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4.3 Notas sobre a Mediação de Conflitos no TJ/RS: a experiência do CEJUSC de

4.3.1 Regulamentação e Organização das Unidades

No Rio Grande do Sul os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (CEJUSCs) foram disciplinados por meio da Resolução n° 1026/2014 do Conselho da Magistratura (COMAG) do Tribunal de Justiça estatual, publicado em 19 de agosto de 2014 (Anexo A). De acordo com este documento, a instalação dos CEJUSCs tem por objetivo a implementação da “Política Judiciária Nacional de Tratamento Adequado de conflitos” e a adequação das práticas autocompositivas realizadas no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul aos termos estabelecidos pela Resolução nº 125, de 2010, do CNJ.

299 CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Iniciado 1º curso de mediação judicial no TJRS.

Brasília, DF, nov. 2011. Disponível em: <http://cnj.jus.br/noticias/cnj/57912-iniciado-1-curso-de- mediacao-judicial-no-tjrs>. Acesso em: 19 set. 2017.

300 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça. Semana nacional da conciliação: "2/3 da população

gaúcha está em conflito na Justiça", afirma Coordenador do NUPEMEC. Porto Alegre, nov. 2016. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br/site/imprensa/noticias/?idNoticia =350955>. Acesso em: 10 jun. 2017.

A Resolução do COMAG previa a imediata instalação de CEJUSCs em todas as comarcas que possuírem cinco ou mais varas com competência nas áreas cível, fazendária, previdenciária, de família e/ou dos juizados especiais cíveis, criminais e fazendários. Nas demais comarcas, a instalação dos CEJUSCs fica condicionada ao requerimento específico por parte dos magistrados. Atualmente, o Estado do Rio Grande do Sul, que dispõe de uma totalidade de 164 comarcas em seu território, conta com CEJUSCs instalados em 41 destas, o que indica a instalação de 7 novas unidades apenas no ano de 2017, comparativamente com os dados de 2016, já referidos.

Conforme determina a Resolução n° 1026/2014 do COMAG, os CEJUSCs têm como competência o atendimento de demandas processuais e pré-processuais, devendo atuar na prevenção, no tratamento e na solução de conflitos que versem qualquer matéria, judicializada ou não, sempre que admitida a solução da controvérsia por métodos consensuais. Dentre as competências designadas pela referida Resolução aos CEJUSCs, destaca-se a responsabilidade em eleger qual a metodologia, dentre aquelas disponíveis no respectivo Centro, será mais adequada para cada caso. Observa-se neste ponto uma distorção conceitual em relação à ideia da Multi-Door Courthouse que inspirou o modelo de “mediação judicial” brasileiro, visto que na concepção norte-americana, embora exerça papel importante na orientação e informação das partes quanto aos métodos disponíveis mais adequados ao caso, a Corte não exerce papel decisório na escolha do método a ser utilizado, que será, via de regra, realizada pelas partes, subsidiadas ainda pela atuação de seus advogados301.

Os CEJUSCs são coordenados por magistrado designado pelo presidente do Tribunal de Justiça, mediante indicação da Corregedoria-Geral de Justiça e análise do NUPEMEC. De acordo com o art. 6º, § 2º, da Resolução n° 1026/2014 do COMAG, os magistrados que exercerem a coordenação dos CEJUSCs deverão possuir capacitação na forma do art. 9º, da Resolução n 125/2010 do CNJ, e, preferencialmente, dispor de experiência na área. O magistrado permanece, portanto, como autoridade máxima na estrutura gerencial dos CEJUSCs, cabendo a ele coordenar as atividades que serão realizadas pelos servidores, mediadores e conciliadores, bem como realizar a homologação dos acordos pré-processuais.

301 FINKELSTEIN, Linda; KESSLER, Gladys. The evolution of a multi-door courthouse. Catholic

Conforme mencionado anteriormente, é possível que o exercício da coordenação das atividades de mediadores e conciliadores por magistrados que possuem formação e extenso treinamento em competências diferentes da autocomposição (isto é, para decidir, não para mediar/conciliar) implique em dificuldades técnicas. Por outro lado, a estrutura hierárquica que dispõe a gestão dos CEJUSCs pelos magistrados parece reproduzir a visão eficientista neoliberal do Poder Judiciário, na qual o juiz já não mais exerce apenas a atividade jurídica/decisória que lhe é própria, assumindo, por vezes de forma preponderante, o papel de gestor responsável pela administração e produtividade da unidade judiciária em que atua302.

Observa-se que, paralelamente à autoridade exercida pelo magistrado titular do respectivo CEJUSC, o magistrado titular da vara de origem dos casos que são submetidos ao procedimento autocompositivo no curso do processo mantém uma série de prerrogativas, desde a competência para designar a realização de “audiência de mediação”303 e para a homologação dos acordos processuais, até a de determinar

a substituição da autocomposição convencional por autocomposição em meio eletrônico.

De acordo com a Resolução n° 1026/2014 do COMAG, os CEJUSCs seriam também responsáveis pela coleta e processamento de dados estatísticos referentes aos atendimentos realizados, o que se daria por meio de uma ferramenta de registro e armazenamento de dados que seria implementada no atual sistema de informática utilizado pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Contudo, até o momento, contados já três anos da edição da Resolução, observa-se que tais ferramentas ainda não foram disponibilizadas.

302 STRECK, Lenio. Juiz não é gestor e nem gerente. Ele deve julgar. E bem! Revista Consultor

Jurídico, São Paulo, 8 ago. 2013. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2013-ago-08/senso-

incomum-juiz-nao-gestor-nem-gerente-juiz-julgar-bem>. Acesso em 30 dez. 2017.

303 O art. 334 do CPC refere-se à “sessão” de mediação como “audiência”. Evidente a confusão do

legislador, pois o termo “audiência”, em âmbito jurídico, pressupõe uma estrutura verticalizada ou triangular, típica da jurisdição, indicando um momento onde as partes e testemunhas são interrogadas e em que os atores se reportam a uma autoridade superior. Em sentido oposto, a mediação, por sua estrutura horizontal, busca, evidenciar o protagonismo das partes na condução do procedimento, e, portanto, é possível interpretar como mais adequado o uso do termo “sessão”, como sinônimo para “reunião” ou “encontro” (ou, ainda, “reencontro”, como certamente preferiria Luís Alberto Warat). Ainda, conforme refere Tartuce, pelo fato de que a mediação pode ser utilizada fora do ambiente judicial, considera-se inapropriado que o termo “audiência” seja utilizado em práticas extrajudiciais, pois tal uso poderia ensejar confusão entre as pautas estatais e privadas. TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. 3. ed. São Paulo: Método, 2016.