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I. 2.2.3.1 Migração por obras de barragem

III.5 O caso da Hidrelétrica de Itá

III.5.5 Formas de reparação

III.5.5.1 Reassentamento rural

A opção dos atingidos de optarem por reassentamentos rurais coletivos representou a possibilidade de agricultores e trabalhadores rurais garantirem as condições para sua reprodução enquanto grupo social e a reorganização de seus territórios, mitigando assim o impacto sofrido com a migração a que foram obrigados a submeterem-se.

“O reassentamento é uma forma de indenização conquistada pela primeira vez pelos atingidos da Usina Hidroelétrica de Itá e Machadinho, passando a ser uma prática de

indenização em outros locais onde são construídas as usinas” (Radaelli, 2010, p.30).

Dentre as 4.139 famílias atingidas e que moravam no meio rural (Consórcio Itá, 2012) 369 famílias (sem contabilizar Catuípe, 74 famílias) optaram pelos reassentamentos rurais coletivos.

Os principais público-alvo dos reassentados foram os trabalhadores rurais sem terra, incluindo os chamados posseiros (sem documento formal de propriedade da terra), e os pequenos proprietários, cuja propriedade fosse inferior ou igual a 75 hectares de terra.

“Segundo o documento “Diretrizes e Critérios para Planos e Projetos de Reassentamentos Rurais de Populações Atingidas pelas Usinas Hidrelétricas de Itá e Machadinho”, o público alvo considerado seria: todos os trabalhadores rurais atingidos, entendendo-se como tal; os que tenham suas funções inviabilizadas economicamente, pelas barragens de Itá e Machadinho, definidos como tal: proprietários (com área até 75 ha), posseiros, filhos de agricultores (caracterizadamente sem terra e com idade mínima de 16 anos), pequenos arrendatários, parceiros, assalariados rurais e trabalhadores volantes que, comprovadamente vivem e trabalham em área de terra a ser atingida pelo reservatório e, devidamente registrados no cadastro sócio-econômico”. (Viana, 2003, pp. 112-113)

Conforme os documentos da GERASUL, foram implantados reassentamentos em sete áreas: Magueirinha (Paraná), Chopinzinho (Paraná), Marmeleiro (PR), Horório Serpa (PR), Campo Erê (Santa Catarina), Campos Novos (SC) e Chiapetta (Rio Grande do Sul). No

97 entanto, existiu mais um reassentamento em local de reassentamento, em Catuípe, no Rio Grande do Sul.

“Foram oito os reassentamentos coletivos implantados com atingidos pela barragem de Itá, nos quais foram reassentadas 444 famílias: 1- Marmeleiro/PR (32 famílias); 2- Campo Erê/SC (50 famílias); 3- Mangueirinha/PR (82 famílias); 4- Chopinzinho/PR (74 famílias); 5- Honório Serpa/PR (38 famílias); 6- Chiapetta/RS (66 famílias); 7- Campos Novos/SC (28 famílias) e; 8- Catuípe/RS (74 famílias)” (Kolln et Silva, 2010, p. 6).

O segundo está relacionado ao reassentamento de Catuípe, último a ser conquistado pelo movimento. Inicialmente, esse projeto não constava dos planos da então GERASUL. A área que hoje pertence a esse reassentamento estava destinada a um reassentamento de atingidos pela barragem de Machadinho. Através de muita mobilização e negociação a área foi repassada aos atingidos pela barragem de Itá, assim como a liberação de recursos para a construção das casas e equipamentos comunitários. A verba repassada, contudo, foi bem menor do que a destinada aos outros projetos. Por isso, ainda hoje, alguns equipamentos comunitários não foram concluídos. Além disso, a atual empresa responsável pela usina não reconhece o reassentamento. Nas palavras de uma atingida reassentada em Catuípe:

“Até o reassentamento de Catuípe, que a gente tá morando, foi o último da barragem de Itá. Eles não queriam reconhecer. (...). Porque a empresa não quer reconhecer, não quer dar a escritura de terra, porque se ela reconhece nós como atingido, ela é obrigada a dar toda a infraestrutura para a comunidade: centro comunitário, Igreja, escola para as crianças estudar. Porque as crianças não podem ficar sem escola, né. Se ela dar a escritura, ela vai se obrigar a reconhecer nós como atingido, que até hoje não reconheceu. E dar essa infrestrutura. E além disso, os nove meses de manutenção alimentação que a gente não teve. Que nós foi no duro mesmo, sofrido, né. E a empresa quer largar o documento da terra para o governo do estado. Mas, isso é uma forma de lavar as mãos: eu não tenho nada a ver com esse povo” (A., agricultora atingida pela barragem de Itá, 2003, cit por Viana, 2003, p.117).

As áreas de terra destinadas para o reassentamento foram selecionadas pela empresa juntamente com uma equipe de técnicos da CRAB. Era avaliada, principalmente, a viabilidade da área para a produção. Os primeiros reassentamentos construídos localizaram- se nos municípios de Marmeleiro-PR e Campo Êre-SC e Mangueirinha-PR” (Radaelli, 2010, pp.32-33).

98 O município paranaense de Mangueirinha recebeu reassentamentos não apenas desta hidrelétrica, mas também das UHEs Salto Segredo e Itá. “Isto posto, é preciso verificar qual a situação das famílias reassentadas em relação à estrutura deste município, pois, neste sentido, tanto as famílias reassentadas quanto a população local podem ser considerados atingidos, já que o aumento significativo da população sem a devida adequação dos serviços do referido município pode refletir na qualidade destes (como, por exemplo, educação, segurança, saúde e transporte públicos). Recentes manifestações de lideranças de reassentamentos, tanto no município de Mangueirinha como no município vizinho de Palmas, apontam para este problema.” (Rocha, 2010, p. 398).

Os reassentados receberam a estrutura mínima em suas propriedades, como casa, galpão, estrebaria e chiqueiro. Também foram construídos espaços de convivência social com igreja, centro comunitário, cancha de bocha e campo de futebol. O sistema de infraestrutura também incluiu abastecimento de água, fornecimento de luz, estradas, saúde e educação. Além disso, os reassentados recebem uma verba de manutenção por nove meses (Radaelli, 2010, p. 32). Conter a evasão rural foi uma das diretrizes contidas na política de reassentamento da ELETROSUL.

O tamanho do lote de cada família variou entre 17 e 59 hectares dependendo da força de trabalho57 existente na unidade familiar. O somatório da força de trabalho de cada unidade familiar deveria ser no mínimo igual a 1,8 para que a mesma tivesse direito ao reassentamento. Na figura 18, é possível observar a tabela utilizada pela ELETROSUL e que relaciona idade e sexo com a força de trabalho correspondente.

Figura 17- Força de trabalho dos agricultores atingidos pela UHE de Itá

Fonte: ELETROSUL, 1987

57 Peso dado a cada trabalhador rural para a execução de tarefas vinculadas às atividades agropecuárias, baseado em parâmetros de idade, sexo e faixa etária.

Faixa etária Idade Sexo F.T

1 5 a 10 anos ambos 0,25 2 11 a 15 anos ambos 0,60 masculino 1,00 feminino 0,80 masculino 0,50 feminino 0,25 3 4 16 a 60 anos 60 anos ou mais

99 Também foi concedida uma verba de manutenção que funcionou como apoio à família reassentada até a comercialização da primeira safra, por um período de até um ano. Sobre a forma de pagamento dos lotes, asssim ficou determinado:

“Os beneficiários deveriam assumir a dívida pela terra e benfeitorias. Esta dívida deveria ser amortizada em um prazo máximo de 20 anos, com 3 de carência e com parcelas de amortização proporcionais (variando de 20% a 45%) à renda monetária líquida da unidade familiar. (Caso a família fosse proprietária de imóvel atingido, o valor deste seria deduzido do montante da dívida)” (Viana, 2003, p. 115).

“Migrar, pois, pode não só significar a perda da terra, mas a perda de seu modo de vida e de sua identidade. Migrar para outra terra pode significar a perda de sua história de vida construída naquela terra onde uma árvore, uma simples cerca de arame, uma pastagem, marcam eventos importantes vividos por estes camponeses”. (Scherer-Warre, 2001, p.32, cit. por Radaelli, 2010, p.61).

É interessante também observar que o reassentamento de Marmeleiro (PR), primeiro a ser implementado, teve toda a infraestrutura básica e as edificações residenciais construídas pela ELETROSUL; já no reassentamento de Mangueirinha (PR), terceiro da cronologia, as edificações residenciais, bem como os galpões foram construídos pelos próprios reassentados em sistema de mutirão com recursos repassados pela empresa.