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Relação entre características respiratórias e a prevalência de

No documento UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO (páginas 90-95)

6 DISCUSSÃO

6.4 Considerações sobre os resultados deste estudo e os dados disponíveis

6.4.3 Relação entre características respiratórias e a prevalência de

As alterações craniofaciais em crianças com obstrução respiratória têm sido amplamente estudadas nos últimos tempos. No entanto, a ausência de relação direta entre a causa da obstrução respiratória e seu efeito no crescimento craniofacial tem gerado grande controvérsia (VIG, 1981).

A análise dos resultados mostrou variados graus de correlação entre as características respiratórias e a prevalência de mordida cruzada posterior. A presença de desvio de septo provocou um aumento discreto na ocorrência de mordida cruzada posterior (21,2%), em relação às crianças que não exibiam desvio (17,9%). Esta pequena diferença, no entanto, não foi estatisticamente significante (p=0,446).

Da mesma forma, a presença de ronco noturno, relatada nos questionários, apresentou discreto aumento na prevalência de mordida cruzada posterior. As crianças que apresentaram ronco expressaram um ligeiro aumento (19,6%) em relação àquelas que não tinham este hábito (17,9%), com relação à ocorrência de mordida cruzada posterior. Porém, sem significância estatística (p = 0,639).

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Em relação à hipertrofia de tonsila faríngea, a presença de Grau 3 praticamente não influenciou na ocorrência de mordida cruzada posterior A ocorrência de hipertrofia de Grau 4 provocou um ligeiro aumento na presença de mordida cruzada posterior. A hipertrofia de tonsila faríngea, no entanto, não apresentou relevância estatística na ocorrência de mordida cruzada posterior, tanto a de grau 3 (p = 0,850), como a de grau 4 (p = 0,532).

As crianças que apresentaram hipertrofia de tonsilas palatinas em Grau 3 apresentaram mordida cruzada posterior em 27,5% dos casos, número maior do que aquelas que apresentaram Grau 4, que apresentaram mordida cruzada posterior em 20,7% dos casos. Por outro lado, as crianças sem a hipertrofia de tonsilas palatinas exibiram mordida cruzada posterior em 17,1% dos casos. A presença de tonsilas palatinas Grau 3 provocou um aumento de 1,84 vez na razão de chances de desenvolvimento de mordida cruzada posterior, aproximando-se bastante do nível de significância estatística (p = 0,057). Porém, este comportamento não se manifestou para a hipertrofia de Grau 4 (p = 0,627).

A presença de hipertrofia de cornetos, ao contrário das demais características estudadas, não provocou aumento na ocorrência de mordidas cruzadas posteriores. As crianças com esta hipertrofia apresentaram mordidas cruzadas posteriores em 16,7% dos casos, enquanto as que não apresentaram a hipertrofia de cornetos apresentaram mordidas cruzadas em 19,2% dos casos. De modo similar aos aspectos anteriormente estudados, estas diferenças nas prevalências também não revelaram significância estatística.

Quando se avaliou o padrão respiratório, a ocorrência de mordida cruzada posterior mostrou nítida diferença entre os grupos. As crianças classificadas como

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respiradoras mistas e as respiradoras bucais revelaram prevalências semelhantes para as mordidas cruzadas (19,7% e 19,9% respectivamente). Já aquelas classificadas como respiradoras nasais apresentaram mordida cruzada posterior em apenas 4,5% dos casos. A respiração bucal provocou um aumento de 5,23 vezes na razão de chances de ocorrência de mordida cruzada posterior (p=0,025). De modo semelhante, a presença de respiração mista aumentou em 5,15 vezes a razão de chances de ocorrência de mordida cruzada posterior (p=0,030).

Linder-Aronson (1970), Adamidis e Spiropoulos (1983), Bresolin (1983) e Oulis (1994) encontraram, em seus estudos sobre respiração bucal, uma tendência de atresia transversal do palato, com aumento da incidência de mordida cruzada posterior.

O estudo de Oulis et al. (1994) relacionou a presença de mordida cruzada posterior com a severidade de obstrução das vias aéreas superiores. Da amostra de 120 crianças com idade entre três e oito anos, 47% apresentaram mordida cruzada posterior. Estes autores observaram elevada presença desta maloclusão, tanto na dentadura decídua como na permanente, em crianças com severa obstrução das vias aéreas, particularmente quando havia hipertrofia das tonsilas faríngeas e palatinas, concomitantemente. Neste estudo, 80% das crianças com Graus três e quatro de hipertrofia das tonsilas faríngea e palatinas apresentaram mordida cruzada posterior. Cabe ressaltar que todas as crianças deste estudo tiveram indicação cirúrgica para remoção de tonsilas faríngeas e/ou palatinas, o que demonstra a gravidade da obstrução respiratória e também pode explicar a elevada prevalência de mordida cruzada posterior.

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Da mesma forma, Góis et al. (2008) encontraram elevada correlação entre padrão respiratório e hábitos de sucção não-nutritivos em relação ao desenvolvimento de determinadas maloclusões. Na faixa etária de três a seis anos, os autores encontraram um odds ratio (or) 10,9 vezes maior para que crianças respiradoras bucais desenvolvam mordida cruzada posterior, mordida aberta anterior ou overjet maior que 3 mm em relação às crianças com respiração nasal. Entretanto, assim como no presente estudo, os autores não encontraram correlação estatística entre o tamanho aumentado da tonsila faríngea e a presença das maloclusões citadas anteriormente. Por sua vez, os estudos de Morrison (1931), Ricketts (1968) e Linder-Aronson (1974) demonstraram uma elevada correlação entre a hipertrofia das tonsilas faríngeas e a presença de maloclusões e alterações craniofaciais.

Esta ausência de consenso quanto à influência do tamanho da tonsila faríngea na presença de maloclusões pode estar relacionada ao fato de que a tonsila faríngea sofre alterações de volume durante o período de crescimento, sendo maior durante a primeira infância e diminuindo com o passar da idade. Assim sendo, a sua atuação como fator etiológico de maloclusões pode não acontecer durante o surto de crescimento, diminuindo a intensidade de seus efeitos maléficos no surgimento de alterações esqueléticas e dentárias, que normalmente ocorrem posteriormente às alterações musculares e funcionais advindas da adaptação do indivíduo à obstrução nasal.

Por outro lado, os estudos de Hartssok (1946), Diamond (1980), Sosa (1982) e Oulis (1994) demonstraram haver relação estatística entre a hipertrofia de tonsilas palatinas e a mordida cruzada posterior. Esta alteração volumétrica, ao contrário da hipertrofia adenoideana, não tende a sofrer uma involução natural, podendo

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permanecer por períodos maiores e surtir efeitos mais severos no desenvolvimento craniofacial e no surgimento das maloclusões. Contudo, neste estudo, apresentou prevalência semelhante à da hipertrofia das tonsilas faríngeas e, da mesma forma, não apresentou relação estatisticamente significante com a mordida cruzada posterior quando analisada isoladamente.

A prevalência relativamente baixa de mordida cruzada posterior, em relação às alterações anatômicas estudadas neste trabalho, pode estar relacionada à faixa etária das crianças avaliadas, todas em fase de dentadura decídua, período este em que ainda não se manifestaram integralmente as consequências das alterações respiratórias. Por outro lado, caso a obstrução nasal se torne crônica, postula-se que a severidade das alterações dento-esqueléticas se tornarão mais acentuadas, como demonstram diversos estudos (RICKETS, 1968; GRAY, 1972; BRESOLIN et al., 1983 e SANTOS-PINTO, 1984).

A ocorrência elevada de mordida cruzada posterior em indivíduos respiradores nasais pode ser explicada pelo menor desenvolvimento em largura da maxila, como também pelo palato ogival, frequente em casos de obstrução nasal. Estas características anatômicas podem ser explicadas pela Teoria da Matriz Funcional de Moss (1969), segundo a qual a passagem do ar pelas cavidades nasais serviria de estímulo para seu desenvolvimento normal. Com a obstrução nasal, este estímulo de crescimento não existiria, levando à atresia maxilar. Outro fator desencadeante da diminuição em largura da maxila seria a própria respiração bucal de suplência, adaptativa à obstrução nasal. Nesta situação, não há contato da língua com o palato duro, gerando um desequilíbrio muscular decorrente da

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ausência de selamento labial e abertura constante da boca para a realização da respiração.

Cabe ressaltar ainda que, no presente estudo, quando se avaliou isoladamente cada característica respiratória, apenas a hipertrofia de tonsilas palatinas de grau 3 demonstrou relativa relevância estatística (p = 0,057) na ocorrência de mordida cruzada posterior. Já as crianças classificadas como respiradoras bucais e mistas apresentaram elevada prevalência da maloclusão, com relevância estatística significante (p = 0,025 e p = 0,030, respectivamente). Pode-se sugerir, a partir destes dados, que a ocorrência em conjunto de alterações anatomofuncionais desencadeiam a obstrução nasal, levando ao surgimento da respiração bucal, favorecendo então o surgimento da mordida cruzada posterior. Talvez, se a idade das crianças avaliadas no estudo fosse maior, poderíamos observar maiores alterações decorrentes de cada característica isolada na etiologia da mordida cruzada posterior.

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