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Reconfiguração do capital no SSI da cana-de-açúcar: novos atores

CAPÍTULO 2. Sistema Setorial de Inovação da cana-de-açúcar do Brasil:

2.2. Mudanças no ambiente de seleção e busca do etanol brasileiro (2000-

2.2.2. Reconfiguração do capital no SSI da cana-de-açúcar: novos atores

A forte expansão produtiva da indústria canavieira ocorreu concomitantemente à com uma mudança na composição do capital do setor. Intensificou-se um processo iniciado nos anos 1990, em que as aquisições e as joint ventures entre as empresas pertencentes ao setor e novos entrantes, passaram a controlar ativos, movimento este observado no gráfico 2.10. e no quadro 2.2. É sabido que o segmento era composto majoritariamente pelo capital nacional com a presença de famílias tradicionais no controle das agroindústrias; tal padrão se altera significativamente, com a entrada de empresas estrangeiras ou de grandes grupos nacionais originários de outros setores.

Gráfico 2.10. Número de fusões e aquisições ocorridas no setor sucroalcooleiro entre 1995 a 2009. 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2 1 1 3 2 7 11 9 5 5 8 9 25 14 4

Fonte: : elaboração própria a partir de KPMG, 2009.

As fusões e aquisições (F&A) tornaram-se uma alternativa para a adequação do tamanho e da estrutura organizacional das empresas frente às novas condições do mercado, caracterizado por uma regulamentação parcial (pós anos 1990) e pela conjuntura econômica mundial, distinta pela intensificação do processo de globalização, expansão das energias renováveis e do boom dos preços das commodities. Este movimento é próprio da dinâmica de crescimento das firmas115; as pertencentes ao setor crescem por aquisição e reforçam sua core

competence, ampliando suas possibilidades de desenvolvimento na mesma rota tecnológica.

Por sua vez, as novas entrantes crescem pelo processo de diversificação. Assim, multiplicam suas competências, sendo capazes de acompanhar novas tendências, possibilitando a realização de novos negócios “fora” da rota tecnológica que sustenta a sua atividade principal, tornam-se ou ampliam sua característica de empresas multi-produto e muti-setorial (CHANDLER, 1998). O caso das empresas ligadas ao setor de petróleo (Shell,

115

BP e Petrobras) é ilustrativo deste movimento, as quais adquiriram ou construíram parcerias com firmas produtoras de etanol, um combustível concorrente aos derivados do petróleo.

Este processo é proveniente de pessoas físicas, fundos de pensão, fundos private

equity, mas, principalmente de grandes firmas ligadas ao setor energético e alimentício (vide

quadro 2.2.). Tal situação promoveu uma reestruturação acionária no setor sucroalcooleiro do Brasil e fortaleceu a tendência à concentração produtiva.

Em relação às novas entrantes, sobretudo as multinacionais, a opção pelas fusões, aquisições ou formação de joint ventures foram preferidas com o objetivo de diminuir os custos operacionais e os custos de aprendizagem. Tal estratégia implica adentrar no setor já com participação de mercado e com ativos em pleno funcionamento (usinas). Assim, adquirem informações e conhecimentos relevantes economicamente, os quais só poderiam ser atingidos com a participação no cotidiano da produção, portanto, perpassa por particularidades culturais e tecnológicas de maneira mais fluída, queimando etapas no processo de aprendizagem, inclinando a curva de aprendizagem e adaptações. Com essa dinâmica, as entrantes encurtam a distância relativa entre das empresas líderes,concorrendo de maneira mais equitativa com as empresas já estabelecidas em um curto período de tempo.

A opção dos novos investidores pela aquisição ou joint venture também se explica pela redução dos custos de expansão dos seus grupos empresariais, pois opera em um novo setor desde o início a economia de escala. Outro fator importante é a remoção das barreiras à entrada, visto que aquisição garante o domínio de ativos complementares, como as bases e os canais de distribuição e comercialização já instalados. Especificamente no caso do açúcar e do etanol, tratam-se de fatores muito importantes, uma vez que boa parte do açúcar é exportada e o etanol é consumido por todo o território nacional.

Nesta seara é perfeitamente possível supor que haja aumento da concentração econômica, com a junção de diferentes plantas sob a direção de uma mesma empresa ou grupo econômico. Isso resulta, em última instância, na diminuição dos custos administrativos e no aumento no poder de negociação de preços dos insumos e dos produtos e, portanto, amplia a rentabilidade e a competitividade das grandes firmas sucroalcooleiras.

No primeiro momento, as aquisições se deram entre as firmas pertencentes ao setor, intensificando o movimento de concentração, já estimulado pela política pública116. Em

116 Programa de Racionalização da Indústria Açucareira (1971-1975); Estímulos à fusão/incorporação de

meados dos anos 1980, o Grupo Cosan incorporou três usinas (Usinas Santa Helena, Usina São Francisco e Usina Ipaussu), todas no Estado de São Paulo; esta ação é o início de um processo maior, o qual se torna sistemático a partir de meados dos anos 1990. Em 1995, a

trading Balli Group realizou um joint venture e incorporou parte das ações da Usina Santa

Elisa (Grupo Zanini), localizada em Sertãozinho/SP. Neste mesmo ano, um consórcio paulista adquiriu a Usina Santa Lydia, no município de Ribeirão Preto/SP (BENI, 2012).

Entre 1995 a 2000, pelo menos nove processos de F&A ocorreram na agroindústria canavieira. Entre 2000 a 2009 foram identificados 97 ações envolvendo fusões, aquisições e

joint ventures, as quais proporcionaram incorporações de unidades de processamento,

verticalização à montante da cadeia, ou seja, compras de terras para autofornecimento e, também, resultou em verticalização a jusante, com a posse de usinas pelas tradings atacadistas de açúcar. Por exemplo, a aquisição da Santelisa pela multinacional Louis Dreyfus, deu origem a Louis Dreyfus Commodities Bioenergia, a qual opera 13 usinas e tem uma capacidade de moagem de 40 milhões de toneladas (VARRICHO, 2012).

A verticalização dos elos de produção é uma das características do processo de concentração em curso. Desta maneira, chega-se em 2011 com 20% da agroindústria concentrada nas mãos de 12 grupos empresariais. Consequentemente, a territorialização destes grupos conforma o próprio circuito espacial de produção canavieiro, materializando-se enquanto sistemas de objetos e ações, assim, hegemonizam áreas regionais na hinterlândia de suas unidades agroindustriais (BENI, 2012; SHIKIDA & PEROSA, 2012; CASTILLO, 2013).

Estes novos atores visam participar da cadeia produtiva sucroalcooleira, ação impulsionada pelas estratégias das commodities trading firms. O interessante é que estas novas firmas passam a participar diretamente da produção e do controle dos ativos, o qual altera a característica histórica do setor. O quadro 2.2. identifica alguns destes novos atores:

tabela 1 indicam esse fenômeno no cultivo da cana-de-açúcar e no controle da matéria-prima, já que nas áreas tradicionais e nas novas áreas de expansão a cana própria é superior a cana de fornecedores.

Quadro 2.2. Presença estrangeira na produção de açúcar, etanol e bioeletricidade no Brasil.

Entrantes Origem de

Capital Entrantes

Origem de Capital

DOW Chemical EUA Epuron (grupo Conergy) França

Shell Anglo-holandesa Eridania Beghin Say França

Glencore Intl A.G. Angla-suíça Eridania Beghin Say (EBS) França

Adecoagro Argentina Evergreen França

Alcotra Bioenergy Bélgica FDA - Franco Bras. A.A. França

Global Energy Espanha Tereos França

ADM (Archier Daniels

Midland) EUA Trading Sucden França

Amyris EUA Trading Noble Group Hong Kong

Bunge e Born EUA Sheree RenuKa Sugars Ltd. Índia

Cargill EUA Mitsubishi Corporation Japão

Coinbra/Dreyfus EUA Mitsui Japão

Globex EUA Sojitz Corporation Japão

Grupo Stanley Morgan EUA Toyota Tshusho Japão

RanchCapital Investment EUA Ventoria Limited Reino Unido

Truenergy EUA Biofuel AS Reino Unido

Wellington Management EUA BP (British Petroleum) Reino Unido

Infinity Bio-Energy EUA Balli Group Reino Unido

Monsanto EUA Clean Energy Brazil Investidores

diferentes Cluster França Brazilian Renewable Energy Company Investidores

diferentes

Fonte: : elaboração própria a partir de BENETTI, 2009; KPMG, 2009; BORGES & COSTA, 2009; SIQUEIRA

& CASTRO JUNIOR, 2011; GARCIA et al., 2015.

Desde o início dos anos 2000 este setor vem recebendo investimentos de empresas estrangeiras e advindas de outros setores econômicos, como: do agronegócio, da energia, da biotecnologia, da química e da petroquímica. Como exemplo, destes novos atores pode-se citar as empresas: Bunge, Cargill, Infinity Bioenergy, Abengoa, Louis Dreyfous, a Shell, BP,

Dow, Dupont, Amyris, Novozymes, Mascoma, Odebrecht, Petrobras, Noble Group, Sojitz e

outras que seguem expostas no quadro 2.2. (CORRÊA, 2014; BASTOS, 2012; BENETTI, 2009; GUEDES, 2009). Com isso, o IDE (Investimento Direto Estrangeiro) na indústria canavieira em 2002, que era cerca de US$ 4 milhões, passa para mais de US$ 1 bilhão em 2007 (SHIKIDA & PEROSA, 2012).

A emergência de novas firmas, novas espécies de firmas, inicia novos sub-setores ou requalifica o conteúdo e a forma dos setores tradicionais (OYELERAN-OYEYINK & RASHAH, 2009). Este processo é percebido no SSI da cana-de-açúcar. Esta mudança estrutural, juntamente com o crescimento e a expansão do setor para novas áreas, estimulou a diversificação das atividades econômicas e a reorientação das atividades inovativas, por exemplo: a difusão da cogeração com objetivo da venda da eletricidade, adaptação das

variedades de cana para novos tipos de solo; novos sistemas operacionais, difusão da automação nas plantas industriais e etc.

Este processo desencadeia o alargamento das fronteiras setoriais e nessa ação residem os elementos da mudança setorial, pois as fronteiras setoriais são importantes “espaços” para o processo de aprendizado, visto que são nessas áreas que localizam-se importantes fontes de novos conhecimentos. Ou seja, a interação entre firmas de diferentes naturezas possibilita o processo de aprendizagem, a aquisição de novas competências e/ou de novas tecnologias, as quais são refuncionalizadas e utilizadas sob uma nova perspectiva, agregando ou redirecionando a rota tecnológica anteriormente estabelecida (MALERBA, 2002; MALERBA, 2007).

A apropriação de novos conhecimentos e as novas oportunidades derivadas dessa nova dinâmica de crescimento impele os atores a buscarem novas tecnologias, conformando novas rotas tecnológias, por exemplo, todos os projetos de etanol celulósico ou de química verde no interior do SSI surgem nesse contexto, e apresentam relações ou são conduzidas por estas “novas” empresas117

. Tal afirmação toma forma nos capítulos 3 e 5.