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CAPÍTULO II ASPECTOS TEÓRICOS INERENTES À PESQUISA

2.4 O QUE DIZEM AS PESQUISAS SOBRE A ESCOLARIZAÇÃO DOS FILHOS

Conforme podemos observar, a maioria dos pesquisadores, elencados acima, nos quadros 1 e 2, direcionou seus estudos à compreensão da formação da identidade, cultura e a relação das pessoas ouvintes com seus pais surdos; e alguns deles focaram nas questões linguísticas dos filhos de pais surdos. Não encontramos nenhum trabalho em que o objetivo fosse, especificamente, discutir a escolarização dos alunos ouvintes que têm pais surdos. Os autores abordam sutilmente esse aspecto apenas quando há depoimentos dos participantes, relatando os conflitos e desafios pelos quais passaram na vida escolar, sem, contudo, investigar a posição da escola em relação a esses alunos e alunas.

Quadros (2017, p. 221), por exemplo, a partir dos relatos de seus participantes e de sua própria experiência, destaca que “a escola é um acontecimento na vida desses codas, que apresenta um impacto significativo nas relações estabelecidas pelas zonas de contato. Inicialmente, a escola representa um espaço de desconforto para a maioria dos entrevistados”.

Entre os principais conflitos escolares, vivenciados pelos filhos ouvintes de pais surdos, pesquisadores (PEREIRA, O., 2013; SOUZA, 2014; STREIECHEN; CRUZ; KRAUSE-LEMKE, 2015; QUADROS, 2017) destacam a dificuldade de aprender a língua oral e a escrita, uma vez que estão habituados a falar sempre por meio da língua de sinais, principalmente quando há mais surdos na família (avós, tios, primos...) além dos pais. Vejamos um relato de uma das participantes de Pereira, O. (2013, p. 97):

Eu tive muitas dificuldades em aprender o português até hoje eu tenho. Principalmente na hora de escrever. Quando eu comecei na escola eu lembro que... eu achava tudo muito novo. Nossa! Vou falar com a boca! Não vou falar com as mãos! [...] pra mim era ‘casa vou’ [...] então foi e ainda é muito difícil de passar para o papel o que você está pensando em Libras. (Hermiose).

Essa mesma participante, Hermiose, admite que, algumas vezes, forjou, ou seja, distorceu as falas dos professores ou da direção a seu favor, porque os mesmos estavam criticando ou denunciando seu comportamento a seus pais: “Eu adoro falar, então eu falava muito, aí a professora chamava minha mãe pra conversar e eu traduzia ‘a Hermiose perfeita’” (Hermiose) (PEREIRA, O., 2013, p. 96).

Percebemos, assim, que há escolas que depositam na criança ouvinte toda a responsabilidade de mediar a comunicação com os pais surdos. Entretanto, isso não significa que a mensagem, repassada pela criança, seja por meio da língua oral ou de sinais, será

sempre de acordo com o que realmente foi falado. Primeiro, porque a criança, ao querer se eximir da culpa e, consequentemente, do castigo, poderá ocultar ou distorcer informações e, segundo, é possível que a criança não consiga entender na íntegra tal mensagem, da mesma forma que o adulto, assim, os pais também não terão acesso à informação completa e/ou verdadeira. Vejamos a seguir um depoimento de outro participante do estudo de Pereira, O. expondo que, desde muito criança, precisava mediar a comunicação entre seus familiares e a escola:

Quando tinha que conversar com a diretora, professora e não era muito legal sempre chamar os avós, que de vez em quando eles trabalhavam e saiam, então já na escola desde pequeno no pré com cinco ou seis anos, comecei a ajudar eles, pra interpretar. (Colin). (PEREIRA, O., 2013, p. 96).

O fato de os filhos ouvintes precisarem atuar como intérpretes de seus pais surdos, é um diferencial bastante significativo entre o aluno ouvinte filho de surdos e o aluno ouvinte filho de ouvintes. No primeiro caso, há uma responsabilidade a mais que não é comum às crianças filhas de ouvintes.

Nesse caso, de a criança ouvinte precisar assumir a posição de ‘intérprete’ para os pais surdos na escola e em outros lugares públicos, é notório que, normalmente, o que se constam nas leis nem sempre é sinônimo de ação. Se assim o fosse, todas as instituições púbicas brasileiras, desde o ano de 2004, a partir da obrigatoriedade do Decreto nº 5.296/2004 (BRASIL, 2004), já teriam extinguido qualquer tipo de barreira comunicativa entre surdos e ouvintes em todos os locais públicos. Entre os diversos serviços, dos quais as pessoas com deficiências têm direitos, esse Decreto, em seu Capítulo II, Art. 6o , § 1º, prevê “serviços de atendimento para pessoas com deficiência auditiva, prestado por intérpretes ou pessoas capacitadas em Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS e no trato com aquelas que não se comuniquem em LIBRAS [...]” (BRASIL, 2004).

Um dos principais entraves que as políticas públicas de inclusão têm se deparado, na área da surdez, concentra-se especialmente na escassez do profissional tradutor e intérprete de língua de sinais (TILS) para sanar todas as necessidades de demanda. Não há número suficiente de TILS para mediar a comunicação entre alunos surdos e comunidade escolar, sobretudo oferecer suporte em escolas em que não há surdos, mas apenas pais surdos de alunos ouvintes.

Por meio do Decreto nº 5626/2005 (BRASIL, 2005), a disciplina de Libras tornou-se obrigatória nas grades curriculares dos cursos de formação de professores e fonoaudiologia. Entretanto, essa disciplina tem como objetivo apenas aproximar aluno surdo e professor em

sala de aula, por meio de uma comunicação, em língua de sinais, ainda muito básica. A carga horária destinada à disciplina, pelas Instituições de Ensino Superior (IES), não permite que o futuro professor aprenda, concomitantemente, a LS com propriedade e também conteúdos tais como: metodologias contempladas na educação de surdos; cultura e identidade(s) surdas; a história das pessoas surdas; estratégias de ensino e avaliação; especificidades da escrita dos surdos; inclusão e tantos outros temas importantes e necessários para que os futuros docentes compreendam seu papel diante do aluno surdo, em contextos escolares inclusivos.

O único curso que forma TILS no Brasil é o Letras Libras ofertado por algumas IES, mas há certa dificuldade de acesso principalmente para as pessoas que residem distante dos centros e capitais, onde ocorre essa formação, conforme apontado por Lacerda (2006, p. 170):

Tem crescido o número de cursos oferecidos, todavia eles se concentram nos grandes centros, atingindo um número restrito de pessoas. Desse modo, é difícil encontrar, em cidades do interior, pessoas com formação específica como intérprete da LIBRAS e que se disponham a atuar como intérprete educacional, já que este trabalho exige dedicação de muitas horas semanais, com horários fixos.

Portanto, se há dificuldades em sanar os bloqueios comunicativos com os alunos surdos, pela falta de profissionais TILS, que dirá com os pais surdos dos alunos ouvintes, espalhados pelas inúmeras escolas brasileiras. Assim, é perfeitamente compreensível que as escolas, em vez de chamar os pais surdos para reunião escolares, prefiram chamar os avós, os tios, os irmãos ou outros membros da família desse aluno. Nesse contexto, percebemos que estamos há anos luz de uma inclusão sem barreiras e que atenda efetivamente todas as necessidades das pessoas com deficiências no Brasil.

Em relação às possibilidades de os pais surdos auxiliarem seus filhos ouvintes nas tarefas escolares, Andrade (2011) expõe alguns depoimentos de seus participantes nos quais a maioria indica que seus pais não conseguiam ajudá-los pela dificuldade que encontravam com a LP. Dessa forma, normalmente eles recorriam aos parentes mais próximos (avós, tios, primos etc.).

Alguns dos participantes do estudo de Andrade (2011) revelam que sentiam algum tipo de constrangimento pelo fato de os pais serem surdos, principalmente quando precisavam se comunicar publicamente com os pais. Vejamos, a seguir, alguns desses depoimentos: “A vergonha que eu tinha é que a gente andava de ônibus e eu gostava demais de conversar. Até hoje a gente ‘bate altos papos’. E, aí, a gente ia conversar no ponto do ônibus e o povo ficava olhando.” (Amanda). “Tive alguns momentos de vergonha com meus amigos. Os pais deles eram ouvintes, tinham mais facilidade, as pessoas aceitavam mais.” (Beatriz). “Eu ficava com

vergonha. Ficava assim: ‘Nossa o que eles vão pensar de mim?’, que eu tenho alguma doença, que eu não posso ser saudável ou que eu carrego alguma coisa que contamina. É bem duro assim.” (Paula). (ANDRADE, 2011, p. 87-88).

Esses depoimentos revelam que a língua de sinais, apesar de sua difusão no Brasil, não possui o mesmo status linguístico das demais línguas. Quando uma pessoa fala publicamente, por meio da Língua Portuguesa e Inglesa ou francesa, por exemplo, logo, subentende-se que ela é bilíngue e dotada de certa inteligência, pois domina dois códigos linguísticos. Isso faz com que muitos demonstrem admiração por essa pessoa bilíngue. Entretanto, quando uma pessoa fala por meio da Língua Portuguesa e da Libras, subentende-se que uma delas é ‘deficiente’ e isso desperta preconceito ou piedade por parte de muitas pessoas, pois “o valor atribuído à surdez como falta exerce influência direta no uso da língua de sinais” (QUADROS, 2017, p. 68). Além disso, a língua de sinais “é a marca que evidencia a presença de uma pessoa surda” (PEREIRA, O., 2013, p. 48) e “a cultura dominante vê a surdez como algo ruim” (QUADROS, 2017, p. 68). O estigma ou o preconceito, portanto, estão associados tanto à LS - considerada a ‘linguagem dos surdos-mudos’; ‘linguagem dos gestos’ – que a desvalorizam e a deixam em um patamar inferior às demais línguas de prestígio, quanto à pessoa surda - que se comunica por meio dessa língua - considerada ‘deficiente’ e, portanto, incapaz de exercer sua própria cidadania. De acordo com Quadros (2017, p. 25), “o ponto de vista da surdez como ausência de audição define as pessoas surdas como deficientes. Dessa forma, as línguas de sinais não são consideradas línguas, mas sim instrumentos para ‘ajudar’ essas pessoas a se tornarem melhores (‘normais’) ou serem curadas da surdez”.

Essa mesma pesquisadora enfatiza que “as crianças codas vivem essa concepção a partir de seus próprios familiares [...] que atribuem à surdez um valor menor e manifestam suas frustrações e seus desejos de que eles pudessem ouvir.” (QUADROS, 2017, p. 68). Mais adiante, a partir de suas experiências escolares e o modo como seus pais surdos eram vistos, a autora revela que “[...] a Libras não era considerada língua. Eles pareciam que ‘olhavam’ para meus pais como ‘pobres coitados que eram surdos’, não como gente normal.” (QUADROS, 2017, p. 152-153).

Hadjikakou et al. (2009) também identificaram que o maior desafio dos participantes do estudo estava relacionado ao olhar diferenciado da sociedade aos pais surdos. Vejamos o depoimento de um de seus participantes: “eu estava em algum lugar com meus pais. Ouvi comentários de algumas pessoas ouvintes ‘Oh, como essas pessoas são infelizes, são surdo- mudo’.” (P 3) (HADJIKAKOU et al., 2009, p. 496).

Esse estigma, que tantos surdos quanto os filhos de surdos vivenciam, por se comunicarem por meio de uma língua considerada minoritária e sem prestígio social, pode fazer com que alguns filhos ouvintes de pais surdos não se sintam confortáveis em conversar com seus pais surdos em público. Entretanto, conforme salienta Quadros (2017, p. 69):

Os olhares marcados com estigma, estereótipos e preconceitos fazem parte da constituição dos codas. Eles aprendem a lidar com isso e, a partir disso, relacionam- se com os surdos e com os ouvintes que fazem parte de seu mundo, tanto em língua de sinais como na língua falada. Suas interações com surdos e ouvintes são influenciadas por essas experiências e estampadas em seus discursos, aparecendo no dia a dia e em suas histórias.

Além das entrevistas com os filhos de surdos, Pereira, O. (2013) analisou alguns depoimentos dos pais surdos em relação aos filhos. No aspecto escolar, um desses pais dá o seguinte depoimento:

Ele começou a ir para a escola e começamos a perceber que na 1ª séria ele tinha muita dificuldade. Ele começou a ficar angustiado e preocupado. A professora também. Mas eu disse para ele, olhe filho, olhe para o seu pai. Lá na escola as pessoas são ouvintes. Você se acostumou com uma família surda, usuária da LIBRAS. Divida seu cérebro em dois. Uma parte é ouvinte e a outra usa LIBRAS. Quando você estiver com alguma dúvida, não fique esperando. No mundo ouvinte os pais podem ajudar, mas para nós surdos é mais difícil. (Pai de Colin). (PEREIRA, O., 2013, p. 97).

Acerca da escolaridade dos alunos ouvintes de pais surdos, Quadros e Masutti (2007, p. 257) denunciam que:

Dentro dessas escolas, os pais se tornam figuras alienígenas, não recebem o

feedback em relação aos seus filhos, porque a maioria delas não está preparada nem

para compreender a cultura surda e muito menos a língua de sinais. Isso cria uma cisão entre o mundo escolar e o universo íntimo, espaços que concorrem de maneira distinta na forma de colocar relevância aos assuntos e construir um olhar para a realidade.

Como forma de contextualizar essas práticas escolares, destacadas por Quadros e Masutti (2007), Pereira, O. (2013), ao relatar o seu percurso escolar, enfatiza que em sua escola haviam classes denominadas como ‘forte’ e ‘fraca’. Como ele não havia passado pela pré-escola, foi inserido na classe ‘fraca’. Depois de superar suas dificuldades, passou para a sala de aula ‘normal’. Entretanto, ali também havia uma separação: a professora dividia a lousa em duas partes, direita para alunos adiantados e, esquerda, para os ‘atrasados’. Todas as crianças que ficavam do lado esquerdo eram de baixa renda e das favelas próximas à escola. Pereira, O. sentia-se satisfeito por, desta vez, estar na ala dos adiantados, mas, hoje, como

educador, ele reconhece que isso foi um crime institucionalizado, pois a segregação ocorria dentro da própria escola e incentivada pelos professores. “Éramos ensinados desde muito cedo que a oportunidade não era igual para todos.” (PEREIRA, O., 2013, p. 20).

Melo (2015) sugere que a presença de ouvintes filhos de surdos dentro dos ambientes escolares, muitas vezes, se confunde com o papel de tradutor e intérprete de língua de sinais, o que deve ser (re)pensado e (re)discutido com mais profundidade.

Essa discussão, de que os filhos ouvintes, normalmente, se tornam ‘intérpretes’ dos pais ou seguem a profissão relacionada à área da surdez foi efetuada por Hadjikakou et al. (2009) e por Moroe (2013). Dos sete participantes do estudo de Moroe (2013), por exemplo, três são estudantes universitários; um é intérprete de língua de sinais; dois são professores de surdos; dois trabalham em empresas privadas e um tem seu próprio negócio. Já na pesquisa de Moroe (2013), sete dos participantes atuam como intérpretes profissionais.

Essas reflexões serviram para adensar nossa compreensão em relação aos inúmeros desafios que os ouvintes filhos de surdos enfrentam no seu dia a dia, oportunizando-nos as seguintes conclusões:

a) Alguns filhos de surdos são considerados bilíngues, pelo fato de se comunicarem por meio de duas línguas (a de sinais - utilizada pelos pais; e a língua oral - utilizada pelos ouvintes que os rodeiam); e biculturais porque vivem entre duas culturas (a dos surdos e a dos ouvintes).

b) A maioria dos filhos ouvintes que têm pais surdos precisa assumir responsabilidades em relação aos pais durante a infância e isso, muitas vezes, faz com que os papeis se invertam, ou seja, ao invés dos pais tomarem conta dos filhos, são os filhos que tomam conta dos pais.

c) Há filhos de surdos que se sentem constrangidos ao se comunicarem com os pais, por meio da língua de sinais, em ambientes públicos, diante dos olhares curiosos e, às vezes, preconceituosos da sociedade.

d) O exercício de interpretar e a responsabilidade que os filhos assumem em relação aos pais surdos estão entre os principais aspectos de negatividade denunciada pelos pesquisadores (PEREIRA, O., 2013; STREIECHEN; CRUZ; KRAUSE- LEMKE, 2015; SOUZA, 2014), ocasionando um amadurecendo precoce, bem como a perda de parte de suas infâncias.

e) Alguns alunos ouvintes filhos de pais surdos encontram inúmeras dificuldades associadas ao processo de ensino e aprendizagem. Uma dessas dificuldades está atrelada à escrita, visto que eles se comunicam, durante muito tempo, quase que

exclusivamente, por meio da LS com os pais surdos. Com isso, eles internalizam a estrutura sintática dessa língua muito mais do que a da língua oral. Isso poderá gerar certa confusão na hora de escrever, pois precisam utilizar a estrutura da LP que difere completamente da LS. Isso pode gerar consequências negativas no processo escolar, uma vez que esses aspectos, normalmente, são totalmente negligenciados pela maioria das escolas brasileiras.

No Brasil, não há leis e/ou discussões que contemplem a inclusão escolar de filhos ouvintes de pais surdos. Assim, a desinformação da maioria dos professores, sobre a cultura e questões linguísticas desses alunos, normalmente, é nutrida por rótulos que podem ocasionar marcas profundas na escolarização e na vida desses sujeitos.

Enfim, são tantas experiências diferentes vivenciadas pelos filhos ouvintes de pais surdos que, conforme Souza (2014, p. 111), não se pode ensinar em um curso, “mas tem a ver com a singularidade que apenas quem tem pais surdos pode entender”. A escola precisa estar atenta aos indícios de qualquer tipo de intolerância ou baixo rendimento escolar de alunos ouvintes, filhos de pessoas surdas, para que, dessa forma, possa tomar as iniciativas coerentes e de acordo com cada caso, a fim de ofertar igualdade de oportunidades e possibilidades para todos, conforme determinam as leis e diretrizes educacionais brasileiras que dizem respeito à inclusão (STREIECHEN; CRUZ; KRAUSE-LEMKE, 2015).

Diante desses resultados, torna-se impossível aos pesquisadores fecharem os olhos ou ignorar os inúmeros conflitos, internos e sociais, que os ouvintes filhos de surdos enfrentam, tanto com os pais surdos, quanto com a sociedade composta por muitos pre(conceitos) e dentro das próprias escolas, diante do desconhecimento dos docentes em relação às peculiaridades culturais desses educandos.

Cabe-nos também enfatizar que a maioria dos autores, citados nesse capítulo, tiveram participantes adultos e alguns realizaram seus estudos em tempos históricos diferentes. Os surdos das décadas passadas não conseguiam frequentar escolas, ter uma profissão ou participar de uma vida social ativa e de forma independente. Assim, os filhos ouvintes eram o único canal entre o mundo surdo e o mundo ouvintes desses pais. Não pretendemos generalizar e afirmar que, atualmente, todos os surdos têm e usufruem dessas oportunidades. Mas, hoje, há muito mais oportunidades de os surdos ingressarem à escola e ter acesso às informações do que as gerações passadas, da década de 1970/1980, em que a tecnologia não era tão desenvolvida como agora. Existe uma grande parcela de surdos(as) – mestres, doutores – atuando, como professores, pesquisadores, nas universidades ou em outras áreas profissionais, com uma vida intensa e repleta de responsabilidades. As redes sociais, o celular,

o computador etc. são ferramentas importantíssimas na vida dos surdos, uma vez que a essas tecnologias tornaram a comunicação dessa população muito mais independente, garantindo- lhes informação instantânea, sem precisar da mediação/interpretação de seus filhos ouvintes. Nesse panorama, há uma enorme chance de os filhos ouvintes dos surdos da geração atual não passarem pelos mesmos desafios desses participantes, destacados nos trabalhos dos autores das quadros 1 e 2. Contudo, serão as pesquisas, nessa direção, que poderão de fato constatar esse pressuposto. Mais adiante, na categoria 4, a partir de alguns relatos de P, poderemos entender se ele exerce ou não a função de ‘interprete’ de sua mãe ou assume responsabilidades dentro de casa.