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A reação entre calcopirita e enxofre

No documento UFOP – CETEC – UEMG Tese de Doutorado (páginas 44-49)

2.5 A reação entre calcopirita e enxofre

A conversão química da calcopirita em uma fase menos refratária à lixiviação pode ser uma alternativa para extração de cobre a partir de concentrados com alto teor de impurezas e/ou baixo teor de cobre, inadequados para serem processados via fusão (smelting). Uma das formas de transformar a calcopirita presentes nestes concentrados em um composto mais reativo, tal como bornita ou covelita, é através da reação da mesma com enxofre gasoso, processo denominado ativação térmica ou sulfidização (PARKER et al., 1975; PADILLA et al., 2003a).

O processo de sulfidização é normalmente realizado em temperaturas da ordem de 300 °C a 500 °C, sendo que a calcopirita e o enxofre elementar podem estar no mesmo compartimento, ou estes reagentes podem ser adicionados em compartimentos separados do forno. Neste último caso, a calcopirita reage com o enxofre gasoso evaporado na temperatura da reação (PADILLA et al., 2003a).

Nas condições padrão de pressão e temperatura (CNTP), a espécie estável do enxofre é o α- enxofre, ortorrômbico, uma molécula formada por 8 átomos do elemento. Na temperatura de 95,3 °C, o α-enxofre converte-se ao β-enxofre monoclínico, o qual funde-se na temperatura de 119,6 °C. Neste ponto, o sólido monoclínico está em equilíbrio com o líquido, o qual contém diversas espécies metaestáveis, principalmente anéis de S8. Com o aumento da temperatura,

próximo a 159,4 °C, conhecida como temperatura λ, ocorre uma mudança repentina na viscosidade do líquido, devido à polimerização das espécies portadores de enxofre. Para temperaturas acima de 250 °C, a viscosidade do enxofre diminui rapidamente, e a coloração amarela torna-se primeiramente vermelha, depois marrom e quase negra. Simultaneamente, o mesmo torna-se extremamente reativo, o que é creditado à presença do S3 e outras moléculas (MEYER, 1976).

O ponto de ebulição do enxofre é 444,61 °C, à pressão de 1atm. Similarmente à fase líquida, na forma de vapor, o enxofre pode ser representado por diferentes espécies moleculares em equilíbrio, tais como S2, S4 e S8 em função temperatura e utiliza-se a forma geral Sn onde 2 ≤ n ≤ 8. Nos

processos de sulfidização, para fins de simplificação, adota-se que a espécie predominante é o S2,

que é a mais estável. É importante ressaltar que a concentração de enxofre na fase gasosa depende da pressão de vapor, a qual não varia linearmente com a temperatura, conforme pode ser observado na Figura 2.1 (MEYER, 1976).

42 Figura 2. 1 Variação da pressão de vapor do enxofre em função da temperatura.

Adaptado de (MEYER, 1976)

A Figura 2.2 mostra as curvas de sulfidização de diversos compostos em função da temperatura e da atividade do enxofre. Estas curvas são determinadas a partir de dados de variação da energia livre padrão de Gibbs (ΔG°) para equações do tipo das observadas em 2.27 a 2.29 (VAUGHAM e CRAIG, 1978), que mostram a reação de sulfetos de cobre com um mol de enxofre gasoso, válidas no intervalo de temperatura indicado.

5CuFeS2 + S2→ Cu5FeS4 + 4FeS2 ΔG° = -50730 + 56,95T kcal (230 °C – 500 °C) (2.27)

2Cu5,5FeS6,5 + S2→ 11CuS + 2FeS2 ΔG°= -45012 + 56,02T kcal (227 °C – 434 °C) (2.28)

2/3Cu5FeS4 + S2→ 10/3CuS + 2/3FeS2 ΔG°= -43740 + 53,48T kcal (227 °C – 434 °C) (2.29)

Para tanto, considera-se que o sistema está em equilíbrio, sendo assim ΔG° = -RTlnK. Tomando- se como exemplo a equação 2.27, tem-se que:

𝐾 =(𝑎Fe𝑆2)4(𝑎Cu5Fe𝑆4)

(𝑎CuFe𝑆2)5 (𝑎𝑆2) (2.30)

Desde que as atividades das fases condensadas sejam tomadas como unitárias, a atividade do enxofre se relaciona com a temperatura através da equação 2.31:

0 100 200 300 400 500 600 700 0.00 0.25 0.50 0.75 1.00 1.25 1.50 1.75 2.00 Pre ss ão de va por do enxof re ( at m ) Temperatura (°C)

43 log 𝑎𝑆2 = ∆𝐺° 𝑅2,303 1 𝑇 (2.31) A solução da equação 2.31 para diversas temperaturas define a curva de transformação da

calcopirita em bornita e pirita mostrada na Figura 2.2.

Os dados termodinâmicos são imprescindíveis para prever reações, as relações de estabilidade e as condições sob as quais uma espécie pode existir. Porém, existem fatores importantes que devem ser levados em consideração ao aplicar dados termodinâmicos para sistemas reais: (i) dados termodinâmicos não levam em consideração a velocidade das reações; (ii) a maioria dos dados termodinâmicos referem-se somente à condição de equilíbrio; (iii) os dados termodinâmicos disponíveis são para fases puras e devem ser aplicados com muita cautela aos sulfetos naturais, os quais podem conter uma variedade de impurezas (VAUGHAM e CRAIG, 1978).

Figura 2. 2 Curvas de sulfidização de alguns sulfetos em função da temperatura. (VAUGHAM e CRAIG, 1978)

44 Parker et al. (1975) mostraram que a reação de um concentrado contendo 70% de calcopirita com enxofre sublimado a 400 °C, 460 °C e 520 °C, em recipientes selados a vácuo, resulta na formação de: (i) pirita e covelita (CuS), (ii) pirita e idaite (Cu5FeS6) ou (iii) pirita e bornita (Cu5FeS4). A

formação de covelita só foi observada quando a temperatura de 400 °C foi empregada; em temperaturas superiores (460 °C e 520 °C), as principais fases detectadas foram idaite (Cu5FeS6)ou

bornita (Cu5FeS4). A formação de um ou de outro composto, mostrou-se dependente da razão

mássica calcopirita/enxofre utilizada nos experimentos. Os mesmos autores constataram que a reação de calcopirita com covelita, a 460 °C - 520 °C, na ausência de ar, também levou à formação de bornita e pirita. Uma característica observada pelos autores nos produtos da transformação da calcopirita, sejam eles obtidos pela reação com enxofre ou com a covelita, foi que as novas fases formadas estavam intimamente associadas, o que tornava a separação dos sulfetos de cobre da pirita antes da lixiviação impraticável (PARKER et al., 1975).

O produto da transformação da calcopirita obtido por Parker et al. (1975), denominado calcopirita ativada, contendo principalmente idaite, foi lixiviado em um meio contendo CuSO4-CH3CN-H2O,

a 77 °C. A extração de cobre a partir da calcopirita ativada, em seis horas de experimento, foi de aproximadamente 75%; já extração a partir da calcopirita não ativada termicamente foi inferior a 40%, neste mesmo intervalo de tempo. Um parâmetro que influenciou significativamente a extração de cobre a partir da calcopirita ativada foi a temperatura empregada na lixiviação, tendo sido observado um aumento de 25% para 75% de extração, quando a temperatura foi aumentada de 48 °C para 77 °C. Já o aumento na concentração do oxidante (CuSO4) não promoveu mudanças

significativas na extração de cobre.

Demopoulos e Distin (1983) também abordaram a sulfidização da calcopirita e a lixiviação do produto da transformação. Para tanto, foram utilizadas partículas contendo 97% de calcopirita, com tamanho entre 37µm-45µm, reagidas com enxofre na proporção mássica 1:3, durante um período de quatro horas, sob atmosfera de nitrogênio, nas temperaturas de 320 °C, 360 °C e 400 °C. As principais fases obtidas no produto da transformação foram covelita (CuS) e pirita, a 320 °C; e nukundamita (Cu5.5FeS6.5) e pirita, a 400 °C. Além das mudanças na mineralogia, uma

importante consequência da sulfidização observada pelos autores foi o aumento da porosidade das partículas reagidas, resultando em um aumento da área superficial de um fator de aproximadamente oito em relação a amostra inicial. Segundo os autores, a combinação dos efeitos

45 mudança na mineralogia e aumento da área superficial, contribuiu significativamente para aumentar a extração de cobre a partir do produto da reação quando comparada à extração a partir da calcopirita. Esse fato foi constatado através de ensaios de lixiviação, com uma solução contendo 2 mol/L de FeCl3 e 0,6 mol/L de HCl a 85 °C, nos quais a extração de cobre foi de

aproximadamente 90%, quando realizada a partir dos produtos da reação, e de apenas 20% quando realizada a partir da calcopirita inicial (DEMOPOULOS e DISTIN, 1983).

Em trabalhos mais recentes, Padilla et al. (2003a; 2003b) investigaram a transformação da calcopirita presente em um concentrado (90% de calcopirita) através da reação com enxofre elementar, no intervalo de temperatura de 325 °C a 500 °C. As amostras de concentrado e enxofre elementar foram introduzidas em um mesmo compartimento (massa de enxofre/massa total = 0,39), no interior de um forno, que foi previamente submetido a um fluxo de nitrogênio para remoção de oxigênio. Os produtos da transformação também diferiram em função da temperatura empregada: nos experimentos realizados com temperaturas de até 400 °C, as principais fases detectadas foram covelita (CuS) e pirita; acima de 400 °C, as fases relatadas foram idaite (Cu5FeS6) e pirita.

Os estudos de lixiviação conduzidos por Padilla et al. (2003a; 2003b) foram focados no produto da transformação contendo covelita e pirita em um meio H2SO4-NaCl-O2, visando uma extração

seletiva de cobre em relação ao ferro. Os parâmetros que influenciaram de maneira mais significativa a extração de cobre a partir do produto mencionado foram a temperatura e a concentração de íons cloreto. Especificamente, a extração de cobre aumentou de 45% para 95%, em 90 min de experimento, quando a temperatura foi aumentada de 85 °C para 100 °C. A adição de 0,5 mol/L de cloreto ao sistema causou um aumento na extração de cobre de 10% (ausência de cloreto) para 95%, em experimentos realizados a 100 °C (PADILLA et al., 2003b).

Em um outro estudo do mesmo grupo de pesquisadores (PADILLA et al., 2007), que também abordou a lixiviação do produto contendo covelita e pirita, porém em um meio H2SO4-O2 sob

pressão, extrações de cobre da ordem de 90% foram alcançadas em 180 min, quando temperaturas de 90 °C a 108 °C e pressão parcial de oxigênio de 507 kPa foram mantidas.

46 Assim como observado por Parker et al. (1975), Amcoff (1988) relatou que a reação da calcopirita com covelita também leva à formação de bornita e pirita. Os experimentos de Amcoff (1988) foram realizados com partículas de calcopirita de 1-2 mm sinterizadas com covelita pulverizada, na proporção de 1:10, aquecidas a vácuo no intervalo de temperatura de 350 °C a 500 °C. O autor observou ainda que a substituição de covelita por calcocita nos experimentos também levou à formação de bornita, porém neste caso não houve formação de pirita. Já o trabalho de Aneesuddin

et al. (1983) mostrou que, quando a calcopirita é ustulada em ambiente oxidante (presença de ar)

entre 350 °C - 440 °C, ocorre oxidação da superfície do material formando CuSO4 e Fe2O3,

enquanto que nas regiões não acessíveis ao oxigênio (mais redutoras), ocorre formação de bornita, pirita e enxofre elementar.

As formas e melhores condições nas quais ocorre a transformação da calcopirita em outros sulfetos de cobre ainda não foram bem estabelecidas, embora seja notório que um processo eficiente para tal poderia ser útil na produção de cobre. Por isso, estudos envolvendo este tema são relevantes tanto sob o ponto de vista acadêmico quanto comercial.

No documento UFOP – CETEC – UEMG Tese de Doutorado (páginas 44-49)

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