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A Resolução dos Problemas Escolares Como Sinônimo de Atendimento às

7 RESULTADOS E DISCUSSÃO

7.3 REFLEXÕES SOBRE O PAPEL DA EQUIPE MULTIPROFISSIONAL

7.3.1 A Resolução dos Problemas Escolares Como Sinônimo de Atendimento às

Embora haja um entendimento dos profissionais de que a resolução de problemas deve envolver todos os profissionais que estão ligados a uma determinada situação, verifica-se que a demanda pelo trabalho do profissional, na prática, corresponde a como dar respostas às situações de emergência, que aparecem e que dificultam a dinâmica de um trabalho mais planejado na escola. Esse entendimento deve ser refletido no sentido de que a proposta de resolução de problemas envolve muito mais o compartilhamento da busca por soluções do que as respostas prontas que um profissional possa apresentar.

Eu acho que em termos de porcentagem, 90% do nosso trabalho é resolução de problemas. É o que chega, é o que vem, é a solicitação, a maior parte do nosso trabalho é resolução de problemas (GFIIIFono1).

No meu caso é quase 100% (GFIIIPsico3).

Num primeiro momento, quando você lê que a CCE tem como meta resolver problemas você já pensa alguém falando: vai lá e resolve meu problema, pega o aluno, leva o aluno, entra na minha sala, faz uma intervenção e resolve o problema, porque é você que vai resolver, mas, penso que não é assim. Se você me relata um problema você vai ser parte responsável para resolvê-lo porque não adianta eu ir até o professor

e falar "faça assim". A gente tenta fazer isso, envolver os demais profissionais na escola nas discussões, mas fica tão discreto, tão sutil (GFIIIFono2).

[...] o que traz esse estranhamento na gente sobre resolver problemas não é o fato em si, mesmo porque a gente faz isso, mas é o fato de colocar essa resolução nas mãos de outra pessoa, nesse caso, nas nossas mãos. Eu gosto da palavra corresponsáveis. Eu fico preocupada quando as coisas ficam nas mãos de uma única pessoa (GFIIIPsico2).

A proposta apresentada pela CCE é que, após identificado algum problema, os profissionais envolvidos com a escola, organizem-se e juntos analisem a situação, por diferentes perspectivas, trazidas pelos diferentes olhares que cada profissional traz para a discussão. Depois, tracem caminhos que consideram relevantes para enfrentar a situação. Esses caminhos envolvem a corresponsabilidade de todos os envolvidos, desde o planejamento até a avaliação do sucesso ou do fracasso dos caminhos definidos.

É recorrente o uso por parte dos profissionais da palavra "apagar incêndio", o que acaba sendo um dos prejuízos que a equipe tem no cumprimento das atividades programadas. A resolução de problemas escolares é a primeira meta da CCE (KAMPWIRTH, 2003), sem que isso signifique “apagar incêndios”, “solucionar emergências”, “atender alunos” ou mesmo “diagnosticar”, pois o processo não se encaminha pelo viés remediativo, outrossim, integra-se às demandas e dificuldades da escola, buscando soluções pelos seus próprios agentes, num processo mediado pelos especialistas que contribuem com conhecimentos especializados em direção a um problema educacional (DETTMER; THURSTON; DYCK, 2005).

A relação estabelecida entre resolver problemas e atender emergências parece ser um fator que intensifica esse entendimento unilateral e se configura como um fator relevante que parece interferir significativamente nas ações programadas pelos profissionais da equipe, principalmente, nas propostas desenvolvidas pelos profissionais da psicologia. Essas interferências envolvem, em grande parte, a solicitação da gestão para intervenção em situações que ocorrem no momento, como a presença de pais que não estavam agendados, reuniões não programadas com Conselho Tutelar, como “alguma emergência com alguma criança ou alguma mãe que precisava falar comigo e era meu horário em sala de aula. Nesse momento surge uma tensão: eu atendo a mãe que está precisando ou atendo a sala como estava combinado?” (GFIVFono1).

Há também situações em que as "intervenções em sala de aula são programadas, mas nem sempre efetivamente estamos na sala de aula. O termo programado é o mais correto porque nem sempre estamos lá" (GFIIIPsico1). Encontramos outra situação que, prevendo situações como essas, a organização do trabalho reflete "poucas ações programadas, porque eu tenho que estar aberta para as emergências" (GFIIIPsico1).

Encontramos nos excetos descritos acima duas situações que envolvem as emergências na escola e demonstram a dificuldade em estabelecer rotina de trabalho e cumpri- -la. A primeira retrata a dificuldade em manter a programação das ações que planejam (intervenções em sala, o horário de planejamento com o professor, o agendamento dos pais, triagens), em razão das solicitações para atender situações inesperadas (solicitações da gestão quanto à indisciplina, relatórios, pais não agendados, reuniões não programadas, mudança no planejamento da sala de aula, passeios extraclasse não comunicados aos especialistas).

A segunda situação descrita pelos profissionais é que, sabendo da existência dessas emergências, deixam janelas em seus horários para atender a esse tipo de demanda, pois já sabem que existem, o que sugere que o impacto não deveria ser tão significativo, uma vez que eles se programam considerando essas emergências.

Entendemos que, se há um planejamento prévio e definido das ações, ele deve direcionar o trabalho, assim como a organização proposta deve ser respeitada pois, ao intensificar a resolução de problemas como fruto das emergências, as intervenções programadas ficariam comprometidas, e, consequentemente, os resultados desse planejamento.

Kampwirth (2003) aponta que a resolução de problemas escolares está voltada a identificar as necessidades da escola e de seus grupos, especialmente do professor. Esta identificação deve ter como base as declarações deste profissional. No entanto, Jordan (1994) alerta para a possibilidade de professor considerar apenas as observações imediatas que recolhe em sala de aula, enquanto que, a fonte dos problemas pode ser resultado de situações que extrapolam as primeiras observações, como por exemplo a tolerância do professor, as pressões e dificuldades familiares, as falhas na alfabetização, etc.

Nesse momento o olhar de outros profissionais é fundamental, pois após identificada a demanda inicial, o olhar multidisciplinar para a sala de aula e para escola pode aumentar as chances de acerto quanto à identificação das dificuldades que emergem desse espaço e as soluções mais propícias ao sucesso. No entanto, é preciso que esses profissionais estejam focados mais nessas demandas, do que nas situações cotidianas da escola, especialmente aquelas advindas da gestão escolar.

Embora o grupo tenha discutido que o ato de resolver problemas também gera reflexões, não se identificou entre eles uma relação direta e consequente, pois a resolução de problemas pontuais e recorrentes não está necessariamente relacionada à reflexão e pode tornar- -se um ato mecânico em que se busca remediar o fato, mas não conhecer e prevenir as causas que levaram àquela situação, concluindo-se que estão correlacionados, mas não são consequentes.

O planejamento das ações da equipe na escola e o cumprimento a esse planejamento são necessários nesse caso, tanto do planejamento de cada área, com suas ações definidas, quanto ao planejamento das ações conjuntas do grupo escolar (equipe multiprofissional, professores, gestão).

Nesse caso, deve servir como direcionador do trabalho, assim como a organização desse planejamento deve ser respeitada, pois ao se intensificar a resolução de ações pontuais como foco do tempo na escola, as intervenções programadas ficam prejudicadas e o processo sistemático de acompanhamento fica comprometido. Os processos de reflexão que essas situações podem provocar ficam empobrecidos, podendo não refletir mudanças e ainda retornar em forma de frustração por não serem identificadas transformações permanentes que demonstrem resultados efetivos.

Este fator, identificado neste contexto como uma dificuldade no trabalho da equipe, suscita o entendimento de que o trabalho desses profissionais na escola pode ser aperfeiçoado e que a atuação não reside em identificar problemas, mas em contribuir na análise desses problemas.

7.3.2 A Importância da Definição de Papéis para Realização do Trabalho.

Wood (1998) alerta para os perigos de situações como a indefinição ou a duplicação de papéis em propostas que envolvem diferentes campos do saber e profissionais atuando juntos. A possibilidade de gerarem relutância e pouca adesão dificultam a aceitação e a efetividade das ações propostas.

Os relatos apresentados a seguir demonstram que a dificuldade na definição de papéis na escola e do que seria responsabilidade de cada um (professor, especialistas e gestão) pode ser um fator complicador na atuação da equipe. Isso pode ocasionar a fragmentação das ações, dificultar o alcance dos objetivos, gerando e acentuando os conflitos entre o que "devo fazer e o que não devo fazer", o que "cabe a mim e o que cabe ao outro",

A dificuldade em definir os papéis durante o trabalho em equipe não é só do professor. É da gestão, dos outros profissionais da escola e até nossa. Quando eu insisto em fazer aquilo que não é meu, da minha competência, temos a dificuldade de assumir nosso papel. Se eu estou o tempo todo fazendo uma algo que sei que não é minha função eu estou falhando (GFIIIEPsico1).

Por exemplo, eu acho que o meu papel não é dar aula. Na minha profissão eu escolhi não ser professora. Mas cada um assumir seu papel é difícil, leva um tempo para identificar essas diferenças. O que fica claro é que quando traço objetivos para o trabalho e não vejo resultado, muitas vezes paro para analisar e vejo que não atingi

porque a atuação não deveria ser minha, mas do professor (GFIIIFono2).

Em alguns momentos eu acho difícil delimitar o papel que é nosso do papel da coordenação. Normalmente quando vou orientar um professor sempre converso com a coordenadora antes porque ficar dando dicas de estratégia pedagógica entra em conflito com o papel da coordenação (GFIVfono2).

Em sua pesquisa sobre coensino, ao abordar a definição de papéis entre os professores do ensino regular e os professores da educação especial, Vilaronga (2014) aponta que quando coexistem diferentes profissionais trabalhando no mesmo contexto, a comunicação é fator fundamental para a definição e entendimento dos objetivos e das estratégias do trabalho a ser desenvolvido. A prática de conversar, discutir e definir conjuntamente o mesmo objetivo, evita que trabalhos paralelos aconteçam no mesmo espaço. O trabalho conjunto modifica as práticas.

Essas definições devem partir do conjunto de profissionais, em um verdadeiro trabalho de equipe. Nesse contexto em que um trabalho se inicia, mais importante que discutir de quem é a responsabilidade, é pensar o que será feito, quais os objetivos se pretende atingir, quais as metodologias e estratégias mais adequadas e onde se quer chegar (VILARONGA, 2014, p. 99).

Para Idol, Nevin, Paloucci-Whitcomb (2000), determinar os papéis e responsabilidades dos membros de um grupo é a primeita etapa num processo de CCE. Depois que os colaboradores se conhecem é que se deve proceder a discussão inicial dos problemas a serem abordados.

Para Wood (1998) essa inter-relação entre profissionais objetiva diminuir a existência de divisões de papéis, favorecer a divisão de conhecimentos e experiências em estratégias e intervenções e instruções adequadas. No entanto, fatores como saber o modo de utilizar o conhecimento e a experiência existente de cada um, não favorecendo o conhecimento de um profissional em restrição ao de outro e identificar as próprias dificuldades em definir o próprio papel, são grandes desafios.