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Capítulo 3. O apadrinhamento de Denis na construção identitária brasileira

3.2. Resumir a história da literatura luso-brasileira

3.2.1. A recepção crítica do Résumé

Cinco artigos diferentes foram publicados na imprensa francesa por ocasião do lançamento do Résumé. O primeiro deles ganhou as páginas do Le Drapeau blanc, em 04 de janeiro de 1827. Utilizando a assinatura de S.-P., seu autor começou aplaudindo as recentes iniciativas tomadas pelos livreiros-editores de seu país no intuito de difundir a produção literária estrangeira. Em sua opinião, essa seria uma alternativa interessante para trazer maior sensibilidade à literatura francesa, a qual, embora tivesse produzido vários clássicos universais, perdera ao longo dos anos a capacidade emotiva, devido a fatores como o apego a regras e o excessivo fechamento em si mesma. Lido sob essa ótica, o trabalho realizado por Denis, de “incluir na forma do résumé uma análise na qual se teria feito reviver as obras-primas literárias de todos os povos”,432 apresentaria um duplo

objetivo: comover os leitores com traduções do português e, ao mesmo tempo, revigorar as letras francesas, incentivando a abertura a outras formas poéticas. Com relação especificamente à parte sobre Portugal, S.-P. salientou a beleza do estilo, o ineditismo das passagens traduzidas, assim como o cuidadoso trabalho de pesquisa:

Eu gostaria muito, aqui, de fazer sentir o charme espalhado por quase todas as páginas do Résumé de la littérature portugaise; mas ser-me-iam necessários aprofundamentos que me são negados. Contentar-me-ei, então, em dizer que o Sr. Ferdinand Denis não apenas analisou, mas traduziu inteiramente certas obras ou certos excertos até agora desconhecidos por nós. Foi graças às mais tenazes pesquisas que ele chegou a obter, em nossas bibliotecas francesas, livros raros mesmo em Portugal.433

Ainda que tenha consagrado pouca atenção à seção relativa ao Brasil, entendendo-a como um mero complemento à de Portugal, o crítico declarou que ali haveria trechos de grande sensibilidade, uma vez que o conhecimento empírico recolhido por Denis lhe permitira “analisa[r] essas obras-primas literárias com essa vivacidade e esse

432 No original: “renfermer sous le forme du résumé une analyse dans laquelle on aurait fait revivre les chefs-

d’œuvre littéraire des touts les peuples”. S.-P. Résumé de l’histoire littéraire du Portugal, suivi du Résumé de l’histoire littéraire du Brésil. Le Drapeau blanc, Paris, 04/01/1827, p. 04.

433 No original: “Je voudrais bien ici faire sentir le charme répandu dans presque toutes les pages du Résumé

de la littérature portugaise; mais il me faudrait des développements qui me sont refusés. Je me contanterai donc de dire que M. Ferdinand Denis a non-seulement analysé, mais traduit en entier certains ouvrages ou certains morceaux jusqu’ici inconnus pour nous. C’est grâce aux recherches les plus opiniâtres qu’il est parvenu à se procurer dans nos bibliothèques françaises des livres rares, même en Portugal”. Loc. cit.

fogo que as inspirou”.434 Mas seus julgamentos não trouxeram apenas elogios: S.-P.

censurou o autor por ter abusado do propósito educativo, deixando em segundo plano a preocupação com o deleite de seus leitores. Também assinalou que o título dado por ele à obra, assim como a escolha de um pequeno formato, poderia levar esses últimos a supor que a publicação priorizava por informações reduzidas ou análises superficiais. Por isso, em seu parágrafo final, aconselhou Denis a cogitar o lançamento de uma segunda edição, dessa vez em formato maior.

Algumas semanas mais tarde, a Revue Encyclopédique veiculou uma longa crítica sobre o Résumé, trazendo a assinatura de J.-R. Seu autor atribuiu à expansão da alfabetização entre os franceses e ao desejo crescente, da parte desses novos leitores, por conhecimentos diversificados, a voga de publicações engajadas em oferecer “em um pequeno número de páginas e a um preço muito baixo, o resumo daquilo que está contido em obras longas e caras”.435 Mesmo localizando uma série de características comuns entre as primeiras e o Résumé – preço acessível, tamanho reduzido e capacidade instrutiva –, não deixou de questionar se o título escolhido estaria ou não apropriado à extensão da obra e a seu pioneirismo na divulgação da produção literária vinda de Portugal. Para exemplificar a pouca familiaridade dos franceses com a literatura lusófona, J.-R. comparou Denis a um amigo deveras atencioso, empenhado em facilitar a inserção de alguém em um ambiente frequentado somente por desconhecidos: “[ele] logo lhe indica o maior número de habitués e dá-lhe, em poucas palavras, uma ideia de seus méritos; dedica-se, sobretudo, a lhe pintar os personagens mais distintos; ele lhe explica as suas qualidades e os seus defeitos [...]”.436 Seguindo essa mesma analogia, de acordo com o crítico, apenas Luís Vaz de Camões teria relações prévias com os leitores de seu país – Gil Vicente, Bernardin Ribeiro, Sá de Miranda, João de Barros, Corte Real e diversos outros nomes da literatura portuguesa estariam ainda à espera de uma apresentação adequada.

De modo geral, J.-R. mostrou-se satisfeito com o trabalho desenvolvido pelo autor francês nesta parte do volume, resumindo suas considerações na seguinte sentença: “suas reflexões [de Denis] têm, muitas vezes, bastante justeza. Percebem-se, em todo o seu

434 No original: “analyse[r] ces chefs-d’œuvre littéraires avec cette vivacité et ce feu qui les ont inspirés”.

Loc. cit.

435 No original: “dans un petit nombre des pages et à très bas prix, le résumé de ce qui renferment des

ouvrages longs et coûteux”. Cf. J.-R. Résumé de l’histoire littéraire du Portugal, suivi du Résumé de l’histoire littéraire du Brésil. Revue Encyclopédique, Paris, mars 1927, p. 702.

436 No original: “[il] lui indique rapidement le plus grand nombre des habitués, et lui donne, en peu des mots,

une idée de leur mérite; il s’attache surtout à lui peindre les personnages les plus distingués; il lui explique leur qualités et leurs défaut […]”. Cf. Ibidem, p. 703.

livro, os mais generosos sentimentos; ele aproveita todas as oportunidades para expressá- los com energia”.437 Porém, o mesmo não pode ser dito sobre a seção relativa à história da literatura brasileira, uma vez que as ideias ali expressas foram bastante problematizadas pelo crítico, principalmente aquelas relativas à questão da originalidade:

É certo que ninguém acredita mais que nós na independência, nas letras como em toda parte, aliás; ninguém coloca em um preço mais elevado a originalidade; mas parece-nos que se pode encontrar um pouco de exagero nos conselhos do Sr. Denis, ou ao menos que se poderia facilmente se enganar quanto ao significado que é útil lhes atribuir. Antes de procurar por seu guia somente na observação, é necessário ter aprendido a observar; e é para aprendê-lo, sobretudo, que se precisa de um guia; e é nisto, sobretudo, que os melhores guias são os anciãos, e nossos escritores que os tomaram como modelos.438

Contrariamente a Denis, portanto, J.-R. não acreditava que o afastamento dos modelos europeus seria uma condição sine qua non para o desenvolvimento da literatura brasileira. Em sua opinião, apenas por meio da filiação aos modelos vindos da Europa (produzidos por mestres da Grécia antiga e da França) ela poderia encontrar a melhor maneira de expressar seu caráter original. De acordo com o crítico, “são as engrenagens da ação, os caracteres e a maneira de examinar a natureza, seja ela qual for, que constituem a originalidade ou a imitação”439, não a presença de personagens indígenas, a descrição de seus costumes ou a introdução de palavras exóticas. Daí que, antes de se preocupar com a exaltação das particularidades do país, os escritores brasileiros deveriam se empenhar em “estuda[r] com respeito os grandes mestres da Antiguidade, para aprender a inventar como eles, para desenhar quadros nos quais os acessórios não sejam apenas novos, mas cujas principais figuras apresentem o mesmo caráter de originalidade”.440 Para concluir, J.-R.

assinalou que o conteúdo do Résumé poderia ter um efeito nefasto sobre os habitantes do

437 No original: “ses réflexions ont souvent beaucoup de justesse. On remarque dans tout son livre les

sentiments les plus généreux; il saisit toutes les occasions de les exprimer avec énergie. Ibidem, p. 705.

438 No original: “Certes, personne n’estime plus que nous l’indépendance dans les lettres comme partout

ailleurs; personne ne met à plus haut prix l’originalité; mais il nous semble qu’on peut trouver un peu d’exagération dans les conseils de M. Denis, ou du moins qu’on pourrait facilement se mépendre sur le sens qu’il est utile d’y attacher. Avant de ne chercher son guide que dans l’observation, il faut avoir appris à observer; et c’est surtout pour l’apprendre qu’on a besoin de guide; et c’est surtout en cela que les meilleurs guides sont les anciens, et nos écrivains qui les ont pris pour modèles”. Ibidem, p. 707-708.

439 No original: “ce sont les ressorts de l’action, les caractères, et la manière d’envisager la nature, quelle

qu’elle soit, qui constituent l’originalité ou l’imitation”. Ibidem, p. 708.

440 No original: “étudie[r] avec respect les grands maîtres de l’antiquité, pour apprendre à inventer comme

eux, pour tracer des tableaux où les accessoires ne soient pas seuls nouveaux, mais dont les principales figures présentent le même caractère d’originalité”. Loc. cit.

Brasil, dizendo: “[eles] poderiam cometer exageros em seu pensamento e se confundir quanto aos meios de dar aos seus escritos uma verdadeira originalidade”.441

Pouco tempo mais tarde, o Journal des Savants difundiu uma longa análise sobre o Résumé, escrita pelo secretário perpétuo da Academia Francesa de Letras, o filólogo e dramaturgo François-Just-Marie Raynouard.442 Embora à época ele se ocupasse, sobretudo, do provençal clássico e do trovadorismo francês, seus interesses contemplavam igualmente a literatura portuguesa, em especial a obra do épico Luís Vaz de Camões. Já em 1817, havia se encarregado de comentar a nova edição d’Os Lusíadas, impressa em Paris sob patrocínio de José Maria de Sousa Botelho Mourão, o Morgado de Mateus – em cuja introdução biográfica aparecem pela primeira vez os clichês, desde então bastante recorrentes, a respeito dos fracassos sentimentais e financeiros do poeta, ou de sua retidão moral e política. Dois anos depois, criara uma ode em homenagem a Camões, a qual receberia, nos anos seguintes, sucessivas traduções para o português.443 Em julho de 1823, assinara o artigo sobre Chefs-d’oeuvre du théâtre portugais (1823), que havia sido editada por Denis para a coleção “Chefs-d’oeuvre des théâtres étrangers”, de Ladvocat.444

Amparado pelos conhecimentos advindos de trabalhos anteriores, não espanta ter sido ele, entre todos os críticos que se dedicaram a escrever sobre o Résumé, o que demonstrou maior profundidade e agudeza de espírito em suas considerações. Contudo, isso se mostra verdadeiro somente no que diz respeito à produção literária portuguesa, pois a brasileira foi completamente negligenciada por Raynouard.

Seu artigo sobre o Résumé possui uma estrutura textual mais próxima da resenha do que da crítica. Assim, em vez de tecer comentários quanto à qualidade literária do livro, Raynouard se empenhou acima de tudo em expor de forma minuciosa os conteúdos encontrados em cada um de seus capítulos. Seguindo a mesma divisão criada por Denis, apresentou cronologicamente as obras e os autores mencionados no interior da publicação e inseriu, no meio dessas descrições, notas sobre o trabalho desenvolvido pelo

441 No original: “ [ils] auraient pu s’exagérer sa pensée, et se méprendre sur les moyens de donner à leurs

écrits une véritable originalité”. Loc. cit.

442 RAYNOUARD, F.-J.-Marie. Résumé de l’histoire littéraire du Portugal, suivi du Résumé de l’histoire

littéraire du Brésil. Journal des savants, Paris, mars 1827, p. 149-161.

443 ZILBERMAN, Regina. A epopeia nas décadas iniciais do Romantismo: de Camões para Ferdinand Denis.

FEIJÓ, Elias J. Torres; SAMARTIN, Roberto; VÁZQUEZ, Raquel Bello; BRITO-SEMEDO, Manuel (ed.). Estudos da AIL em Literatura, História e Cultura Portuguesas, Associação Internacional de Lusitanistas,

Santiago de Compostela; Coimbra, p. 1-17, 2015. Disponível em

<https://www.unicv.edu.cv/images/ail/102Zilberman.pdf>. Acesso em 24 fev. 2020.

444 RAYNOUARD, F.-J.-Marie. Chefs-d’œuvre des théâtres étrangers, allemand,... italien, portugais, &c..

francês e sobre seus próprios estudos referentes à literatura portuguesa – como se o contexto lhe parecesse propício à autopromoção. Ainda que tenha elogiado Denis pela qualidade de suas traduções, pelo seu grande domínio do assunto e pela sua perspicácia na escolha de trechos capazes de despertar o interesse, não deixou de censurá-lo por ter recorrido demasiadamente a outros escritores, cujas reflexões incorporara como verdadeiras. Apontou, do mesmo modo, alguns deslizes que localizara dentro do Résumé, ora quanto à data, ora quanto à autoria de determinadas obras (a exemplo das trovas sobre a morte de Inês de Castro, atribuídas erroneamente por Denis a D. Pedro I de Portugal, ou de certos sermões que ele acreditava serem do padre António Vieira, apesar da ausência de assinatura). Ao concluir seu texto, recomendou um tamanho maior de publicação, o que permitiria ao autor eliminar passagens apressadas, bem como aumentar os trechos traduzidos e as notas de rodapé com informações biobibliográficas.

Por fim, em junho desse mesmo ano, foi a vez do dramaturgo e crítico literário Charles Magnin dedicar-se ao Résumé em sua coluna habitual do Le Globe,445 publicada

geralmente aos sábados – quando o periódico, cuja circulação ocorria também às terças e às quintas, dobrava de tamanho, passando de quatro para oito páginas. Veiculada de forma irregular ao longo de seis meses, sua crítica se divide em quatro partes, sendo as três primeiras consagradas à produção literária de Portugal, e apenas a última, ao Brasil. Notamos facilmente certas similitudes entre as ideias de Magnin e aquelas que haviam sido expostas, nos meses anteriores, pelos críticos do Le Drapeau blanc, da Revue

Encylopédique e da Revue des Savants. Logo nas linhas iniciais, ele apresentou uma

consideração sobre a ignorância na qual os franceses haviam se mantido ao longo dos séculos em matéria de literatura portuguesa:

Nós fazemos soar bem alto nossos progressos nos estudos das literaturas estrangeiras. O fato é que, no que concerne a Portugal, nossa erudição não é mais que leviana. De todos os escritores dessa nação, conhecemos apenas Camões, e, de todas as obras desse poeta, não lemos nada além de

Os Lusíadas. Seria, no entanto, um fenômeno estranho uma literatura

composta de uma única obra. [...] Essas literaturas, das quais chegam até nós apenas uma ou duas obras-primas, são como países distantes cujas capitais nós conhecemos por mapas mais ou menos fiéis, e dos quais nos

445 MAGNIN, Charles. Résumé de l’histoire littéraire du Portugal, suivi du Résumé de l’histoire littéraire du

Brésil; par M. Ferdinand Denis. Le Globe, Paris, 16/06/1827, p. 168-171; 28/06/1827, p. 194-196; 21/07/1827, p. 248-250; 22/07/1827, p. 534-536. Mais tarde, uma versão resumida da crítica seria publicada pelo autor em Causeries et méditations historiques et littéraires (1843). Cf. MAGNIN, Charles. Causeries et méditations historiques et littéraires. V. II (partie étrangère). Paris: Benjamin Duprat, 1843.

resta a conhecer ainda uma multitude de lugares interessantes, ainda que menos consideráveis e menos célebres.446

Entretanto, ao examinar a história da literatura brasileira feita por Denis, Magnin revelou maior capacidade inovadora, divergindo em vários aspectos das abordagens apresentadas anteriormente pelos outros críticos. A seu ver, fatores como a recente independência política conquistada pelo Brasil e a procura por produções literárias com características originais, da parte dos letrados europeus, justificariam a necessidade não apenas de ler os escritores americanos, mas também de incluí-los nas novas historiografias da literatura a serem produzidas na Europa. Perdoou as análises superficiais realizadas pelos que haviam escrito antes do fim do sistema imperial, como Andrès, Boutterweck, Sismondi e Sané, mas declarou que, daquele momento em diante, tal atitude seria simplesmente indefensável. Na sequência, retomou as concepções apresentadas em

Scènes de la nature quanto à capacidade da natureza tropical de inspirar a escrita literária,

procurando compreender como, diante de uma paisagem tão esplendorosa, os escritores brasileiros tinham se limitado a produzir “mirradas imitações da velha poesia do Antigo Mundo”.447 De acordo com o crítico, a resposta para tal questionamento estaria na

proibição da imprensa no Brasil até o ano de 1808 – quando finalmente se deu a criação da Impressão Régia –, e no forte controle, realizado pela coroa lusitana, da circulação de obras e periódicos em sua colônia – “parece que o jugo colonial se estendeu até os espíritos, e que a emancipação do gênio somente pode seguir, e seguir bem lentamente, aquelas das instituições e do solo”.448

Magnin encontrou, principalmente em Santa Rita Durão e Basílio da Gama, cujas obras conhecera por intermédio de Denis, uma exceção a essa regra. Do Caramuru, disse que se tratava de uma bela narrativa, repleta de curiosos costumes indígenas e

446 No original: “Nous faisons sonner bien haut nos progrès dans l’études des littératures étrangères. Le fait

est que, pour ce qui concerne le Portugal, notre érudition n’est encore que bien légère. De tous les écrivains de cette nation, nous ne connaissons que Le Camõens, et, de tous les ouvrages des ce poète, nous n’avons guère lu que La Lusiade. Ça serait cependant un étrange phénomène qu’une littérature composée d’une seule ouvrage. [...] Ces littératures, dont il n’est venu jusqu’à nous qu’un ou deux chefs-d’œuvres, sont comme des pays lointains dont nous connaissons les capitales par des plans plus ou moins fidèles, et où il nous reste à reconnaître une foule de lieux intéressants encore, bien que moins considérables et moins célèbres”. MAGNIN, Charles. Résumé de l’histoire littéraire du Portugal, suivi du Résumé de l’histoire littéraire du Brésil; par M. Ferdinand Denis. Le Globe, Paris, 16/06/1827, p. 168-169.

447 No original: “de chétives imitations de la vieille poésie de l’ancien monde”. MAGNIN, Charles. Le Globe,

Paris, 22/11/1827, p. 534.

448 No original: “il semble que le joug colonial se soit étendu jusque sur les esprits, et que l’émancipation du

empenhada em opor “a humanidade europeia e a heroica barbárie desses povos”,449 embora

empregasse uma estrutura demasiadamente próxima à epopeia homérica.450 Do Uraguai, não escondeu seu desconforto com o destaque concedido à Companhia de Jesus, nem seu descaso com o propósito satírico de certas passagens, as quais, em sua opinião, teriam perdido completamente o sentido. Mesmo assim, declarou que “notam-se nesse poema alguns caracteres bem traçados e, sobretudo, algumas pinturas bem feitas dessa parte do Novo Mundo”,451 e ainda que “existe, contudo, na ação do selvagem e na paisagem sobre a qual essa narrativa se desenha um tom de originalidade que a retórica do ex-jesuíta não pode apagar totalmente”.452 Depois desse longo parêntese sobre os dois épicos, no último parágrafo de sua resenha Magnin voltou a se concentrar no Résumé. Censurou a ausência de erratas, o formato pequeno do volume e o emprego do termo “redondillas”, no lugar de “redondilhas”. Por outro lado, exaltou Denis por seu cuidadoso trabalho de pesquisa, por seu estilo rico em ideias e expressões, e ainda por sua alma delicada, capaz de apreciar profundamente as produções literárias brasileiras.

Se o lançamento do Résumé despertou certo interesse na imprensa francesa – sendo alguns desses artigos críticos redigidos até mesmo por estudiosos e especialistas em literatura portuguesa, como mostrado anteriormente –, nas décadas subsequentes, por outro lado, poucos conterrâneos de Denis continuaram se referindo à publicação. As únicas exceções foram os verbetes acerca do autor disponibilizados em dicionários e enciclopédias, a exemplo de La France littéraire ou Dictionnaire bibliographique des

savants, historiens et gens de lettres de la France, ainsi que des littérateurs étrangers qui ont écrit en français, plus particulièrement pendant les XVIIIe et XIXe siècles (1828), do Dictionnaire Universel des contemporains (1893) e da Bibliographie brésilienne: catalogue des ouvrages français & latins relatifs au Brésil (1898).453 Nos próximos capítulos veremos que, sobretudo a partir do último quartel do século XIX, Denis obteve

449 No original: “entre l’humanité européene et l’heroique barbarie de ces peuplades”. Idem. p. 535. 450 Loc. cit.

451 No original: “on remarque dans ce poème quelques caractères bien tracés, et surtout quelques peintures