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PARTE I – ENQUADRAMENTO TEÓRICO

CAPÍTULO 1. A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA: CONCEPTUALIZAÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO DO FENÓMENO

3. Resultados da investigação internacional e nacional sobre o fenómeno da violência doméstica

3.2. Resultados da Investigação Nacional

Em relação aos contributos a nível nacional sobre o fenómeno da violência doméstica importa salientar o papel, a partir da década de 80 do século XX, das mais variadas organizações da sociedade civil (e.g. associações de mulheres), que procuraram desde sempre intervir diretamente com as mulheres vítimas e fomentar/desenvolver uma intervenção em rede com as mais diversas estruturas públicas, segundo uma lógica de proximidade na prevenção e combate a este fenómeno da violência doméstica (AR, Resolução do Conselho de Ministros n.º 102/2013). O tema da violência contra as mulheres ganhou relevo ao deixar de ser um tema privado e passar a ser público, através da implementação de medidas, de políticas sociais e da produção de legislação adequada (Dias, 2010).

O movimento feminista contribuiu também para a perceção deste fenómeno a nível nacional, apesar de durante muito tempo se ter afirmado que não existiu movimento feminista em Portugal. Nomes como o de Maria Lamas ou Elina Guimarães, ou de associações como a Liga Republicana das Mulheres Portuguesas ou do Conselho Nacional das Mulheres Portuguesas, são alguns dos exemplos do trabalho desenvolvido e das mulheres que lutaram pelos direitos de outras mulheres aos mais diversos níveis (Dias, 2010).

A investigação realizada sobre o fenómeno da violência doméstica em Portugal tem demonstrado ser primordial devido aos temas estudados e às novidades que têm trazido para a sociedade:

“É certamente, graças ao desenvolvimento da investigação nesta área – que muito contribuiu para o aumento da visibilidade do problema social e para a consequente sensibilização da sociedade – que se devem os recentes avanços sentidos na legislação portuguesa, nomeadamente, quanto à configuração da violência doméstica como crime público.” (Barroso, 2007, p.36).

Uma das investigadoras pioneiras acerca deste fenómeno foi Luísa Ferreira da Silva, em 1989. A sua obra apenas é editada no ano de 1995, ficando conhecida através do título Entre marido e mulher alguém meta a colher (Dias, 2004). Nesse mesmo ano surge o primeiro Inquérito de Vitimação em Portugal, sendo o grande objetivo a

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estimativa do volume de incidentes criminais de sobreviventes de uma dada população durante um determinado período de tempo (Almeida, 1998, citado por Costa, 2005).

No ano de 1997, Nelson Lourenço, Manuel Lisboa e Elza Pais realizaram o estudo

Violência contra as Mulheres, em que procuraram estudar os atos de violência mais

frequentes contra as mulheres e os comportamentos das mulheres face à agressão, as suas representações sobre a violência, bem como a realização de uma caracterização dos agressores. Este estudo veio a ser um importante elemento de diagnóstico para a Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres (CIDM), atualmente substituída pela CIG (Dias, 2004).

O primeiro Inquérito Nacional Violência contra as Mulheres, datado de 1995, surgiu na sequência da realização de vários estudos sobre violência contra as mulheres, permitindo ter a primeira visão global da prevalência do fenómeno da violência contra as mulheres a nível nacional. Através de um novo inquérito por questionário sobre a violência de género foi possível realizar uma análise comparada ao fenómeno (ano de 2007) com o Inquérito Nacional Violência de Género (Lisboa e colaboradores, 2009).

Dias (2004) dá-nos a conhecer outros estudos realizados sobre a temática como, por exemplo o trabalho de Pais (1996), intitulado Rupturas violentas da conjugalidade:

Os contextos do homicídio conjugal em Portugal, no âmbito do qual foram analisados os

contextos conjugais da violência de acordo com os condicionalismos sociais em que é produzida. A autora conclui que existe uma tipologia do homicídio conjugal. Um outro autor, Casimiro (1998), no estudo Representações Sociais da Violência Conjugal, procurou analisar os discursos de mulheres casadas ou com uma relação conjugal, com filhos pequenos, pertencentes a diferentes classes sociais e que vivessem em meio urbano. O seu objetivo era perceber quais as representações que construíam sobre a violência doméstica, bem como o modo como viviam a conjugalidade. Em 2002, a investigação de Antunes, intitulada de Violência e vítimas de crimes em contexto doméstico, deu a conhecer a realidade da violência doméstica em Portugal e medidas legais implementadas (Dias, 2004).

Mais recentemente, destacamos o estudo de Duarte (2014) intitulado Para um

Direito sem Margens: representações sobre o Direito e a violência contra as mulheres,

e ainda o de Martins (2015), intitulado Dar voz às mulheres vítimas nas relações de

intimidade: perceções sobre a (re)construção do projeto de vida – enredos e atores.

A definição de conceitos, perceção do ciclo de violência, enquadramento legal e jurídico, apresentação de dados sobre o fenómeno da violência doméstica ou as várias

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explicações da predominância das mulheres enquanto vítimas de violência doméstica são alguns dos temas abordados em relação ao fenómeno da violência doméstica. Os fatores/motivos explicativos da violência doméstica, principalmente na área da Psicologia, ou a perceção dos fenómenos culturais associados à violência doméstica, de acordo com as relações de poder entre homens e mulheres são ainda outros temas presentes nas investigações nacionais (Soares & Cláudio, 2010).

As diferentes formas de violência, os perfis dos agressores e vítimas, a perceção dos principais fatores que levam a que as mulheres continuem a viver com os agressores ou os mitos construídos socialmente em torno das famílias são também temas abordados em contexto de investigação nacional (Dias, 2004, 2010). A maioria das investigações realizadas são em áreas como a psicologia, sociologia e saúde, em que são investigados casos específicos, mas também nas áreas das ciências sociais, focadas, por exemplo, nas questões de género (Schraibera, d`Oliveira, França-Junior & Pinho, 2002; Dias, 2004, 2010; Souza, Ribeiro, Penna, Ferreira, Santos & Tavares, 2009).

Globalmente, percebemos que as investigações realizadas a nível académico, ainda escassas, têm vindo a dar a conhecer a situação de vulnerabilidade a que as vítimas estão expostas. Apesar do impacto e do contributo, consideramos que existe ainda um longo caminho a percorrer.

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