• Nenhum resultado encontrado

Revistas em objetos pessoais e armários

No documento MESTRADO EM DIREITO DO TRABALHO (páginas 132-139)

3. A REVISTA COMO FORMA DE EXERCÍCIO DO PODER DE

3.2 Revistas em objetos pessoais e armários

Detectamos no decorrer de nossa pesquisa que à prática de revistas em objetos pessoais e armários dos empregados não é dada a importância merecida. Muitos autores nem mesmo tocam no assunto e a jurisprudência é quase silente.

298

Sandra Lia Simón é uma das poucas autoras que trata do tema. Em sua opinião “da mesma forma que o direito de propriedade não autoriza que o locador adentre no imóvel alugado, o empregador não poderá fiscalizar, sem o consentimento do empregado, esses bens e locais. Trata-se de dar nova dimensão à noção constitucional de domicílio, que é ampla e não pode ser confundida com uma mera conceituação teórica, pois a sua essência concentra- se na função que representa para o indivíduo”299.

Para Sandra Lia Simón a doutrina e a jurisprudência são muito permissivas em relação às revistas em armários e objetos pessoais dos empregados. Para ela, tal permissividade, “além de ser passível das mesmas críticas já apontadas no momento do estudo das revistas pessoais, tem o agravante de que a noção constitucional de domicílio abrange os objetos, bens e locais reservados ao empregado pelo empregador, de maneira que gozam da proteção insculpida no art. 5º, inciso XI, da Constituição Federal. Conseqüentemente, só poderão sofrer revista no caso de flagrante delito ou por determinação judicial”300.

Alice Monteiro de Barros também entende constrangedoras as “revistas nas bolsas, carteiras, papéis, fichários do empregado ou espaços a ele reservados, como armários, mesas, escrivaninhas, escaninhos e outros, que se tornam privados por destinação. A partir do momento em que o empregador

299

A proteção constitucional da intimidade e da vida privada do empregado, p. 149-150.

300

concede aos obreiros espaço exclusivos, obriga-se, implicitamente, a respeitar sua intimidade”301, implicando violação da intimidade do empregado.

Leciona Alice Monteiro de Barros302 que no conceito de objetos do

empregado, inclui-se o veículo do trabalhador, que pode consistir em local adequado para a ocultação de bens da empresa.

Apesar de considerar invasão da intimidade do trabalhador, entende a referida autora que, a revista em objetos pessoais e veículos poderá ser efetuada quando “necessária à salvaguarda do patrimônio do empregador e como medida de segurança dos demais empregados”303.

De forma geral a doutrina pesquisada defende que o poder de fiscalização do empregador deve ser limitado e que, caso seja realmente necessária a prática de revistas em armários, veículos e objetos pessoais dos empregados, recomenda-se que elas ocorram, preferencialmente, na saída do trabalho, sempre mediante um critério objetivo de seleção (não discriminatório) e na presença de um representante dos empregados, ou, na ausência deste, de um colega de trabalho304.

301

Proteção à intimidade do empregado, p. 77.

302

Ibidem, p. 78.

303

Ibidem, mesma página.

304

Defende também que em alguns casos é importante que a revista seja feita por pessoa do mesmo sexo e na presença de colegas do mesmo sexo, de forma que se evitem situações constrangedoras305.

Além disso, assevera Sandra Lia Simón que “a prática da revista desrespeita o princípio da presunção de inocência, insculpido no art. 5º, inciso LVII. Ademais, se aos acusados são assegurados o contraditório e a ampla defesa, nos termos do art. 5º, inciso LV, como excluir da incidência desse dispositivo aos simples “suspeitos”?”306.

Não podemos deixar de ponderar que a intimidade possui várias esferas ou graus. Inegável que a intimidade do empregado deve ser sempre respeitada, porém, ela é diferente em determinadas situações. Quando estamos em nossas casas temos uma expectativa de intimidade, quando estamos na rua outra e no local de trabalho outra diferente.

O empregador tem o poder de direção e fiscalização sobre os empregados e bens da empresa, tendo, em certo ponto, acesso a certa esfera da intimidade do trabalhador, não podendo, diante disso, desrespeitar a dignidade da pessoa humana.

305

Alice Monteiro de Barros, Curso de direito do trabalho, p. 581.

306

Desta forma, a dificuldade que se apresenta “consiste em estabelecer limites entre o direito à intimidade do trabalhador e o direito de dirigir a atividade do empregado, conferido ao empregador pelo art. 2º da CLT”307.

O principio fundamental da dignidade da pessoa humana pode ser usado para se insurgir contra a exigência do empregador para que o empregado cumpra determinações desarrazoadas. No caso concreto, será possível desvendar com clareza e objetividade se a situação enseja ou não ofensa à dignidade da pessoa humana308.

A subordinação do empregado e o poder diretivo do empregador não justificam a invasão da intimidade do trabalhador e o desrespeito à sua dignidade. O que se admite é que os direitos fundamentais sejam modulados de forma a ensejar o correto desenvolvimento da atividade produtiva309.

Interessante que se compatibilizem os avanços da tecnologia com a necessidade de salvaguardar os direitos fundamentais do trabalhador, com a instalação de câmeras ou detectores de metais, por exemplo, a fim de evitar qualquer procedimento que possa, de alguma forma ferir a intimidade do trabalhador, conforme já tratado no item anterior.

Caso não seja possível o alcance de solução por meio da tecnologia, entendemos que a revista realizada em bolsas e sacolas pode ser adotada como procedimento interno na busca da proteção do patrimônio do

307

Alice Monteiro de Barros, Proteção à intimidade do empregado, p. 72.

308

Manoel Jorge e Silva Neto, Direitos fundamentais e o direito do trabalho, p. 23.

309

empregador. Porém, alguns cuidados devem ser tomados para que o ato não configure invasão da intimidade do empregado e desrespeito a sua dignidade humana.

Para tanto sugerimos que as bolsas e sacolas sejam abertas pelo próprio empregado, o mesmo devendo ocorrer no caso de fiscalização de seus armários, gavetas e veículos. O empregador ou seus prepostos não devem tocar nos pertences do empregado.

A revista tem que ser feita em todos os empregados de forma indistinta, somente nos casos em que a empresa tem um número excessivo de trabalhadores é que se tolera que a revista seja feita por meio de sorteio, mas tal sorteio tem que incluir todos os trabalhadores e não só os de nível hierarquicamente inferior, como normalmente ocorre. Não se pode afirmar em momento algum que somente pessoas de menor nível de escolaridade ou financeiro é que levam pertences do empregador. Tal entendimento configura discriminação o que é vedado pela legislação pátria e fortemente combatido em todo o mundo pela OIT.

Não entendemos ser necessário que a fiscalização da forma como sugerida acima seja feita por pessoa do mesmo sexo, uma vez que não se verificará o corpo do trabalhador, mas tão somente seus pertences.

A revista também não pode ser efetuada na presença de clientes do empregador nem de transeuntes das calçadas. Deve ser feita na saída do

trabalho, porém em local reservado. Não vemos nenhum constrangimento no fato das revistas serem procedidas na presença de demais colegas de trabalho, desde que todos sejam submetidos a tal procedimento.

Em qualquer caso, é importante que o trabalho seja visto como fonte de realização do trabalhador seja realização moral, material ou espiritual. O que é inconcebível é que o trabalho seja visto como mero fator produtivo, onde se dá maior importância ao patrimônio do empregador do que à dignidade da pessoa do trabalhador.

4. A REVISTA ÍNTIMA NO DIREITO COMPARADO E

No documento MESTRADO EM DIREITO DO TRABALHO (páginas 132-139)