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Ano de nascimento - 1952

Terminou o curso do Magistério em 1971/72

Ingressou na Rede Pública de Educação de Adultos em 1987

[Rosa, Fala sobre a tua experiência vivida na educação de adultos, a começar pelas razões dessa opção, conte as coisas que foram acontecendo, umas atrás das outras, episódios, momentos mais marcantes, até deixar a educação de adultos. Podes levar o tempo que quiser e fala de tudo o que achares importante]

Comecei a trabalhar na educação de adultos em 1987, lembras-te daqueles cursos de

educação de adultos para jovens, cursos de 2º ciclo, a minha primeira experiência foi aí. Gostei muito dessa experiência, gostei muito mesmo. Foi em Castro Marim, eu vinha da telescola, como tinha dado 12 anos de aulas na telescola de Azinhal, já tinha experiência de 2º ciclo (…) Foi assim, quando acabei o curso do Magistério fui para o 1º ciclo, ainda dei uns anos e depois fui para a Telescola. Ainda cheguei a trabalhar 1º ciclo de manhã e telescola de tarde. Depois, surgiu a oportunidade e fiz a opção, passei a trabalhar na Telescola. Trabalhei doze anos e gostei muito dessa experiência. Depois, vim para o 1º ciclo, para Castro Marim. Havia aqueles cursos para jovens, acho que eram cursos financiados pelo Fundo Social Europeu, “hhh”, havia falta de professores e a Marília convida-me. Eu vou dar a parte de Ciências, havia a parte de Letras e a parte de Ciências e eu vou dar a parte de Ciências desses cursos para jovens adultos, dava Matemática, Ciências. Gostei muito da experiência. Era à noite, sabes, trabalhar à noite é muito difícil porque as pessoas já vêm com um dia de trabalho, mas, pronto, criei uma grande relação de amizade com aqueles moços, eram jovens entre os 16 e os 20 anos que andavam a fazer o 2º ciclo. Estive dois anos nessa experiência, depois esse curso acabou e eu, depois, comecei a dar aulas de alfabetização. Dava aulas, não, não, estou a mentir, joca, entro para a equipa concelhia de Castro Marim, a Marília convidou-me, a equipa era a Marília, eu e a Rosa Forra. Eu entrei junto com a Rosa Forra Comecei a dar alfabetização, dava aulas de tarde, e comecei com uma experiência no Lar de Castro Marim, pessoas muito idosas. O que é que elas queriam, não era, propriamente, aprender a ler e a escrever, eu funcionava quase como uma psicóloga da educação de adultos. Eles queriam, era, convívio, era conversar, eles vinham, sentavam-se, contavam histórias. Fiz uma recolha de histórias das vivências deles. Foi uma recolha sobre as vivências

deles quando eram novos, dos sacrifícios que fizeram, onde trabalharam, Castro Marim era uma zona muito pobre e a vida era difícil, aquelas pessoas tinham passado muitas dificuldades quando eram novas. Eles adoravam falar da vida deles, contar histórias, alguns falavam da experiência na escola. Foi uma recolha muito interessante, que tinha, no fundo, um pouquinho da vida daquelas pessoas. Não sei onde é que isso para, ficou na coordenação concelhia, depois a coordenação acabou e não sei para onde é que, aquele material que produzimos, foi parar (…) Isto foi num curso que era de tarde, depois, ainda dentro da educação de adultos, começou a aparecer um tipo de cursos socioeducativos, de costura, de bordados, não me lembro como se chamavam esses cursos, as pessoas tinham que ter uma parte de formação. E eu comecei a dar essa formação aos adultos que andavam nesses cursos socioeducativos. Também gostei dessa experiência, já não me recordo o que é que eu dava,”hhh”, mas, era também alfabetização, porque havia pessoas que precisavam fazer o 4º ano, antiga 4ª classe e ainda foram diplomadas umas quantas. Mas essas pessoas, já “arranhavam” qualquer coisa na leitura e escrita, não havia muitas analfabetas, por isso, era mais fácil ensinara ler e escrever. Essas faziam a 4ª classe sem grande dificuldade, também, eram, sobretudo, mulheres ainda jovens. Isso foi para aí nos anos de 1988, 89, depois, começaram a aparecer aqueles cursos do FSE. Na coordenação concelhia dava apoio à Marília e comecei também a dar formação a esses jovens, lembro-me de ter dado a CEE (…) sabes que a nossa memória já vai falhando, mas, era dentro dessa área. Depois, abandonei a educação de adultos, talvez aí em 1991, estive 4 anos com a Marília. Sabes, eu adorava dar aulas a crianças, estava desejosa de voltar ao ensino primário, porque eu estava efetiva em Castro Marim e o sair à noite também me estava a cansar muito, então decido voltar para o 1º ciclo, para a minha escola em Castro Marim. Mas ficou o bichinho da educação de adultos, voltei para a escola mas continuei a dar um curso de alfabetização em Castro Marim, mas, aí como bolseira. De manhã era professora primária, de noite dava alfabetização. Castro Marim é uma localidade muito especial, com uma mistura muito grande em termos de pessoas, das suas origens, não sei explicar. Não é fácil dar aulas em Castro Marim, tanto a nível de 1º ciclo como com os adultos. Eu fui bem aceite, mas reconheço que aquela gente é especialmente difícil, se comparamos, por exemplo, com as gentes de Vila Real de Stº António. Eu senti que gostaram de mim e eu trabalhei lá muitos anos, criei muita afetividade com as pessoas, mas é uma terra (…) Sabes que, C. Marim é conhecida como aterra do

degredo e eu notava, nessa altura, que havia uma grande miscelânea de culturas, de saberes,”hhh”, uma grande confusão, mas, eu consegui integrar-me. Em C. Marim eu consegui fazer uma recolha de lendas com a Rosa Forra, a minha colega de coordenação concelhia, fizemos um livro, esse livro tem a Rosa, fizemos uma compilação com as lendas, com as vivências das pessoas, histórias de vida, está muita coisa lá, tudo escrito à máquina e encadernámos. Já sabes, que naquele tempo era tudo muito rudimentar. Depois, eu mudei de casa e ela disse-me “ Dá-me isso para mim”. E, eu dei-lhe esse trabalho, que tínhamos feito, ficou interessantíssimo (…) Depois, saí de C. Marim e fui dar aulas de alfabetização para a Altura e Altura foi dos sítios que mais gostei de dar aulas. Morava em Vila Real e deslocava-me todas as noites. Não era nada fácil. Tinha turmas de 20 e tal “alunos”, desde alemães, ingleses, belgas, que queriam aprender o português. Foi uma experiência muito enriquecedora mas muito cansativa, foram das aulas que mais me custaram a preparar porque ensinar português a estrangeiros foi muito difícil para mim, mas muito mesmo. As pessoas, os estrangeiros, muitos eram pessoas já “formadas” e queriam saber a parte de gramática, e, eu tinha que fazer bem a preparação em casa. Foi complicado. Enquanto, que a alfabetização, com os outros, tu sabes como é, as pessoas queriam mesmo aprender a ler e escrever para fazer o 4º ano, aí as pessoas tinham muita vontade, mas, também era muito difícil, as pessoas vinham de um dia de trabalho e vinham cansadas, sabes que depois de um dia de trabalho a “cabeça” já não está a funcionar em pleno. Eu explicava uma vez e outra e outra com todos os métodos, eu trabalhava na Primária com o método das 28 palavras e à noite ia mais para o Paulo Freire, não é? e tentava partir da palavra e batalhar ali com elas mas, num dia aprendiam, no outro já se tinham esquecido, sabes como é. Mas foi uma experiência muito válida, gostei muito, criei um núcleo de amizade muito grande com aquelas pessoas. Fazíamos lanches, convívios mesmo agradáveis, eram pessoas que ainda hoje eu considero amigas e quando me vêm fazem uma festa. Criei lá bons laços de amizade, foram três anos muito bons, aí sempre com as mesmas pessoas. A maioria destas pessoas fez o 4ºano. Sabes, joca, quando as pessoas vão para o curso e já sabem qualquer coisa, já leem alguma coisa é fácil, agora aquelas que não sabiam nada, que nunca tinham andado à escola, com essas era muito difícil conseguir que fizessem o 4ºano. Era muito difícil, muito difícil. (…) Mas, era engraçado, o grupo era sempre grande, porque mesmo aquelas que acabavam o 4º ano continuavam a ir. Apesar de fazerem o 4º ano, continuavam a ir ao curso. As pessoas gostavam de lá

estar porque não era só o aprender a ler e escrever, aquilo era um grupo muito interessante, discutíamos vários temas, eu levava várias coisas para discutir, as pessoas gostavam daqueles debates e fazíamos os tais convívios. As pessoas gostavam de estar ali, gostavam daquele bocadinho do dia. Mesmo as pessoas que não sabiam ler nem escrever gostavam dos debates, porque todas tinham as suas opiniões e gostavam de as dar. Foi um trabalho muito agradável, era aborrecido sair de casa todas as noites mas depois, gostava muito de lá estar. Era um trabalho muito gratificante. Mas desculpa lá, sabes que a educação de adultos nunca pagou bem, aquilo era uma autêntica exploração, fazer aquele trabalho por uma mísera bolsa de dez contos

[Então sujeitavas-te a isso, porquê?]

Olha, joca, primeiro, porque gostava muito de “fazer” alfabetização e depois, porque a minha filha estava a fazer um curso superior numa universidade particular e eu precisava desse dinheiro, sempre, era uma ajuda. Depois, eu vim trabalhar para Vila Real de Stº António, nessa altura, para o 1º ciclo. Efetive-me aqui em Vila Real e havia aqui cursos de adultos, mesmo ao pé da minha casa. Na mesma sala onde eu trabalhava de dia com o 1º ciclo, ia dar o curso à noite aos adultos. Criei outro grupo de amizade. Foram mais três anos com aquele grupo, que foi um dos que eu mais gostei de trabalhar, porque criei laços afetivos que ainda hoje se mantêm, ainda me continuo a dar com algumas daquelas pessoas que “andaram” no curso de alfabetização. E é muito interessante, isso, sabes! Porque a gente afeiçoa-se às pessoas e naqueles cursos não vamos lá só para despejar matéria,”hhh”. Aqui, ainda, levei pessoas a fazer a 4ªa classe, mas, tinha, também, um grupo pequeno que andava a aprender a ler e a escrever que levava ali a tentar aprender, num dia aprendiam e no outro parecia que desaprendiam. Este grupo, também, esteve comigo durante três anos. Os que não chegaram a fazer a 4ª classe e os outros que fizeram. O grupo nunca se desfez. E, sabes, porque é que acabou, porque é que deixei o curso? Porque fui tirar os Complementos de Formação, aí deixei de trabalhar em educação de adultos, aliás, tu foste meu professor aqui em Vila Real nos complementos de Formação de uma disciplina que se chamava Educação Intercultural, deves lembra- te, não? Isto já foi aí há uns dez anos, não? ora eu estou aposentada vai para quatro anos, ainda trabalhei aí uns seis anos, tinha aí na volta dos 47, 48 anos, agora tenho já 58 anos, estou quase a fazer os 59 (…)

Depois, deixei o curso de alfabetização com muita pena minha. Encontrava as

pessoas e elas diziam-me “ Então, Professora Rosa que pena não termos continuado e agora já não volta mais? não queremos crer que já não volta a ser a nossa professora” Acabou aí a minha experiência em educação de adultos, acabou não, porque mantenho ainda as amizades daquele tempo. Depois, elas tiveram uma professora de quem não gostaram e a seguir, a educação de adultos começou-se a gerir por outros moldes. Os professores eram colocados de propósito na alfabetização, elas não escolhiam, era a direção regional que as colocava. Também, acabaram os bolseiros. Mesmo que eu quisesse voltar depois de fazer os Complementos já não podia. E, mesmo, que eu tivesse que optar, já não voltava á educação de adultos, porque eu adoro crianças e era no 1º ciclo que eu queria acabar (…)

[Foram as saudades pelo 1º ciclo que te fizeram abandonar a coordenação

concelhia?]

Foi, isso foi, mas também estava desgastada com o trabalho na coordenação concelhia, não o trabalho com os adultos na alfabetização, não, era, mais, o desgaste da coordenação concelhia, estava cansada da Marília (…) estás a gravar isto?

[Estou, mas acho que deves continuar, porque eu preciso perceber o que

aconteceu]

Já não tinha paciência, foram quatro anos muito desgastantes. É muito difícil trabalhar com a Marília, eu até tenho receio de falar, tenho guardado isto sempre para mim. A Marília é uma pessoa, e, eu tenho vergonha dizer isto, joca, é uma pessoa que absorve o trabalho das outras pessoas que estão com ela em equipa, faz como se o trabalho fosse só dela, quer o protagonismo das coisas e era como se o trabalho fosse só dela. E, isto cansava-me a mim e à Rosa Forra, a outra colega que trabalhou comigo na coordenação concelhia. Vocês, lá em Faro, não se apercebiam de nada disto. E, isso era muito desgastante, olha, a Rosa era uma pessoa muito válida, mesmo muito válida e, depois, os “louros”, entre aspas, não é que a gente quisesse “louros”, mas, eu, quando trabalho em equipa, a equipa é uma equipa una. E, quando a gente via, quando o trabalho era apresentado, não era o nosso trabalho, era o “eu”, o “eu” Marília. E, depois, a maneira de ela trabalhar, cansativo, desgastante, trabalhar com a Marília era um trabalho muito desgastante, joca (…) [Hum…] Era assim, a Marília era a coordenadora concelhia, não tinha cursos de alfabetização, eu e a Rosa tínhamos. Nós na Coordenação, eu e a Rosa, é que preparávamos todo o material para entregar aos bolseiros, fazíamos as fichas todas, todas, era um trabalho

de gabinete diário, consultávamos livros, fazíamos as montagens, depois, tirávamos as fotocópias. A fotocopiadora estava na Câmara e nós levávamos ali penduradas manhãs inteiras a tirar fotocópias para entregar às bolseiras, que ainda eram muitos cursos. Esse trabalho era todo meu e da Rosa. Depois, nas reuniões, entregávamos esse material às bolseiras, tudo organizado por semanas e apresentávamos a planificação mensal. Nessas reuniões refletíamos sobre os cursos, sobre as dificuldades que tinham encontrado, etc…, e aí, a Marília era a chefe, ela é que fazia reunião, connosco presentes, mas ela é que orientava a reunião. Só falávamos quando ela pedia, para dar as orientações, para tirar dúvidas, fazer esclarecimentos, aí, pedia- nos a nós. A Marília não tinha experiência de alfabetização e nós tínhamos. Sabes, esta orientação era muito importante porque as bolseiras não tinham formação, eram jovens com o 12º ano e nós explicávamos como deviam trabalhar, como deviam utilizar o material que lhes dávamos. Estas reuniões eram mensais e era sempre em Castro Marim, na coordenação concelhia. Quando íamos visitar os cursos, eu ia sempre com a Marília, porque, a Rosa como tinha o curso de alfabetização à noite não podia ir, eu é que ia sempre (…)

[Lembras-te das bolseiras?]

Do nome delas já não me lembro, mas, tínhamos um curso em Odeleite, um curso

nas Furnazinhas, Junqueira, Azinhal, Rio Seco, Cortelha, Castro Marim, dava a Rosa, de noite e eu dava de dia. Como já te disse, em Castro Marim, eu dava aos cursos do FSE e a Rosa dava a alfabetização. Eu, à noite, nunca dei alfabetização em Castro Marim, dei de dia, alfabetização no Lar como já te disse, durante um ano, e, depois, dei essa formação, formação geral, aos jovens adultos dos cursos do FSE (…) Por isso, é que era eu que ia visitar os cursos com a Marília, ela não queria ir sozinha para a serra à noite. Mas, estas visitas eram muito importantes porque era um apoio que se dava aquelas bolseiras. Nós reuníamos mensalmente, o que acho que era pouco, porque elas, às vezes precisavam de mais orientação. Não eram todas, havia algumas com experiência. Lembro-me de uma moça que nós tínhamos, que estava no curso do Rio Seco, com bastante experiência, já com anos disto e essa já fazia um trabalho um pouco melhor que as outras, não sei que é feito dessa moça (…) Há tempos estive com uma moça que foi bolseira em Odeleite que tirou o curso de educadora de infância,”hhh” a bolseira de Furnazinhas saiu de lá, nunca mais soube nada dela, do Rio Seco era uma moça casada, tinha alguns quatro filhos, acabou por ficar por lá, é dona de casa (…) não me recordo já, são já muitos anos, joca. A

Marília não te soube dizer isto? Olha que ela conhece toda a gente [Não] Então ainda está pior do que eu, não te falou dos sítios onde tínhamos os cursos? (…)

[Que significado teve para ti a educação de adultos?]

Foi uma experiência muito boa, gostei muito, aprendi a ser uma pessoa diferente daquilo que seria se tivesse continuado só no 1º ciclo. Olha, joca, foi uma grande experiência, mas, também, foi um grande desafio porque eu não sabia nada de educação de adultos quando comecei. Não tinha nenhuma formação. O que aprendi foi nos cursos e na Formação que vocês faziam. Lembro-me de ter ido a Faro, lembro-me daqueles cursos sobre o método de Paulo Freire, sobre animação da leitura que eu adorei. Eu fazia isso muito e depois, também, quando fui para o 1º ciclo. Gostava muito dessa técnica. Até as minhas colegas adoravam, tantas vezes fui à sala delas fazer animação da leitura com os alunos e outras salas. Ainda há pouco tempo, a Rosa disse-me assim” Prepara uma sessão de animação de leitura para vires dar à minha sala, para os moços não me verem sempre a mim” (risos). E eu disse-lhe “ Sim, vou pensar no assunto”. Eu gostava muito de fazer isto, fazia muito com os adultos. Eram sessões que eles adoravam, mesmo aqueles que não sabiam escrever, mas liam com ajuda, em voz alta. Aquilo era uma coisa giríssima. Fazia com todas as pessoas e mesmo que não lessem, elas ouviam. Fazia aqueles textos simples e ajudava-as a ler, as pessoas participavam no debate, davam as suas opiniões e as pessoas cresciam. Podiam não aprender a ler e a escrever mas cresciam mentalmente a discutir os assuntos. E discutíamos tudo nas aulas, não penses que eu me limitava só a treinar a leitura e escrita, às vezes, havia uma que dizia “ Professora hoje temos estado muito na conversa”, muitas queriam aprender a ler e escrever. Aquilo era um ambiente bom. Sabes, joca, na educação de adultos, as pessoas estavam à vontade “ A senhora está já há muito tempo aí ao pé dessa senhora” “ Professora tem que vir aqui para o pé de mim” “ Então, ela leu ontem e hoje tem que ler outra vez”. Era assim, eram piores que os gaiatos. Estavam sempre requisitando a minha presença. Era cansativo, joca, era um trabalho muito desgastante. Eu lembro-me, no ano que eu vim aqui par Vila Real de Stº António, olha, agora estou dispersando, eu tinha o 1º ciclo de dia, e apanhei um primeiro ano, que eu quando chegava a uma escola queria era o 1º ano, que eu adoro o 1º ano, é dos anos que mais me “enchem” é o primeiro ano. Eu trabalhava com o método das 28 palavras e então, eu via os gaiatos começarem logo a ler em Dezembro, começam a fazer a decomposição das sílabas e são capazes de ler. E, eu tinha avós e netos, tinha netos de dia e avós à noite, que era

giríssimo, lembro-me da D. Maria Alberto que me dizia assim “ Então o meu Fábio já sabe ler e eu ainda não leio porquê D. Rosa” (risos). E, eu tinha de explicar “ Vocês sabem, têm todo o desgaste de uma vida em cima, a senhora é uma pessoa nervosa, o seu neto está aberto para tudo agora, por isso aprende a ler tão facilmente”. E o gaiato ensinava à avó em casa. E, é claro, a senhora ainda conseguia “arranhar” mas nunca uma leitura fluente. Eu acho que nunca tive ninguém que aprendesse a ler com aquela “soltura” na leitura. Aprendiam a ler alguma coisa, liam, mas, sempre, uma leitura “arrastada”. Eu, se calhar, a experiência que tive não foi das mais positivas, não sei. Acho muito difícil ensinar a um adulto a ler bem, quem é analfabeto puro nunca consegue aprender a ler bem, até porque eles teriam de treinar em casa para melhorar e eles, isso, não faziam, eles só liam quando lhes dava textos. Agora, o caso era diferente com aqueles que já tinha andado na escola, nem que fosse só um ano. Aí, esses aprendiam muito melhor e ficavam a ler razoavelmente, porque tinham alguma noção, mas, quem aprendia de novo, não, muito difícil, arranhavam uma leiturazinha de palavras, pequenas frases, pequenos textos simples. Dar-lhes um texto complexo para a mão, não, eles não conseguiam, e, depois, aqueles, que já sabiam ler e escrever, dava-lhes, também, textos simples com temas que eles conhecessem. Trabalhava sempre a partir de um tema. Liam em voz alta e, depois,

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