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CAPÍTULO III – REVISÃO DA LITERATURA

3.1 OS TESTES DE IMPARIDADE DO GOODWILL

3.1.2 Os testes de imparidades do goodwill: prós e contras

3.1.2.4 Quantia recuperável do goodwill

A quantia recuperável é o valor mais alto de entre o justo valor de um ativo ou UGC menos os custos de vender e o seu valor de uso (§6, IAS 36).

Por definição, justo valor menos os custos de vender é a quantia a obter da venda de um ativo ou unidade geradora de caixa, numa transação entre partes conhecedoras e dispostas a isso, sem qualquer relacionamento entre elas, menos os custos com a alienação (§6, IAS 36). Já o valor de uso é o valor presente dos fluxos de caixa futuros estimados, que se espere surjam do uso continuado de um ativo ou unidade geradora de caixa e da sua alienação no fim de vida útil (§6, IAS 36).

Dos muitos assuntos da IAS 36 que têm merecido atenção na literatura, o modo como as empresas definem UGC e como medem a sua quantia recuperável, como calculam os custos de capital e estimam o valor residual no cálculo da quantia recuperável, são alguns deles (Peterson e Plenborg, 2009).

Das mesmas ideias comunga o European Financial Reporting Advisory Group (EFRAG) na sua avaliação da IFRS 3. A EFRAG argumenta que a norma introduzirá mensurações duvidosas da quantia recuperável do goodwill (EFRAG apud Peterson e Plenborg, 2009).

O critério do justo valor, sem ter de se recorrer a discussões sobre o significado e sentido da palavra “justo”, acabará sempre por pender para a parte que na negociação mais argumentos esgrimir, podendo o mesmo bem, com diferentes intervenientes, apresentar valores substancialmente diferentes, em especial se para o bem em causa não existir o recurso à consulta de preços correntes fixados num mercado ativo.

A IAS 36 admite como critério de mensuração o valor de uso, mas não explicita como devem ser estimados os diversos determinantes de valor. Por exemplo, a IAS 36 não fornece orientação sobre como deve ser mensurado o valor residual (Petersen e Plenborg, 2010).

A IAS 36 apela a uma limitada divulgação de assunções e processos usados numa organização que tenha elegido o justo valor como referencial para os testes de imparidade, várias divulgações específicas e detalhadas são exigidas para o caso em que o valor em uso é a base adotada para a determinação da quantia recuperável. Estas parecem projetadas para ajudar os utilizadores das demonstrações financeiras a acederem à robustez do modelo de fluxos de caixa descontados usado para estimar a quantia recuperável.

Com efeito, a IAS 36 dedica ao critério do justo valor cinco parágrafos (§§ 25 a 29), enquanto que para o valor de uso vinte e oito parágrafos (§§ 30 a 57). Em termos de requisitos de divulgação, no seu § 134, a IAS 36 dedica duas alíneas ao critério do justo valor para o cálculo da quantia recuperável das UGC, e para o critério do valor de uso 5 alíneas, com grande nível de detalhe de assunções e processos usados.

As divulgações acima mencionadas quanto ao critério do valor de uso, devem explicitar e explicar um conjunto de requisitos de difícil quantificação, que torna esta metodologia facilmente sujeita a práticas oportunistas. Deste modo, as divulgações devem contemplar: uma descrição de cada pressuposto-chave em que a gestão tenha baseado as suas projeções de fluxos de caixa para o período abrangido pelos orçamentos/previsões mais recentes; uma explicação do método utilizado pela gestão na atribuição dos valores a cada pressuposto-chave; a definição do período sobre o qual a gestão tenha projetado os fluxos de caixa, a taxa de crescimento usada e as taxas de desconto a aplicar aos fluxos de caixa projetados (Carlin e Finch, 2007).

O elevado grau de exigência de divulgações, relativamente ao critério do valor de uso para o cálculo do valor recuperável de uma UGC, é compreensível. Este é um complexo processo, que começa com a definição de UGC, a fixação de uma taxa de desconto que traduza a rentabilidade do ativo e os riscos associados, passando pela escolha dos períodos sobre os quais os orçamentos são desenvolvidos, e termina com a adequada seleção da taxa de crescimento no período terminal. Existem condições, neste complexo processo de cálculo do valor realizável dos ativos, mesmo que não sejam procuradas ou intencionais, para que os valores das quantias recuperáveis dos ativos sofram desvios substanciais, com os consequentes efeitos no reconhecimento (ou não) de perdas de imparidade.

À partida, o primeiro momento de reconhecimento e mensuração do goodwill não parece levantar qualquer questão em termos do seu reporte nos balanços das entidades. Contudo, diversos autores referem que nas CAE se sobrevalorizou o goodwill (Rodrigues, 2003, Forbes, 2007, Carvalho, C., Rodrigues, A. M., Ferreira, C., 2008), em especial nos anos 90, com evidentes repercussões no rigor e fiabilidade das DF e consequências no futuro ao nível dos montantes de imparidades a reconhecer na mensuração subsequente do goodwill (Al- Khadash e Salah, 2009) .

Se num processo de CAE se sobrevalorizou o goodwill, em que medida se poderão efetuar testes de imparidade deste ativo, que respeitem critérios de rigor e transparência exigidos pelas normas?

A existência de um valor alto de goodwill relativamente ao preço de aquisição de uma entidade, pode significar que aquele ativo está sobreavaliado, originando nos anos subsequentes o reconhecimento de imparidades (Al- Khadash e Salah, 2009).

Num estudo realizado por Forbes (2007) às 100 maiores empresas dos EUA, no período compreendido entre 2002 e 2007, o autor refere-se aos valores que aquelas empresas reconhecem de goodwill como “buraco negro”, dado que, no seu entender, enquanto os seus ativos fixos tangíveis se encontram reconhecidos ao justo valor, em bases consideradas razoáveis, o goodwill é divulgado sem qualquer explicação dos valores de que é composto.

Quanto à escolha do modelo de cálculo do valor recuperável das UGC, o estudo que temos vindo a referir de Petersen e Plenborg (2010), confirma a prevalência do método do valor de uso (41 empresas), em relação ao método do justo valor menos custos para vender (5 empresas), enquanto ambos os métodos foram aplicados pelas restantes (16 empresas).

Para estes autores, o problema central no cálculo do valor de uso como método para a estimação da quantia recuperável, para além da problemática que diz respeito à não divulgação dos cálculos e explicações que estão na base da sua elaboração, relaciona-se com a taxa de desconto utilizada, matéria de central importância e que se aborda no ponto seguinte.