• Nenhum resultado encontrado

A REVOLUÇÃO RUSSA E AS REPÚBLICAS DA UCRÂNIA E DA BIELO-

1. PROXIMIDADES E DISTANCIAMENTOS: RECAPITULAÇÃO HISTÓRICA DAS

1.5. A REVOLUÇÃO RUSSA E AS REPÚBLICAS DA UCRÂNIA E DA BIELO-

Nas ocasiões em que um império entra em colapso por qualquer motivo, acontece um rearranjo de forças dentro das unidades que anteriormente o constituíam. A perda de poder, momentânea ou definitiva, do Estado imperialista gera períodos de turbulência nas nações dominadas, nas quais é comum virem à tona fortes sentimentos nacionalistas, acompanhados de desejos de autonomia política, de fato e de direito. A história da Rússia e dos Estados que fizeram parte por longos séculos de suas fronteiras imperiais ilustra muito bem tal padrão, repetido sempre que verificado o desfazimento de uma estrutura imperial russa. Na medida em que a Revolução Bolchevique de 1917 significou o desmantelamento da Rússia

imperial dos czares, não causa espécie que nos primeiros anos do que viria a ser a União das Repúblicas Socialistas Soviética (URSS), quando ainda em ebulição a guerra civil, houvesse convulsões internas, bem como tentativas de independência e estabelecimento como Estados de algumas regiões antes dominadas pelo Império Russo. Justamente isso ocorreu com a Ucrânia, que passou por um turbulento período entre 1917 e 1921, no qual foram fundadas duas repúblicas ucranianas distintas. Os efeitos dos acontecimentos na Ucrânia se alastraram a Belarus.

A Revolução de Fevereiro de 1917 intensificou o nacionalismo ucraniano, em movimento liderado pelo historiador Hruchevski. Em março do mesmo ano foi fundado o parlamento (Rada) ucraniano. Depois de negociações com o Governo Bolchevique Provisório de Petrogrado, é proclamada em junho uma república ucraniana autônoma, instituição ainda ligada à Rússia. Um mês após a Revolução de Outubro, em 20 de novembro de 1917, é constituída a República Popular Ucraniana, cujos laços com a vizinha do leste também não haviam sido formalmente desfeitos. Na época, o território ucraniano abrigava um quinto da população da Rússia czarista, além disto, nele estavam localizados os solos mais férteis do império desfeito, bem como a maior parte da indústria metalúrgica e da exploração de minas (LIEVEN, 2002, P. 57). Em função desses fatores, a União Soviética não podia prescindir da Ucrânia. Diante da crescente busca de autonomia ucraniana, os bolcheviques exigiram o realinhamento com a Revolução.

O endurecimento soviético levou o movimento nacionalista ucraniano a procurar ajuda externa, encontrando-a na Alemanha. Sentindo-se protegida, a República da Ucrânia proclamou sua independência total da Rússia soviética em janeiro de 1918, sendo reconhecida como Estado pelos alemães dez dias depois (CARR, 1977, p. 334). No mês seguinte, o governo soviético reconquistou Kiev. O domínio bolchevique durou três semanas, sendo extirpado pelas forças da Rada, secundadas pelos exércitos da Alemanha e da Áustria. Em março de 1918 é assinado o Tratado de Brest-Litvosk, pelo qual a Rússia perdeu os territórios do leste da Polônia, da Ucrânia, da Letônia, da Lituânia e da Estônia, que foram entregues à Alemanha12. O apoio germânico acabou por custar caro aos ucranianos, pois no mês de abril a Rada foi desalojada do poder pelos alemães, que instituíram o governo

12 A perda territorial ocasionou sensível redução do território russo, que ficou mais ou menos com as mesmas conformações que possuía antes das conquistas de Pedro I no ocidente (LIEVEN, 2002, p. 57).

marionete de Hetman Pvlo Skoropadskyi. A linha reacionária pró-germânica e pró- senhores de terra adotada por Skoropadskyi revoltou os camponeses da Ucrânia.

Com a derrota na I Guerra Mundial, a Alemanha foi forçada a assinar um armistício com as potências vencedoras. Entre os deveres germânicos estava a retirada das tropas do território ucraniano. Sem o apoio externo, Skoropadskyi foi retirado do poder pelas forças nacionalistas da Rada. Em fevereiro de 1919, os bolcheviques retomaram Kiev e mantiveram o poder sobre a cidade, salvo por breves períodos de perda de controle, ora para os poloneses, ora para os mencheviques. O movimento nacionalista ucraniano se deslocou, assim, para a porção mais ocidental do país. Em outubro de 1920, a Polônia assinou armistício com os líderes bolcheviques e dispersou as forças nacionais ucranianas de seu território. A perda do auxílio externo acarretou à Ucrânia o retorno ao completo domínio dos bolcheviques no ano de 1921.

Se a queda do império russo gerou a República Popular da Ucrânia, o fim do império dos Habsburgo possibilitou a criação da República Popular da Ucrânia Ocidental, em novembro de 1918. Esta reclamava os territórios da Galícia, Volyn, Transcarpátia e o que hoje são os territórios poloneses de Peremyshyl, Kholm, Pidlachia e a região de Lemko. No mesmo período, a Polônia declarou sua independência. Como havia disputa territorial entre poloneses e ucranianos ocidentais, as duas partes entraram em conflito. No mês de janeiro de 1919, as duas repúblicas ucranianas assinaram acordo, o qual foi meramente formal, pois entre ambas havia diferenças políticas e programáticas. Alguns meses depois, em julho de 1919, a Polônia conquistou a República Popular da Ucrânia Ocidental (WILSON, 2002, p. 127).

Muitos dos fatos acontecidos na Ucrânia nos anos que se seguiram à Revolução de 1917 se repetiram em Belarus, mas com intensidade bem menor, dado que o movimento nacionalista bielo-russo era incipiente e débil. Em agosto de 1917 foi estabelecida no Belarus uma Rada bielo-russa, a qual não obteve reconhecimento dos soviéticos, que a derrubaram e constituíram um Conselho de Comissários do Povo. No mês de fevereiro de 1918, o exercito alemão invadiu Belarus, estabelecendo uma Rada sob seu poder. A derrota alemã na I Guerra Mundial forçou a retirada do invasor germânico no final do mesmo ano, oportunidade na qual os bolcheviques retomaram o poder sobre Belarus.

A escolha posta aos bielo-russos era criar uma república ou serem incorporados à Rússia. Em janeiro de 1919 o Partido Comunista decidiu pela gestação da República Socialista Soviética da Bielo-Rússia (CARR, 1977, p. 346), e no mesmo ano as forças polonesas invadiram a nova república, ocupando até mesmo Minsk. O acordo russo-polaco assinado em 1920, estabeleceu que parte do território bielo-russo ficaria em posse da Polônia.

Ainda que a análise das identidades nacionais como elementos de aproximação e de separação entre os Estados observados seja abordada em momento posterior, convém desde logo ressaltar as claras diferenças entre os movimentos nacionalistas ucraniano e bielo-russo. Enquanto na Ucrânia o sentimento de nação já detinha nível razoável de desenvolvimento, “para os russos brancos, observa um historiador recente, ‘a nacionalidade veio como um presente da Revolução Russa que quase não tinham solicitado’”, pois “os operários e camponeses russos brancos sempre se consideraram uma parte do povo trabalhador da Rússia e apenas uma parte insignificante da inteligentsia pequeno- burguesa russo-branca era partidária da independência” (CARR, 1977, p. 347).

No mês de dezembro de 1922 foi criada a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. Já na sua formação, o Estado soviético contava com as três repúblicas eslavas: Rússia, Ucrânia e Bielo-Rússia. A quarta república fundadora era a da Transcaucásia, que englobava as futuras repúblicas da Geórgia, Armênia e Azerbaijão (SEGRILLO, 2000a, p. 347).

Documentos relacionados