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Capítulo I. Educação de Adultos – História e fundamentos

6. Reflexão Final

As opções políticas nacionais e internacionais, relativamente ao campo da educação e formação de adultos, têm vindo a sofrer muitas alterações e a evoluir em diversos sentidos ao longo dos tempos. Ainda que as lógicas subjacentes às intervenções neste domínio sejam frequentemente de humanização e de emancipação das populações pouco escolarizadas, a verdade é que as práticas e os discursos que se lhes associam têm evoluído sempre numa perspectiva de desenvolvimento económico. No seguimento da IV Conferência da UNESCO (1985), “[o] enfoque deixou de ser colocado na alfabetização nos países em vias de desenvolvimento e passou a ser o cumprimento da escolaridade obrigatória nos países desenvolvidos” (Cavaco, 2008, p. 112). Esta realidade não é diferente em Portugal, onde a lógica dominante é actualmente a de controlo social, centrada em dispositivos de escolarização compensatória (Cavaco, 2008, p. 111). Parece existir uma pressão no sentido de “assegurar maiores taxas de conclusão

da escolaridade obrigatória” de forma a equilibrar a nossa posição por comparação aos outros países da Comunidade Europeia (Cavaco, 2008, p. 125). Consequentemente, verifica-se uma sobrevalorização dos diplomas e dos certificados, em detrimento da valorização das pessoas e da sua experiência de vida. Como refere Cármen Cavaco (2008), a formação passa a existir como medida de intervenção junto dos adultos desempregados, com uma finalidade de prevenção e de reparação, para evitar possíveis problemas que poderiam advir das condições sociais desta população. Perdido o controlo sobre o desenvolvimento industrial, e estando agora as políticas ao serviço do desenvolvimento económico, a formação surge como uma tentativa de “minimizar os efeitos negativos do modelo de desenvolvimento” (Cavaco, 2008, p. 545).

“Os formandos são seleccionados de acordo com as directivas políticas e com os programas/medidas de financiamento disponíveis no momento”. A selecção dos formandos baseia- se na sua situação face ao emprego e à inserção social e não são tidos em conta os seus interesses e motivações” (Cavaco, 2008, p. 545).

Numa perspectiva pragmatista, o adulto é visto como responsável pelo seu próprio percurso e pelas suas próprias aprendizagens de forma a garantir o seu “lugar” no mercado de trabalho (Cavaco, 2008, p.124). Os cursos EFA e o RVCC baseiam-se em pressupostos metodológicos de valorização do indivíduo e da sua experiência de vida; no entanto, essa realidade passa a depender apenas das equipas e da sua forma de lidar com o paradoxo que se vive a este nível. No que diz respeito à gestão, administrativamente, os percursos são padronizados e a selecção dos formandos baseia-se em critérios artificiais, como forma de resposta ao problema social de desemprego. Estas formas de actuação levam a que os indivíduos passem a ser vistos como incapazes de se gerirem autonomamente, levando à emergência de novas dependências, e reduzindo as possibilidades de se aprofundarem os conhecimentos necessários a uma intervenção verdadeiramente adequada às suas especificidades. Por outro lado, existe a questão do acesso à formação, pois “[n]o caso dos adultos pouco ou nada escolarizados, oferta de educação e formação por si só não gera procura” (Cavaco, 2008, p. 547). Os adultos pouco ou nada escolarizados constituem os “não públicos” das aprendizagens em contextos formais ” (Melo, 2004a, p. 13, cit. in Cavaco, 2008, p.19).

Para já, “[o]s novos dispositivos baseados no reconhecimento, validação e certificação de competências apresentaram-se como uma tentativa notória de implementar uma ruptura com o modelo escolar nas políticas e práticas de educação de adultos” (Cavaco, 2008, p. 33). Estas são “inovadoras e muito pertinentes porque estão fundamentadas na revalorização epistemológica da experiência dos adultos” (Cavaco, 2008, p. 33). As novas práticas podem contribuir para colmatar algumas falhas, nomeadamente no que diz respeito ao aprofundamento do conhecimento dos adultos pouco escolarizados, “assim como para mobilizar esta população para processos de aprendizagem formais” (Cavaco, 2008, p. 22). Com vista a responder definitivamente às dificuldades de uma intervenção real e efectiva com este público, é “fundamental a “reinvenção” de novas políticas e dinâmicas educativas e formativas” (Cavaco, 2008, p.19).

Capitulo II

Narrativa biográfica do percurso profissional

Aulas, sessões, revisão bibliográfica são etapas fundamentais na abordagem a uma qualquer problemática. No entanto, tal como o refere Cármen Cavaco (2008),

“as situações educativas e formativas não podem unicamente ser percepcionadas e analisadas através das intenções que têm subjacentes, mas, nomeadamente através dos efeitos que provocam nos indivíduos. Reconhece-se que os indivíduos são sujeitos construtores da sua experiência e, neste caso, assumem um papel preponderante no processo formativo” (p. 29).

Posto, isto, impõe-se um momento de auto-análise e reflexão, neste caso concreto centrada no meu percurso profissional e por vezes também pessoal, pois só assim será possível compreender a ligação entre o teórico, o vivido, o integrado e o criado, naquela que será a visão apresentada neste estudo. Mais do que um processo de enquadramento, será essencialmente um momento para reflectir sobre o meu papel como profissional.

1. Muitas experiências, muitas riquezas…

Em conversa casual com os meus tios, foi muito interessante descobrir que a minha tia, com o contributo da minha avó, tinha, nos tempos de Angola Colonial, ajudado adultos das mais variadas idades a aprender a ler e a escrever de acordo com as ideias de Paulo Freire. Talvez tenha sido mais um pequeno contributo num contexto de humanização da formação de adultos. A intenção foi certamente essa. Pensar que a minha bisavó, que nasceu e cresceu em Angola, não só sabia ler e escrever, como adorava fazê-lo. Antes de falecer, com 98 anos, comunicou a toda a família que pretendia escrever a história da sua vida para nos deixar como legado. Infelizmente, a doença não lhe permitiu avançar com o seu propósito. Facto é que, quando chegou a uma fase tão avançada da sua vida, quis deixar-nos o que de mais precioso tinha, as suas experiências de vida. Infelizmente, não herdei o gosto que a minha bisavó tinha

pela escrita e tenho a certeza de que se este processo acontecesse sob a forma de uma amena e interessante conversa, certamente que seria muito mais fácil para mim.

2. “Adultos não dizem asneiras, adultos têm pontos de vista…”

Não consigo deixar de pensar no significado da palavra adulto. Não no seu significado semântico, naturalmente, pois nesta altura da minha vida seria espectável que o soubesse, mas sim, no que significa para mim ser adulta. É curioso e até divertido pensar que depois de anos a pensar “eu um dia vou ser adulta”, hoje, com 31 anos, ainda mantenho essa sensação, “um dia vou ser adulta…”. Porquê? Talvez porque na realidade não passe tudo de um ponto de vista.

Hoje sabe-se que tudo o que somos na actualidade, seja como filhos, companheiros, amigos, pais, profissionais ou cidadãos, se deve à conjugação de tantos factores que é impossível discriminá-los a todos. Ainda assim, penso que cada um de nós sabe, assumidamente ou não, aqueles que foram os momentos de viragem nas suas vidas. Talvez o que nos falte seja o hábito de reflectir sobre isso.

Vejamos o meu caso: sou licenciada em psicologia, trabalhei como formadora e hoje sou Profissional de RVC, aparentemente uma profissão relativamente recente e que parece ser um intermédio entre as duas realidades anteriores. No entanto, o que eu queria ser “quando fosse grande” era bióloga. Como é que isto aconteceu?

Para responder a esta questão, poderia começar com um “Era uma vez uma menina que vivia no Rwanda, pequeno país no “coração” de África. Adorava animais, a natureza e as aulas de biologia. Como tal, a profissão que gostaria um dia de assumir parecia-lhe obvia. Queria ser como a Sigourney Weaver em “Gorilas na Bruma”, algures estudando os hábitos de um animal qualquer”. Não é fácil identificar os momentos exactos em que as mudanças ocorrem e as decisões se alteram, sabemos que se aprende com o meio, com as coisas num processo de ecoformação (Pineau, 1991 cit in Canário, 2008, p. 116). Influenciada pela natureza que me rodeava e os animais que faziam, de forma muito especial, parte da minha vida, ser bióloga era o meu destino. Acontece que, na escola, sendo uma criança reservada e tímida, sempre fui mais ouvinte do que falante. Esta característica era atractiva para colegas que necessitassem

de desabafar algumas das suas “angústias” de criança. Acabava sempre por dar os meus conselhos e, daí, comecei a ouvir com relativa frequência expressões como: “pareces minha psicóloga…”, “tens jeito para ser psicóloga…”, “deverias tirar psicologia…”. Este terá sido um dos primeiros factores de relevo a influenciar aquele que foi o meu percurso em direcção a uma profissão. Mudei de ideias e decidi então que seria psicóloga, não estudaria o tipo de animal pensado inicialmente, mas iria estudar outro bem mais complexo – o Homem. Mal sabia eu o quanto esses meus amigos tinham participado numa escolha tão importante da minha vida. Uma escolha que viria a determinar todo o meu percurso até aos dias de hoje. Deixei o Rwanda com nove anos de idade, mas trouxe comigo a influência dos meus colegas, que deram assim um contributo simples mas fundamental num processo de heteroformação. Mas, não foi só isso que trouxe comigo. O contacto com a população nativa, a natureza e os colegas de escola das mais variadas nacionalidades, constituíram também um importante pilar da minha formação. E, tal como Gaston Pineau o disse na sua teoria tripolar da formação, a minha narrativa inicia-se com um eu aprendendo através da relação com os outros e em interacção com as coisas da minha vida (Pineau, 1991 cit in Canário, 2008, p. 116).

Com, desde cedo, um objectivo bem definido e sem dúvidas relativamente à minha escolha, segui o percurso necessário para que em Janeiro de 2004 terminasse a minha licenciatura em Psicologia Clínica. A frequência do ensino superior para um aluno que não seja trabalhador-estudante (e que nunca tenha trabalhado efectivamente), permite experimentar uma realidade intermédia entre ser-se adulto e/ou adolescente, na medida em que ainda não se assume o mesmo nível de responsabilidades exigido a um adulto, mas fazem-se as primeiras experiências nesse sentido. Por outro lado, muda o sistema de ensino, a forma de aprender e os papéis do professor e do aluno. As diferenças não se fazem sentir apenas do ensino secundário para o ensino universitário, mas mesmo dos primeiros anos de licenciatura para os últimos. O que muda? Parece-me que um dos principais factores é a forma como o professor olha para o aluno. Um exemplo prático disso é o facto de ao longo dos primeiros anos de curso nunca ter tido acesso ao contacto telefónico de nenhum professor, enquanto no meu último ano de licenciatura quase todos os professores deram aos alunos no mínimo o endereço de correio electrónico e, frequentemente, o contacto de telemóvel. Tendo que considerar circunstâncias particulares como a necessidade de um acompanhamento

mais próximo dos trabalhos e o facto dos alunos serem em número mais reduzido, não deixa de ser importante o impacto que esse factor tem na relação professor-aluno e principalmente na forma como este último vai olhar para si mesmo.

À medida que vamos progredindo na escolaridade, também a nossa idade vai aumentando e a verdade é que, se no final de uma licenciatura continuássemos a ser tratados como adolescentes, então não faria sentido que no ano seguinte fosse esperado que iniciássemos uma actividade profissional, assumindo funções de adultos. Parece- me evidente que a forma como somos tratados influencia o modo como olhamos para nós mesmos e nos posicionamos perante os contextos. Sinto que os últimos anos de licenciatura foram, nesse sentido, um factor preponderante. Percebi que entrava numa fase diferente da vida, grande parte devido ao espelho que os “outros” representam para nós. Mais do que como uma estudante, começavam a tratar-me como uma profissional, o que me empurrou a assumir esse papel. Se, por um lado, a minha experiência foi positiva e promotora de um sentimento de responsabilidade maior, por outro, consigo hoje compreender que o mesmo pode acontecer no sentido inverso. Como foi o exemplo do ensino recorrente que, adoptando um modelo escolar, no qual os adultos veêm desvalorizados os seus saberes e as suas experiências adquiridas até ao momento, acabou por ter pouco sucesso no que diz respeito à adesão (Lima, 2008). Os adultos, a quem esta oferta “supostamente” se dirigia, acabaram por assumir uma atitude de distanciamento e de rejeição face à oferta, pois não se identificavam com o papel que lhes era atribuído. Tal como referido por Carmen Cavaco (2008),

“é frequente recorrer-se a um discurso pré-concebido [que] assenta na ideia de que os adultos pouco escolarizados são portadores de um défice de saberes e competências, que só pode ser ultrapassado através da frequência de modalidades de educação e formação baseadas no modelo escolar. (…) Como se pode depreender, tal discurso tem provocado uma estigmatização dos indivíduos pouco escolarizados com consequências de carácter social e outras de carácter individual, relativas à própria imagem que estes adultos têm de si” (p32).

Hoje, essa é uma das principais premissas que transporto para a minha prática profissional. Tendo consciência da dificuldade que isso implica, tento olhar para as pessoas com as quais trabalho pelo que elas são e não através de uma imagem pré- concebida, seja esta relação pessoal ou profissional. Infelizmente, distanciarmo-nos dos discursos dominantes e da padronização a que o ser humano muito recorre, não é fácil.

Tenho consciência do quanto é pouco provável conseguir manter-me totalmente isenta dessas avaliações.

Foi nesta fase do meu percurso académico que comecei a questionar com mais veemência o papel do professor. Até porque a diversidade de práticas era muito grande. Recordo-me de um professor que tinha um comportamento muito atípico para um docente. Ao contrário de uma grande parte dos professores que tive nos primeiros anos de curso, lembro-me perfeitamente do seu nome, embora não faça sentido referi- lo aqui. Facto é que este professor, que se apresentava claramente embriagado nas aulas e com um discurso pouco formal, via as suas aulas teóricas lotadas, ao contrário de outros professores de renome, cujas aulas estavam sempre desertas. Por oposição à figura do passador que voltará a ser abordada mais adiante, temos habitualmente como professores pessoas que se posicionam no papel de mestre - este representa o modelo a ser seguido e que vai transmitir saberes e valores aos seus alunos (Josso, 2008, p. 119). O distanciamento criado entre o professor-aluno é quase inevitável, o que não me pareceu constituir necessariamente um aspecto potenciador de aprendizagens. Penso que terá sido esse o fenómeno a que assistimos. O referido professor, brincava com as pessoas que estavam à sua frente, descia do “púlpito” e falava para nós de entre as filas de alunos. Nós, surpreendidos, ora olhávamos para a frente, ora olhávamos para trás e absorvíamos as suas palavras e as analogias constantes, com respectivas representações ao vivo. Era divertido? Sim. Mas mais do que isso, havia relação. Se a heteroformação ocorre pela interacção social em que a pessoa é influenciada pelos outros, então este era sem dúvida um excelente exemplo disso (Pineau, 1991 cit in Canário, 2008, p. 116).

Hoje analiso esta realidade à luz de uma frase que ouvi anos mais tarde, na rádio, dita por um desconhecido que nunca consegui identificar: “as pessoas esquecem-se do que lhes disseram, esquecem-se do que lhes mostraram, mas nunca se esquecem da forma como foram tratadas”.

Na altura, já tinha o hábito de analisar e questionar comportamentos, no inicio por feitío, mais tarde, por defeito profissional. Ainda assim, sempre me mantive na perspectiva de aluna. Nunca imaginei que um dia iria assumir um papel semelhante ao do professor. Até porque a timidez era muita e a circunstância só de ter que ler para um grupo numeroso de pessoas fazia-me “gelar”. Os dias em que tinha apresentações orais eram um martírio, pois a insegurança era grande e nunca gostei de me expor.

No final do curso, tive a minha primeira experiência profissional, assumindo funções como psicóloga clínica num Centro de Saúde. Nesse contexto, confrontei-me com outra realidade da minha formação profissional: a teoria não ensina ninguém a trabalhar. Os 4 anos de curso, com todas as suas leituras, pesquisas, trabalhos e testes, não permitiram que no primeiro dia de trabalho me sentisse capaz de assumir as funções que me eram propostas. No entanto, e porque a qualidade da nossa formação está directamente ligada à qualidade de quem nos forma, tive a sorte de me calhar uma orientadora que compreendia perfeitamente esta questão. Tal como referido por Fernández (2008), “[r]econhece-se que, mais que em qualquer outro momento da história, o trabalho é um local de aprendizagem, porque cada vez mais a forma de aprender é fazendo” (p.74).

Iniciei então o meu percurso com a observação de sessões de psicoterapia de apoio, conduzidas pela minha orientadora. Foi nessa altura que compreendi a importância de tudo o que lera anteriormente. Agora sim, tudo fazia sentido e percebi que era importante a prática não cair no vazio. Uma prática previamente preparada tem mais significado. Consegui entender as palavras e identificar as técnicas utilizadas. Mas não teria sido capaz de as reproduzir com a mesma qualidade. Tive vontade de voltar aos livros e reler muitas das coisas que durante o curso não me pareceram pertinentes – não lhes entendia o sentido. Esse sentido só parece vir com a operacionalização e é por isso que penso que teria aprendido muito mais, e com maior prazer, se ao longo do curso a teoria tivesse sido conjugada com mais momentos de prática. Assim como ocorreu nos adultos não escolarizados, na investigação conduzida por Cavaco (2008),

“[o]s saberes foram adquiridos tendo por referência a sua utilidade, ou seja, quando eram percepcionados como necessários para ultrapassar desafios e exigências. Nestes casos os indivíduos empenham-se e ocorrem processos de aprendizagem. (…) em última análise, é sempre a pessoa que avalia a pertinência e oportunidade de aprendizagem e decide se acciona ou não os mecanismos necessários para a aquisição de saberes” (p.112-113).

Terminada a licenciatura, fui confrontada com dois problemas: a realidade do desemprego e o fim de um longo percurso como estudante. Nessa altura encontrei uma solução temporária para a minha angústia. Inscrevi-me num curso de Formação Pedagógica Inicial de Formadores. Assim, seria possível continuar a sentir-me uma estudante e simultaneamente estaria a melhorar as minhas hipóteses de entrar para o

mercado de trabalho. Percebi que era ainda difícil para mim assumir a responsabilidade do trabalho e toda a autonomia que isso implicaria.

Por ter sido sempre uma pessoa tímida, nunca me imaginei no papel de formadora. Concluir esse curso era para mim um desafio muito grande. A intenção inicial era a de tornar o meu currículo, de recém-licenciada, um pouco mais competitivo. Na realidade, não ponderava vir a dar formação. Soube do curso através de uma amiga e, antes disso, não fazia ideia de que para se dar formação era exigido o agora tão famoso CAP (Certificado de Aptidão Profissional). Pensei que apenas fosse necessário ser-se especialista numa determinada área e que, dessa forma, poderíamos candidatar-nos para dar formação ou ensinar. O curso era pago e a um preço considerável na altura - efeitos da mercantilização da formação.

Nesta fase da minha vida é notória já a interiorização do discurso dominante da perspectiva da Aprendizagem ao Longo da Vida e do Modelo Económico Produtivo, que lhe está subjacente, centrado na responsabilidade individual e na necessidade do indivíduo assumir um percurso de formação contínua para garantir o seu lugar no mercado de trabalho (Cavaco, 2008, p. 80). Sem o saber, também eu correspondi, tal como referido por Fernández (2006), ao chamado efeito Mateus, que remete para a realidade de que “o que mais sabe, quanto mais sabe, mais deseja saber, mais procura saber e mais se lhe concebe saber” (p.72). Mais adiante no meu percurso profissional, foi possível contactar com a realidade oposta da população pouco escolarizada e do seu fraco acesso a processos formativos.

No primeiro dia de formação, fiquei com a certeza de que iria desistir. Soube que o curso começava e terminava com a simulação de uma pequena sessão de formação, na qual cada formando assumiria o papel de formador. Apesar da ansiedade e de toda a insegurança que senti, acabei por me preparar em casa sobre um tema à minha escolha.

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