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Entre os riscos sociais, a falha de planejamento urbano, a crise alimentar, a crise hídrica e a migração involuntária de grande escala são aquelas que trazem e poderão trazer ainda mais impactos negativos para a segurança alimentar nos países.

Providenciar alimentos saudáveis e nutritivos para uma população urbana que cresce em nível mundial requer um planejamento urbano eficiente, que permita ligações consistentes entre produtores rurais e mercados urbanos, criando um sistema alimentar mais socialmente inclusivo e mais efetivo (FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS, 2015c).

Estas preocupações e ligações entre segurança alimentar e áreas urbanas surgem como uma grande preocupação internacional na medida em que os países notaram os impactos negativos das mudanças climáticas, dos estilos de vida não saudáveis e da redução de espaços abertos em áreas urbanizadas. Na tentativa de mitigar os efeitos destas mudanças causadas por um grande número de fatores políticos e econômicos, passou-se a dar mais importância para as implicações do planejamento urbano, do planejamento de transporte, da importância de uma integração de planejamentos entre o design urbano, paisagistas,

arquitetos, profissionais da saúde e da indústria de alimentos que, juntos, podem melhorar a situação da segurança alimentar (DICKSON; KARUPPANNAN; SIVAM, 2015).

Mesmo a produção de alimentos tendo se distanciado das proximidades de sua população (grandes centros), o consumo de alimentos continua sendo fundamental para o funcionamento econômico e social das cidades, e conforme o passar dos anos, a tendência é que o reconhecimento dos alimentos e seu papel crítico nas áreas urbanas torne-se muito mais significativo no futuro (BUDGE, 2011).

Levando em consideração que o sistema de alimentos possui carater multifuncional, sempre haverá profundos efeitos deste, em outros setores, como o de saúde pública, justiça social, energia, água, terra, transporte e desenvolvimento econômico. Daí surge a importância de um planejamento urbano eficiente que abra espaço para a re- imaginação de “cidades como uma fazenda” (VILJOEN, 2005; MORGAN, 2009).

Além da falha de planejamento urbano, as crises alimentares também são questões preocupantes quando se trata de segurança alimentar. Ela ocorre quando famílias experimentam estas tensões (falta de alimento) por vários anos e os governos e agências de ajuda não conseguem intervir (THOMSON REUTERS FOUNDATION, 2014). Para Nellemann (2009), a atual crise alimentar no mundo, é resultado de efeitos combinados da competição por terras de cultivo e de desenvolvimento de biocombustíveis, baixos estoques de cereais, alto preço do petróleo, especulação nos mercados de alimentos e eventos extremos climáticos.

Além da ausência de uma ação por parte dos atores estatais e organizacionais, outros fatores podem afetar estas áreas de insegurança alimentar, como secas e inundações. Um exemplo trágico de acontecimentos como estes citados, deu-se em 2010, no Paquistão, quando enchentes devastaram plantações e levaram ao colapso dos rendimentos rurais, provocando uma rigorosa insegurança alimentar. Um ano depois, uma seca atingiu a África Oriental e desencadeou uma insegurança alimentar que afetou 13 milhões de pessoas (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016a).

Na Etiópia, uma seca devastadora (a maior em 30 anos) está causando a pior crise alimentar que o país já enfrentou, levando mais de 9 milhões de pessoas a demanandarem assistência humanitária neste ano de 2016. Grande parte destas mudanças no país é consequência do El Niño, um padrão climático que resulta no aumento das temperaturas, e que se torna mais frequente, já que o aquecimento global aumenta a probabilidade de que o El

população da Etiópia depende da agricultura, tornando o país extremamente vulnerável às secas e mudanças climáticas (OXFAM, 2016).

Sob esta ótica, entende-se que a crise alimentar não é apenas uma questão humanitária, mas também política (FERNANDO, 2011). Nas palavras de um ex-diretor executivo do World Food Programme (Programa Alimentar Mundial), "sem comida, as pessoas têm apenas três opções. Elas protestam, elas emigram ou morrem.”75 (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016a, p. 50, tradução nossa). Obviamente, nenhuma destas opções é admissível. É necessária a criação de políticas mais coerentes e coordenadas que acelerem o progresso e a contrução da segurança alimentar global. Para isso, será preciso o aumento de recursos financeiros e investimentos, permitindo os governos nacionais a tomarem decisões e medidas que solucionem os atuais desafios (ORGANISATION FOR ECONOMIC CO- OPERATION AND DEVELOPMENT, 2013b).

O mesmo vale para as crises hídricas (ocupando o 3º lugar no ranking dos 10 riscos mais impactantes e 9º lugar no ranking dos 10 riscos com maior probabilidade de acontecer). As políticas voltadas para a garantia da segurança alimentar não devem perder de vista a crescente escassez da água, já que este recurso é a “peça chave” impulsionadora da produção agrícola (HANJRA, QURESHI, 2010; WORLD ECONOMIC FORUM, 2016a).

A crise hídrica é interpretada como uma situação onde não há água suficiente para satisfazer as necessidades hídricas humanas, seja para beber, para alimentos, para higiene, entre outros. A ausência da água implica em uma pressão sobre este recurso, onde a demanda é maior que a oferta (FALKENMARK, 2006). Com o aumento da população mundial e aumento da demanda por água, maior o número de pessoas afetadas pela crise hídrica, levando consequentemente ao aumento da importação de alimentos (YANG, et al. 2003). Estima-se que hoje, meio bilhão de pessoas viva em países com escassez de água, e em 2025, este úmero aumentará para três bilhões de pessoas, devido o aumento da população (MOLDEN, 2007).

Além da demanada de água destinada às necessidades básicas humanas, é previsto um aumento nos conflitos entre usos agrícolas e ecológicos, enquanto a água é transferida para as cidades para usos domésticos e industriais (HANJRA; QURESHI, 2010). Essas competições desencadearão diversos desafios, como: a) limitação da capacidade humana em elaborar instituições e políticas que respondam aos desafios de segurança alimentar emergentes (GILMAN; POCHAT; DINAR, 2008; LOBELL, et al, 2008); b) declínio na

produção mundial de alimentos per capita, ameaçando a segurança alimentar em um futuro próximo (BROWN; FUNK, 2008); e c) o aumento da desigualdade no acesso à água cria uma divisão entre os “ricos”, que possuem acesso e os “pobres”, que são impossibilitados de tê-lo, perpetuando a pobreza e alargando as desigualdades no acesso à água para o alimento (HUSSAIN; HANJRA, 2003).

Para que estes riscos sobre a água e alimentos sejam mitigados, estratégias deverão ser criadas, adotando sistemas agrícolas mais resilientes, melhorando a eficiência da energia utilizada no transporte e na produção de alimentos, aumentando a quantidade de alimentos produzidos localmente e melhorando a governança agrícola, que deverá se adaptar às mudanças globais nos setores hídricos e de alimentos, e em diversos outros setores correlacionados (HANJRA; QURESHI, 2010).

No último risco global de caráter social e impactante na segurança alimentar, está a migração involuntária de grande escala, ocupando o 1º lugar no ranking de riscos globais com maior probabilidade de acontecer (WORLD ECONOMIC FORUM, 2016a).

As migrações involuntárias são também resultados dos impactos negativos das mudanças climáticas, que afetam principalmente a segurança alimentar e causam um efeito de desestabilização no cenário político global (MCGREGOR, 1994). Para Reuveny (2007), os problemas ambientais que causam as migrações, podem ser adaptados de três diferentes formas: a) as pessoas podem ficar onde estão, sem fazer nada e aceitar os custos destes problemas; b) as pessoas podem ficar no local e mitigar aquelas mudanças; e c) podem deixar a área afetada e migrar. A escolha entre estas três opções dependerá da extensão dos problemas e das capacidades de mitigá-las.

Enquanto os países mais desenvolvidos costumam mitigar estes problemas através das inovações tecnológicas e da reformulação de instituições, os países menos desenvolvidos são muito menos propensos a fazer o mesmo, devido a sua falta de riqueza e conhecimento. Desta forma, as pessoas que vivem nestes países menos desenvolvidos são obrigadas a sair de seus lares e migrarem para países não afetados, podendo causar diversos problemas e conflitos nestas regiões “receptoras” (REUVENY, 2007).

Estes problemas, ou conflitos violentos, podem se dar por diversas razões. Primeiramente, a chegada de novas pessoas (migrantes) em um outro país pode levar a competição por recursos naturais e econômicos já escassos. Em segundo lugar, a onda de migrantes de uma etnia diferente da população local pode gerar o aumento de uma tensão étnica e a solidificação de identidades. Em terceiro lugar, a onda de migrantes pode causar uma desconfiança entre país receptor e país emissor. Por último, um conflito pode surgir

quando pastores migrantes e agricultores locais sedentários competem pelo uso da terra (SALEHYAN, 2007; BUHAUG; GLEDITSCH, 2008).

Conclui-se que a segurança alimentar, além de ser afetada pela migração involuntária, pode ser também a causa destes mesmos movimentos de pessoas quando ela não funciona. Ou seja, conflitos e mudanças climáticas impactam na segurança alimentar, levando pessoas a migrarem de seus países, para países mais seguros. Nestes países receptores, a disputa por terra, por recursos econômicos e naturias gera uma pressão nos mesmos, abrindo espaço para uma possível insegurança alimentar ou início de conflitos entre locais e migrantes. A solução para estes problemas está na criação de políticas e programas que visem o aumento da resiliência e diminuição da vulnerabilidade das áreas e setores agrícolas (FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION OF THE UNITED NATIONS, 2015d).