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RAÇAS SÃO ESPÉCIES INCIPIENTES ?

No documento Como Surgem as Espécies ? Gustavo Gollo (páginas 62-67)

Todos os mecanismos de especiação gradual pressupõe a diferenciação dos grupos através de uma sucessão de passos até a complementação do processo de especiação.

Portanto, em alguma etapa deste processo, o grupo em especiação deve se encontrar em uma fase em que já se apresenta distinto da espécie original mas ainda não adquiriu o status de uma espécie boa. Os defensores dos modelos graduais de especiação denominamos grupos que atravessam esta fase de raças biológicas.

De acordo com o mecanismo de especiação direta, ao contrário, a especiação se processa tão rapidamente que não existem grupos em estados intermediários que possam ser chamados de “raças”.

No entanto, a observação da natureza evidencia grupos com características distintas dos indivíduos comuns da espécie e que podem ser chamados de raças pelos taxonomistas.

Este fato pode ser visto, erroneamente, como uma refutação do mecanismo de especiação direta.

De acordo com Mayr ( 1970, p. 276 ) os “tipos de animais que não apresentam ( ou apresentam apenas pequenas ) diferenças estruturais, apesar de claramente separados por caracteres biológicos, são chamados raças biológicas. Uma análise mais cuidadosa revela que esta definição se adapta a uma série muito heterogênea de fenômenos”.

É certo que muitos grupos classificados como raças biológicas constituem, de fato, espécies crípticas.

Outros grupos ligeiramente diferenciados da espécie original e que podem ser chamados de raças podem ser o fruto de um processo similar ao de especiação direta, ainda que incapaz de gerar uma nova espécie. Vimos anteriormente (seção 2.e) que, para que surja uma nova espécie é necessário o surgimento de um novo mecanismo de isolamento reprodutivo que seja antagônico ao da espécie ancestral. É possível, no entanto, que surja um novo mecanismo reprodutivo, mas que ele não seja antagônico ao anterior. Por exemplo, o surgimento da preferência pelos indivíduos mais brilhantes só promove especiação se a espécie já possui anteriormente a preferência oposta pelos indivíduos menos brilhantes. Se não é este o caso, a preferência pelos mais brilhantes deve se alastrar por toda a espécie sem provocar a cisão do grupo. Mas, enquanto parte da população está sujeita à seleção sexual dos indivíduos mais brilhantes e a outra parte não, pode-se

encontrar animais muito brilhantes, nas regiões em que predomina a preferência por esta característica, em contraste com animais não brilhantes de outras regiões.

É possível também que a seleção natural diferente em áreas distintas, aliada à deriva genética, se encarregue da produção de tipos regionais peculiares. No entanto, se estas diferenças não alteram o mecanismo reprodutivo dos indivíduos em questão, elas não estão relacionadas à especiação, e caso os indivíduos dos tipos diferenciados se encontrem com os outros, intercruzam normalmente, provocando a troca gênica e gerando indivíduos intermediários entre os tipos.

Se grupos como estes podem ser chamados de raças, devemos enfatizar que eles não exemplificam um passo em direção à especiação.

Cap.3 REPLICADORES

3.1 Definição

Vamos definir um “replicador” como qualquer entidade que produz cópias de si mesma. Entre os atributos destas cópias deve estar o potencial para produzir cópias de si mesmas. Deste modo, potencialmente, um replicador é um ancestral de uma linhagem indefinidamente longa de replicadores.

Podemos imaginar muitas classes possíveis de replicadores. Como exemplos comuns de replicadores temos os seres vivos. Quando se reproduzem eles fazem cópias muito boas de si mesmos, ainda que, normalmente , imperfeitas, e, potencialmente, estas cópias são reprodutoras.

Outra classe de replicadores pode ser ilustrada pelos genes e cistrons. Esta classe difere da anterior em virtude de que estas entidades, muitas vezes, produzem cópias perfeitas de si mesmas. Por esta razão chamo esta classe de “replicadores estritos”. De acordo com Dawkins (1984, p. 133) “um gene no núcleo de uma linhagem célula é um replicador, mas um organismo individual que se reproduz sexuadamente não é. Ele não faz cópias (perfeitas) de si próprio. (“a gene in the nucleus of a germ-line cell is a replicator, but a sexually reproducing individual organism is not. It does not make copies of itself.”).

Deste modo, fica claro que no referido texto, Dawkins considera “replicadores” apenas aqueles tipos aqui considerados “replicadores estritos”. Portanto, há uma diferença de terminologia entre este texto e o de Dawkins.

É possível também imaginar a classe dos replicadores imateriais, aqueles que não ocupam lugar no nosso espaço físico. Assim, podemos seguir Dawkins (1979) e considerar as “idéias” como replicadores pertencentes a esta classe.

Podemos, de fato, distinguir uma vasta gama de classes de replicadores, que diferem quanto a uma ou outra característica.

Imaginemos um universo povoado por um único replicador em um dado momento.

Posteriormente, este replicador produzirá cópias de si mesmo e estas cópias produzirão outras cópias, de forma que, algum tempo depois, este universo poderá estar povoado por uma infinidade de cópias do replicador original. Se o replicador em questão é do tipo estrito que só produz cópias idênticas de si mesmo, com o passar do tempo, o universo estará povoado por clones. Se, no entanto, o replicador original é capaz de produzir cópias imperfeitas de si próprias, com o passar do tempo, o universo povoado inicialmente por um único replicador poderá abrigar uma enorme diversidade de novas formas replicadoras.

Se os diferentes replicadores têm aptidões distintas, quero dizer, se as diferentes formas replicadoras tendem a produzir replicadores da própria forma em proporções distintas, provavelmente, as formas mais aptas para a replicação deixam mais descendentes que as outras. Por esta razão, com o passar do tempo, este universo tenderá a estar povoado por um grande número de replicadores muito aptos, e por um menor número de

replicadores menos aptos para a replicação.

No caso de replicadores materiais em um universo finito é esperado que em algum momento surja competição entre as formas replicadoras. Em seguida, deverá ocorrer a extinção dos tipos menos aptos.

Um breve raciocínio do leitor deverá levá-lo à conclusão que, para muitas classes de replicadores, o surgimento de um único replicador em um universo finito acarretaria,

provavelmente, a geração de vários subgrupos de replicadores assemelhados, subgrupos estes distintos uns dos outros, de forma que, em um sentido muito amplo, seríamos levados a descrevê-los como várias “espécies” de replicadores.

No documento Como Surgem as Espécies ? Gustavo Gollo (páginas 62-67)

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