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Riqueza e abundância de aves de sub-bosque florestal

V. 1.2.3.3 U NIDADE C ONTROLE

V.1.2.7. Riqueza e abundância de aves de sub-bosque florestal

Nas seis campanhas em que se desenvolveram as capturas com redes-de-neblina computram- se 178 capturas de 40 espécies em um esforço consolidado de 28.610 m².h. Desse total, anilharam-se 128 indivíduos, 18 foram soltos sem marcação ou por fugirem durante sua manipulação, ou pela ausência de anilhas de tamanho adequado, 25 espécimes foram recapturados e sete exemplares foram coletados (FIGURA V.1.13).

FIGURA V.1.13. Destinação final das aves capturas em redes-de-neblina na Unidade Frente/APP (n = 167) durante o “Programa de monitoramento da fauna de vertebrados terrestres – UHE Mauá”.

Ao se avaliar o número de capturas e recapturas ao longo das campanhas observa-se um significativo aumento nas recapturas na décima campanha (FIGURA V.1.14), indicativo de que parte considerável das espécies que detém territórios na localidade estudada foi amostrada. Durante a 9ª campanha a autorização IBAMA para captura, coleta e transporte de material biológico estava vencida e a equpe não dispôs da renovação em decorrência dos trâmites burocráticos envolvidos, e assim não foi executada amostragem que envolvesse a captura de animais silvestres. Como discutido em tópico anterior, é possível que algumas alterações venham a suceder no decorrer da amostragem, uma vez que para atingir a representatividade adequada da avifauna florestal com este método é necessário dispensar grande esforço de amostragem (Whitman, 2004; Freitas et al., 2007; Magalhães et al., 2007)

FIGURA V.1.14. Número de capturas (porção escura) e recapturas (porção clara) de aves em redes-de-neblina ao longo das campanhas do “Programa de monitoramento da fauna de vertebrados terrestres – UHE Mauá”.

Na linha B foram capturados mais indivíduos, mas menor número de espécies do que na linha A, e embora possa ser a princípio efeito secundário do maior esforço amostral ali despendido, contorna-se este viés e se permite comparação direta pelo cálculo da frequência de captura; este valor, por sua vez, atesta que a frequência de captura na linha B é, de fato, maior do que aquela obtida na linha A (TABELA V.1.5). Outra informação interessante é o número de recapturas em cada uma das linhas. Na linha B houveram até então 15 recapturas (15,2% das capturas), ao passo que em A foram apenas 6 recapturas (9% das capturas).

TABELA V.1.5. Síntese da amostragem com redes-de-neblina comparando os resultados obtidos entre as linhas A e B nas campanhas do “Programa de monitoramento da fauna de vertebrados terrestres – UHE Mauá”.

Linha Esforço (m².h) Capturas Recapturas Riqueza Frequência de captura (.10-3)

A 13.454 74 7 29 5,5

B 15.102 104 18 26 6,9

De modo geral, a partir dos resultados obtidos, pode-se inferir que o ambiente amostrado pela linha B é utilizado de forma diferente daquele representado pela linha A. Esta, por se tratar de área de encosta com sub-bosque denso pela grande representatividade de cipós e taquarais, pode ser nicho de poucas espécies, mas utilizado para deslocamento e forrageio por muitas, potencial explicação para o menor número de capturas, mas maior riqueza. O microhábitat de B, onde o sub-bosque é mais aberto e há maior número de árvores com maior diâmetro e maior cobertura do dossel, é possivelmente utilizado para estabelecimento de territórios ou porções fixas da área de vida de algumas aves, talvez influenciando o maior número de recapturas. Em última instância, no entanto, estas conclusão são essencialmente especulativas e devem ser avaliadas com cautela, pois a causalidade do fenômeno supracitado pode ser decorrente das diferenças na capturabilidade das aves.

A diferença na estrutura da vegetação entre as duas linhas de captura é marcante, por sua vez decorrente do fato da linha A estar instalada na encosta íngreme da unidade amostral, e a linha B alocar-se em maior proximidade da planície aluvial do Rio Tibagi. Algumas diferenças fitoestruturais importantes são a cobertura do dossel, a forma de vida dominante do sub- bosque (p. ex. densidade de herbáceas, adensamentos de taquarais, samambaias), abundância de ramos no sub-bosque, entre outros. Além de influenciar diretamente a composição da avifauna que ocupa estes dois microambientes, através do uso de hábitat e estratificação diferenciado das espécies, todas estas características influenciam na capturabilidade das aves por afetarem diretamente a percepção destas à presença da armadilha, seja a incidência de luz sobre as redes, seja a presença de poleiros nas suas imediações, facilitando a evasão dos pássaros (Mallory et al., 2004).

As espécies com maior número de capturas são T. rufiventris (n = 19), Turdus albicollis (n = 18),

Chiroxiphia caudata (n = 13), Tachyphonus coronaus e Conopophaga lineata (ambas n = 9). À

alterações ambientais. No entanto, figuram entre as espécies com razoável número de capturas Hemitriccus diops (n = 6), Xiphorhynchus fuscus (n = 6) e Habia rubica (n = 5), considerados altamente sensíveis e proximamente relacionados a microhábitats particulares, encontrados usualmente em florestas melhor conservadas (Parker et al., 1996; Aleixo, 2001). Dez outras espécies capturadas nas redes também apresentam alta sensibilidade à degradação ambiental: Phaethornis eurynome, Nonnula rubecula, Pteroglossos bailloni, Batara cinerea,

Mackenziaena severa, Drymophila ochropyga, Grallaria varia, Sclerurus scansor, Campylorhamphus falcularius, Philydor lichtensteini e Onychorhynchus swainsoni. Ao todo,

táxons sensíveis representam cerca de 38% das espécies contempladas por nossa amostragem.

É interessante mencionar as observações avifaunísticas que seguiram a supressão da vegetação exótica em áreas da KLABIN dentro da área do reservatório. Durante, e pouco após, o impacto pontual nas imediações de nossa área de estudo observaram-se alterações sensíveis em alguns grupos de aves na captura com redes-de-neblina. Pôde-se registrar e capturar, por exemplo, uma rara espécie da região, a maria-leque (Onychorhynchus swainsoni), além da captura tanto em armadilha fotográfica, quanto em rede de neblina, da juruva (Baryphthengus

ruficapillus), mais comum em áreas próximas ao rio em contraposição às encostas. Pouco

tempo depois, mesmo em buscas mais intensas não foi possível registrá-las novamente. Embora não possa se dizer conclusivamente que esses exemplares foram afugentados pela perturbação local e terem, posteriormente, se deslocado para outras regiões não se estabelecendo em nosso ponto amostral, é um indicativo de três fenômenos de grande interesse no que concerne às respostas da fauna ao desmate vindouro: (i) pelo menos parte dos táxons encontrados na área de influência direta respondem à supressão florestal buscando novas áreas de mata e abandonando o ambiente alterado; (ii) matas de encosta, como de nossos pontos amostrais em UFA, não são hábitat adequado ao estabelecimento de algumas dessas espécies; e (iii) áreas de silvicultura com sub-bosque adensado (como era o caso de muitas áreas na unidade estudada) são ambientes adequados ao deslocamento, ou talvez ao estabelecimento dessas aves.

Embora a ocupação de monoculturas pela avifauna seria limitada principalmente pela escassez de recursos alimentares (Straube, 2008), verificou-se predominância de plantas zoocóricas – cujos frutos são dispersos pela fauna – e ausência de táxons anemocóricos – cujos frutos são dispersos pelo vento – em subbosque de plantios de Pinus taeda no Paraná (Dias et al., 2009). Estas plantas, por sua vez, são provavelmente dominantes nesses ambientes pelo alto influxo de propágulos (Liebsch & Acra, 2007), reforçando a terceira conjectura a pouco mencionada.

Esses recursos, no entanto, não são igualmente usufruídos pelas diferentes guildas de aves: a complexidade estrutural tem papel preponderante na composição da comunidade que usa esses hábitats, onde alguns insetívoros aparentemente são excluídos (Cruz, 1988; Machado & Lamas, 1996).

As informações das recapturas, mesmo sendo numericamente pequenas, nos permitem levantar algumas hipóteses sobre a dinâmica territorial e de deslocamentos da avifauna na localidade explorada. Há que se reforçar a natureza especulativa destas conclusões, pois como mencionado anteriormente, somente após amostragens bastante extensas podem-se inferir com maior grau de segurança aspectos da dinâmica de comunidades de sub-bosque em florestas tropicais (e.g. Stouffer & Borges, 2001). Sem embargo, estes apontamentos são importantes neste estudo com o objetivo de balizar considerações sobre a avifauna a ser atingida pelo impacto em apreço.

Das recapturas efetuadas, pode-se perceber tanto a ocorrência de deslocamentos mais extensos na área, como preferência de microhábitats e maior restrição na abrangência de áreas de vida de algumas espécies (TABELA V.1.6). As capturas e recapturas de Platyrinchus

mystaceus, Chiroxiphia caudata e Mionectes rufiventris ocorreram tanto na linha A, quando na

B, indicativo de que utilizam toda a vertente íngreme, além de porções mais baixas da área estudada em seus deslocamentos diários. No caso particular de M. rufiventris isso ficou mais evidente, quando duas recapturas, em dias consecutivos, acusaram sua ocorrência nas linhas B e A.

Outro fato interessante concerne ao grande número de recapturas de aves na linha B comparadas àquelas na linha A. Apenas Picumnus temmincki e Pyrrhocoma ruficeps aparentemente têm preferência por utilizar este microhábitat, de sub-bosque mais denso e dossel mais aberto. Dois táxons parecem ter área de vida mais restrita e preferência pelo hábitat contemplado pela linha B, tendo sido recapturados em duas ocasiões, sempre na mesma localidade: Xiphorhynchus fuscus e Automolus leucophthalmus. As demais recapturas também parecem indicar maior uso do ambiente baixo como local fixo dentro das áreas de vida das espécies, ao passo que o ambiente da linha A é aparentemente lar de menor número de aves, mas mais utilizado para deslocamentos; esta constatação reforça as sugestões acima mencionadas, sobre maior riqueza com menor número de capturas na linha A, e maior taxa de captura, mas menor número de espécies capturadas em B.

TABELA V.1.6.Aves capturadas e recapturadas nas amostragens com redes-de-neblina nas duas linhas de redes na Unidade Frente/APP (UFA), com datas e locais dos eventos.

ANILHA ESPÉCIE SEXO IDADE PESO CAMPANHA DATA LINHA

C72701 Chiroxiphia caudata M A 31 4 2010-05-12 B Recaptura 29 6 2010-07-27 A C72702 Chiroxiphia caudata F J 31 4 2010-05-13 B Recaptura A - 10 2010-11-17 A C72707 Chiroxiphia caudata I J 17 5 2010-06-24 A Recaptura M A 22 12 2011-01-22 B C72709 Playrinchus mystaceus I A 8 6 2010-07-27 A Recaptura - 10 2010-11-17 A Recaptura - 12 2011-01-23 B D109109 Mionectes rufiventris I A 21 8 2010-08-31 A Recaptura - 10 2010-11-17 B Recaptura 16 10 2010-11-18 A

E147518 Picumnus temmincki M A 8 6 2010-07-28 A

Recaptura 12 10 2010-11-17 A D109103 Xiphorhynchus fuscus I A 18 6 2010-07-27 B Recaptura 20 8 2010-08-30 B Recaptura 21 10 2010-11-17 B G90306 Automolus leucophthalmus I A 33 4 2010-05-13 B Recaptura 34 5 2010-06-23 B Recaptura - 10 2010-11-17 B Recaptura 35 11 2010-12-15 B C72719 Hemitriccus diops I A 11 8 2010-08-31 B Recaptura 10 10 2010-11-18 B C72713 Leptopogon amaurocephalus I A 19 8 2010-08-29 A Recaptura - 12 2011-01-23 A

E147513 Schiffornis virescens I A 23 6 2010-07-27 B

Recaptura - 10 2010-11-17 B

E147533 Pyrrhocoma ruficeps M A 14 8 2010-08-31 A

Recaptura - 10 2010-11-17 A

E147516 Pyriglena leucoptera F A 23 6 2010-07-27 B

Recaptura 24 12 2011-01-23 B G90304 Turdus albicollis I A 58 4 2010-05-12 B Recaptura 61 5 2010-06-25 B G90308 Turdus albicollis I A 63 4 2010-05-13 B Recaptura 62 8 2010-08-29 B G90316 Turdus rufiventris I A 70 6 2010-07-27 B Recaptura - 8 2010-08-29 B H82401 Turdus rufiventris I A 75 4 2010-05-13 B Recaptura 78 5 2010-06-23 B H82402 Turdus rufiventris I A 59 4 2010-05-13 B Recaptura 70 5 2010-06-24 B C72708 Basileuterus leucoblepharus I A 16 5 2010-06-24 B Recaptura 16 10 2010-11-18 B

E147531 Basileuterus leucoblepharus I A 16 8 2010-08-31 B

Embora bastante especulativos como já citado, estes dados são indicativos do uso diferenciado dos hábitats contemplados por nossa amostragem, onde as áreas de encosta – com vegetação predominantemente de sub-bosque adensado com taquaras e cipós – aparentam ser mais utilizadas para o deslocamento das espécies, e menor número de táxons estabelecendo-se nesses ambientes. A implicação mais importante, caso esse fenômeno seja repetido em toda a área de influência e para toda comunidade aviária de sub-bosque florestal, relaciona-se ao impacto da perda de hábitat de baixada e manutenção dos ambientes de encosta quando do desmate e enchimento do reservatório. Nesse sentido, espécies que não ocupam esse tipo de ambiente, quando afugentados de suas áreas originais, podem não se estabelecer nas imediações das áreas afetadas (futura APP), mas utilizá-la em seus deslocamentos buscando novos sítios para colonizar.

A lista completa dos exemplares capturados, sua identificação e destinação, é apresentada na TABELA V.1.7.

TABELA V.1.7.Aves capturadas durante a amostragem com redes-de-neblina nas duas linhas de redes na Unidade Frente/APP (UFA).

Na coluna DESTINO figura o código da anilha CEMAVE utilizado como marcação (acompanhado do sinal “*” no caso

das recapturas), se o indivíduo foi coletado, ou ainda se foi solto sem marcação (denotado pelo sinal “-“).

CÓDIGO ESPÉCIE FAMÍLIA CAMPANHA DATA LINHA DESTINO

HMA-03 Chiroxiphia caudata Pipridae 4 2010-05-11 B - HMA-04 Turdus albicollis Turdidae 4 2010-05-11 B G90301 HMA-05 Turdus rufiventris Turdidae 4 2010-05-11 B G90302 HMA-06 Platyrinchus mystaceus Tyrannidae 4 2010-05-11 B - HMA-07 Tachyphonus coronatus Thraupidae 4 2010-05-12 B - HMA-08 Dendrocolaptes platyrostris Dendrocolaptidae 4 2010-05-12 B G90303 HMA-09 Basileuterus culicivorus Parulidae 4 2010-05-12 B D109150 HMA-10 Chiroxiphia caudata Pipridae 4 2010-05-12 B C72701 HMA-11 Turdus albicollis Turdidae 4 2010-05-12 B G90304 HMA-12 Chiroxiphia caudata Pipridae 4 2010-05-12 B - HMA-13 Turdus rufiventris Turdidae 4 2010-05-13 B H82401 HMA-14 Turdus albicollis Turdidae 4 2010-05-13 B G90305 HMA-15 Automolus leucophthalmus Furnariidae 4 2010-05-13 B G90306 HMA-16 Turdus albicollis Turdidae 4 2010-05-13 B G90307 HMA-17 Turdus rufiventris Turdidae 4 2010-05-13 B H82402 HMA-18 Turdus albicollis Turdidae 4 2010-05-13 B G90308 HMA-19 Chiroxiphia caudata Pipridae 4 2010-05-13 B C72702 HMA-20 Sclerurus scansor Scleruridae 4 2010-05-13 B G90309 HMA-23 Phaethornis eurynome Trochilidae 5 2010-06-22 B - HMA-24 Nonnula rubecula Bucconidae 5 2010-06-22 A E147502 HMA-25 Nonnula rubecula Bucconidae 5 2010-06-22 A E147503 HMA-26 Nonnula rubecula Bucconidae 5 2010-06-22 A E147504