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IV: A INVESTIGAÇÃO : D OIS E STUDOS DE CASO

1. Projeto de Investigação: Curso Livre “Cooperação, Cidadania e Desenvolvimento”

1.3. Reflexão final

O Curso Livre é uma oferta formativa de natureza não-formal, ao qual estão subjacentes algumas características do ponto de vista da aprendizagem que são consideradas pelos organizadores do curso como essenciais para a sua operacionalização. Realça-se o carácter experimental da formação, adequado ao perfil e interesses dos formandos e ao seu próprio ritmo de aprendizagem. Este é um dos aspetos relevantes na prática de ED, como defendem o GEGWG:

“Fundamental em todas as formas de educação, tomar em consideração a situação e background do grupo de aprendizagem é crucial em educação global. A idade, o número de participantes, as diversidades sociais e culturais em relação com os temas escolhidos, o tempo, os materiais e o espaço disponíveis devem ser os primeiros pontos a tomar em conta aquando do desenho e escolha dos métodos apropriados, num programa de educação global. Partir dos contextos dos aprendentes e explorar cooperativamente as suas necessidades está igualmente entre os primeiros aspetos a considerar. Isto é particularmente essencial quando se trata de desenhar programas de educação global sem curricula prescrito” (2010: 31-32).

137 Esta ideia é ainda sustentada pelos formadores do curso, que acreditam que as sessões a dinamizar devem ser pensadas de acordo com o perfil e nível de conhecimentos dos formandos. São os mesmos, neste caso, a validar o programa, conteúdos e objetivos do Curso Livre, na sessão de abertura. A sua participação neste processo de decisão da formação é importante, uma vez que lhes dá poder de influenciar o seu próprio processo de aprendizagem.

Ainda em relação à educação não-formal, crê-se que as práticas educativas proporcionadas pelo curso vão num sentido de proporcionar aos indivíduos a reflexão do mundo a partir da sua própria realidade, como forma de reação sobre a mesma: “A ideia é que eles, através destas

metodologias, metodologias ativas, fossem convidados, não só a refletir sobre as questões que nós abordávamos, mas também a refletir como é que podem agir para. E eu acho que o campo não-formal dá bastante espaço para isso (…)” (Organizador 2). Efetivamente, no universo da

educação não-formal, e mais particularmente em matéria de ED, a metodologia assume uma dimensão fundamental. Ao estar adequada ao grupo de aprendizagem, a metodologia deve ser participativa, no sentido de sensibilizar e mobilizar os indivíduos para a construção de um mundo com valores como a justiça social, o respeito pela alteridade e a solidariedade. Ora, ao despertar a responsabilização dos sujeitos, desenvolve-se o seu espírito crítico e estimula-se à ação consciente e informada (GEGWG, 2010). Esta abordagem considera, pois, a problematização do mundo como forma de uma aprendizagem ativa, transformadora e com significado, enquanto exercício de cidadania (GEGWG, 2010: 35). É neste sentido que parece assentar o pressuposto metodológico do Curso Livre, na medida em que se privilegiam métodos desafiantes, interativos e reflexivos para a formação do indivíduo.

Tanto a dimensão de educação não-formal, como o cuidado com uma abordagem metodológica participativa e ativa, parecem estar relacionados com as motivações estiveram na base da escolha e frequência no Curso Livre por parte dos formandos. Denota-se um interesse geral ao nível dos conhecimentos, nomeadamente na oportunidade de conhecer e refletir sobre temáticas novas, como são o Desenvolvimento, a Cidadania e a Cooperação. Enquanto espaço de formação mais dinâmico e flexível do ponto de vista dos conteúdos, mas também da metodologia, esta parece ser uma oportunidade interessante para ter acesso a temáticas distintas daquelas que são trabalhadas em contexto escolar. Ao mesmo tempo, verifica-se que, genericamente, os formandos consideram que o curso poderá trazer novas oportunidades académicas e profissionais87 no futuro, sendo um desafio a esses níveis também.

De forma mais global, a perceção dos formandos relativamente ao Curso Livre é francamente positiva, tanto sobre o desenvolvimento dado ao curso relativamente ao nível de conhecimentos, como sobre o cumprimento dos objetivos do curso e a correspondência às expectativas iniciais. Ainda nesta perspetiva, e sobre a correspondência do curso de formação

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Mais uma vez, na altura em que se realizou o Curso Livre “Cooperação, Cidadania e Desenvolvimento”, considerava-se a possibilidade de realização do Curso Específico, que procede ao primeiro.

138 aos contextos académico e vida profissional, e como antes visto, os formandos consideram que de adequa às suas expetativas.

Relativamente aos formandos, são de realçar dois aspetos importantes. Primeiro, a frequência do curso é feita maioritariamente por indivíduos do género feminino. Depois, os formandos têm, na sua maioria, o mesmo percurso académico – são estudantes da licenciatura em Educação Básica da ESE-IPVC. Estes fenómenos parecem resultar do facto da divulgação do curso ser feita maioritariamente na ESE-IPVC, onde a maioria dos formandos estuda e onde o número de mulheres é superior ao número de homens. Para contrariar esta situação, a realização do Curso Livre poderia ser divulgada ao universo académico do IPVC e à restante comunidade educativa ou civil, no sentido de atrair um maior número de interessados e com interesses, conhecimentos e backgrounds variados.

Retomando a questão do sucesso da iniciativa e de igual modo à perspetiva dos formandos, a perceção dos formadores e organizadores quanto ao curso de formação é evidentemente positiva, pelo seu encadeamento funcional e eficaz. Nesta avaliação, destaca-se a introdução do referencial e da componente de trabalho autónomo como elementos inovadores e úteis do ponto de vista da organização e da aprendizagem. A criação do referencial permitiu a clarificação dos objetivos do curso e do seu propósito educativo. Por sua vez, o trabalho autónomo dos formandos permitiu uma aproximação das temáticas abordadas com as práticas assumidas nestas áreas de trabalho, procurando diretamente exemplos de práticas bem-sucedidas a nível local ou num contexto mais amplo.

Denota-se, para os formandos e para os formadores e organizadores, uma preocupação com as aprendizagens efetuadas a partir do curso. Os primeiros destacam a consolidação de conhecimentos sobre ED e cooperação. Considera-se ainda que estes conhecimentos poderão ser profícuos na prática futura, enquanto agentes de desenvolvimento: “A aprendizagem relativa a

contextos de interculturalidade, a educação para o desenvolvimento e cooperação para o desenvolvimento podem, especificamente, vir a ser úteis para a concretização de alguns projetos profissionais (…) que tenciono, pessoalmente, vir a trabalhar no futuro” (Estudante

A). Além desta componente mais teórica, identifica-se uma componente pedagógica e didática importante ao nível das aprendizagens, como uma dimensão pedagógica.

Por sua vez, formadores e organizadores consideram que o curso contribuiu de forma relevante para a formação dos participantes enquanto cidadãos. Ao permitir a discussão e a reflexão sobre questões contemporâneas e sobre problemas globais, o curso, construído com base em experiências pessoais – dos formadores – ou simulações, através de dinâmicas, estimulou o envolvimento ativo e a análise crítica da realidade social. Este exercício prático de cidadania, enquanto pressuposto de ED, tem subjacente uma dimensão de aprendizagem que não ensina, mas que educa (GEGWG, 2010: 31). Esta perspetiva revê-se nas perceções de formadores e organizadores sobre a ED e sobre o modo como os conteúdos e as metodologias

139 veiculados no Curso Livre se enquadram na noção de ED. Numa primeira instância, sobressai a ideia de que a ED “está relacionada com o desenvolvimento humano sustentável, com uma

cidadania global participativa. Para mim, ED é isto. Não há uma definição de ED, mas engloba estas ideias de cidadania global, ED para o desenvolvimento humano sustentável, desenvolvimento humano (…)” (Formador 1). A formação para a cidadania tem, como se

verifica, um destaque evidente enquanto processo educativo, na medida em que se crê que a ED educa cidadãos mais atentos, conscientes e ativos ao nível dos seus conhecimentos, competências e valores, para um mundo mais justo: “tu atuas na tua esfera de atuação,

salvaguardando aqui a repetição. (...) desta tua responsabilidade de não melhorares só o teu bairro e a tua comunidade, tens que melhorar o mundo como um todo. (…) Educar cidadãos para que, de facto, tenham um papel mais ativo, pertinente e integrado no desenvolvimento, seja em que escala for.” (Formador 3).

Em suma, a partir da analogia que entende a ED como uns óculos para ver e percecionar o mundo, considera-se que o Curso Livre, pela sua natureza não-formal, estimula os sujeitos para a compreensão e mobilização ativa e consciente. Este alerta para os problemas do mundo incita ao questionamento e à procura de alternativas para a cidadania, para entender a diferença e ‘o outro’. A ED, através deste sentido de aprendizagem ativa e transformativa (GEGWG, 2010), num contexto não-formal, ajuda a despertar os indivíduos, de forma mais ou menos evidente, para a compreensão da realidade social e do seu poder na mudança e na construção de um mundo mais justo e mais sustentável (idem).

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