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Riquezas e pobrezas no Brasil e no Chile: das industrializações às ditaduras

No documento Brasil e Chile : riquezas e pobrezas (páginas 123-194)

O capítulo começa com a caracterização do modelo primário exportador tradicional, e segue explicando a sua prolongada crise durante os anos 1930 e a subsequente quebra desse modelo tradicional e a passagem a um novo modelo de desenvolvimento, em que o processo de industrialização por substituição de importações ganhou à cena história no Brasil, no Chile e mais além. Um destaque especial foi dado para a Revolução e Contrarrevolução no Chile entre os anos de 1970 e 1973. E finaliza com uma descrição histórica das ditaduras militares entre os anos de 1964-1985 no Brasil e 1973-1990 no Chile.

Foi com um conjunto de autores vinculados às tradições mais diversas (keynesiana, marxista e liberal) que registramos as transformações das fisionomias das forças produtivas nesses dois países no decorrer de meio século, por volta de 1930 aos anos 1980; que sublinhamos as muitas mudanças nas correlações de forças sociais conflitivas nos dois países nesse período, destacando as múltiplas alianças estabelecidas, vitórias, derrotas, e as conduções das políticas econômicas e sociais; bem como os seus diversos resultados; que, em suma, descrevemos a produções e reproduções das riquezas e das pobrezas nas gentes e na materialidade transformada nesse meio século.

Durante as industrializações por “substituições de importações”

Maria da Conceição Tavares (1972) há muito avaliou que o chamado “modelo exportador”, vigente nas economias latino-americanas em geral durante cerca de quatro séculos, entrou em crise durante as primeiras décadas do século XX e em colapso a partir de 1930. Esse modelo se caracterizava pelo alto peso relativo do setor externo nas economias primário-exportadoras, onde as exportações enquanto “centro dinâmico de toda a economia” eram responsáveis pela geração de importante parcela da renda nacional e o crescimento da mesma, e as importações responsáveis por suprir vários tipos de bens e serviços necessários ao atendimento de parte apreciável da demanda interna, que incluíam faixas inteiras de bens de consumo terminados e praticamente o total dos bens de capital. Nessas economias, a reduzida atividade industrial em conjunto

124 com o setor agrícola de subsistência fora insuficientes para dar à atividade interna um dinamismo próprio. Daí a constatação de que o crescimento econômico até esse período estar basicamente atrelado aos ditames da demanda externa por produtos primários, dando a essas economias um “caráter eminentemente dependente e reflexo”.

O crescimento “para fora” das economias latino-americanas esteve intimamente atrelado à forma pela qual a região foi inserida na divisão internacional do trabalho. Estava até então praticamente condenada a ser primário-exportadora, enquanto a industrialização era monopólio dos países do centro do capitalismo. E para a maioria dos países latino-americanos, entre eles o Brasil e o Chile, havia uma nítida divisão do trabalho social entre os setores externo e interno de suas economias. Enquanto o setor exportador, mais produtivo e geralmente de alta rentabilidade, era especializado em alguns poucos produtos dos quais uma pequena parcela era consumida internamente, o setor interno, basicamente de subsistência e de baixa produtividade, somente satisfazia parte das necessidades de alimentação, vestuário e habitação da parcela da população monetariamente incorporada aos mercados consumidores. Por outro lado, a alta concentração de propriedade dos recursos naturais e do capital, sobretudo no setor exportador, resultava numa distribuição de renda extremamente desigual, onde as maiorias auferiam baixos níveis de renda que praticamente as excluíam dos mercados monetários, enquanto as minorias auferiam níveis e padrões de consumo similares aos dos grandes centros europeus que eram em grande parte atendidos por importações. (idem).

Esse modelo primário-exportador tradicional viveu o seu “ponto crítico” durante a prolongada crise dos anos 1930. Foi profundo o impacto dessa crise no setor externo das economias brasileira e chilena, sobretudo nesta, onde à violenta queda na receita de exportação e a consequente redução na capacidade para importar foi ainda maior. A profundidade do desequilíbrio externo levou os governos dos dois países a adotarem uma série de medidas, entre elas, restrições e controle de importações, elevação da taxa de câmbio e a compra de excedentes ou financiamento de estoques, visando defender o mercado interno dos efeitos da crise no mercado internacional, do que resultou num estímulo considerável à produção interna e na irradiação de um “novo modelo de desenvolvimento”, intitulado por Tavares de “substituição de importações”90

.

90 Sobre As diversas acepções do termo “substituição de importações”, convém registrar aqui com

Tavares que “o termo “substituição de importações” é empregado muitas vezes numa acepção simples e literal significando a diminuição ou desaparecimento de certas importações que são substituídas pela

125 O que caracteriza esse novo modelo é antes de tudo a alteração das “variáveis dinâmicas da economia”, onde há uma perda de importância relativa do setor externo no processo de formação da renda nacional e consequentemente um aumento da participação e dinamismo da atividade interna. O setor externo não deixa de desempenhar papel relevante, mas há mudança significativa de suas funções. Deixa de ser diretamente responsável pelo crescimento da renda através das exportações, e passa a ser decisivo no processo de diversificação da estrutura produtiva, mediante importações de equipamentos intermediários. Devemos ainda considerar que as transformações substantivas das estruturas produtivas se circunscreveram quase que exclusivamente ao setor industrial e atividades conexas. O setor primário, incluindo as atividades tradicionais de exportação, não foram alteradas de modo sensível. Preservou- se assim uma base exportadora precária e sem dinamismo. E que os novos setores dinâmicos apareceram e se expandiram no âmbito restrito dos mercados nacionais. (ibidem).

O fato de boa parte de todo continente americano, incluindo o Brasil e o Chile, ter desatado, e quase ao mesmo tempo, processos de industrialização voltados para os mercados internos por essa via da substituição de importações, resultou não só na tentativa de se repetir aceleradamente na região à experiência de industrialização dos países desenvolvidos (em condições históricas muito distintas) (Tavares, 1972), mas também na criação de estruturas produtivas similares, logo competitivas entre si (Oliveira, 2006). Há ainda que se ressaltar que no plano latino-americano foram poucos os países que lograram implantar projetos de industrialização para substituir as importações, que avançaram até mesmo na produção de bens de consumo duráveis e de bens de capital para os seus respectivos mercados nacionais. Foram os casos do México, do Brasil e da Argentina. Peru, Chile, Uruguai e Colômbia deram apenas “passos nessa

produção interna. Entendida desta maneira esta expressão, disfarça a natureza do fenômeno (...) e inclusive induz a um entendimento errôneo da dinâmica do processo em questão. Na realidade, o termo “substituição de importações”, adotado para designar o novo processo de desenvolvimento dos países subdesenvolvidos, é pouco feliz porque dá a impressão de que consiste em uma operação simples e limitada de retirar ou diminuir componentes da pauta de importações para substituí-los por produtos nacionais. Uma extensão deste critério simplista poderia levar a crer que o objetivo “natural” seria eliminar todas as importações, isto é, alcançar a autarcia. Nada está tão longe da realidade, porém, quanto a esse desideratum. Em primeiro lugar, porque o processo de substituição não visa diminuir o quantum de importação global; essa diminuição, quando ocorre, é imposta pelas restrições do setor externo e não desejada. Dessas restrições (absolutas ou relativas) decorre a necessidade de produzir internamente alguns bens que antes se importavam. Por outro lado, no lugar desses bens substituídos aparecem outros e à medida que o processo avança isso acarreta um aumento da demanda derivada por importações (de produtos intermediários e bens de capital) que pode resultar numa maior dependência do exterior, em comparação com as primeiras fases do processo de substituição” (Tavares, 1972, p.38-39).

126 direção”, enquanto os outros não conseguiram sair da estrutura primário-exportadora (Sader, 2009).

O Brasil e o Chile veem transformando suas fisionomias pelo menos desde a Grande Depressão de 1929. Ambos promoveram de diferentes maneiras e em graus diversos o desenvolvimento de suas forças produtivas, em particular de suas atividades industriais, fortaleceram seus mercados internos, constituíram suas classes sociais fundamentais, elaboraram projetos nacionais, expandiram a capacidade de regulação de seus Estados, de realização de políticas sociais e de fomento à produção, se urbanizaram aceleradamente etc. E não obstante a quebra do modelo tradicional e a passagem a um novo modelo que possibilitou maior diversificação da produção interna e de retenção das riquezas criadas, somado a todo o caráter ascendente dos processos de mobilização social, incluindo a maior participação popular na vida política, o fato é que a desigualdade de patrimônio e de renda seguiu elevadíssima. Poucas décadas não pudera reverter uma situação estrutural de longuíssima duração, isto é, não houve alteração substantiva no que diz respeito às desigualdades materiais, nas distâncias que separam os ricos dos pobres, sobretudo no Brasil. A temática da pobreza socioeconômica parece não ter avançado pari passu a da pobreza política, pelo menos até 1964 no Brasil e 1973 no Chile, momentos em que se instauram as respectivas ditaduras militares e que as pobrezas políticas revelam as suas piores faces.

No Brasil, a economia agroexportadora fundada no café e atrelada aos interesses ingleses e dos Estados Unidos entrou em colapso a partir de 1930. Em meio a essa crise ocorreu uma importante mudança política no país, que conduziu ao poder forças políticas que desde os anos 1920 realizavam vários enfrentamentos com os governos da República Velha. Esta termina definitivamente com a vitória da Aliança Liberal encabeçada por Getúlio Vargas, que foi capaz de reunir uma ampla coalizão de forças, um conjunto de oligarquias não vinculadas ao café, juntamente com segmentos médios militares, tenentes que inclusive foram partícipes da famosa Coluna Prestes, e outros com clara inspiração autoritária e fascista, bem como segmentos de bases sociais mais populares. Vargas assume o governo provisório no dia 3 de novembro de 1930 para cumprir um mandato programado até o ano de 1934. O programa getulista inicial visava, entre outros objetivos: garantir o direito do voto via reforma do sistema eleitoral (destaque-se o fato de que até então o voto não era secreto e universal, as mulheres não votavam e não havia justiça eleitoral, sendo que quem comandava e fiscalizava as

127 eleições eram os representantes do governo nas localidades); proteger a economia nacional; proteger o trabalho via instituição do Ministério do Trabalho, destinado a superintender na questão social, no amparo e na defesa do operariado urbano e rural; e difundir o ensino público, sobretudo o ensino técnico profissional. Um programa reformista que evidentemente não atendia ao conjunto de medidas encabeçadas no Manifesto do Partido Comunista.

As primeiras medidas econômicas adotadas pelo novo governo visavam o equacionamento da crise cambial e a manutenção da demanda agregada e do nível de emprego. Para tanto, suspendeu parte dos pagamentos da dívida externa, congelou a remessa de lucros para o exterior, introduziu o controle de câmbio, sustentou a desvalorização da moeda nacional e elevou as tarifas de importação (Baer, 2002). Instituiu uma nova política de defesa do café91, que segundo Furtado, concretizou-se “num verdadeiro programa de fomento da renda nacional. Praticou-se no Brasil, inconscientemente, uma política anticíclica da maior amplitude que a que se tenha sequer preconizado em qualquer dos países industrializados” (Furtado, 2000, p.205).

As medidas de defesa da demanda agregada, ancoradas na política de defesa do café, conjugadas com medidas de combate à crise cambial, foram responsáveis por promover o que Furtado chamou de “deslocamento do eixo dinâmico” da economia brasileira; por irradiar esse novo modelo de substituição de importações de que nos fala Tavares. Enquanto a participação da indústria no valor adicionado avança do patamar de 24% para 36% entre os anos de 1930 a 1945, a participação da agricultura caía de 47% para 37%92 no mesmo período consierado. Coube à indústria alavancar cada vez mais o crescimento da economia e da maior riqueza no país. Na década de 1930, a produção industrial cresceu em média 7,2% ao ano, ao passo que a produção agrícola o fez num ritmo bem mais modesto, 2,8%.93 Considerando o período entre os anos de 1930 a 1945, o crescimento médio anual do Produto Interno Bruto foi de 4,4%. Já a inflação média

91 O governo federal passa a assumir diretamente o comando da política de defesa do café, antes sob o

controle dos governos estaduais; o governo passa a trabalhar não mais pelo aumento do preço do café, mas pela manutenção do mesmo; o próprio governo é quem comprar com emissões monetárias o excedente do café, e não mais via créditos externos; o governo decide queimar os estoques acumulados para conter seus preços, fato inusitado até então; a política de valorização do setor cafeeiro foi substituída por uma política que promovia a progressiva substituição dessa atividade por outras atividades econômicas, sobretudo a atividade industrial. (Souza, 2007). O governo brasileiro destruiu cerca de 27% da produção de café no período correspondente aos anos de 1931 a 1945, o equivalente a quase 4,7 milhões de toneladas, de uma produção total de pouco mais de 17,4 milhões (Gremaud et al., 2006, p.366).

92

Ver: Gremaud et al., 2006.

128 registrou 6,5% a.a, e a média da dívida federal/PIB foi de 9,2, e a média da dívida externa/exportações de 3,594, índices que dão mostras da capacidade e da dificuldade de conduzir o processo de industrialização por substituição de importações.

A indústria passava a ter um peso cada vez maior na produção da riqueza nacional. A industrialização contou tanto com a implementação da indústria de base como com a dinamização do mercado interno. Foi durante o primeiro governo Vargas (1930-1945) que as primeiras empresas estatais foram fundadas, com a instalação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e da Companhia Vale do Rio Doce (1942). Foi nesse mesmo período, que foi instituída de forma progressiva toda uma legislação trabalhista, que ampliou o poder de compra ao menos de boa parte dos trabalhadores urbanos, fixando efetivamente o salário mínimo nas grandes cidades e indústrias.

A incipiente questão social95 não mais podia ser tratada como um caso de polícia, tal como pensava Washington Luís e de fato o fora na República Velha96. O desenvolvimento do proletariado brasileiro exigiu um tratamento por parte do Estado e do empresariado para além da repressão e da caridade a que até então estavam submetidos os trabalhadores. Diferentemente do Chile, não houve no Brasil de fins do século XIX uma radicalização das lutas operárias, mesmo porque o operariado brasileiro ainda não estava constituído como classe em si e muito menos para si. A questão social só começa a se colocar como questão política entre nós a partir da primeira década do século XX, com as primeiras lutas dos trabalhadores e iniciativas voltadas ao mundo do trabalho, com a formação dos primeiros sindicatos na agricultura e nas indústrias rurais (a partir de 1903) e com o reconhecimento (1907) do direito de organização sindical, e também com a fundação do Partido Comunista Brasileiro (1922), que por anos foi a maior e principal organização partidária de esquerda no país. No entanto, o PCB

94 Ver: Gonçalves, 2003, p.145. 95

A chamada “questão social” é um eufemismo usado pela historiografia para referir-se à luta de classes. Para alguns autores filiados à tradição marxista, a “questão social” “não é senão as expressões do processo de formação e desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da sociedade exigindo seu reconhecimento como classe por parte do empresariado e do Estado. É a manifestação, no cotidiano da vida social, da contradição entre o proletariado e a burguesia, a qual passa a exigir outros tipos de intervenção mais além da caridade e da repressão” (Iamamoto & Carvalho, 1995, p.77 apud Santos, J., 2012, p.25).

96 Washington Luís Pereira de Souza fora o último presidente da República Velha, que governou o Brasil

entre os anos de 1926 a 1930. Antes dele, os respectivos presidentes eleitos foram: Deodoro da Fonseca (1889-1891), Floriano Peixoto (1891-1894), Prudente de Moraes (1894-1898), Manuel Ferraz de Campos Sales (1898-1902); Francisco de Paula Rodrigues Alves (1902-1906); Afonso Augusto Moreira Pena (1906-1909); Nilo Procópio Peçanha (1909-1910); Hermes Rodrigues da Fonseca (1910-1914); Venceslau Brás Pereira Gomes (1914-1918); Epitácio da Silva Pessoa (1919-1922); e Artur da Silva Bernardes (1922-1926).

129 permaneceria por longo período na ilegalidade, entre os idos de 1935 a 1945 e de 1947 até 1988.

O governo Vargas chegou a enfrentar militarmente a sublevação do PCB na chamada “Intentona Comunista” (1935), e posteriormente o colocou por uma década na clandestinidade. E foi capaz de combinar tal enfrentamento com uma forte iniciativa política que alterou o estatuto do trabalho na sociedade e na economia, transformando assim a luta de classes em certa colaboração de classes, e dando impulso à construção do Estado social. Além disso, ainda teve de enfrentar o crescimento do movimento fascista brasileiro, chamado de integralismo, e sua influência nas hostes governistas. Tudo isso contribuiu para alterar a conformação do pacto social vigente, e que a Constituição de 1934 também expressava (além da forte disputa de hegemonia e direção do processo de modernização então em curso). Em 1937 Vargas instaura a ditadura do Estado Novo que duraria até o ano de 1945.

Cabe aqui refletirmos sobre uma curiosa constatação apontada por Laura Soares Tavares (2006) quanto ao enfrentamento da questão social, não apenas no Brasil como em toda a América Latina, a saber, de que suas histórias estiveram não apenas marcadas por Estados nacionais frágeis do ponto de vista institucional, como também exigiram que assumissem tarefas urgentes em tempos históricos curtíssimos se comparados à dedicação secular levada a cabo pelos países centrais. Além disso, ela argumenta que “o enfrentamento democrático da questão social, além de recente, é episódico na história latino-americana, associado aos períodos de redemocratização dos seus regimes políticos” (2006, p.1107). Os próximos capítulos apresentam certos alcances e limites dos enfrentamentos da questão social, particularmente das questões das desigualdades e das pobrezas, no Brasil e no Chile, durante o processo mais recente de redemocratização. Por agora, importa registrar com Elaine Rossetti Behring e Ivanete Boschetti como tal constatação parece acertada para o caso do Brasil nos seus momentos ditatoriais. Segundo elas

é interessante notar que a criação dos direitos sociais no Brasil resulta da luta de classes e expressa a correlação de forças predominante. Por um lado, os direitos sociais, sobretudo trabalhistas e previdenciários, são pauta de reivindicação dos movimentos e manifestações da classe trabalhadora. Por outro, representam a busca de legitimidade das classes dominantes em ambiente de restrição de direitos políticos e civis – como demonstra a expansão das políticas sociais no Brasil nos períodos de ditadura (1937- 1945 e 1964-1984), que as instituem como tutela e favor: nada mais simbólico que a figura de Vargas como “pai dos pobres”, nos anos 1930. (Behring & Bochetti, 2008, p.78-79).

130 Parece haver certo consenso entre os estudiosos da política social brasileira de que a década de 1930 e o início dos anos 1940 podem ser caracterizados como os anos de introdução da política social no país, que teve seus desfechos com a Constituição de 1937, que ratificou a necessidade de reconhecimento das categorias de trabalhadores por parte do Estado, e com a promulgação em 1943 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), que selou o modelo corporativista e fragmentado dos direitos sociais no Brasil (idem, p.106 e 108). Não cabe realizarmos aqui um inventário detalhado das medidas adotadas nesse período e nos momentos subsequentes. Enunciaremos apenas as principais medidas adotadas e que mais contribuíram na conformação dos Sistemas Brasileiro e Chileno de Proteção e Promoção Social.

Está claro que as atuações sociais dos Estados brasileiro e chileno tiveram origens no surgimento das classes trabalhadoras urbanas e no esforço de dar respostas aos conflitos que marcaram as relações entre capital e trabalho, num contexto de crescente industrialização, sobretudo para o caso brasileiro. Muitas das conquistas nos domínios político, econômico e social, que parte de seus trabalhadores lograram a partir dos anos 1930, chegavam com um atraso de décadas em relação às conquistas auferidas pelos trabalhadores chilenos. Já apontamos algumas destas durante os governos Balmaceda e Alessandri, entre fins do século XIX e princípios do século XX.

A ação social do Estado brasileiro durante o governo Vargas caracterizou-se pela constituição de caixas de seguro social – organizadas por setor econômico, financiadas e geridas pelo Estado, por empregadores e empregados, visando proteger os trabalhadores e seus familiares de certos riscos coletivos –, e por uma ampla regulamentação do mundo do trabalho assalariado. Nesse período, sobretudo em sua fase ditatorial, é que foi instituída a Previdência Social no país com os Institutos de Aposentadorias e

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