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As origens da luta contra a E/MGF podem situar-se logo em 1948 com a De- claração Universal dos Direitos do Homem, embora a problemática da E/MGF só tenha sido abordada pela primeira vez pela Comissão de Direitos Humanos em 1952. Seguidamente, a OMS organizou uma campanha mundial contra a prática e um primeiro seminário sobre os efeitos da mesma. O Decénio da Mulher foi insti- tuído entre 1975-1985 e, durante esse período, a OMS organizou um seminário em Cartum (1979), onde se definiu claramente a política de luta contra a E/MGF. Tam- bém em 1979 foi estabelecida a Convenção para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Contra as Mulheres (CEDAW), comummente designada como “Carta dos Direitos Fundamentais das Mulheres”, que apela aos Estados para alterarem modelos de comportamentos socioculturais no sentido de eliminarem práticas e costumes que podem colocar em causa a vida humana, ou criar outros problemas que deles possam advir.

A Conferência sobre as Mulheres ocorreu em Copenhaga (Dinamarca) em 1980, incidindo sobre as práticas tradicionais nefastas à saúde da mulher. Em 1984 a ONU cria em Dacar o Comité Inter-africano (CI-AF) sobre as práticas tra- dicionais nefastas e prejudiciais à saúde da mulher e da criança, como forma de sensibilizar as autoridades e as populações locais para o tema e para a necessi- dade de tomar medidas que as erradiquem. Uma vez que a E/MGF afeta essen- cialmente crianças, importa referenciar a Convenção sobre os Direitos da Criança

1 N.T.: Fanateca é o nome dado às excisadoras na Guiné-Bissau; o nome está associado ao fanado,

(CDC), adotada em novembro de 1989 pela Assembleia Geral das Nações Unidas, a Carta Africana para o Bem-Estar das Crianças e a Carta Africana da Juventude; estes documentos estabelecem claramente a necessidade de os Estados membros se comprometerem no respeito pelos direitos das crianças e prevê igualmente que os Estados adotem medidas eficazes e adequadas no sentido de abolir práti- cas tradicionais prejudiciais à saúde das crianças.

Em 1991 realizou-se um seminário regional no Burquina Faso e no Sri Lanka com o objetivo de associar essas práticas à violação dos direitos humanos. Em 1994 a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), no Cairo, recomendou aos governantes dos países praticantes que interditassem a prática.

A IV Conferência Mundial de Beijing, em 1995, foi o início de um consenso entre as associações femininas do Norte e do Sul para a interdição da E/MGF. A sua plataforma de ação (também de 1995) apela claramente aos Estados para aprovarem e fazerem aplicar legislação que permita a eliminação de todas as práticas e dos atos de violência contra as mulheres, tais como a MGF.

Em 1997, três agências das Nações Unidas (OMS, UNICEF e FNUAP) elabora- ram conjuntamente um Plano de Ação de dez anos, que teve como objetivo prin- cipal uma diminuição notável da prática de E/MGF e a sua eliminação ao longo de três gerações; a sua plataforma recomenda a criação de comités nacionais para o abandono da prática nos diferentes países. Nos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), adotados pela Assembleia Geral das Nações Unidas no ano 2000, a questão da E/MGF encontra-se implicitamente no Objetivo 3 referente à igualdade de género, assim como nos Objetivos 4 e 5, cujos princípios orienta- dores se baseiam essencialmente na redução da mortalidade materna e infantil.

Em 2003, a Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas aprova a Resolução nº 2003/28, proclamando o dia 6 de fevereiro como o Dia Internacional da Tolerância Zero contra a E/MGF.

Em 2008 foi publicada pela OMS uma Declaração conjunta, assinada pelas dez agências da ONU que condenam a prática e que estão a apoiar ações que conduzem ao abandono da mesma: OMS, FNUAP, UNICEF, UNIFEM, UNESCO,

PNUD, UNAIDS, UNECA, EACDH e ACNUR. Nessa Declaração recomenda-se que as ações e intervenções a tomar sejam multissectoriais, sustentadas, contínuas e conduzidas pelas próprias comunidades. Importa aqui também recordar a cam- panha do Secretário-geral das Nações Unidas para pôr fim à Violência Contra a Mulher, iniciada em março de 2008, bem como as Resoluções da Comissão sobre a Condição da Mulher, adotadas na sua 51ª e 52ª sessões, dedicadas à eliminação da E/MGF, e a Recomendação Geral nº 14 da Convenção sobre a Eliminação de

Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher. Ainda em 2008, o FNUAP e a UNICEF assinaram o chamado Programa Conjunto para o Abandono da E/MGF, programa esse que beneficia 17 países africanos, entre os quais a Guiné-Bissau.

A 20 de dezembro de 2012, a terceira comissão da Assembleia Geral das Na- ções Unidas aprova, por unanimidade, a Resolução 67/146, e em 2014 a Resolu- ção 69/150, que têm como objetivo específico persuadir os Estados-membros a “intensificar a ação mundial para eliminar as práticas de E/MGF”.

No que se refere ao Conselho da Europa, deve salientar-se a Resolução so- bre as Mutilações Genitais Femininas de 12 de abril de 1999 e a Recomendação do Conselho de Ministros aos Estados-membros sobre a proteção das mulheres contra a violência, assim como a Resolução sobre a MGF 2001/2035 (INI) do Par- lamento Europeu.

No quadro do Acordo de Cotonou, celebrado no ano 2000 e que regula as relações dos 27 Estados-membros da União Europeia com os 79 países de África, Caraíbas e Pacífico, incorporou-se nesse acordo um compromisso contra as prá- ticas de E/MGF.

Em 22 de julho de 2014 foi realizada uma Cimeira Mundial em Londres de- nominada “Cimeira das Raparigas” com o objetivo de “criar uma aliança em torno de um movimento à escala mundial para pôr fim aos casamentos infantis e às práticas de mutilação genital feminina”.

Sendo uma realidade muito enraizada no continente africano, por motivos relacionados com as tradições e costumes locais, importa salientar a Carta Africa- na dos Direitos Humanos e dos Povos de 1981 e o seu Protocolo sobre os Direitos das Mulheres, adotado em Maputo (Moçambique) a 11 de julho de 2003, que constituem documentos de referência onde são salientados o respeito pela vida e pela integridade física e moral da pessoa humana, reforçando que todas as for- mas de tratamento cruéis, desumanos ou degradantes são interditos.

Em julho de 2011, na Cimeira da União Africana em Malabo, os chefes de Estado africanos adotaram uma importante decisão solicitando à Assembleia Geral das Nações Unidas a adoção de uma resolução interditando a prática de Mutilação Genital Feminina no mundo, solicitação essa que foi aceite através da Resolução 67/146 das Nações Unidas.

Em dezembro de 2005 em Dacar foi adotada pelos parlamentares africanos a Declaração Final da Conferência Parlamentar Africana sobre a Violência contra as Mulheres, com maior realce para o Abandono das Mutilações Genitais Femi- ninas e o papel dos parlamentares nacionais a esse propósito. De salientar ainda a introdução da temática como crime contra a humanidade pela Amnistia Inter- nacional.