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Reflexões sobre aspectos a serem contemplados em pesquisas de

2.6 OS PROGRAMAS: THE INCREDIBLE YEARS

2.6.3 Reflexões sobre aspectos a serem contemplados em pesquisas de

Por essa pesquisa ter uma característica de intervenção e por envolver um programa baseado em evidências, sabe-se que seu nível de complexidade e seu grau de exigência metodológica são altos. Para que diversos aspectos possam ser contemplados e respondidos

ao longo do presente estudo, optou-se por construir essa última subseção, na seção revisão de literatura. O objetivo dessa subseção é realizar apontamentos sobre alguns estudos que tratam sobre processos de avaliação de programas de intervenção bem como estudos de Webster-Stratton que descrevem cuidados sobre a fidelização ao programa. Por se tratar de um programa com uma ampla disseminação (conforme subseção 2.6.2), entende-se que essa subseção não propõe uma revisão aprofundada sobre aspectos de avaliação de programas de intervenção.

Murta (2007) indica que um dos caminhos para o avanço científico nacional na área de programas de intervenção preventivos em saúde mental à população infanto-juvenil é a replicação dos programas estrangeiros bem sucedidos. Esse caminho pode ser importante, uma vez que as pesquisas brasileiras se baseiam preferencialmente em delineamentos de pré e pós-teste contando com a coleta de dados apenas antes e depois da intervenção (Rios & Williams, 2008). Algumas condições facilitadoras poderiam contribuir ao avanço desse campo no Brasil, como, por exemplo, novas diretrizes curriculares para o curso de Psicologia que estimulem o ensino e pesquisa de práticas preventivas, coletivas e comunitárias; impactar na produção em pesquisa e oferta de serviços à sociedade; e maior disponibilidade de financiamento e de fomento à pesquisa com número grande de participantes e de caráter longitudinal (Murta, 2007).

As contribuições das pesquisas internacionais, segundo Rios e Williams (2008), sobre programas de intervenção referem-se aos delineamentos experimentais bem elaborados, por amostras de participantes maiores e pela utilização de diferentes grupos experimentais e grupos controle. Em relação à coleta de dados, ela ocorre antes, durante e imediatamente após a intervenção e contam com medidas de follow up visando verificar a manutenção da aprendizagem. Segundo essas autoras, a literatura internacional segue as seguintes premissas em suas pesquisas no campo de prevenção aos problemas emocionais e comportamentais: não há apenas uma solução aos problemas emocionais e comportamentais; os comportamentos de risco são inter-relacionados; intervenções multimodais são as mais adequadas; as intervenções devem ser mais ecológicas e menos individuais; deve-se implementar intervenções o mais cedo possível, ou seja, antes da cronificação de fatores de risco e agravamento dos sintomas; e os programas preventivos devem ser implementados com a participação ativa da comunidade de modo que possam se sustentar ao longo do tempo.

Certamente, é fundamental que a aplicação de programas de intervenção siga as etapas de pesquisa propostas por Muehrer (1997): inicialmente, a identificação do problema e sua prevalência; seguido pelo levantamento dos fatores de risco e proteção envolvidos; antes

da intervenção, implementar um estudo piloto apoiado em teoria; então, implementar um estudo com design experimental em ambiente natural próximo às condições reais; disseminar em larga escola a intervenção a fim de verificar sua validade externa; e, por fim, transformar esse conhecimento científico em serviços à comunidade e políticas públicas.

Um fator dificultador à avaliação de programas de intervenção citado por Lohr, Pereira, Andrade e Kirchener (2007) e Salvador (2012) foi a aderência dos participantes aos programas de intervenções que suas pesquisas desenvolveram. Para isso, Lohr et al. (2007) sugerem que um plano de recrutamento e divulgação atenda as características potenciais e o local onde o programa será desenvolvido. Pereira e Gioia (2010) indicam que um trabalho em contexto escolar realizado com o corpo docente deve preconizar o atendimento da demanda deste público, pois muitas imposições de intervenção acabam por perder a adesão dos professores, não criando um procedimento vantajoso a eles. Salvador (2012) sugere que pesquisas futuras considerem o delineamento experimental com grupo controle a fim de diminuir a ameaça à validade interna, que o número de encontros do programa não seja reduzido e que há uma necessidade urgente de se fortalecer a relação família-escola.

Refletindo sobre as indicações de pesquisas de programas de intervenção, percebe-se que o programa Incredible Years Teacher Management Training (IY TCM) de Webster-Stratton (2012) contempla características imprescindíveis de eficácia. Entretanto, a autora do programa sustenta que deve existir uma fidelização ao programa, ou seja, uma integridade original na aplicação do programa para se atingir os resultados descritos em seus estudos. Caso haja uma fidelização baixa (por exemplo, redução no número de horas de treinamento, alteração na sequência das atividades e baixa qualidade do treinador na aplicação), pode ocorrer de não ter resultado ou ter um baixo resultado nas mudanças comportamentais dos professores previstas pelo programa (Webster-Stratton et al., 2011). Existem três dimensões, com caráter tanto quantitativo quanto qualitativo, a serem consideradas no processo de fidelização do programa: (1) aderência, que se refere ao número de workshops e de horas de treinamento; (2) treinador com habilidades apropriadas ao desenvolvimento do programa em seus métodos, sequência e uso dos propósitos ou princípios que embasam o programa e favorecem a aprendizagem dos professores; (3) suporte diferencial do treinador às necessidades particulares da população envolvida (Webster-Stratton et al., 2011; Reinke, Herman, Stormont, Newcomer & David, 2013).

Esses autores indicam que um fator importante ao processo de fidelização é o engajamento ou envolvimento dos participantes ao programa. Para isso, o programa permite uma flexibilidade de adaptação por considerar que existem necessidades culturais diferentes

entre os grupos de participantes. Para que o treinador busque o balanço entre a adaptação e a alta fidelização, alguns direcionamentos devem ser contemplados (Webster-Stratton et al.,

2011): (1) o IY TCM é um modelo de relação colaborativa, ou seja, treinador e professores se relacionam com seus conhecimentos, potenciais e perspectivas. O treinador solicita e acolhe ideias e sentimentos dos professores, aprende com eles sobre suas salas de aula e os envolve em um processo reflexivo sobre suas experiências e dificuldades e os conduz para um processo de resolução de problemas. Outro aspecto dessa relação de colaboração é que o treinador precisa cuidadosamente adaptar conceitos e explicações a fim de criar uma situação de aprendizagem segura e acolhedora para que os professores revejam suas crenças e seus estilos de interação com os seus alunos. Ao final de cada workshop os professores emitem um

feedback sobre o encontro a fim de ajudar o treinador em sua condução; (2) de uma forma

geral, nota-se que ainda existe um distanciamento evidente entre programas estrangeiros e brasileiros de intervenção e pesquisas baseadas em evidências (Murta, 2007; Rios & Williams, 2008), sendo que o presente estudo visa contribuir para o estreitamento dessa lacuna por meio de um delineamento experimental e como um aporte de intervenção aos professores e ao ambiente escolar, visto que, no Brasil, a maior frequência de estudos ainda está relacionada com a avaliação de programas parentais (Rios & Williams, 2008) e circunscritos a grupos de crianças e adolescentes (Murta, 2007; Lohr et al., 2007). Dessa forma, espera-se que tanto nosso contexto científico quanto o social se beneficiem de forma a (1) integrar programas de intervenção a pais e professores uma vez que é essa conjunção que traz maior efetividade no alcance de mudanças comportamentais às crianças (Webster-Stratton et al., 2004; Webster-Stratton & Bywater, 2014), e (2) levar para dentro do contexto escolar programas de intervenção que possam contribuir com a prevenção de problemas de comportamento de crianças pelos professores (Bolsoni-Silva et al., 2010); formação sistemática e empírica ao professor (Rios & Denari, 2011); e o aprimoramento da relação família-escola (Salvador, 2012).

Os antecedentes científicos apresentados nessa seção da presente tese sustentam a ideia da pesquisadora de que um professor que utiliza rótulos e estereótipos para explicar o comportamento do seu aluno, o responsabiliza de forma integral pelas suas dificuldades comportamentais e de aprendizagem e/ou interage de forma coercitiva em nada contribui para o desenvolvimento global e a aprendizagem escolar de crianças. É necessário que todos os esforços científicos e sociais estejam direcionados a fornecer e construir formações específicas aos professores para que eles possam educar seus alunos considerando em suas práticas diárias, além dos objetivos curriculares acadêmicos, os objetivos comportamentais,

emocionais e sociais das crianças. Os professores, por meio de uma postura interacionista, preventiva e positiva, podem, assim, lidar de maneira efetiva com a diversidade de seus alunos favorecendo o potencial humano de cada um deles a partir da tenra idade e os conduzirem para uma trajetória escolar de sucesso e prazer.

3 MÉTODO

Este estudo consiste em uma pesquisa aplicada que busca realizar uma avaliação sobre a aceitação cultural e os impactos de um programa de intervenção para professores voltado a trazer resultados potenciais aos campos da Psicologia e da Educação. O modelo da pesquisa é o experimental com delineamento pré e pós-teste, sem grupo de comparação, a fim de realizar uma explicação da realidade por meio da manipulação da variável independente em relação à variável dependente (Cozby, 2003). No presente estudo, a variável independente define-se como o programa de intervenção e as variáveis dependentes como as estratégias de gestão de sala de aula pelos professores e os comportamentos dos alunos.

No entanto, além de fazer a análise quantitativa dos dados coletados por meio dos instrumentos, foi possível realizar uma microanálise qualitativa da condução do programa em si. Pontua-se que esse estudo tem um caráter preventivo primário/universal, ou seja, é implementado para um público em geral, com exceção da população de risco, que necessita de um atendimento especializado.

Ressalta-se que todos os procedimentos dessa pesquisa seguiram rigorosamente os princípios e normas estabelecidos na Resolução 466/2012 pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) para pesquisas com seres humanos. Este projeto de pesquisa foi encaminhado ao Comitê de Ética da Universidade Federal do Paraná – Setor de Ciências da Saúde – sendo aprovado na data de 7 de janeiro de 2015 – CAAE: 38579214.4.0000.0102. Para manter a confidencialidade dos dados foi utilizado um código alfanumérico para nomear os participantes e realizar a comparação dos resultados pré e pós-intervenção.