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A relativização da teoria da separação dos poderes de Montesquieu quando da litigância em face da Fazenda Pública.

3 O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA EFICIÊNCIA JURISDICIONAL (ART.5º, INCISO LXXVIII DA CONSTITUCIONAL FEDERAL DE 1988) E AS AÇÕES

3.2 A relativização da teoria da separação dos poderes de Montesquieu quando da litigância em face da Fazenda Pública.

Segundo Montesquieu, na clássica obra “O espírito das leis”, para que haja um efetivo equilíbrio entre os Poderes constituintes do Estado (Poder Executivo, Poder Legislativo e Poder Judiciário), faz-se necessário que os três tenham independência em seus atos, sendo vedado a um determinado Poder adentrar à esfera de outro e vice-versa. A autonomia seria o segredo da tripartição de Poderes.

Ocorre que tal teoria abriga evidente incompatibilidade com a idéia de que um Poder não poderia intervir diretamente no outro. Acerca da organização dos poderes estatais, Alexandre de Moraes21 assevera:

A Constituição Federal, visando, principalmente, evitar o arbítrio e o desrespeito aos direitos fundamentais do homem, previu a existência dos Poderes do Estado e da Instituição do Ministério Público, independentes e harmônicos entre si, repartindo entre eles as funções estatais e prevendo prerrogativas e imunidades para que bem pudessem exercê-las, bem como criando mecanismos de controles recíprocos, sempre como garantia de perpetuidade do Estado Democrático de Direito.

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Germana de Oliveira Moraes e William Marques Paiva Júnior22 apresentam uma

releitura da teoria apresentada por Montesquieu ao indicar um poder uno que apresenta funções diferenciadas: executiva, legislativa e judiciária. Tal compreensão é interessante por não individualizar os “Poderes” de forma a universalizar cada um como se fossem âmbitos completamente dissociados. Na verdade, o que se tem é o Poder Estatal:

Partindo-se da premissa consoante a qual o poder é uno, quaisquer que sejam as manifestações de vontade emanadas em nome do Estado, mostra-se inadequado falar em tripartição de poderes estatais, razão pela qual se prefere o uso do termo funções estatais legislativa, administrativa e jurisdicional. A função administrativa consiste na concretização e realização dos interesses públicos da comunidade, quer dando execução a decisões ou deliberações, constantes de actos legislativos, actos de governo e actos de planificação, quer intervindo, conformadora ou ordenadoramente, na prossecução de fins (de interesse público) individualizados na Constituição e nas leis.

Observando a seara da função judiciária, observa-se que existe a necessidade de haver uma instância que poderá ser procurada em caso de descompasso das outras funções restantes. Como garantir a segurança jurídica de um cidadão quando agravado por ato do Executivo? E em casos de omissão do Legislativo?

O Judiciário vem apresentar esse viés diferenciado se comparado aos demais e a Constituição Federal, pelo princípio da inafastabilidade do controle judicial (art.5º, inciso XXXV), garante essa possibilidade.

Não é razoável que decisões tomadas pelo Executivo ou até mesmo pelo Legislativo que podem vir a causar perigo de lesão a direitos fundamentais deixem de passar pela apreciação jurisdicional.

Na tentativa de esquivar-se do crivo do Poder Judiciário, não raras são as vezes que o princípio da separação dos poderes é suscitado pelos entes públicos litigantes para justificar a suposta impossibilidade de controle jurisdicional de atos praticados pelo Executivo e Legislativo.

Invocar tal teoria para retardar a efetivação dos direitos fundamentais sociais seria algo completamente destoante da lógica do Estado social.

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22 MORAES, Germana de Oliveira e MARQUES JUNIOR, William Paiva. A modernização do modelo

brasileiro ante o sistema de jurisdição administrativa do Direito comparado. In: XIX Encontro Nacional do

O combate a esse tipo de pensamento deve ser reiteradamente feito pelos magistrados, tendo em vista que, em se tratando de direitos constitucionalmente previstos, não há que se falar em desrespeito ao princípio da separação de poderes23. Uma vez acionado, por compor o Estado e ter o dever de velar pelo cumprimento das leis, é concebível que o Judiciário exija que a Administração Pública tome as providências cabíveis para assegurar determinado direito. O Supremo Tribunal Federal tem decidido nesse sentido conforme demonstra extensa jurisprudência.

Em casos de ausência de norma regulamentadora do exercício do direito, também caberá ao Poder Judiciário produzir tal norma que seja suficiente para o gozo do direito pleiteado. É o caso de mandados de injunção que são impetrados visando à efetividade da norma disposta no artigo 37, inciso VII da Constituição Federal, no que se refere ao exercício do direito de greve24 pelos servidores públicos.

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23 EMENTA: Agravo regimental no agravo de instrumento. Constitucional. Legitimidade do Ministério Público.

Ação civil pública. Implementação de políticas públicas. Possibilidade. Violação do princípio da separação dos poderes. Não ocorrência. Reserva do possível. Invocação. Impossibilidade. Precedentes. 1. Esta Corte já firmou a orientação de que o Ministério Público detém legitimidade para requerer, em Juízo, a implementação de políticas públicas por parte do Poder Executivo de molde a assegurar a concretização de direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos garantidos pela Constituição Federal, como é o caso do acesso à saúde. 2. O

Poder Judiciário, em situações excepcionais, pode determinar que a Administração pública adote medidas assecuratórias de direitos constitucionalmente reconhecidos como essenciais sem que isso configure violação do princípio da separação de poderes. 3. A Administração não pode invocar a cláusula da “reserva

do possível” a fim de justificar a frustração de direitos previstos na Constituição da República, voltados à garantia da dignidade da pessoa humana, sob o fundamento de insuficiência orçamentária. 4. Agravo regimental não provido. (AI 674764 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 04/10/2011, DJe- 205 DIVULG 24-10-2011 PUBLIC 25-10-2011 EMENT VOL-02614-02 PP-00302) (grifo nosso).

24 EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.

CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEGITIMIDADE ATIVA DE ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA. PARÂMETROS CONCERNENTES AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE. CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO. PREVALÊNCIA DO INTERESSE SOCIAL.

INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA OFENSA À