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2.2. O modelo para estudo dos conectores desenvolvido por pesquisadores do IDS

2.2.2. Definição semântica

2.2.2.2. Tipo de relação estabelecida

2.2.2.2.4. Relação causal

As relações causais, assim como as condicionais, também são dinâmicas. Eles relacionam um objeto causado e outro causante. Porém, diferentemente da relação condicional, o valor do objeto causado é sempre fixa. Por exemplo:

(2.39) Já que você não fala (R), eu chamo a polícia (E). (Blühdorn, 2006a)

Nesse exemplo o conector relaciona estados de coisas. O valor factivo de E se encontra sempre fixo, é uma evidência, é um fato consumado, por isso E representa o efeito e R uma causa.

As relações causais podem ser estabelecidas nos quatro domínios. No domínio do espaço, a ocorrência de um objeto desencadeia a ocorrência de outro objeto.

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(2.40) A marca (E) da bala (R)(causa). (Blühdorn, 2006a)

Esse exemplo pode ser uma referência à seguinte situação: Uma bala

perdida que entrou pela janela deixou uma marca na parede da sala.

No domínio do tempo, a factividade de um estado de coisas desencadeia a factividade de outro estado de coisas.

(2.40) Quando escavaram o túnel (R) (momento/causa), a casa desabou (E). (Blühdorn, 2006a)

O exemplo acima também pode ser interpretado como relação de situamento, em que R será o momento em que E acontece.

No domínio epistêmico, a verdade de uma proposição desencadeia a verdade de outra proposição.

(2.41) Penso (R), (logo (R)) (causa) existo (E). (Blühdorn, 2006a)

No domínio deôntico, a desejabilidade de um ato de fala desencadeia a desejabilidade de outro ato.

(2.42) Queremos que esse projeto termine logo (R), e justamente (por isso (R)) (causa)

ele tem que ser bem estruturado (E). (Blühdorn, 2006a)

Portanto a diferença entre as relações condicional e causal é que na primeira o valor do resultado é aberto e na segunda ele está fixo.

É importante salientar que os quatro tipos de relações semânticas estabelecidas pelos conectores se organizam em níveis de complexidade relacional, ou seja, se organizam de acordo com o grau de complexidade em que se estabelece a relação entre E e R. A reinterpretação se dá sempre

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do nível menos complexo para o mais complexo. Dessa forma, relações de similaridade podem ser reinterpretadas como de situamento e assim sucessivamente, porém nunca o contrário:

Similaridade Situamento Condicional Causal

menos complexo mais complexo

Sentido da reinterpretação

Resumidamente, podemos dizer que os quatro tipos de relações descritos acima apresentam as seguintes características:

 relação de similaridade: conexão simétrica;  relação de situamento: conexão assimétrica;

 relação de condição: conexão assimétrica-dinâmica com resultado de valor aberto;

 relação de causa: conexão assimétrica-dinâmica com resultado de valor fixo.

De acordo com o que foi descrito acima sobre o modelo desenvolvido no IDS, os quatro tipos de relações podem operar nos quatro domínios semânticos, criando um sistema de conexões possíveis. Segundo o modelo, esse sistema está resumido de acordo com o quadro abaixo:

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Quadro 1: Domínio versus tipo de conexão Tipo de conexão Relação entre objetos

físicos: Domínio espacial

Relação entre estados de coisas: Domínio temporal

Relação entre

proposições: Domínio epistêmico

Relação entre atos: Domínio deôntico Similaridade Similaridade espacial Similaridade temporal Similaridade lógica Similaridade deôntica

Situamento Situamento espacial Situamento temporal Situamento lógico Situamento deôntico

Condição Condição de existir Condição de acontecer Condição de verdade Condição de desejabilidade

Causa Causa da existência Causa do acontecer Causa de verdade Causa de desejabilidade

Fonte: adaptado de Blühdorn (2006a:16).

É importante ressaltar que nosso objeto de estudo neste trabalho são as conjunções subordinativas temporais. Sendo assim, as leituras possíveis das ocorrências dos corpora se deram nos domínios de segunda, terceira e quarta ordem. Pelo fato de o presente estudo ser sobre conectores temporais, uma leitura no domínio de primeira ordem não foi possível.

Portanto, a presente tese não analisou conexões que se estabelecem no domínio espacial. Ocupamo-nos em analisar as conexões estabelecidas por certos conectores temporais nos domínios temporal, epistêmico e deôntico.

Cabe apontar que a abordagem da semântica dos conectores mostrada neste modelo difere da abordagem tradicional, por esta apresentar alguns problemas quanto à classificação dos conectores adverbiais. As conexões adverbiais reconhecidas tradicionalmente pela gramática mostram que o nome adotado para descrever a conexão corresponde normalmente ao papel relacional de R. Por exemplo:

(2.43a) Os dois haviam sido capturados (E) quando reparavam um oleoduto numa região produtora do estado de Rivers, sul (R).

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Neste exemplo o papel relacional de R é temporal, assim a conexão é classificada como de tempo.

No entanto, a nomenclatura adotada pela tradição gramatical para classificar as conexões adverbiais não é uniforme. Para a classificação tradicional, por exemplo, a conexão abaixo é considerada conclusiva:

(2.44)Ele chegou cedo (R); portanto, deve estar gripado (E)

Porém, a análise do papel relacional temático atribuído pelo conector

portanto revela que o papel temático de R é evidência e não conclusão. A

conclusão, nesse exemplo, corresponde ao papel temático de E.

A abordagem semântica dos conectores trazida por Blühdorn foi desenvolvida para superar esse e outros problemas da abordagem tradicional. Dessa forma, o modelo adotado nesta tese propõe categorizar todas as conexões em função do papel relacional do relatum R.

O modelo adotado nesta tese permite reorganizar a classificação semântica tradicional dos conectores, essa reorganização está mostrada no quadro abaixo:

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Quadro 2: Reorganização da classificação semântica tradicional dos conectores sob a

perspectiva do modelo desenvolvido no IDS.

Relação entre objetos físicos: domínio espacial Relação entre estados de coisas: domínio temporal Relação entre proposições: domínio lógico- epistêmico Relação entre atos: domínio ético-deôntico Relação de similaridade aditiva alternativa adversativa comparativa conformativa proporcional de companhia aditiva alternativa adversativa comparativa conformativa proporcional de companhia Aditiva alternativa adversativa comparativa conformativa proporcional Aditiva alternativa adversativa comparativa conformativa proporcional Relação de situamento de companhia de posse de lugar de companhia temporal Modal de conhecimento Modal de normas Relação condicional Condicional condicional concessiva Condicional concessiva Condicional instrumental final concessiva

Relação causal Causal causal instrumental consecutiva concessiva Causal evidencial explicativa conclusiva concessiva Causal instrumental intencional explicativa final concessiva

Fonte: Blühdorn (2006a:17).

Nesta tese foram estudadas as conexões apresentadas no quadro acima no domínio temporal, epistêmico e deôntico.

Estudos como os de Blühdorn (2003, 2006a, 2006b, 2008), Sweetser (1990), Lyons (1977) e Frawley (1992) trazem contribuições importantes para o desenvolvimento de pesquisas que abordam os conectores sob o ponto de vista dos domínios semânticos. Outros trabalhos que também se destacam pela importância de seus conteúdos para pesquisas sobre esse

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tema serão apresentados a seguir. A intenção é mostrar uma leitura crítica desses estudos, salientando a pertinência deles para a presente tese.