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Reflexão da articulação de cuidados entre a CPCJ e o NACJR do Lumiar

No documento anexos e apendices (páginas 120-127)

Uma das actividades com grande relevância no meu percurso na Unidade de Cuidados Personalizados do Lumiar, foi a participação numa reunião conjunta entre elementos da CPCJ e elementos do núcleo. A reunião decorreu na Comissão de Protecção de Jovens (CPCJ) Lisboa Norte. Nas reuniões são debatidos casos conjuntos e articuladas intervenções, e ocorrem mensalmente. As famílias que aqui são discutidas encontram-se num segundo nível de intervenção com aplicação de acordos de promoção e protecção de medidas em meio natural de vida (conforme descritos no artigo 56º da Lei n.º147/99). Estes acordos são revistos com uma periodicidade variável (6 meses a 12 meses) e revalidados até 18 meses, altura em que a situação é arquivada por remoção do perigo e reencaminhada para o nível primário (continuar a ser vigiada na comunidade), ou para tribunal. As famílias continuam a frequentar os recursos da comunidade, e a serem alvo de uma intervenção de enfermagem.

A questão mais importante e que me interessava observar eram as estratégias utilizadas pelos enfermeiros, de modo a apoiar as pessoas e famílias a atingir o bem-estar durante estes períodos de transição e os ganhos em saúde no final da transição. Das situações apresentadas aponto uma como especialmente relevante: Mãe Seropositiva para VIH, não cumpridora de tratamento por recusa em aceitar a doença; o pai das crianças não sabe da existência da doença na mãe porque esta nunca o informou. Dos dois filhos menores, de 13 meses e 3 anos respectivamente, apenas um vive com os pais. O filho mais velho foi retirado pelo tribunal por incumprimento. Estes pais não efectuavam consultas de Saúde Infantil com regularidade às crianças, recorrendo aos serviços de urgência em caso doença aguda. Tinham de ser frequentemente convocados para cumprir esquema vacinal da criança. Tinham efectuado a assinatura de acordo há cerca de 6 meses para cumprimento de várias medidas

• Assegurar vigilâncias às crianças, de acordo com o seu calendário e desenvolvimento psicomotor

• Cumprir esquema vacinal da criança de acordo com o plano nacional de vacinação Obrigatório

• A mãe comprometia-se a submeter-se a tratamento médico

• Promover um ambiente psico-sócio-afectivo essencial ao desenvolvimento integral da criança

• Assegurar os cuidados de alimentação, higiene, saúde e conforto das crianças.

Em reunião os profissionais da CPCJ referiam que o novo acordo já deveria ter sido assinado (terminou o prazo de 6 meses) e que a mãe não tinha comparecido mesmo após vários contactos telefónicos, mencionando que se a situação continuar teria de ser enviada para tribunal. A equipa da UCSP do Lumiar, por seu lado, referia que tinha conseguido, neste período, um bom contacto com a família. Numa relação de proximidade estabelecida com a família, a enfermeira especialista em SIP tinha conseguido que a mãe efectuasse regularmente as consultas de Saúde Infantil ao filho, e que ela própria se tinha proposto para marcar uma consulta de Infecto no Hospital de Santa Maria, o que era um grande passo na aceitação da doença. Pediam, por isso, à CPCJ que não enviassem o processo para o tribunal de modo a não ser quebrada a relação de confiança e proximidade estabelecida com a mãe. Ficou decidido que a EE em SIP falaria com a mãe no sentido de a conseguir convencer da necessidade de assinar o segundo acordo. O que foi conseguido após convocação da mãe pela EE em ESIP.

No debate deste caso com a enfermeira orientadora pude verificar que havia uma necessidade de trabalhar o potencial da mãe de modo a desenvolver a ocorrência de uma transição desenvolvimentista, havia uma insuficiência de papel demonstrada pela “disparidade no cumprimento das obrigações de papel ou expectativas do próprio” (Meleis et al 2010 p.1). A actuação da enfermeira especialista junto desta família foi no sentido de trabalhar essa insuficiência. O tipo de transição que estava a ser trabalhada dizia respeito à “transição desenvolvimentista da família como a relação mãe/criança, parentalidade e cuidado da família à criança” (Meleis, Trangenstein, 1994). As estratégias utilizadas pela Enfermeira especialista de SIP foram várias tendo modificado o longo do processo de acompanhamento da família. Cada transição é “ caracterizada pela sua singularidade, complexidade e múltiplas dimensões” Meleis Et all 2000, p. 27).

Após questionamento da enfermeira especialista de SIP pude identificar as seguintes problemas e actuações terapêuticas de enfermagem:

Problemas analisados á luz da teoria de Meleis

Propriedades Universais

Condições de transição

Tipos de transição Terapêutica de enfermagem Indicadores de transições saudáveis Mudanças no papel Mudanças na dinâmica familiar Conhecimentos Sentimentos e expectativas Bem-estar físico Desenvolvimentista Saúde/doença Promotora Preventiva Interventiva Subjectivos Bem-estar Bem-estar nas relações

Modelo de enfermagem de transições adaptado de Meleis et al 2010, p. 47)

Actuações de enfermagem identificadas

Propriedades Universais Condições de transição Tipos de transição Terapêutica de

enfermagem Indicadores de transições saudáveis Insuficiência de papel verificada na

mãe – necessidade de intervenção de enfermagem – suplementação de papel (parentalidade)

Insuficiência na procura de cuidados de saúde

Sentimentos e expectativas - A

enfermeira verificou que a mãe não queria voltar à CPCJ porque já lhe tinha sido retirada uma criança e temia que fosse esse o caminho. (O ambiente medeia a transição na medida que ele pode providenciar suporte ou induzir stress)

Saúde/doença - Em conversas com

a mãe, efectuadas na consulta de saúde infantil, foram conhecidas as razões da não adesão às consultas no Hospital de Santa Maria e debatidos com ela os riscos que corria do não cumprimento da terapêutica. (mãe mantinha recusa na aceitação da sua doença numa atitude de “ilusiva Normalidade”)

Desenvolvimental - Debatida a

Promotora – Promover a

compreensão do seu papel de mãe em relação as

necessidades e sentimentos do filho.

Cuidados antecipatórios trabalhados em todas as consultas de saúde infantil consoante necessidades encontradas.

Preventiva – Agendamento

Objectivos: Bem-estar

Mãe assume necessidade de frequentar consulta, Mãe cumpre com consultas de SI do filho e da creche informam que criança está bem e a ir regularmente.

Desenvolvimento

Insuficiência na manutenção da

saúde da mãe (recusa de tratamento) A mãe referia que não queria que o pai soubesse da sua condição de saúde com receio que ele a deixasse (medo dos estereótipos, medo da marginalização)

necessidade de cumprimento das

consultas do filho. de novos contactos com a família de modo a manter uma relação de proximidade e vigilância do cumprimento de medidas instituídas Interventiva - Contactos telefónicos para convocação nas primeiras

consultas.

Contactos com instituições – CPCJ, creche da criança (activar recursos da comunidade facilitadores do processo de transição)

adequado á idade

Bem-estar nas relações

- pai começa a

comparecer nas consultas conjuntamente com a mãe, no entanto continua a não estar informado da doença da mãe. (reconhece necessidade de mudança mas não houve transição completa neste aspecto, mantinha muitos medos)

Segundo Meleis et al 2000, na avaliação de uma teoria não se deve considerar apenas a sua validação, mas também seus componentes. É importante entender e considerar a experiência individual vivenciada por pessoas que receberam cuidados de enfermagem baseados em determinada teoria, bem como por aquelas que prestaram esses cuidados, ou seja, os profissionais de enfermagem. Por isso, depoimentos, exemplos e histórias também podem ser utilizados para validar e fundamentar uma teoria.

As famílias em contextos de risco encontram desafios particularmente complexos pelos reduzidos recursos de que dispõem para o desempenho da sua função parental. Nos contextos de risco inserem-se as situações de pobreza1, violência doméstica, maus-tratos ou negligência de crianças, abuso de substâncias, entre outros.

As estratégias utilizadas pela Enfermeira Especialista de SIP foram promotoras de uma adequação de papel, a mãe reconheceu as necessidades do filho, proporcionando-lhe os cuidados adequados ao seu desenvolvimento. Estas questões foram trabalhadas em Consultas de Saúde infantil onde a enfermeira especialista de SIP trabalha as competências parentais e antecipa as necessidades futuras. A comunicação e a interacção estabelecida entre a enfermeira e a mãe durante este processo foram de primordial importância para esta transição.

Pude constatar que no processo de seguimento destas famílias de risco é necessário accionar um conjunto de estratégias aos mais variados níveis: junto da família/jovem/criança; família alargada (avós, primos, entre outros), outras entidades e parceiros (Outros Centros de Saúde, CPCJ, Hospital, Jardim Infantil). Só com uma actuação articulada é possível promover a continuidade de cuidados a estas famílias. Este seguimento e articulação são dinâmicos alterando-se consoante as necessidades actuais da família. Devem ser trabalhadas as suas capacidades e não as suas limitações.

“Intervention is more effective if the staff can restrain their expertise, using their

skills to encourage family members to see each other as a resource and to mobilize help from within their own network. That may involve a new role for workers, requiring a less central position than is customary, and a less active effort to solve the families’ problems for them”(Minuchin, Minuchin & Colapinto, 1998, p. 65)

1

Definida como “ a situação de escassez de recursos, de que um indivíduo, ou família dispõem, para satisfazer necessidades consideradas mínimas” (Rodrigues, Samagaio, Ferreira, Mendes & Januário)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 Meleis; A.F. et all, (2000) Experiencing transitions: an emerging middle-range Theory,

Adv. Nurs. Sci. ; 23(1): 12-28

 MINUCHIN, S., MINUCHIN, P. & COLAPINTO, J. (1998). Working with the

APENDICE X

No documento anexos e apendices (páginas 120-127)