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3.4 Das modalidades de substituição – regressiva, progressiva e retenção na fonte

3.4.2 Retenção na fonte

No que tange à retenção na fonte, por sua vez, boa parte da doutrina alega inexistir uma efetiva substituição tributária porque haveria apenas um dever administrativo do “agente de retenção”. 208

Paulo de Barros Carvalho expõe o posicionamento de que a relação que se verifica entre a pessoa que retém o tributo e o Fisco não ostenta natureza tributária. Não haveria, portanto, na hipótese de retenção na fonte, uma modalidade de substituição tributária.

208 Cf. HELENO TORRES. Op. cit.,; RENATO LOPES BECHO. Op. cit., p. 122; MISABEL DERZI; Direito

Tributário Brasileiro. Aliomar Baleeiro. 11. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998; PAULO DE BARROS CARVALHO. Teoria .... p. 89, nota 48; SACHA CALMON NAVARRO COELHO. Manual... p. 389; LUIS CÉSAR SOUZA DE QUEIROZ. Sujeição passiva... p. 200; PAULO AIRES BARRETO. Imposto de Renda... p. 781.

Não cremos existir relação jurídica tributária entre a União e a empresa que retém, mas tão-somente uma obrigação estabelecida pelo legislador federal, com a finalidade de facilitar o cumprimento da prestação, a cargo do verdadeiro sujeito passivo (a pessoa física que teve parte de seu dinheiro retida na fonte pagadora). E por isso que é dever, de conteúdo patrimonial, há penalidades pecuniárias que garantem ao Estado o cumprimento dessa prestação por parte das pessoas jurídicas que devam promover a retenção.

É curioso notar que quase todos os autores se referem a esse tipo de vínculo como sendo de índole tributária.209

Sacha Calmon também comunga do entendimento de que a retenção não representa um modal de substituição tributária, criticando a posição dos autores que o defendem.

Convém repassar o enfoque ha pouco adotado sobre os esquemas de sujeição passiva tributária. Para nós, a sujeição passiva é direta e indireta. A direta ocorre em razão de fato gerador próprio ou alheio. A indireta dá-se por transferência do dever de pagar em razão de sucessão causa mortis ou inter vivos, ou por sub-rogação legal de terceiros (responsáveis). O que retém tributos não é sujeito passivo. É um sujeitado à potestade do Estado. O seu dever é puramente administrativo. Fazer algo para o Estado, em nome e por conta do Estado. Noutras palavras, o dever do retentor de tributos é um dever de fazer: fazer a retenção.210 (Grifos nossos).

Heleno Taveira Torres, muito embora adotando o nomes juris de substituição para a operação que envolve a retenção do tributo a cargo do terceiro responsabilizado, entende, contudo, que este dever ostenta natureza meramente formal, destinada a facilitar o trabalho de arrecadação estatal.

Agente de retenção é o sujeito que fica “no lugar” do contribuinte, pagando o tributo em nome deste, porque assim dispôs a lei, mesmo sem guardar qualquer relação pessoal ou material com o fato jurídico tributário. Trata-se de um “intermediário” legalmente interposto para os fins de arrecadação tributária, suportando uma obrigação tributária acessória, meramente de natureza formal, relativamente à entrega do dinheiro ao Estado, como um fazer algo no interesse da arrecadação e da fiscalização.

[...]

Tal substituição consiste apenas em uma singular estrutura de arrecadação do tributo (relação de dever instrumental), pela substituição do sujeito passivo real (previsto na legislação relativa ao tributo devido como sendo um contribuinte do mesmo) por um outro sujeito passivo, apenas para os fins de arrecadação, haja vista sua particular situação em relação ao fato gerador do tributo.211

209 CARVALHO, Paulo de Barros. Teoria ... p. 89, nota 48. 210 COELHO, Sacha Calmon Navarro. Manual... pp. 389-390. 211 TORRES, Heleno Taveira. Op. cit.,

Renato Lopes Becho é enfático em afirmar o equívoco da doutrina que classifica a retenção como hipótese de substituição tributária.

Pois bem. A doutrina, no mais das vezes, tem apontado, como vimos, essa sistemática como sendo a substituição tributária. Entendemos que a sistemática da retenção na fonte não seja um exemplo de substituição tributária. Abstraindo-se do texto legal, procurando compreendê-lo sistematicamente, acreditamos que a retenção na fonte transforma o retentor (substituto, para a doutrina acima) em sujeito ativo auxiliar, nunca em sujeito passivo.212

Paulo Aires Barreto é signatário do entendimento de que o dever de retenção na fonte decorre de uma relação de natureza administrativa:

Segundo nosso entendimento, na sistemática de retenção na fonte, coexistem duas normas jurídicas e, por conseguinte, duas relações jurídicas distintas: uma de cunho tributário, que se instala entre o contribuinte (pessoa fisica ou jurídica que auferir a renda) e a União, que se faz representar pelo substituto; e outra de cunho administrativo, que vincula o substituto à União, por meio da qual o substituto fica obrigado a entregar aos cofres públicos os recursos retidos do contribuinte. Nesta última, atua o substituto como verdadeiro órgão arrecadador. O montante retido, conquanto permaneça na posse do substituto, pertence ao contribuinte.213

Não parece, porém, que seja assim.

O agente de retenção, verdadeiro substituto tributário, é submetido a uma obrigação como qualquer outro substituto, segundo as premissas adotadas. Ele é um terceiro, vinculado ao contribuinte do imposto ou à própria materialidade, que tem uma obrigação própria instituída em substituição à do contribuinte, mas tendo por base a obrigação do substituído.

O que demonstra que essa obrigação se encaixa no conceito adotado é principalmente o fato de que a retenção depende e se submete ao regime jurídico do substituído. Assim, ao promover a retenção, o agente irá calcular o valor a reter de acordo com as normas que fixam a obrigação do substituído.

Na verdade, a particularidade que identifica a retenção na fonte ante as outras modalidades de substituição é simplesmente o fato de que esta se dá concomitantemente à ocorrência do fato jurídico tributário. Não há, como na substituição regressiva, postergação da obrigação para um momento posterior, nem a sua antecipação, tal como ocorre na progressiva. Dentre as modalidades adotadas, é a mais simples e, digamos assim, a que

212 BECHO, Renato Lopes. Op. cit., p. 122.

melhor expressa o fenômeno da substituição, porque procura traduzir apenas e tão somente a opção do legislador por um sujeito passivo em detrimento de outro. Nas demais modalidades, a substituição vem acompanhada da alteração substancial de outros dados da obrigação, tais como a postergação da obrigação, sua antecipação, ou mesmo a presunção da base de cálculo. Isso não quer dizer que nessa modalidade o valor recolhido pelo substituto seja idêntico ao que seria devido pelo substituído. No caso, por exemplo, da retenção do imposto de renda na fonte do salário dos empregados, o valor retido não é o efetivamente devido pelo empregado nem a título de recolhimento mensal. Basta que ele tenha outras fontes de renda e o valor que ele deverá recolher no mês será diverso. Nesses casos, aliás, a retenção é feita com base em estimativa do valor devido pelo substituído.

Há uma nítida diferença entre a substituição tributária progressiva e a retenção porque, no primeiro caso, há a presunção da própria ocorrência do fato jurídico tributário e, no segundo, o fato tributário já é conhecido – no caso analisado, a renda. No caso de tributação exclusiva na fonte, instituto previsto na nossa legislação de imposto de renda214, com a retenção terá havido a extinção definitiva da obrigação tributária do próprio substituído. Isso não quer dizer, porém, que a relação entre o substituído e o Estado é irrelevante, pois, caso o substituído seja imune a tal tributação, por exemplo, não deverá se submeter a essa retenção.

Na maioria dos casos, entretanto, como a materialidade (auferir renda) promovida pelo substituído depende de uma série de fatores que não somente aquela renda específica, o

214 Título I

TRIBUTAÇÃO NA FONTE Capítulo I

RENDIMENTOS SUJEITOS À TABELA PROGRESSIVA Seção I

Incidência

Disposições Gerais

Art. 620. Os rendimentos de que trata este Capítulo estão sujeitos à incidência do imposto na fonte, mediante aplicação de alíquotas progressivas, de acordo com as seguintes tabelas em Reais:

I II

§ 1º O imposto de que trata este artigo será calculado sobre os rendimentos efetivamente recebidos em cada mês, observado o disposto no parágrafo único do art. 38 (Lei nº 9.250, de 1995, art. 3º, parágrafo único).

§ 2º O imposto será retido por ocasião de cada pagamento e se, no mês, houver mais de um pagamento, a qualquer título, pela mesma fonte pagadora, aplicar-se-á a alíquota correspondente à soma dos rendimentos pagos à pessoa física, ressalvado o disposto no art. 718, § 1º, compensando-se o imposto anteriormente retido no próprio mês (Lei nº 7.713, de 1988, art. 7º, § 1º, e Lei nº 8.134, de 1990, art. 3º).

§ 3º O valor do imposto retido na fonte durante o ano-calendário será considerado redução do apurado na declaração de rendimentos, ressalvado o disposto no art. 638 (Lei nº 9.250, de 1995, art. 12, inciso V). BRASIL. Decreto nº 3.000, de 26 de março de 1999. Disponível em: < http://www.receita.fazenda.gov.br/Legislacao/rir/Livro3.htm>. Acesso em: 2 set. 2009.

valor retido acaba não sendo – ou pode acabar não sendo exatamente o devido pelo contribuinte.

O que importa é que a atribuição de uma obrigação a uma pessoa que tenha vinculação com a materialidade ou com o contribuinte de um determinado tributo para, nos termos da legislação tributária, reter um determinado valor desse contribuinte e posteriormente recolher ao Fisco, configura modalidade típica de substituição tributária.