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São muitas as peculiaridades que orbitam ao redor do entendimento de quem pode ser considerado segurado especial e também ao redor de quando o mesmo terá sua qualidade de segurado mantida ou perdida.

O alcance da qualidade de segurado pelo segurado especial, segundo Dias e Macêdo (2010, p. 149):

Ocorre independentemente da sua vontade. É a própria lei que estabelece a filiação dos segurados obrigatórios ao Regime Geral de Previdência Social. A vontade do segurado em se filiar ou não a esse Regime não tem a menor importância. Essa filiação ocorre por força da lei, compulsoriamente, independentemente da vontade dos segurados.

Destarte, deve-se atentar para a correlação entre o lado factual específico da situação demonstrada pelo pretenso segurado especial e os requisitos atribuídos pela legislação previdenciária.

Como anteriormente destacado, a legislação passa a tratar, depois da Lei nº 11.718/2008, como segurado especial a pessoa física que, quer resida em imóvel rural, quer resida em aglomerado urbano ou rural próximo a tal imóvel, sozinha ou em regime de economia familiar, com possível e eventual ajuda de outros, dentro de certos requisitos, exerçam atividades de produtor rural (agropecuarista ou seringueiro/extrativista vegetal) ou de pescador artesanal (art. 12, VII, Lei nº 8.212/1991).

Abordar-se-á, a partir de então, as peculiaridades e atributos específicos relativos à qualidade de segurado especial, os modos de adquiri-la e de perdê-la e as exceções previstas na legislação. Ter-se-á por base as mudanças efetuadas pela Lei nº 11.718/2008 na legislação previdenciária (Leis 8.212/1991, 8.213/1991 e Decreto 3.048/1999), a qual, em boa parte do ordenamento, embutiu verdadeiras inovações, não apenas o modificando.

Dessa forma, adentra-se em especificidades vitais para o adequado entendimento da qualidade de segurado especial arroladas no decorrer da Lei nº 8.212/1991, modificada pela Lei nº 11.718/2008.

O agropecuarista que deseje ter essa qualidade, além das características apontadas no art. 12, VII, Lei nº 8.212/1991, também deve explorar terreno não superior a quatro módulos fiscais, o qual, caso não cumprido, poderá ser confundido com contribuinte individual. Não é preciso, porém, que se tenha a propriedade da terra, pois a posse é suficiente. Com o intuito de melhor situar o tamanho relacionado à medida “módulo fiscal”, é válida a doutrina de Ibrahim (2012, p. 197):

O módulo fiscal, como previsto na Lei nº 11.718/08, é unidade de medida expressa em hectares, fixada para cada município, considerando o tipo de exploração predominante no município; renda obtida com a exploração predominante e outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam significativas em função da renda ou da área utilizada. O módulo fiscal serve de parâmetro para classificação do imóvel rural quanto ao tamanho, na forma da Lei nº 8.629, de 25 de fevereiro de 1993. De acordo com esta lei, a pequena propriedade rural é aquela com área compreendida entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais. A dimensão exata do módulo fiscal é variável de um Município para outro.

Ao seringueiro ou extrativista, é determinado que exerçam suas atividades de modo sustentável e que as utilizem como principal meio de sustento de vida. Ao pescador artesanal, que faça da pesca a profissão habitual ou principal meio de vida e, segundo o art. 9º, §14, do Regulamento da Previdência Social, que “não utilize embarcação, ou utilize embarcação de até seis toneladas de arqueação bruta, ainda que com auxílio de parceiro, ou na

condição, exclusivamente, de parceiro outorgado, utilize embarcação de até dez toneladas de arqueação bruta”.

3.4.1 Trabalho em regime de economia familiar

Já quanto à qualificação de segurado especial aos que circundam o produtor rural e o pescador artesanal (cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 anos de idade ou a este equiparado) é entendida como válida desde que trabalhem dentro do grupo familiar respectivo.

Os parágrafos 1º, 7º e 8º, do art. 12 da Lei nº 8.212/1991, todos modificados ou introduzidos pela Lei nº 11.718/2008, tratam a respeito da conceituação do regime de economia familiar e do uso de outras pessoas fora do grupo familiar como empregadas nas atividades rurais.

Contrariando a ordem numérica dos parágrafos, para que se adote uma ordem lógica, sabe-se que o §7º do art. 12 da Lei nº 8.212/1991 determinou que “para serem considerados segurados especiais, o cônjuge ou companheiro e os filhos maiores de 16 (dezesseis) anos ou os a estes equiparados deverão ter participação ativa nas atividades rurais do grupo familiar”. Isso quer dizer que, caso eles exerçam atividades alheias, como trabalho em prefeituras ou em firmas, por falta de qualidade, mesmo que ainda morem juntos ao produtor rural ou pescador artesanal, o que é bastante comum, não poderão ser reconhecidos como segurados especiais apenas por habitarem no mesmo imóvel dos que realmente desenvolvam atividades características do segurado especial. Do mesmo modo, a prática de atividade remunerada por qualquer dos habitantes não irá desconfigurar a caracterização de segurado especial dos outros, de tal forma atestando jurisprudência do STJ:

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. RURÍCOLA. ATIVIDADE RURAL. COMPROVAÇÃO. ROL DE DOCUMENTOS EXEMPLIFICATIVO. ART. 106 DA LEI 8.213/91. DOCUMENTOS EM NOME DE TERCEIRO. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CARÊNCIA. ART. 143 DA LEI 8.213/91. DEMONSTRAÇÃO. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE URBANA POR MEMBRO DA FAMÍLIA. NÃO DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. I - O rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único da Lei 8.213/91, é meramente exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis, portanto, outros documentos além dos previstos no mencionado dispositivo. II - Na hipótese dos autos, houve o necessário início de prova material, pois a autora apresentou documentos em nome do marido, o que também lhe aproveita, sendo despicienda a documentação em nome próprio, nos termos da jurisprudência desta Corte. III - Consoante dispõe o artigo 143 da Lei 8.213/91, o trabalhador rural enquadrado como segurado obrigatório, na forma do artigo 11, VII

da Lei em comento, pode requerer a aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, o que restou comprovado pela Autora. IV - Este Superior Tribunal de Justiça considera que o exercício de atividade remunerada por um dos membros da família, mesmo que urbana, não descaracteriza a condição de segurado especial dos demais. V - Agravo interno desprovido. (BRASIL. Superior Tribunal de Justiça – Quinta Turma. ADRESP 200900619370, Ministro Relator GILSON DIPP, 2010, grifo nosso). O §1º do art. 12 da Lei nº 8.212/1991 diz que o regime de economia familiar é “a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes”. Essa subsistência ficou proibida, portanto, de ser garantida pela utilização de empregados permanentes, mas o §8º do referido artigo garantiu a possibilidade do uso de trabalho exterior ao grupo familiar desde que seja de modo provisório, sem relação de emprego, em tempo de safra, respeitada a proporção de 120 pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho.

A Lei utilizou-se, dessa forma, de uma proporção inversamente proporcional na correlação entre o número de pessoas usadas e o número de dias trabalhados, ou seja, aumentando-se a quantidade de pessoas, o montante de dias tenderá a ser menor. A título de exemplo, se o segurado especial desejar fazer uso de 2 empregados temporários, a quantia de dias em que estes poderão participar das atividades do grupo familiar, sem que provoquem a perda da qualidade de segurado especial do contratante, será reduzida a 60. Na hipótese de serem 3 os temporários, os dias permitidos de trabalho se restringiriam a 40, e assim por diante.

3.4.2 Não descaracterização da qualidade de segurado especial

Por disposições concebidas pela Lei nº 11.718/2008 e embutidas no §9º do art. 12 da Lei nº 8.212/1991, da mesma maneira conforme anteriormente demonstrado, também não importará na descaracterização da condição de segurado especial atividades que venham a envolver:

I – a outorga, por meio de contrato escrito de parceria, meação ou comodato, de até 50% (cinquenta por cento) de imóvel rural cuja área total não seja superior a 4 (quatro) módulos fiscais, desde que outorgante e outorgado continuem a exercer a respectiva atividade, individualmente ou em regime de economia familiar;

II – a exploração da atividade turística da propriedade rural, inclusive com hospedagem, por não mais de 120 (cento e vinte) dias ao ano;

III – a participação em plano de previdência complementar instituído por entidade classista a que seja associado, em razão da condição de trabalhador rural ou de produtor rural em regime de economia familiar;

IV – ser beneficiário ou fazer parte de grupo familiar que tem algum componente

que seja beneficiário de programa assistencial oficial de governo;

V – a utilização pelo próprio grupo familiar, na exploração da atividade, de processo de beneficiamento ou industrialização artesanal, na forma do § 11 do art. 25 desta Lei; e

VI – a associação em cooperativa agropecuária.

A fonte de renda do segurado especial deve ser especificamente assegurada através da ação em atividades rurais. Caso venha a ter outros rendimentos, perde-se a qualidade de segurado especial. Contudo, o §10, do art. 12, da Lei nº 8.212/1991, entende que há certas rendas, dentro de determinados casos, que podem coexistir com a proveniente da atividade originária rural, quais sejam:

I – benefício de pensão por morte, auxílio-acidente ou auxílio-reclusão, cujo valor não supere o do menor benefício de prestação continuada da Previdência Social;

II – benefício previdenciário pela participação em plano de previdência

complementar;

III – exercício de atividade remunerada em período de entressafra ou do defeso, não superior a 120 (cento e vinte) dias, corridos ou intercalados, no ano civil;

IV – exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais;

V – exercício de mandato de vereador do município onde desenvolve a atividade

rural, ou de dirigente de cooperativa rural constituída exclusivamente por segurados especiais;

VI – parceria ou meação;

VII – atividade artesanal desenvolvida com matéria-prima produzida pelo respectivo grupo familiar, podendo ser utilizada matéria-prima de outra origem, desde que a renda mensal obtida na atividade não exceda ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social;

VIII – atividade artística, desde que em valor mensal inferior ao menor benefício de prestação continuada da Previdência Social.

A Lei nº 11.718/2008 garantiu, então, ao segurado especial o exercício de outras atividades sem que este corresse o risco de perder a qualidade de segurado. Serviu para que ele também possa ter outra fonte de renda na época em que não há safra e, consequentemente, também não há como prover o sustento, contribuindo, pois, para a diminuição da miséria. Avalizou o segurado especial na participação da vida política, podendo auferir não somente as obrigações, mas também os vencimentos pecuniários do exercício do cargo de dirigente sindical ou de vereador. Estimulou o desenvolvimento das atividades artesanais e artísticas, sem que fossem enquadrados apenas como artesãos ou artistas, e o uso do imóvel rural como hospedagem para turistas. Possibilitou o recebimento acumulado de benefícios previdenciários entre si e assistenciais, pois ficou entendido que resultariam de fatos geradores distintos. Ainda concedeu ao segurado a chance de fazer parte de plano

previdenciário complementar caso queira permanecer mais bem segurado contra as contingências sociais.

A Lei nº 11.718/2008 foi fundamental para a distinção e caracterização do segurado especial, pois, segundo Dias e Macêdo (2010, p.141), referido ordenamento tem como principais focos:

a) detalhar várias hipóteses de caracterização e descaracterização do segurado especial; b) permitir a contratação de empregados e trabalhadores eventuais de forma temporária; e c) estabelecer a inscrição prévia do segurado especial, vinculando-o à propriedade em que trabalha e ao grupo familiar respectivo, com atualização obrigatória dos dados anualmente.

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