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1.2. Definições do “desafio tecnológico”: o etanol celulósico

1.2.2. A tecnologia de produção do etanol (E2G)

O objetivo da tecnologia de segunda geração é realizar a produção do etanol a partir da biomassa, material vegetal que é formado pela celulose, pela hemicelulose e pela lignina. Esta matéria-prima pode ser originada dos resíduos agroflorestais ou por cultivos energéticos, as quais são especialmente cultivadas para este fim, como o caso da cana-de-açúcar, do sorgo sacarídeo, do milho entre outros (LEITE & LEAL, 2007; DEMIRBAS, 2008; TAYLOR, 2008; MATHEWS et al., 2011). Ademais, esta tecnologia elevaria a produção do biocombustível sem aumentar a área plantada de biomassa, já que utilizaria o material lignocelulósico.

da água presente nesse caldo clarificado para transformá-lo em um xarope concentrado, com aproximadamente 65° brix (% de sólidos solúveis).

Cozimento – esta etapa visa a cristalização e recuperação de 80% a 85% da sacarose presente no xarope. O sistema utilizado transforma o xarope em massa que posteriormente será centrifugada.

Centrifugação - após o cozimento, a massa passa por um processo de separação física (centrifugação). O açúcar é centrifugado e lavado com água quente e vapor, tendo como subproduto o mel que poderá ser utilizado no processo de fabricação de etanol.

Secagem – após a centrifugação, o açúcar é encaminhado aos secadores para a secagem e, posteriormente peneirado. Na sequencia, é envasado em big-bags de 1200Kg e armazenado para comercialização.

50 O processo de fermentação dura diversas horas e como resultado produz o vinho, chamado também de vinho

De maneira geral, a tecnologia de segunda geração visa ter acesso aos açúcares contidos na celulose e na hemicelulose, ou seja, a técnica consiste em aproveitar os açúcares nas moléculas da sacarose que estão protegidos por uma “espessa” camada de fibras. Para isso, as técnicas de pré-tratamento da biomassa devem quebrar as cadeias de polissacarídeos, que unem as moléculas da parede celular das plantas.

Esta tecnologia realiza o desmonte da parede celular, pois a estrutura dos vegetais envolve a celulose em camadas compostas de uma combinação da lignina e da hemicelulose (estrutura protetora da célula), que se desenvolveu ao longo de centenas de milhões de anos exatamente para protegê-la de agentes externos (PERRONE et al., 2011; MAIO; HENNESSY; BABCOCK, 2012; SCHUTZ, 2012; ZILBERMAN et al., 2013; GUSTAFSSON et al., 2014; MURAKAMI, 2015);

A produção do etanol celulósico apresenta duas rotas tecnológicas distintas que mostram-se em melhores condições para se estabelecerem como dominantes: a termoquímica e a bioquímica. A rota termoquímica consiste em transformar a biomassa em biogás através do processo de gaseificação, que posteriormente são transformados em etanol e/ou em outros líquidos (Gás de Síntese). O processo denomina-se conversão, ou seja, passar a matéria do estado sólido para o estado gasoso. O resultado desse processo são os gases CO2, H2, CO e o

vapor d’água51

.

A rota bioquímica se subdivide em duas alternativas tecnológicas distintas, pois utilizam catalisadores de natureza diferente: a rota química ocorre através da hidrólise ácida, já a rota biológica se dá pela hidrólise enzimática, a qual ocorre através da ação dos micro- organismos (fungos e bactérias). A hidrólise é uma reação química que tem por objetivo quebrar as cadeias de carbono. Ela ocorre a partir da ação dos micro-organismos (fungos e bactérias) e possibilita a quebra das moléculasdevido à adição de água; nesse caso a água tem acesso às moléculas pela dissolução das fibras que compõem a hemicelulose e a lignina.

O processo de hidrólise ácida consiste em utilizar um ácido forte para atacar as ligações glicosídicas entre os monossacarídeos de um polissacarídeo. Esse processo, de desmonte das células, é feito de maneira rápida, por meio da adição de ácidos ao composto de

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A gaseificação pode ser definida como o processo de conversão termoquímica de um material sólido ou líquido (que contém carbono na sua composição) em um produto gasoso combustível (gás de síntese), através da oxidação parcial à temperaturas elevadas (reações termoquímicas numa faixa de temperaturas de 800°C a 1100°C) e em pressões atmosféricas ou maiores, até 33 bar. (CORAL, 2009, p. 32). Toda essa reação ocorre através da queima da biomassa. Enfim, os processos da rota termoquímica que são conhecidos como processos BTL (Biomass To Liquid) são na verdade sistemas de gaseificação que operam de forma a limitar a oxidação completa do hidrogênio pela água, e do monóxido de carbono para dióxido de carbono, assim, obtêm o gás de síntese, gás que será sintetizado por uma reação catalítica, o que torna possível a obtenção de hidrocarbonetos, dos álcoois, do hidrogênio, da amônia, e do gás natural sintético. (LORA et al., 2008).

biomassa e, ao mesmo tempo, do controle da temperatura desta mistura, primeiramente elevando a temperatura e na sequência (em poucos minutos) forçando a queda da temperatura. Preservam-se assim intactos os monossacarídeos que serão usados para fermentação. De certa forma, o composto recebe um “choque térmico” para que os ácidos não agridam os açucares.

A hidrólise enzimática é o processo tecnológico mais promissor como apontam os trabalhos de Leal & Leite (2007); Nyko et al. (2010); Zilberman et al. (2013); Raele et al. (2014); FAPESP (2015); Silveira et al. (2016); UNCTAD (2016) . As maiores expectativas para a difusão da tecnologia de etanol celulósico ao longo prazo estão depositadas na possibilidade de utilizar a “maquinaria bioquímica” de micro-organismos (fungos e bactérias) para “desmontar” a parede celular. O problema é que, assim como os fungos desenvolveram estratégias para invadir a parede celular, as plantas também co-evoluiram para sofisticar seus mecanismos de defesa. Assim, embora haja fungos capazes de degradar a parede celular vegetal, ela é bastante recalcitrante à degradação (BUCKERIDGE et al., 2010).

O desafio está em quebrar a estrutura da celulose que está organizada em grandes estruturas chamadas polissacarídeos, que as leveduras não conseguem fermentar diretamente para converter em etanol, mesmo após o processo de pré-tratamento. Com isso, a tecnologia enzimática consiste em realizar a conversão bioquímica da celulose em açucares (glicose e xilose) por intermédio das enzimas, proteínas produzidas por fungos, bactérias e plantas capazes de causar reações químicas específicas, sem sofrer alteração em sua composição, dessa maneira, sendo capazes de extrair açúcares da celulose para a produção de etanol (FAPESP, 2010).

O quadro 1.2. pontua alguns problemas ainda não superados pelo arcabouço científico e tecnológico do etanol de segunda geração, reforçando que se configura neste caso uma corrida tecnológica a nível internacional em aberto. A produção do etanol celulósico ainda encontra-se em uma fase pré-paradigmática permeada por incertezas, na qual as rotas tecnológicas concorrem para estabelecer o standard da produção.

Quadro 1.2 Dificuldades tecnológicas ainda não superadas no etanol celulósico.

Rota ácida Rota enzimática Rota termoquímica

 * Alto custo de investimento, principalmente em maquinário (devido à natureza do material dos equipamentos);  * Material resistente a

reações químicas que sejam compatíveis com os preços praticados no setor.

 * Desenvolvimento de sistemas de pré- tratamento adequados para diferentes tipos de biomassas;

 * Desenvolvimento de processos de destoxificações do produto da hidrólise;  * Desenvolvimento de novos tipos de enzimas

(selecionar micro-organismos ou desenvolver geneticamente);

 * Desenvolvimento de novas cepas de leveduras capazes de fermentar os compostos hidrolisados (C5).

 *Os mecanismos/reações relacionados à hidrólise enzimática não são bem conhecidos, necessitando de investimentos em pesquisa básica.

 * São requeridas plantas de grande capacidade para alcançar viabilidade econômica (alto custo de investimento inicial);  * São requeridas grandes

quantidades de matéria primas (planta

termoquímica = 500 t/h de biomassa seca).

Fonte: elaboração própria.

- Hidrólise enzimática

A evolução da tecnologia enzimática requer o desenvolvimento ou a seleção de microrganismos capazes de hidrolisar52 a celulose, tendo como subproduto açúcares (Hexoses e Pentose) que devem ser fermentados e posteriormente destilados. A direção do desenvolvimento desta tecnologia é a junção de todas as etapas em apenas um reator, ou seja, realizar o pré-tratamento, a hidrólise, a fermentação e a produção de enzimas no mesmo equipamento, utilizando-se do mesmo “conjunto” de micro-organismos, os quais devem ser tolerantes as altas concentrações de etanol e produzir exclusivamente o etanol.

Este processo produtivo integrado é denominado de Consolidated Bioprocessing

(CBP), considerado como o ponto final na evolução da tecnologia de conversão da biomassa

(HARUN et al.; 2011; DAL POZ et al., 2015).

Portanto, o que se apresenta em 2016 são esforços em melhorar e desenvolver os processos, tornando-os mais eficientes e integrados. Estas ações traduzem-se em um variável grupo de modelos tecnológicos, a saber:

Separate Hydrolysis and Fermentation (SHF),

Separate Hydrolysis and Co-Fermentation (SHCF),

Simultaneous Saccharification and Fermentation (SSF),

Simultaneous Saccharification and CoFermentation (SSCF),

Consolidated Bioprocessing (CBP)

52 Processo químico de decomposição ou alteração de uma substância que envolve a divisão de uma molécula

De maneira geral, a tecnologia do etanol celulósico baseada na rota enzimática apresenta as seguintes etapas53: 1) pré-tratamento, 2) hidrólise; 3) fermentação e 4) destilação. O nível de integração das etapas determina as características do modelo tecnológico do etanol celulósico. Destaca-se, que a destilação ocorre igualmente ao etanol de primeira geração. A figura 1.1. representa as diversas configurações que a tecnologia do etanol celulósico pode assumir.

O pré-tratamento da biomassa consiste em uma degradação parcial da sua estrutura, no qual o material lignocelulósico passa por um processo facilitador para a ação posterior dos microrganismos. Os mais “comuns” são a explosão a vapor54

, a utilização de ácidos com temperatura e pressão controladas55, o hidrotérmico e o processo Organosolv; estas ações abrem os caminhos para os agentes biológicos hidrolisarem as cadeias de polissacarídeos na etapa seguinte, assim, o resultado do pré-tratamento é a separação da biomassa em celulose, hemicelulose e lignina. As duas primeiras estruturas celulares serão hidrolisadas e a lignina56 será aproveitada para geração de energia elétrica, por meio da sua queima nas caldeiras visando à geração de vapor.

Figura 1.1. Configurações tecnológicas do etanol celulósico – rota enzimática.

Fonte: elaboração a partir de BEVILAQUA, 2009.

53 Estas etapas ocorrem após o recolhimento, limpeza e secagem da matéria-prima. 54

A Iogen Corporation detém tecnologia baseada nesse processo, vale destacar que está presente na cooperação tecnológica com a Raízen.

55 Uma das opções mais difundidas baseada nesse princípio é o Organosolv, pré-tratamento do material e

hidrólise são realizados simultaneamente num reator contínuo. A tecnologia desenvolvida pela Dedini Indústria de Base é baseada nesse conceito

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O segundo processo é a hidrólise enzimática. Como foi dito anteriormente, visa à quebra da estrutura celular da celulose para obtenção da glicose (C6) e da xilose (C5). Esta

ação não é trivial, visto que os compostos enzimáticos apresentam rendimentos heterogêneos, dependendo do tipo da biomassa e do pré-tratamento desempenhado. Assim, é necessário ampliar os desenvolvimentos em engenharia genética para desenvolver fungos ou bactérias adequadas para cada tipo de material ou um conjunto biotecnológico capaz de atuar igualmente independente das condições da biomassa.

O terceiro processo é a fermentação da glicose e da xilose. Esta etapa é complicada, pois as leveduras tradicionais, tais como a Saccharomyces cerevisiae, não conseguem fermentar estruturas compostas por cinco carbonos (a xilose), assim, é necessário separar esta etapa em duas, com isso, aumentam-se os custos e desperdiça-se uma quantidade expressiva de açucares para a produção de etanol. A outra opção é a utilização de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) para realizar este processo de maneira completa, de tal modo, a busca do setor nessa etapa produtiva é por novas variedades de leveduras.

A configuração mais madura para a produção do etanol celulósico, que está agora na fase de demonstração e comissionamento, é a realização de todas as etapas de hidrólise e fermentação em reatores separados; este conjunto tecnológico é denominado de Separate

Hydrolysis and Fermentation (SHF). Portanto, os esforços de desenvolvimento caminham na

direção da superação dos pontos de estrangulamento do pré-tratamento, que é relativamente caro e ineficiente. E, na busca por micro-organismos geneticamente modificados, com a remoção e adição de características genéticas que permitam a redução do número de etapas do processo de conversão. A evolução tecnológica caminha para a combinação e realização conjunta desses processos em um mesmo reator (HARUN et al.; 2011; MAIO; HENNESSY; BABCOCK, 2012; DAL POZ et al., 2015).

1.3. A ABORDAGEM METODOLÓGICA SUBJACENTE À ANÁLISE DE SISTEMAS