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5. ENTRE A PERÍCIA E O ENGAJAMENTO – a mídia ativista

5.2 OS ATIVISTAS DE MÍDIA

5.2.3 Rebelión – David contra Golias

A borda do frame não é tão nítida em Rebelión. Os ativistas não se colocam nem como antiglobalização nem como anticapitalismo, mas como parte de um movimento de resistência global à globalização neoliberal. Ao frame organizador socialista é acrescentada uma noção de esquerda um pouco mais flexível que em La Haine.

A história do surgimento do website Rebelión começou com um bate papo entre um técnico em informática e um jornalista, ambos de Madri. O primeiro anunciava ao segundo a possibilidade de criar um jornal na internet e perguntava se ele conhecia jornalistas capazes de conseguir material para alimentá-lo periodicamente. Era 1996. A intenção era criar uma mídia com funções de agência que nutrisse de informações rádios livres, boletins locais e outros meios alternativos e comunitários.99

Possui hoje um conselho de redação com dez pessoas – e outras dezenas de colaboradores entre jornalistas e intelectuais –, que se dividem por sessões, ficando responsáveis pela postagem e exclusão dos textos que chegam a Rebelión. As dúvidas sobre a publicação ou não de um texto são sanadas por referendo aos demais colegas. Os ativistas reconhecem que se trata de um espaço restrito à participação dos leitores.

99 Texto intitulado La Honda de David, de Pascual Serrano, jornalista fundador. Disponível

Mas para isso sugerem outros serviços de informação, como o Indymedia.

Rebelión rechaça o discurso da imparcialidade, independência e objetividade do jornalismo e afirma que a informação é uma guerra entre modelos sociais. Aposta na crise de credibilidade do jornalismo padrão para se estabelecer como porta voz importante dos movimentos sociais na internet. Na sessão Mentiras y Medios, faz link com outros websites da sua rede de comunicação alternativa, bem como ao que denominam “rádios e televisões rebeldes”.100

As sessões estão dispostas em três colunas na página inicial. Na coluna central, estão as informações gerais que são atualizadas diariamente e, em primeiro plano a charge do dia. Na coluna esquerda, as sessões temáticas e mais abaixo, informações específicas por território. Logo abaixo vêm as colunas dos autores, a sessão

Libros libres, o espaço para cartas dos leitores e para contatos e informações sobre Rebelión. Na coluna direita, artigos considerados Lo más destacado e as resenhas de livros recomendados.

Na disposição das informações, as sessões temáticas funcionam como as editorias de um webjornal comum. Os textos apresentam a estrutura da notícia: um artigo principal (que seria a manchete), seguido de outros secundários, o que sugere uma hierarquia de importância entre os textos. Há distinção entre os textos opinativos e as notícias, a qual, contudo não se refere tanto à forma do texto, mas ao fato dos primeiros virem assinados pelos intelectuais colaboradores e apresentarem uma análise sobre os temas que exploram. As notícias também podem ser assinadas, mas se diferenciam pela gravata – texto explicativo do conteúdo do texto. Todos sem exceção apresentam o chapéu – palavra ou expressão que informa o assunto.

O frame que perpassa as construções de sentido dos variados temas contemplados pelo website é construído pelo ajuste ao aspecto político de cada um. Seja uma questão ambiental, cultural, econômica ou de gênero, os textos exploram, pelo viés

crítico, as conseqüências políticas de todos os acontecimentos narrados. Não há em Rebelión nenhum slogan bombástico (como em La Haine); o posicionamento é interno aos textos. A apresentação das informações é sóbria e a organização dos textos facilita a leitura.

Apesar dos textos estarem mais próximos da forma de artigo que de notícia, há uma preocupação com a reportagem: informações sobre o lugar dos acontecimentos, personagens, questões em debate. Mas o frame é ainda ativista. Dessa forma, os textos de Rebelión ora têm estrutura de notícia, ora (mais freqüentemente) de artigo opinativo e muitas vezes se iniciam com reportagem e terminam com comentários impressivos.

No texto “La protesta contra la globalización ahonda la crisis del FMI y el

Banco Mundial”101, uma parceria de Rebelión e El País, é visível o ajuste ao padrão

jornalístico. O primeiro parágrafo é um lead, com informações sobre o acontecimento (cancelamento da reunião), data (27 de setembro de 2000), local (Praga), devido aos protestos dos ativistas dos MJG (desenrolar dos fatos). O chapéu é “Reunión del FMI y BM en Praga” e a gravata diz “El FMI cede a las protestas y adelanta el fin de su asamblea”.

O texto consulta várias fontes, mas privilegia as oficiais, tanto do lado dos organismos internacionais quanto do lado dos movimentos sociais (presidente, diretor, porta-vozes). Há inclusive uma fonte sigilosa. Traz ainda números de participantes dos protestos, de feridos nos confrontos com a polícia, mas não se aprofunda nas questões. Neste caso, o texto é uma notícia.

Sob o mesmo chapéu, há outro texto em outro estilo. Apresentando mais detalhes sobre o acontecimento, com informações sobre número de detenções e o desencontro de declarações entre ativistas e policiais, o texto102 trata do dia a dia na

101 Texto de 28/09/2000. Disponível em www.lahaine.org/economia/praga280900.htm.

Último acesso em 07/02/2006.

102 “Los organizadores de la protesta denuncian el estado de excepción contra la dicidencia

cidade pela técnica de reportagem de ação (que narra ato por ato). É também um texto jornalístico, claramente favorável, contudo, ao ponto de vista dos ativistas, o que confirma a intenção de combater o mito da objetividade.

Desde meados de 2004, a forma jornalística ficou mais freqüente. Exemplo é um texto de 2006, “Empleados del FMI repudian cambios salariales”, uma nota curta, quase restrita às informações do lead.103 Mas esse tipo de notícia ainda é pouco

freqüente diante da expressiva quantidade de artigos formalmente opinativos.

A forma da notícia está no título (utilização de verbo no presente para reportar a ação), no primeiro parágrafo pelo recurso ao lead, nas gravatas que explicam o conteúdo e nas entrevistas com as fontes, atribuindo a elas as declarações. Dessa forma, ainda que critiquem na grande imprensa a parcialidade, esta é assumida pelos ativistas de mídia. Embora não acreditem na objetividade como atitude, buscam-na no estilo. Assim se apresenta a maioria dos textos de Rebelión: com títulos nominais (sem verbo), com a opinião já expressa no chapéu, assinados por intelectuais engajados nas lutas representadas.