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Parte I: Percurso Epistemológico

1. Subjetividade e Gênero: referências para a observação do Grupo das Meninas e suas

2.2. Pesquisa com histórias de vida em formação recurso para o enfrentamento aos entraves

2.3.3 Recolha do material biográfico

16 Atualmente sua filha, Karina Silva, repete o feito tornando-se a segunda mulher a conduzir a gestão do município. Seu mandato iniciou-se no ano de 2013.

Tendo realizado o “sobrevoo”, reconhecido o contexto geográfico e cultural que engendrou o Grupo das Meninas e onde elas desenvolveram suas redes de sociabilidade, delimitado o objeto e identificados os sujeitos da investigação, concentramos esforços e passamos a nos dedicar efetivamente à recolha do material biográfico. Aqui cabe dedicar um adendo: neste momento da realização do trabalho estivemos sob forte impacto das descobertas que realizávamos sobre a história de Amargosa, a história do jogo político local etc. Assim, sob o encantamento proporcionado pelas revelações obtidas durante as entrevistas preliminares, vislumbramos a oportunidade de converter os momentos de recolha de material biográfico para o desenvolvimento desta pesquisa em momentos de recolha de material para a confecção de um filme documentário sobre a mesma temática. Consideramos que esta ação, além de ser prazerosa, cumpriria tanto a função de atender as necessidades da pesquisa, quanto a de oferecer à comunidade um registro de sua história num momento em que sua realidade se modifica muito rapidamente e coloca em risco a preservação de sua memória. Com isto, constituímos uma enxuta equipe de filmagem, reunindo além desta pesquisadora, mais três profissionais da área de cinema18. Paralelamente nos articulamos, obtivemos o apoio de Profa. Conceição Rezende e Profa. Regina Vaz de Almeida, nos organizamos e iniciamos o processo de recolha dos materiais biográficos – agora contando com registro de som e imagem em alta definição.

Portanto, para a realização desta recolha de material biográfico realizamos seis reuniões coletivas com o Grupo das Meninas e nove reuniões para realização de entrevistas individuais. Todas as entrevistas tiveram caráter semiestruturado com espaço para que as Meninas se posicionassem a respeito de sua origem familiar, a formação escolar, o ingresso no mundo do trabalho, a docência, a participação no Grupo das Meninas, experiências político-partidárias, trabalhos sociais voluntários e formação religiosa. Em nenhum momento tivemos o Grupo todo reunido, mas ao todo dentre suas dezessete integrantes, onze participaram, oferecendo suas contribuições em algum dos momentos planejados. É importante esclarecer que desde o início do contato com o Grupo não nos comprometemos a entrevistar individualmente todas as dezessete participantes, posto que numa pesquisa qualitativa não seria necessário nos comprometer com a

18 Elen Linch, Leandro Rodrigues e Ryane Nascimento. Esta equipe embora não alcançando sucesso na concorrência pela verba pública para a realização do filme realizou as filmagens com financiamento próprio e aguarda condições

quantidade de entrevistas realizadas, mas sim, com a qualidade dos conteúdos alcançados e com a representatividade dos mesmos. As entrevistas preliminares já haviam fornecido elementos que nos permitiram saber que o Grupo é constituído por mulheres que pertencem a três agrupamentos políticos que no município são diferentes, e até mesmo divergentes. Assim, nos esforçamos para apresentar esta diversidade no universo desta investigação. Desde o início do contato estabelecemos ainda que as Meninas que atualmente não residem em Amargosa também não constituiriam o universo de sujeitos entrevistados. As informações biográficas contidas neste relatório referentes a estas mulheres nos foram oferecidas pelas outras Meninas durante as entrevistas individuais e coletivas concedidas a esta pesquisadora.

O primeiro encontro não foi coletivo, foi uma entrevista individual onde Profa. Conceição Rezende nos conduziu19 em uma visita ao Ginásio Santo Bernadete que foi uma verdadeira viagem no tempo! Embora ela já estivesse aposentada e fora do Ginásio há mais de quinze anos, a impressão que nos dava é a de que aquele espaço ainda era dela, tamanha era sua intimidade

com ele. Não havia naquele dia um responsável pela escola para nos receber, embora a visita tivesse sido agendada com antecedência. Mas isto não representou problema algum, Profa. Conceição dominava aquele espaço e o conhecia como ninguém. Entramos em todas as salas, subimos todas as escadas e caminhamos todos os corredores e pátios, estivemos inclusive nos espaços de acesso restrito como arquivos e almoxarifado. Ela tinha uma razão e uma lembrança a apresentar sobre quase tudo que vimos, a história de sua vida se mistura com a história daquela escola. No horário do recreio ela nos conduziu à sala dos (as) professores (as), onde havia umas quinze pessoas reunidas. Ela nos apresentou ao grupo como professores que somos da UFRB e mencionou que fazíamos uma pesquisa sobre a escola. Então o inusitado aconteceu: após esta breve apresentação, uma professora do Ginásio tomou a palavra e nos perguntou se nós tínhamos consciência da honraria que estávamos recebendo – ter Profa. Conceição como nossa cicerone. Com isso, a professora passou a nos apresentar Profa. Conceição, mencionando suas realizações como ex-Diretora daquela escola e também como fundadora da DIREC 29. Além disso, ressaltou a importância dela em sua vida pessoal, como o modelo para o exercício da docência que teria procurado seguir ao longo de sua carreira. Ao final desta manifestação, os professores presentes passaram a aplaudir Profa. Conceição. Foi um momento emocionante! Esta entrevista nos ajudou

a conquistar o apoio de Profa. Conceição para envolver o Grupo das Meninas com nossa proposta de pesquisa.

O segundo encontro foi coletivo e nós já o organizamos com a ajuda de Profa. Conceição Rezende. Ele aconteceu em sua própria residência. O objetivo deste momento foi justamente apresentar o convite para que as Meninas aderissem às nossas propostas, aceitando participar tanto dos procedimentos de recolha de materiais biográficos para esta pesquisa, quanto para o desenvolvimento do filme. Este encontro aconteceu em 13 de abril de 2012, durante uma reunião

das Meninas para um Estudo Bíblico que acontece quinzenalmente e é coordenado por Profa.

Conceição Rezende. Ao final do Estudo, apresentamos a proposta às presentes através de um folder20 elaborado por esta pesquisadora especialmente para esta ocasião. Nove21 participantes do

Grupo estavam presentes e de imediato aceitaram participar dos projetos. O passo seguinte foi

proceder com o agendamento dos novos encontros coletivos e ainda das entrevistas individuais que realizaríamos com apenas algumas das integrantes. Para celebração do encontro, Profa. Conceição preparou um caruru para as presentes, estava delicioso!

O terceiro encontro também não foi coletivo, foi uma nova entrevista que realizamos também no mês de maio de 2012 com Irmã Gertrudes, religiosa sacramentina na residência da Congregação em Amargosa. O objetivo foi buscar descrições e imagens dos espaços e do cotidiano das Sacramentinas. Registrar o estilo de vida sacramentino que influenciou a formação das Meninas do Grupo.

O quarto encontro também ocorreu em maio de 2012 e também não foi coletivo. Foi uma visita realizada ao Colégio Santa Bernadete conduzida por Profa. Silvandira, sua atual Diretora. Silvandira apresentou o Colégio, suas dependências, instalações e dispôs sobre seu funcionamento atual.

O quinto22 encontro aconteceu no mês de agosto de 2012 na residência de Profa. Regina Vaz. Neste encontro reafirmamos os compromissos, reapresentamos as propostas para aquelas

20 Este prospecto consta entre os anexos deste relatório.

21 Profa. Conceição, Profa. Terezinha, Profa. Lourdes, Profa. Iza, Profa. Regina, Profa. Marizinha, Profa. Joseny, Profa. Belarmina e Profa. Noélia.

22 Nosso trabalho de recolha de materiais biográficos foi interrompido pelas comemorações do São João, que no Recôncavo – em especial, em Amargosa – envolve grande parte das famílias e toma praticamente o mês de junho inteiro. Somando a este lapso de tempo, vivemos o recesso escolar e, quando pensamos em retomar nosso trabalho, Profa. Conceição Rezende sofreu um problema cardíaco grave e nós nos pusemos a esperar sua recuperação. Após consultas ao Grupo, ao final do mês de agosto de 2012 decidimos retomar o contato com o Grupo ainda lentamente,

que não tinham participado da primeira reunião e o movimento de apresentação das memórias biográficas foi iniciado. Nesta ocasião testamos as primeiras filmagens e construímos junto com

o Grupo a metodologia para o prosseguimento do processo de recolha do material biográfico.

Nesta oportunidade planejamos proceder com a recolha do material biográfico através da realização de encontros coletivos e outros individuais. Um encontro coletivo com o Grupo para apreciar fotografias e outros documentos antigos organizados em álbuns temáticos por Profa. Regina Vaz: álbuns relativos à experiência de formação no Ginásio Santa Bernadete, álbuns relativos à experiência docente, álbuns relativos aos encontros do Grupo das Meninas e álbuns relativos à história de Amargosa. O objetivo era motivar a recuperação de memórias relativas ao tempo da infância e juventude – o contexto da formação escolar. Outro encontro coletivo objetivaria a realização de uma visita coletiva ao Ginásio Santa Bernadete, que àquela altura já estava sendo dirigido novamente por uma integrante do Grupo das Meninas – Profa. Silvandira Chaves. A intenção desta visita era recuperar memórias relativas ao período em que trabalharam na escola e deram início à formação do Grupo das Meninas. Por fim, quanto aos encontros coletivos, projetamos nossa participação numa das reuniões do Estudo Bíblico com o objetivo de captar informações sobre o relacionamento atual do Grupo, seus temas de reflexão, interesses etc. Além disto, decidimos neste encontro sobre a necessidade de realizar algumas entrevistas individuais e sugerimos que estas fossem feitas ou nas próprias residências das entrevistadas ou em alguma locação condizente com o universo de referências relacionadas à entrevistada.

Oito23 integrantes do Grupo participaram deste terceiro encontro, além da equipe de filmagem. Embora não tivéssemos definido previamente um recorte temporal para abordarmos neste encontro, as Meninas apresentaram espontaneamente conteúdos relativos ao histórico de Amargosa no tocante à chegada das Irmãs Sacramentinas ao município, que desembocou na fundação do Ginásio Santa Bernadete – que foi apresentado pelo Grupo como um dos mais importantes polos de escolarização de mulheres e de formação docente desta região do estado da Bahia nas décadas de 1946 a 1965. Neste Ginásio não só as Meninas estudaram, mas também, em sua maioria, iniciaram e deram seguimento às suas atuações profissionais. Este encontro terminou em chocolate quente, bolo de milho, sequilhos e outras gostosuras.

O sexto encontro foi individual. Realizamos uma entrevista individual com Profa. Regina Vaz em sua residência. Os temas mais abordados foram relativos ao período vivido como aluna interna no Ginásio Santa Bernadete e a história do município de Amargosa em razão da paixão da professora pelo tema. Regina é uma colecionadora de indícios historiográficos relacionados a Amargosa, fotografias, documentos etc. Nesta entrevista ela disponibilizou todo este acervo para nossa investigação, além disso, organizou um CD contendo fotografias de todas as Meninas do

Grupo, bem como atas e convites de formatura de todas elas, fotografias do Ginásio Santa

Bernadete em diferentes períodos de sua existência, incluindo o período em que elas o dirigiam. Este arquivo continha também imagens dos famosos (nesta região) desfiles cívicos realizados pelas escolas de Amargosa entre as décadas de 1970 e 1980.

O sexto encontro foi uma visita coletiva ao Ginásio Santa Bernadete, em março de 201324. A proposta para ele era abordar as experiências vividas a partir da década de 1970, quando as Meninas habitavam o Ginásio na condição de professoras e gestoras. Entretanto a conversa, como em outros encontros coletivos, também escapou ao tema e retornou ao período de internato e à formação escolar sacramentina, sinalizando para a importância deste tema na constituição da identidade deste grupo. É preciso considerar também que a vida destas Meninas, como um todo, se mistura com a vida do Ginásio. É impossível separar. Ao final planejamos a continuidade do processo de recolha através de uma maratona de atividades que foram realizadas nos dias que seguiram.

O sétimo encontro consistiu na realização de uma entrevista individual com Profa. Marizinha Borges Sales, que ocorreu também em março de 2013, na sede do Centro Espírita Irmã Scheilla, onde ela preside os trabalhos da comunidade que o frequenta. A trajetória política de sua família figurou entre os principais temas abordados nesta circunstância.

Nos oitavo e nono encontros realizamos entrevista individual com Profa. Joseny Cajado. No oitavo encontro nos reunimos com ela nas dependências da Escola Agrotécnica (atual CETEP-Vale do Jiquiriçá) onde atuou por muitos anos como Vice-diretora. E o nono encontro foi realizado, ainda continuando a entrevista com ela, na sede da Associação das Voluntárias da Comunidade de Amargosa, onde ela realiza sua vocação filantrópica. Ambos também aconteceram em março de 2013.

Do mesmo modo, nos décimo e décimo primeiro encontros que realizamos em março de 2013, entrevistamos individualmente Suzete Sampaio, a única das Meninas que deixou o magistério e se dedicou a outra profissão. No décimo momento acompanhamos uma tarde de seu trabalho junto aos idosos da Fazenda Esperança, um asilo caritativo que abriga idosos carentes de Amargosa e região. No décimo primeiro nos dedicamos a ouvir sua trajetória de vida, as razões que a motivaram a deixar o magistério, o retorno a Amargosa e a escolha pela dedicação à Pastoral do Idoso.

O décimo segundo encontro foi coletivo, realizado em março de 2013. Participamos de uma reunião do Estudo Bíblico que foi conduzida por Profa. Conceição Rezende em sua residência. Nesta oportunidade foi possível compreender a necessidade que as Meninas sentem de se manter ativas, planejando e conduzindo atividades sociais. Percebemos também divergências entre elas a respeito do modo como interpretam e vivenciam a espiritualidade. Sete25 membros do Grupo participaram desta reunião além da equipe de filmagem.

Por fim, o último encontro, também realizado em março de 2013, foi coletivo e organizado com a ajuda de Profa. Regina Vaz de Almeida, que além de abrir sua residência para a ocasião, preparou os álbuns temáticos com fotografias e documentos que motivaram a apresentação das memórias. Este encontro reuniu Profa. Regina, Profa. Noélia e Profa. Belarmina e, mesmo com uma diversidade enorme de caminhos temáticos disponíveis nos álbuns, o tema da noite retornou ao tempo de escola, quando elas exploraram temas relacionados à juventude delas, o período de internato e também o tempo do trabalho.

Mas nosso trabalho investigativo não esteve restrito às entrevistas que realizamos com as integrantes do Grupo, nós procedemos também com visitas ao Ginásio Santa Bernadete, às dependências paroquiais e à residência das Irmãs Sacramentinas, onde inclusive se localiza uma pequena biblioteca que abriga documentos que contêm e registram a história desta Congregação em Amargosa. Durante o ano de 2012 realizamos visitas sistemáticas à residência das Irmãs Sacramentinas em Amargosa. Nestas oportunidades, sua biblioteca, bem como o acervo de documentos antigos da Congregação, foram colocados à disposição de nosso estudo. Assim, nos dedicamos ao estudo dos documentos da Congregação em Amargosa e compartilhamos do

convívio com as Irmãs Sacramentinas a fim de nos sensibilizarmos para aprendizagem sobre seu modo de ser e viver.