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OU CLINICAMENTE N° EUTANÁSIAS 2003 450

2.6 Diagnóstico

2.6.4 Reação em cadeia pela polimerase (PCR)

Apesar da alta sensibilidade dos testes sorológicos e parasitológicos, eles não discriminam as espécies de leishmanias. O aparecimento de novos focos em áreas não tradicionalmente endêmicas para LVC tornou-se um problema no momento de distinguir casos autóctones de casos adquiridos em

áreas endêmicas, os casos alóctones. As espécies de Leishmania presentes na América Latina pertencem a dois grupos taxonômicos. Um deles é o sub-gênero Leishmania, composto pela L. mexicana e L. amazonensis, responsáveis pela forma cutânea localizada ou difusa; e a L. chagasi, causadora da forma viscerotrópica no novo mundo. O outro sub-gênero, Viannia, compreende a L. braziliensis, L. panamensis e L. guyanensis, que causam lesões cutâneas e mucocutâneas. A variabilidade das espécies é estudada tradicionalmente por análise multilocus por eletroforese baseada em 15 enzimas. O polimorfismo dos aminoácidos é responsável pela mudança da mobilidade enzimática produzindo diferentes fenótipos. No entanto, a identificação das espécies leva de dois a três meses para ser concluída. Essa técnica requer o isolamento do parasito em meios de cultura, todavia, muitas formas promastigotas não se desenvolvem nos meios (GOMES et al., 2006).

Tanto as leishmanias como outros kinetoplastídeos, possuem uma complexa rede de moléculas de DNA circular dentro de uma única mitocôndria. O DNA mitocondrial do parasito representa aproximadamente 20% do DNA total celular e está organizado em rede discóide, onde milhares de minicírculos e maxicírculos interligados constituem 95% de sua estrutura. Cada minicírculo completo possui de 700 a 800 pares de bases, sendo que 200 pares correspondem a uma região conservada (DEGRAVE et al., 1994).

A PCR é muito sensível e específica e possibilita a identificação do DNA parasitário em tecidos e fluidos provenientes de humanos e caninos infectados (MOREIRA et al., 2002). O desenvolvimento da PCR proporcionou grande avanço nas técnicas de biologia molecular relacionadas ao diagnóstico da leishmaniose. Primers designados para amplificar seqüências encontradas em minicírculos de KDNA de leishmanias de diferentes espécies foram testados em vários tecidos. Em estudo realizado no Sudão, a PCR foi considerada mais sensível do que a microscopia para a detecção de parasitos em aspirados de linfonodos e de medula óssea. Além disso, a PCR pode ser importante no momento de determinar o sucesso do tratamento, pois em pacientes humanos tratados para LV que foram negativos na PCR utilizando tecido de linfonodo, não houve recidiva ou desenvolvimento de leishmaniose cutânea, enquanto pacientes que foram positivos na PCR sob as mesmas condições apresentaram leishmaniose cutânea pós- calazar ou recidivas (SUNDAR e RAI, 2002; HU et

al., 2000). Ferreira et al (2008) realizaram PCR de material proveniente de swab conjuntival obtendo alta freqüência de positividade (de até 73,9%). Essa técnica é muito útil no diagnóstico da LVC e pode ser aplicada também no monitoramento de cães vacinados.

O diagnóstico sorológico de pacientes imunocomprometidos é de difícil interpretação, com muitos resultados falsos negativos. A PCR assume importância por revelar a presença do parasito em vários tipos de amostras, como sangue periférico, líquido ascítico e efusão pleural. Adicionalmente aos métodos clássicos para o diagnóstico da LV, como o parasitológico direto e cultura, a PCR é uma ferramenta importante que deve ser considerada pelos clínicos, que avaliam pacientes de áreas endêmicas (DIEHL et al., 2004).

Em estudo comparativo no qual foram utilizadas técnicas microbiológicas convencionais e PCR com iniciadores espécie-específicos, tomando como amostra biológica sangue periférico de pessoas imunocompetentes e imunocomprometidas, a PCR mostrou sensibilidade e especificidade elevadas em ambos os casos (ANTINORI et al., 2007).

Leontides et al (2002) pesquisaram pela RIFI e PCR em amostra de soro e de medula óssea de 73 cães saudáveis provenientes de área endêmica na Grécia. Na PCR obtiveram 46 (63%) amostras positivas enquanto que na RIFI apenas 9 (12,3%). As técnicas de PCR utilizadas para leishmaniose variam de acordo com os primers utilizados. Lachaud et al (2002) demonstraram que os iniciadores oriundos do cinetoplasto são mais sensíveis, principalmente o K13A- K13B e o RV1-RV2, detectando até menos de 10 parasitos por mililitro de sangue. Os primers provenientes do cinetoplasto provaram ser mais adaptados pois detectaram os parasitos em 100% dos cães soropositivos. A sorologia se mostrou ineficiente na detecção da LVC em um grande número de casos sintomáticos, enquanto que a PCR foi positiva em casos sintomáticos como assintomáticos.

Gomes et al (2006) observaram que o uso dos primers RV1 e RV2 diferenciou a L. chagasi dentre outras espécies de leishmanias. Não foi obtido nenhum produto da PCR a partir de L. braziliensis e L. amazonensis, prevalentes em muitas regiões brasileiras. Da mesma forma, não foi obtido a partir de T. cruzi, outro kinetoplastídeo filogeneticamente próximo das leishmanias. Com a dispersão da L. chagasi em áreas que antes eram

endêmicas somente para L. braziliensis, a PCR é interessante por discriminar as espécies envolvidas, ser rápida, sensível, não necessitar de cultura dos parasitos, adequando-se principalmente ao controle epidemiológico, que necessita de resultados laboratoriais eficientes e rápidos (GOMES et al., 2006).

2.7 Controle

As medidas de controle de LV envolvem fundamentalmente o tratamento de casos humanos, borrifação de casas e peridomicílios com inseticidas de ação residual e identificação com eutanásia de cães sorologicamente positivos. Recomendam-se, também, o destino adequado do lixo e a remoção de entulho e da matéria orgânica do peridomicílio (BRASIL, 2002a).

Há necessidade de expandir as linhas de conduta e estratégias para o controle da leishmaniose visceral, pois apesar das medidas implantadas, os indicadores epidemiológicos revelam que ainda não se obteve impacto positivo no controle da doença (BRASIL, 2002b). Desta forma, estudos sorológicos de cães naturalmente infectados para obtenção de métodos diagnósticos que facilitem a realização de inquéritos epidemiológicos são úteis para se conhecer a distribuição geográfica da LVC no país (REIS, 2001).

Tendo em vista as dificuldades de controle e vigilância da doença, as ações têm se baseado em uma melhor definição das áreas de transmissão ou de risco. O novo enfoque visa incorporar a vigilância dos estados e municípios silenciosos, ou seja, sem ocorrência de casos humanos e em cães, para se evitar ou minimizar os problemas referentes ao agravo em áreas sem transmissão. Nas áreas com transmissão de LVC, após estratificação epidemiológica, as medidas de controle são individualmente distintas e adequadas. Entretanto, é de fundamental importância que as medidas usualmente empregadas no controle da doença sejam realizadas de forma integrada, para que possam ser efetivas (BRASIL, 2003).

A contribuição da eutanásia dos cães positivos para o controle da doença é discutível. O impacto dessa forma de controle é muito conflitante por se mostrar trabalhoso, de eficácia duvidosa e desagradável para os médicos veterinários e proprietários (DIETZE et al., 1997). Os cães possuem muitas funções na sociedade moderna e desta forma, a saúde e o bem-estar desses

animais são extremamente importantes para os seus proprietários tanto pelo aspecto de saúde pública como social que ele desenvolve dentro de uma família (BEAVER, 2005). Segundo Dietze et al (1997), a evolução das taxas de soropositividade em humanos no início e aos 12 meses em duas áreas, uma com eliminação e outra sem eliminação de cães, não revelou diferença significante entre elas.

Em estudo conduzido em um bairro de Teresina no Piauí, 34 lotes foram alocados aleatoriamente com quatro tipos de intervenção: uma com borrifação de inseticidas intradomicilar e de anexos; outra com borrifação intradomicilar associada à eliminação de cães soropositivos; outra com borrifação intradomiciliar, de anexos e eliminação canina e outra com apenas borrifação intradomiciliar. Em comparação com os lotes que receberam apenas borrifação intradomiciliar, a eliminação canina diminuiu em 80% a incidência da infecção. Por outro lado, a borrifação de anexos adicionalmente à borrifação intradomicilar com ou sem eliminação de cães ou com eliminação de cães não se associou significantemente à redução da soroconversão. Os resultados de trabalhos que abordam a eficácia da eliminação dos cães são ainda conflitantes, mostrando que há necessidade de estudos futuros relacionados a esta variável do programa de controle da LVC (COSTA et al., 2007).

Entretanto, apesar da eliminação dos cães infectados não ter sido claramente comprovada como eficaz no controle da doença, o risco para o homem - da manutenção de um cão infectado no domicílio, além da baixa eficiência dos protocolos terapêuticos - justifica, até o momento, o seu uso como método de profilaxia. Um dos maiores desafios para o aprimoramento das estratégias de controle é a identificação de cada elemento da cadeia epidemiológica, bem como seu impacto na transmissão (MESTRE e FONTES, 2007).

Não há nenhuma forma de controle relacionada ao trânsito de cães possivelmente infectados entre áreas endêmicas e não endêmicas. A proximidade entre cidades não endêmicas e regiões onde a doença ocorre, associada às condições climáticas e fisiográficas propícias à manutenção da enfermidade e a falta de controle quanto ao trânsito de cães provenientes de

outras localidades, contribui para o risco de introdução e difusão da LVC nos municípios(REITHINGER et al., 2002).

Os programas continuados de educação sanitária são essenciais para a informação da população sobre a doença e para a ação conjunta entre a comunidade e os órgãos de saúde municipais (NUNES et al., 2005). Programas educativos devem ser implementados em escolas e associações de moradores, alertando a população para os sinais clínicos mais comuns da doença e para os métodos de prevenção(DNDI, 2007). A posse responsável de animais deve ser enfatizada, pois, mesmo em áreas endêmicas para a LVC, a taxa de reposição canina é extremamente elevada após a retirada dos cães positivos para eutanásia (ROSA et al., 2005). Em estudo realizado em Araçatuba-SP, área endêmica para LVC, estimou-se a reposição da população canina e analisaram- se também os motivos que levaram os proprietários a adquirirem ou não novos cães. Houve reposição em 44,5% dos casos, principalmente devido à necessidade de companhia ou guarda, enquanto que o temor da doença foi o principal motivo para a não aquisição de novos cães (NUNES et al, 2007).

Não se recomenda o tratamento de cães, pois há controvérsias em relação à cura parasitológica, a despeito da aparente cura clínica. Embora os sinais clínicos sejam minimizados ou eliminados após o tratamento, os cães podem permanecer ainda como fontes de infecção. Com efeito, na vigência de cães sorologicamente positivos, recomenda-se a eutanásia humanitária, segundo o Manual de Vigilância e Controle da Leishmaniose Visceral do Ministério da Saúde, 2003 (BRASIL, 2003).

A análise por PCR de amostras de pele, aspirados de linfonodo e de sangue de cães infectados tratados durante dois anos revelou que, em todos os animais, pelo menos uma das amostras foi positiva. Os cães apresentaram recidivas revelando PCR positivas em algum dos três tipos de amostras. Em animais clinicamente saudáveis, a análise da PCR de pele e linfonodos foram positivas (MANNA et al., 2004).

Outro método de controle proposto por muitos pesquisadores, porém ainda controverso, é a vacinação de cães. Estudos indicam que proteínas filtradas provenientes de cultura de promastigotas de leishmania podem estimular forte imunidade em diferentes hospedeiros e conferir proteção em camundongos BALB/c infectados com L. major (LEMESRE et al., 2007).

Verificou-se que a vacina produzida a partir de antígenos naturalmente secretados e excretados, facilmente purificados do sobrenadante de culturas de promastigotas de L. infantum, foi capaz de conferir 92% de proteção em cães residentes em área endêmica. Além disso, o uso dessa vacina para o tratamento de cães infectados resultou em melhora clínica duradoura. Esse tipo de antígeno resultou em aumento significativo dos títulos de IgG2 e, interessantemente, esses anticorpos não estão presentes em cães naturalmente infectados. Sugere-se, portanto, que cães incapazes de controlar a infecção por L. infantum não desenvolvem esse tipo de resposta imune humoral. Parece que o aumento dos títulos de IgG2 está associado com a expansão da produção de interferon-gama e interleucina-2 pelas células T helper1, promovendo, conseqüentemente, proteção e resistência (LEMESRE et al., 2005).

O protocolo de vacinação é composto por três doses, em intervalos de 21 dias entre as aplicações. A revacinação é feita um ano após a primeira dose e repetida anualmente, proporcionando a manutenção da resposta imune. O cão somente é considerado protegido 21 dias após a terceira dose da vacina. Portanto, é possível que se infecte durante o programa de vacinação, e até mesmo alguns dias após a terceira dose, caso seja picado por um mosquito infectado. Nesse caso, a vacinação não impede o desenvolvimento da doença ou o aparecimento dos sintomas. A resposta imune IgG-mediada é indistinta daquela induzida pela infecção natural, quando utilizadas técnicas sorológicas tradicionais para o diagnóstico. Todavia, atualmente estão sendo desenvolvidas novas técnicas baseadas em citometria de fluxo, capazes de diferenciar a infecção natural da vacinação por meio da distinção entre os títulos de IgG1 e de IgG2.

Em áreas endêmicas, nas quais os cães são os principais reservatórios da doença, redução significante na transmissão é esperada com a combinação de métodos preventivos eficientes, notadamente a vacinação, o uso de coleiras repelentes e a aplicação tópica de inseticidas. O controle futuro para a LVC provavelmente será fundamentado na adoção sistemática da vacinação, associada ao uso de coleiras (CAMARGO-NEVES, 2005). O uso de coleira impregnada com deltametrina em cães do município de Araçatuba - SP, associado a outras medidas de controle, reduziu o coeficiente de soroconversão na área tratada. Entretanto, os resultados sobre o impacto da utilização das

coleiras como método de controle complementar não foram conclusivos (GLASSER, 2005).

Uma das razões pelas quais as campanhas de controle falham é pelo grande período de tempo entre a coleta das amostras, análise das mesmas e implementação das ações de controle. Essa espera é de aproximadamente 80 dias, e os cães permanecem como fontes de infecção para os mosquitos. A estratégia de eliminação em 80 dias após a coleta reduz a prevalência em 9%, enquanto que a eliminação rápida em sete dias resultou em redução de 27% na soroprevalência (REITHINGER et al., 2002). Adicionalmente, outros fatores relacionam-se com a alta prevalência da doença no país, como mudanças ambientais e climáticas, redução dos investimentos em saúde e educação, descontinuidade das ações de controle, adaptação dos vetores aos ambientes modificados pelo homem, fatores pouco estudados ligados aos vetores (variantes genéticas), novos fatores imunossupressores tais como co-infecção com o HIV e dificuldades de controle da doença em grandes aglomerados urbanos, onde problemas de desnutrição, moradia e saneamento básico estão presentes (GONTIJO E MELO, 2004).

3 OBJETIVOS

Levando-se em consideração os aspectos apresentados os objetivos do estudo foram:

1. Comparar os resultados da RIFI, ELISA, exame parasitológico direto corado ao Giemsa a partir de punção aspirativa de linfonodos, bem como pela técnica de reação em cadeia pela polimerase (PCR);

2. Verificar a sensibilidade, especificidade e concordância dos exames utilizados, como contribuição para o controle da enfermidade, principalmente em áreas endêmicas.