Alfred Dreyfus: no dia 10: As provas; no 12: As supostas confissões de Dreyfus; no 13: A inocência de Dreyfus; no 14: Dreyfus e Bertillon; no 18: O Verdadeiro traidor; no 19: O borderô é de Esterhazy; no 20: Esterhazy e os especialistas; no 25: Os documentos secretos; no 28: O documento falso.

Não houve outro mês mais fértil para reviravoltas que setembro de 1898. No ano seguinte, após uma longa investigação do Tribunal de Cassação, alguns jornais evoluíram em direção dreyfusismo, em um movimento lento. Tal alinhamento significou o reconhecimento de fatos irrefutáveis. Neste momento as paixões atingiram seu auge, segundo Ponty (1974) O silêncio foi rompido, o episódio Dreyfus ocupou, na imprensa, um espaço como nunca se havia visto; sucessivos depoimentos foram explorados.

Todos os dias os jornais atualizavam suas publicações com os relatórios do processo de Rennes. Alguns jornais matutinos chegaram a lançar uma edição no final da tarde com objetivo de manter seus eleitores atualizados. Contudo o campo antidreyfusard estava longe de ser dizimado, ele se mantinha fortalecido. Le Petit Journal, na manhã seguinte ao veredito de Rennes, lançou seus primeiros ataques antissemitas, transitando, no final da luta, do que Ponty (1974) classificou como raivoso sem ser antissemita (A2) para raivoso e antissemita (A2). Para L’Intransigeant220

, a França estava salva. Le Petit Journal221 afirmou que as forças

220 11 de setembro de 1899, artigo de Rochefort. 221 11 de setembro de 1899, artigo de Ernest Judet.

armadas haviam salvado a pátria. La Libre Parole222 registrou que os oficiais do Conselho de Guerra haviam escutado o país inteiro, o qual lhe agradecia por ter cumprido seu dever mantendo a condenação de Dreyfus.

Dreyfusards de longa data como Le Siècle; L’Aurore; Les Droits de L’Homme; Le Radical; Le Rappel, os jornais socialistas: La Petite République; La Lanterne; Le Réveil du Nord e mesmo Le Petit Provençal elevaram o tom, os dreyfusards adotaram uma postura mais ofensiva. Consideraram o veredito um julgamento abjeto, deixando a pergunta: será que o Tribunal de Cassação é controlado pelo Conselho de Guerra? Para eles não haveria uma consciência livre que pudesse se curvar a tal veredito. O chamamento era para a luta: “Em pé! Que todos os homens que desejam permanecer livres e confiantes se unam! A batalha continua ” (LE RÉVEIL DU NORD, 1899)223.

De maneira geral, os antidreyfusards (A2 e A2) não evoluíram, permanecendo constantes em sua posição. Os antidreyfusards (A3) classificados como moderados tornaram-se revisionistas. Os socialistas (A4) colocaram-se ao lado da tendência radical do dreyfusismo de combate. No final de 1899, a divisão política entre os defensores de Dreyfus era muito mais acentuada do que dois anos antes: de um lado, a esquerda; de outro a centro-esquerda. Houve um momento em que, em uma estratégia econômica, os jornais Le Figaro e Le Soleil distanciaram-se dos defensores do Capitão, pois estavam receosos de perder seus leitores, especialmente o último de Hervé de Kérohant que viu um terço de sua clientela monarquista migrar para Le Gaulois reconhecidamente contra Dreyfus, esclarece Ponty (1974). L’Écho de Paris, contra Dreyfus mas não antissemita (A2), também se beneficiou dessas transferências.

Nem Le Figaro nem Le Soleil simpatizavam com a esquerda, eram respeitadores das leis e das instituições. O primeiro tinha cumprido um papel de protagonismo junto a Zola na afirmação da inocência de Dreyfus. No entanto, por terem esse aspecto legalista, almejavam que Alfred Dreyfus aceitasse sua condenação. Le Petit Parisien, Le Jornal des Débats, La Liberte e Le Matin tomaram a decisão de se manterem imparciais ou apenas informativos.

222 10 de setembro de 1899, artigo: Le traître condamné. À bas les Juifs. Vive l’Armée de Édouard Drumont.

223 Debout ! que tous les hommes qui veulent rester libres et fiers s’unissent ! la bataille continue.. (SIAUVE-EVAUSY apud PONTY, 1974)

É preciso afirmar, contudo, que uma grande parte da imprensa mostrava-se conservadora e os movimentos realizados somente se concretizaram por estarem expostos à pressão da opinião pública que dava sinais de mudança e exigia outra postura da imprensa.