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Redução de Impostos, “Equilíbrio” Orçamentário e Desregulação das

PARTE II – Estabilização Monetária Internacional e Retomada do Projeto Hegemônico

Capítulo 3 Redução de Impostos, “Equilíbrio” Orçamentário e Desregulação das

A nova lei reduzindo impostos seria aprovada pelo Congresso logo no primeiro ano do governo Reagan, período em que o presidente contava com alto índice de popularidade (68% de aprovação), principalmente por ter sobrevivido ao atentado contra sua vida semanas antes de enviar projeto de lei. Depois desse incidente, Reagan proferiu no Parlamento um emocionado discurso televisivo para a aprovação do mesmo121. De acordo com a nova legislação122, apesar de terem sido estabelecidas reduções nas alíquotas do imposto de renda ao longo das diferentes faixas de ganho anual, a princípio, indivíduos de renda mais alta seriam os mais beneficiados.

Conforme Baker (2007: 65), a redução de impostos era peça central da agenda econômica da administração Reagan e de acordo com este autor (ibidem: 66) a taxa marginal mais alta do imposto de renda americano era de 70%, sendo reduzida para 50% ao longo de três anos. Fizemos uma simulação com base no texto do anterior Código Tributário de 1954123, comparando-o à nova lei e, no que se refere ao que era tributado antes da reforma, chegamos a números bastante próximos, constando um valor um pouco mais baixo para a taxação aplicada com a nova lei. Ou seja, as faixas de renda mais altas passariam a pagar um imposto de aproximadamente 43% em média se comparados aos 71% anteriores. (Ver Tabela 3.1)124. A renúncia fiscal, além de ajudar a incrementar a demanda interna (ibidem: 67), favoreceu o setor financeiro já que, ainda sob altos índices inflacionários, as famílias buscaram proteger a renda liberada pelo Estado, investindo no mercado de papéis (KRIPNER, op. cit.: 103-104).

121 O recém-empossado presidente Reagan foi baleado em 30 de março de 1981 por John Hinckley Jr., cidadão norte-americano considerado portador de problemas psiquiátricos.

122

UNITED STATES PUBLIC LAW 97-34—AUG. 13, 1981, também conhecida como Economic Recovery Tax Act of

1981 ou Kemp-Roth Tax Cut.

123

Internal Revenue Code of 1954. PUBLIC LAW 591 - CHAPTER 736, APPROVED AUGUST 16, 1954. 124

Consideramos para nosso simulacro uma renda anual entre cem mil e duzentos mil dólares que corresponderia à faixa dos 5% mais ricos para o ano de 1981. Conforme dados do Censo Americano, as famílias pertencentes à camada dos 5% mais ricos teriam, em 1981, uma renda de no mínimo US$140.000,00 ao ano em valores correntes. Este é o valor base que utilizamos para a comparação. Para os dados sobre distribuição de renda, ver: U.S. Census Bureau, Current Population Survey, Annual Social and Economic Supplements. Table

H-1. Income Limits for Each Fifth and Top 5 Percent of All Households: 1967 to 2016. Disponível em:

Cidadãos com melhores possibilidades de aquisição de ativos imobilizados ou financeiros ou que, antes da reforma, não obtivessem suas rendas somente a partir de ganhos salariais, usufruiriam também de reduções no imposto sobre ganhos de capital, isto é, diminuição de uma alíquota de aproximadamente 28% para no máximo 20% sobre tais rendas (BAKER, op. cit.: 66). Esta medida favoreceu da mesma maneira o mercado financeiro norte-americano, tornando-o ainda mais rentável, assim como setores imobiliários e industriais que proporcionassem retornos maiores do que Wall Street. Conforme os dados do Think Tank norte-americano, Tax Policy Center125, as famílias de renda mais elevada foram as mais favorecidas com a redução desse tributo, pois eram justamente as que detinham a maior parte dos ativos financeiros nos Estados Unidos (Gráfico 3.1)126. Conforme Burman (2012: 2 e 9), em seu parecer ao Congresso dos Estados Unidos sobre redução de impostos para ganhos de capital: “Capital gains are disproportionately realized by extremely wealthy taxpayers. A tax preference for capital gains inevitably provides large benefits to very high-income people”.

Outra renúncia fiscal contemplada por aquela mesma lei de 1981 seriam os 25% de crédito sobre impostos incidentes sobre quaisquer custos para a realização de atividades que envolvessem pesquisa e experimentação (vulgarmente denominado pelas firmas como Pesquisa & Desenvolvimento). Tal privilégio atenderia às empresas de alta tecnologia e àquelas vinculadas ao desenvolvimento de novas armas e equipamentos militares que vieram a ter sua demanda elevada por parte do próprio governo dos EUA ainda naquela gestão.

125 Autodescrição da instituição: “The Tax Policy Center (TPC) is a joint venture of the Urban Institute and

Brookings Institution. The Center is made up of nationally recognized experts in tax, budget, and social policy

who have served at the highest levels of government.” Disponível em: http://www.taxpolicycenter.org/about.

Consultado em: 29 de novembro de 2016.

126 “The treatment of capital gains income is important to keep in mind in assessing the distributional effects of

the income tax, since much of the income of the richest families is in form of capital gains […] According to a study by the Congressional Budget Office, the Reagan tax cuts saved families in the top 1 percent of the income distribution an average of more than $25,000 a year in taxes, as their average tax rate fell from 29.8 percent in 1980 to 24.8 percent in 1983” (BAKER, op. cit.: 66).

Tabela 3.1

Pelo lado do gasto governamental, o que se verifica é uma elevação mais do que extraordinária nas despesas do Estado desde o fim da Segunda Guerra. No primeiro mandato, o governo Reagan gastou 31% a mais do que Carter. No segundo, 16% a mais do que ele próprio nos seus primeiros quatro anos. Ao terminar completamente seu governo, Reagan deixou para trás um orçamento anual 60% maior do que Carter. Exatamente o oposto do discurso vinculado para sua eleição e reiteradamente proferido durante todo seu governo. Em abril de 1981, o presidente fazia o seguinte pronunciamento para o Congresso:

The answer to a government that’s too big is to stop feeding its growth. Government spending has been growing faster than the economy itself. The massive national debt which we accumulated is the result of the government’s high spending diet. Well, it’s time to change the diet and to change it in the right way. (Applause)127.

Richard D. Erb, Diretor Executivo dos EUA no FMI, declarava dois meses depois em reunião junto aos membros do FMI:

127 Discurso. ‘ADDRESS OF THE PRESIDENT TO A JOINT SESSION OF CONGRESS’, 28 Abr. 1981. Executive

Secretariat, NSC: Trip File. DSC01143.

Faixas de renda tributáveis (ajustada) (A) Piso (B) Renda 'Exemplo' (C) Desconto padrão sobre a base³ (D) Valor fixo do Imposto (E) Alíquota do imposto variável (%) (F) Valor variável do Imposto (B- C-A) x E Valor Total do Tributo (D + F) Total Tributado sobre (B) Acima de US$ 4.000 mas não mais que US$ 6,000 4.000,00 6.000,00 600,00 820,00 24% 336,00 1.156,00 19,27% Acima de US$ 20.000 mas não mais que US$ 22.000 20.000,00 22.000,00 1.000,00 6.260,00 47% 470,00 6.730,00 30,59% Acima de US$ 38.000 mas não mais que US$ 44.000 38.000,00 40.000,00 1.000,00 15.900,00 62% 620,00 16.520,00 41,30% Acima de US$ 70.000 mas não mais que US$ 80.000 70.000,00 80.000,00 1.000,00 37.480,00 74% 6.660,00 44.140,00 55,18% Acima de US$ 100.000 mas não mais que US$ 150.000 100.000,00 140.000,00 1.000,00 60.480,00 83% 32.370,00 92.850,00 66,32% Acima de US$ 150.000 mas não mais que US$ 200.000 150.000,00 200.000,00 1.000,00 101.980,00 87% 42.630,00 144.610,00 72,31% Acima de US$200.000 200.000,00 250.000,00 1.000,00 145.480,00 90% 44.100,00 189.580,00 75,83% Faixas de renda tributáveis (ajustada) (A) Piso (B) Renda

'Exemplo' (C) Desconto padrão sobre a base³ (D) Valor fixo do Imposto (E) Alíquota do imposto variável (%) (F) Valor variável do Imposto (B- C-A) x E Valor Total do Tributo (D + F) Total Tributado sobre (B) Redução com a Lei de 1981 Valor liberado com a Lei de 1981 Acima de US$ 4.400 mas não mais que US$ 6.500 4.400,00 6.000,00 600,00 546,00 14% 140,00 686,00 11,43% -41% 470,00 Acima de US$ 18.200 mas não mais que US$ 23.500 18.200,00 22.000,00 1.000,00 4.442,00 28% 784,00 5.226,00 23,75% -22% 1.504,00 Acima de US$ 34.100 mas não mais que US$ 44.700 34.100,00 40.000,00 1.000,00 8.152,00 41% 2.009,00 10.161,00 25,40% -38% 6.359,00 Acima de US$ 44.700 mas não mais que US$ 60.600 44.700,00 60.000,00 1.000,00 12.498,00 49% 7.007,00 19.505,00 32,51% -41% 24.635,00 Acima de US$ 100.000² 66.600,00 140.000,00 1.000,00 20.289,00 50% 36.200,00 56.489,00 40,35% -39% 36.361,00 Acima de US$ 150.000 66.600,00 200.000,00 1.000,00 20.289,00 50% 66.200,00 86.489,00 43,24% -40% 58.121,00 Acima de US$ 200.000 66.600,00 250.000,00 1.000,00 20.289,00 50% 91.200,00 111.489,00 44,60% -41% 78.091,00 Notas:

1- Valores sem deduções legais, considerando-se o imposto aplicado sobre chefes de família.

2- A última faixa de renda considerada na Lei de 1981 é a de renda acima de US$60.600,00. Portanto, as três últimas faixas da tabela foram criadas para efeito de simulação. 3- Desconto sobre a base de cálculo para os indivíduos sem possibilidades de requisitar deduções maiores que o próprio desconto padrão.

Fonte: Internal Revenue Code of 1954. PUBLIC LAW 591 - CHAPTER 736, APPROVED AUGUST 16, 1954 ; e UNITED STATES PUBLIC LAW 97-34—AUG. 13, 1981. (Elaboração própria)

SIMULAÇÃO DO IMPACTO NA REDUÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA EM 19811

INTERNAL REVENUE CODE OF 1954

The staff concern about the size of budget deficit apparently reflects the view that the deficit will create pressures for still higher interest rates and/or demands for an easing of monetary policy. I can assure you that the U.S. is determined to reduce the budget deficit and takes the goal of balanced budget by 1984 very seriously128.

Gráfico 3.1

Contudo, ao analisarmos item por item dos dispêndios governamentais - em termos reais - da administração Reagan, comparando-os à gestão Carter (tabela 3.2), verificamos primeiramente que em duas contas do orçamento as elevações são bastante notáveis. Em ‘Defesa Nacional’, principal gasto do governo em termos percentuais (23% do total no governo Carter), o aumento real no dispêndio foi de 36,8% no primeiro mandato, acumulando outros 23,7% no segundo governo129, o que totaliza 70% a mais que seu antecessor. No item, ‘Juros Líquidos’, que

128

‘Statement by Mr. Richard D. Erb on The United States 1981 Article IV Consultations Executive Board Meeting

81/109’. 31 Jul. 1981. Jordan, Jerry: Files. DSC00060. Ver também: Pontos para discussão do presidente na

reunião do G-7 em 1981: “By 1984, Federal budget outlays, as percent of GNP, are expected to decline by 3

percent points”. ‘Macroeconomics – Talking Points’, ‘The Economic Recovery Program’, CCEA 48: Ottawa Economic Summit: Macroeconomic Policy, 23 Jun. 1981. DSC00668. Ver palestra de Murray L. Weidenbaum,

chefe do Conselho de Assessores Econômicos do Presidente em Washington: “During the Vietnam War the

Federal budget deficit swelled from 0.2 percent of GNP in FY 1965 to 3.0 percent in FY 1968. The current buildup, on the other hand, is occurring while budget is being brought into balance.” ‘POLICY MAKING AND THE ECONOMY’. COLLOQUIUM ON ALTERNATIVE FOR ECONOMIC POLICY. A Public Policy Forum Conducted by The Conference Board, 10 Jun. 1981. Executive Secretariat, NSC: Trip File. DSC01151.

129

Neste item, o gasto com ‘desenvolvimento de armas nucleares’ eleva-se em 60% no primeiro mandato Reagan e mais 38% no segundo. Se comparado este último com a gestão Carter, temos um aumento real de 121% neste dispêndio.

corresponde ao pagamento dos juros da dívida pública, o aumento registrado na primeira gestão foi de nada menos que 75,25% e de mais 37,69% no segundo mandato. Neste ponto, temos em consideração o fato da política monetária ter sido determinada pelo Federal Reserve, o que nos leva ao entendimento de que grande parte dessas elevações tenham sido reflexo da forte alta de juros desencadeada durante a gestão Paul Volcker.

São também dignos de nota para o primeiro mandato os aumentos de 28,07% e 27,29% nos gastos com ‘Seguro para Garantia de Renda’ e com a ‘Previdência Social’, respectivamente. O primeiro correspondendo a 14% do orçamento, enquanto o segundo a algo em torno de 20%. A dinâmica desses dois itens, porém, não está diretamente vinculada a determinações dos gestores do orçamento, mas a direitos gozados no momento em que seus detentores os requisitam. Assim, a evolução nos montantes referentes ao ‘Seguro para Garantia de Renda’ respondeu em grande medida aos movimentos de queda no nível de emprego (Gráfico 3.2, acima) enquanto o crescimento no gasto previdenciário estaria mais vinculado ao aumento no número de pensionistas dado o envelhecimento da própria população (Gáfico 3.2). O gasto ‘Medicare’130 que também entendemos estar em grande medida vinculado à questão da idade dos cidadãos norte-americanos, cresceu, da mesma maneira, substancialmente (o dispêndio aumentou 100% desde Carter até o final do segundo governo Reagan), passando, dessa forma, de 5% de participação para aproximadamente 7% no total do orçamento federal. No caso do ‘Seguro para Garantia de Renda’, em específico, há no segundo mandato uma redução de 0,42% já que a taxa de desemprego começa a decrescer a partir de 1983131, o que não ocorre com o gasto previdenciário que sobe por volta de 11% no segundo governo.

130

Seguro saúde para pessoas maiores de 65 anos e portadores de necessidades especiais, instituído durante a política da Grande Sociedade do presidente Lindon Johnson. Os custos são compartilhados entre Estado e cidadãos. O valor aqui em questão se refere à contribuição do governo.

131

A conta de ‘Seguro para Garantia de Renda’ (Income Security) abrange outros tipos de pensionistas fora da previdência social, incapacitados para o trabalho, previdência de funcionários do Estado, salário desemprego, assistência para moradia, garantia de nutrição e outros seguros.

Tabela 3.2

Outros gastos também tiveram elevações reais nos dois mandatos como em ‘Ciência, Espaço e Tecnologia Geral’ (14,4% no primeiro mandato e 10,4% no segundo); ‘Agricultura’ (32% e 39%)132; ‘Saúde’ (13% e 35%) e ‘Transportes’ (2,8% e 7,3%, respectivamente). A despesa referente à ‘Administração do Judiciário’ recebeu corte de 0,66% na primeira gestão, compensada por uma elevação de 27,8% no segundo governo. A elevação em todos estes outros gastos menores não foi de grande relevância se comparadas com os dois maiores aumentos (Defesa e Juros

132

Elevação considerável, dada a força dos lobbies no setor agrícola norte-americano. De acordo com o New York Times de 10 de Abril de 1981: “On the one hand, despite Mr. Stockman's efforts, some of the most

venerable and expensive farm programs remain intact. Old subsidies do not fade away easily, and the Reagan budget makes clear that some of the farm lobbies are still defending their territory more effectively than the urban poor.” Reagan's agriculture policy emerges as lobbies and budget cutters clash. THE NEW YORK TIMES.

Nova Iorque. 10 de Abril de 1981. U.S. Disponível em: http://www.nytimes.com/1981/04/10/us/reagan-s- agriculture-policy-emerges-lobbies-budget-cutters-clash-budget-targets.html. Consultado em 30/11/2016. Contas Gastos Adm. Carter (1977- 1980) Particip. Desp. Total Carter Gastos Adm. Reagan 1 (1981-1984) Particip. Desp. Total Reagan 1 Diferença Carter vs. Reagan 1 ¹ Gastos Adm. Reagan 2 (1985-1988) Particip. Desp. Total Reagan 2 Diferença Reagan 1 vs. Reagan 2 ² Diferença Carter vs. Reagan 2 ³ Particip. Desp. Era Reagan Realocação de Recursos Era Reagan Defesa Nacional 452.073,00 23,03% 780.136,00 25,29% 36,86% 1.098.472,00 27,43% 23,71% 69,30% 26,50% 3,47% Relações Exteriores 34.008,00 1,73% 53.121,00 1,72% 23,88% 52.426,00 1,31% -13,29% 7,41% 1,49% -0,24%

Ciência, Espaço e Tecnologia Geral 20.727,00 1,06% 29.912,00 0,97% 14,45% 37.604,00 0,94% 10,45% 26,41% 0,95% -0,10%

Energia 33.096,00 1,69% 45.119,00 1,46% 8,12% 16.666,00 0,42% -67,55% -64,91% 0,87% -0,81%

Recursos Naturais e Meio Ambiente 47.008,00 2,39% 51.824,00 1,68% -12,57% 54.929,00 1,37% -6,88% -18,58% 1,51% -0,89%

Agricultura 37.985,00 1,94% 63.391,00 2,06% 32,35% 100.300,00 2,50% 39,01% 83,98% 2,31% 0,37%

Comércio e Crédito Habitacional 23.423,00 1,19% 28.102,00 0,91% -4,85% 34.992,00 0,87% 9,40% 4,09% 0,89% -0,30%

Transportes 69.758,00 3,55% 89.007,00 2,89% 1,19% 107.445,00 2,68% 6,06% 7,32% 2,77% -0,78% Desenvolvimento Regional e de

Comunidades 40.594,00 2,07% 34.152,00 1,11% -33,28% 25.251,00 0,63% -35,04% -56,66% 0,84% -1,23% Educação, Treinamento, Emprego e

Serviços Sociais 109.863,00 5,60% 112.865,00 3,66% -18,52% 118.208,00 2,95% -7,98% -25,03% 3,26% -2,34%

Saúde 79.489,00 4,05% 113.369,00 3,68% 13,11% 153.921,00 3,84% 19,28% 34,92% 3,77% -0,28%

Medicare 100.698,00 5,13% 195.844,00 6,35% 54,24% 289.984,00 7,24% 30,09% 100,65% 6,85% 1,72%

Seguro para garantia de renda 275.516,00 14,04% 444.908,00 14,43% 28,07% 504.284,00 12,59% -0,42% 27,53% 13,39% -0,65%

Previdência Social 401.542,00 20,46% 644.495,00 20,90% 27,29% 814.072,00 20,33% 10,97% 41,26% 20,57% 0,12% Benefícios e Serviços para Veteranos

de Guerra 78.066,00 3,98% 97.310,00 3,16% -1,14% 108.661,00 2,71% -1,89% -3,02% 2,91% -1,07%

Administração do Judiciário 16.612,00 0,85% 20.807,00 0,67% -0,66% 30.273,00 0,76% 27,83% 26,98% 0,72% -0,13%

Administração Pública 49.968,00 2,55% 45.161,00 1,46% -28,32% 40.892,00 1,02% -20,45% -42,98% 1,21% -1,33%

Juros Líquidos 160.525,00 8,18% 354.708,00 11,50% 75,25% 555.909,00 13,88% 37,69% 141,30% 12,84% 4,67% Recebimentos de compensação não

distribuídos (68.017,00) -3,47% (120.073,00) -3,89% 40,01% (139.127,00) -3,47% 1,80% 42,52% -3,66% -0,19%

Totais 1.962.934,00 3.084.158,00 24,61% 4.005.162,00 14,09% 42,17% Notas:

1 - Considerada a inflação acumulada entre 1981 e 1984: 26,09%. 2 - Considerada a inflação acumulada entre 1985 e 1988: 13,82% 3 - Considerada a inflação acumulada entre 1981 e 1988: 43,52%

Fonte: Office of Management and Budget, White House, Table 3.2 Outlays by Function and Subfunction 1962-2021 . Disponível em: https://www.whitehouse.gov/omb/budget/Historicals. Acessado em 25/11/2016. Elaboração própria.

Orçamento Federal dos Estados Unidos - 1977-1988

Líquidos), pois mesmo que tenham crescido em valores reais, perderam no conjunto aproximadamente 1,3% de sua participação no total geral do orçamento, com exceção de ‘Agricultura’ que teve um leve aumento de 0,37% na divisão geral do bolo133.

Gráfico 3.2

Em verdade, o que realmente foi enxugado no governo Reagan recaiu sobre cinco grandes contas. Entre elas, a de ‘Recursos Naturais e Meio Ambiente’ (subtração de 12,5%) – sendo ‘Controle e Redução da Poluição’ a subconta com maior redução (28%). Sobre o item, ‘Comércio e Crédito Habitacional’, houve uma redução de 4,8% no primeiro mandato, compensada por um aumento de 9,4% no segundo. Contudo, o que determinou essa mudança foi uma redução nos depósitos compulsórios que entravam como crédito nesta conta até 1985, quando se torna também um gasto134. Outra redução ocorreu na conta, ‘Desenvolvimento Regional e de Comunidades’: redução de 56,6% nos recursos, somando os dois governos. A

133 Somando todas contas que perderam participação no orçamento, chegamos ao valor de 10,35% a menos em relação ao total geral.

134

Consideramos que deve existir uma relação direta entre a lei para desregulação do setor financeiro hipotecário privado, conforme a UNITED STATES PUBLIC LAW 97-34—AUG. 13, 1981, e a diminuição por parte do governo na ajuda financeira pública para moradia e na exigência de garantias para estas.

conta ‘Educação, Treinamento, Emprego e Serviços Sociais’ também teve cortes totalizados para os dois mandatos de 25% nos recursos, reduzindo sua participação de 5,6% para 2,95% do gasto total (a subconta ‘Educação Superior’ teve, todavia, um incremento de 20%, enquanto ‘Treinamento e Recolocação Profissional’ perdeu 63% do apoio financeiro). Outras reduções no período Reagan ocorreram na conta de ‘Benefícios e Serviços para Veteranos de Guerra’ que perdeu 3% dos repasses e a na conta de ‘Administração Pública’, onde são contabilizados a folha de pagamentos de funcionários públicos e ativos imobilizados da máquina do Estado, reduziu-se 43% das verbas. No que se refere à conta ‘Relações Exteriores’, que contempla ajuda humanitária, assistência em segurança internacional, diplomacia e programas financeiros internacionais, houve uma elevação geral de 7%, tendo, porém, sua participação diminuída de 1,7% para 1,5% do orçamento.

Assim, mesmo tendo em consideração tais reduções, o que se verifica é uma grande elevação real no gasto público total. Nossa primeira observação, contudo, é a de que houve uma diminuição na participação percentual da maioria das contas em relação ao total geral gasto pelo governo (juntas, todas as reduções somam 10,35% a menos de participação no orçamento federal). O governo privilegiou, por seu turno, consideráveis elevações no gasto com pagamento de juros da dívida pública, que aumenta sua fatia em 4,67%, e na despesa militar que, mesmo sendo o item mais dispendioso desde a Segunda Guerra, teve um aumento de 3,47% de participação. ‘Medicare’ aumentou sua parte em 1,72%, ‘Previdência Social’ 0,12% e ‘Agricultura’ 0,37%. Como já salientamos ‘Medicare’ e ‘Previdência Social’ constituem gastos autônomos para o atendimento de direitos sociais que dificilmente têm sua dinâmica alterada somente com a caneta do Poder Executivo. A conta ‘Agricultura’ teve sua dinâmica vinculada a seu respectivo lobby, que naquela gestão foi capaz de barganhar incrementos junto ao governo Reagan. A conclusão que nos resta é a de que a administração Reagan, nos gastos em que podia intervir diretamente, cortou créditos públicos, serviços e benefícios oferecidos pelo Estado em favor de um dispêndio militar sem precedentes em tempos de paz, ao mesmo tempo em que dava aval para o pagamento de elevados juros determinados por uma política monetária que apoiava. A reafirmação do poder americano se vislumbra, dessa maneira, nas duas faces de uma mesma moeda: de um lado, o movimento de reafirmação financeira do dólar pela elevação da taxa de juros; de outro, um

excepcional aumento do poder de coerção por meio de uma projeção militar agigantada. O enxugamento da liquidez internacional para dentro dos Estados Unidos foi, dessa forma, instrumento indispensável para a manutenção da divisa como meio de reserva internacional, permitindo a sistemática de cobertura de um déficit fiscal ampliado que, em grande medida, facilitou a renovação do poder militar norte-americano135.

No discurso oficial, a parcimônia com os gastos federais era o critério que se dizia que aquele governo adotaria. O que ocorria de fato, como vimos acima, inquietava assessores, instituições internacionais como o FMI e outros países do centro que manifestaram em diversos momentos grande preocupação com relação aos patamares inéditos do gasto americano e suas possíveis consequências136 (Gráfico 3.3). A condução da política fiscal dos EUA também não estava rigorosamente atrelada aos alardeados preceitos do Supply Side Economics, nem à ideologia de funcionamento do mercado propalada pelo arcabouço neoliberal. O governo Reagan, apesar da renúncia a receitas e da desregulação financeira, ofereceu crédito, incentivos fiscais e adotou uma política de demanda efetiva junto ao complexo industrial-militar que não estavam naquelas agendas conceituais. Fica claro, dessa maneira, que, apesar da retórica, o controle do temido problema inflacionário estava totalmente a cargo do Fed. Assim, de acordo com Murray L. Weidenbaum, chefe do Conselho de Assessores Econômicos da Presidência (CEA - Council of Economic Advisors):

Turning finally to monetary policy, it should be recognized that monetary restraint is a sine qua non of sustained non-inflationary growth. […] At the Vietnam War the growth rate of M-1 was several percentage points greater than the rate of inflation. We expect and will continue to encourage the Federal Reserve to maintain a more responsible stance. From all indication, the Fed is doing just that. 137

Há também o seguinte comentário emitido pelo CEA:

135

Conforme Krippner (op. cit.: 94-97), ninguém na administração Reagan ou mesmo Volcker previram a magnitude do volume de capitais que acabou sendo direcionada para os Estados Unidos depois da grande alta de juros.

136

A média do déficit fiscal no período Reagan foi de 219 bilhões de dólares ao ano, enquanto seu antecessor