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MAPA XI – Mapa da Área Especial de Estudo da Galheta – AEEG

2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDOS

2.4 SÍTIOS ARQUEOLÓGICOS

2.4.1 Sítios do município de Laguna

O município de Laguna abriga considerável conjunto arqueológico localizado ainda in situ, distribuído de maneira não uniforme ao longo de sua extensão territorial. Dependendo da fonte utilizada, os dados referentes ao número de sítios catalogados e às características de cada exemplar variam substancialmente, indicando a carência de comunicação entre os responsáveis pelas informações e a necessidade de atualização dos produtos catalogados.

Para as análises cartográficas realizadas neste tópico, adotou-se como referência a produção acadêmica de Farias e Kneip (2010) e Assunção (2010), pelo entendimento de que estes estudos representam o estado da arte das pesquisas arqueológicas na região em foco, sobrepondo-se, inclusive, aos dados oficiais disponibilizados pelo IPHAN em seu Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos. Tal decisão não significa, como se comprova ao longo do trabalho, que as demais fontes existentes são desconsideradas.

O Mapa IV identifica espacialmente a localização dos sítios arqueológicos pré- históricos catalogados por Farias e Kneip (2010; pp. 195-202) e Assunção (2010: 61) no município de Laguna20. Estão mapeados quarenta e nove sítios21, classificados pelos tipos Sambaqui, Estação Lítica, Oficina Lítica, Tupi-Guarani ou Taquara/Itararé.

20 Por se tratarem de dados compilados mais recentemente, optou-se por adotar as listagens de sítios elaboradas

pelos autores citados, em detrimento de outras pesquisas mais antigas, realizadas por outros autores, mas igualmente relevantes à presente dissertação.

21 A inserção dos sítios no mapa foi realizada conforme coordenadas informadas pelos autores. Ressalta-se que

no caso de Farias e Kneip (2010), foram informadas as coordenadas de 49 sítios para o município de Laguna, mas um deles (Km 308) apresenta valores que o posiciona fora dos limites do município. Quanto à obra de Assunção (2010), foram utilizadas as coordenadas referentes somente ao sítio Galheta V, não existente nos registros de Farias e Kneip (2010).

Imaruí Tubarão Jaguaruna Capivari de Baixo Gravatal Imbituba 708000 708000 718000 718000 683 60 00 683 60 00 684 80 00 684 80 00 686 00 00 686 00 00 Convenções Cartográficas Limite municipal Massa d'água Sítios arqueológicos Estação lítica Oficina lítica Sambaqui Sítio histórico Taquara/Itararé Tupi-Guarani OC EA NO AT NT ICO Lagoa de Santo Antônio Lagoa do Camacho Lagoa da Garopaba do Sul

Base de limites políticos IBGE 2012 (adaptada); base de massa d'água Epagri 2010; e base de sítios arqueológicos elaborada conforme Farias e Kneip (2010) e Assunção (2010).

Autor: Guilherme Butter Scofano Orientador: Dr. Francisco Henrique de Oliveira

Mapa elaborado em setembro de 2012. RS

SC PR

Laguna

Mapa de Sítios Arqueológicos

Laguna - Santa Catarina

«

0 1 2 4 6Km

1:150.000 Escala

Projeção Transversa de Mercator Datum SIRGAS 2000

Zona UTM 22 Sul Meridiano Central -51°

65 A maioria dos sítios é formada pelo tipo sambaqui, localizada a Sul do Canal da Barra. É possível verificar áreas marcadas pela aglomeração de sítios, indicando algumas possibilidades: maior quantidade de pesquisas em setores específicos; maior número de remanescentes arqueológicos em função da baixa ocupação do local nos períodos atuais; e/ou concentração de sítios como resultado das dinâmicas dos povos pré-históricos na região em questão.

Inicialmente pesquisados na segunda metade do século XX pelo professor João Alfredo Rohr (Farias, 2010: 293), os sítios do trecho Sul de Laguna são enquadrados por DeBlasis et al. (2007: 37) como pertencentes às comunidades sambaquieiras ocupantes da denominada “paleolaguna de Santa Marta”. Segundo os autores, além de relevantes exemplares materiais da ocupação pré-histórica, os sítios locais configuram-se como importante fonte de estudo ao tema da espacialidade e territorialidade dos grupos humanos pretéritos. Através do cruzamento entre a distribuição dos sítios e os conteúdos materiais neles encontrados, possibilita-se a teorização quanto às relações entre comunidades e às formas de exploração do ambiente.

DeBlasis et al. (2007: 47) apresentam um modelo cartográfico de evolução da paleolaguna entre 4200 e 2000 anos antes do presente (Figura 14), onde é sugerido o possível recorte territorial derivado das áreas de influência dos sambaquis catalogados.

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Figura 14: Evolução da paleolaguna de Santa Marta e dos sítios arqueológicos.

A imagem indica a variação regressiva do nível do mar, com consequente ocupação dos trechos anteriormente submersos e alagadiços pelos povos de sambaqui. A existência de sítios em ilhas sugere o conhecimento e utilização de técnicas de deslocamento aquaviário, reafirmando a proximidade entre as comunidades pré-históricas e os sistemas lagunares. A este respeito, diz Gaspar (2000: 48) que

A ocupação de ilhas, algumas distantes da costa, e a grande quantidade e diversidade de restos de fauna aquática demonstram grande intimidade com o mar. Os sambaquieiros certamente dispunham de algum tipo de embarcação para garantir as rotineiras idas e vindas entre os diferentes pontos do continente e as ilhas. [...] Nos sambaquis é encontrado um eficiente arsenal tecnológico para a captura de pescado, formado por uma variedade de pontas ósseas que eram presas à extremidade de hastes de madeira, algumas com a função de perfurar o animal caçado, outras com a extremidade

67 arrebitada para auxiliar na fixação do peixe tal qual uma farpa de arpão.

Em seus escritos, a autora afirma a ocorrência de sítios arqueológicos ocupados ininterruptamente por até mil anos, conduzindo a reflexões a respeito do sedentarismo das comunidades pretéritas e adaptação às variações climáticas e aos condicionantes ambientais nas práticas de rotina.

Ainda em relação à espacialidade do conjunto arqueológico, Assunção (2010: 27) disserta sobre a possibilidade de se interpretar o “padrão de assentamento” das comunidades sambaquieiras através de análises sobre a disposição dos sítios. Questões ainda nebulosas, como a construção de hierarquias e os fluxos populacionais, poderiam ser abordadas pela justaposição dos aspectos individuais dos sítios com as funções a eles atribuídas dentro de um contexto territorial ampliado.

Outro elemento essencial às pesquisas arqueológicas é o estado de conservação dos sítios. Para os exemplares do município de Laguna, são superficiais as informações oficiais disponibilizadas pelas fichas catalográficas do IPHAN. Embora representem um primeiro passo na tentativa de padronização dos dados, as fichas disponíveis mostram-se incompletas ou preenchidas de maneira aquém da qualidade desejada. São oferecidas três categorias de preservação, identificados pelo campo “Grau de integridade”, divididas entre “menos de 25%”, “entre 25 e 75%” e “mais de 75%”. Somente 24 das 45 fichas existentes apontam o nível de preservação dos sítios estudados, condicionando à busca por outras referências mais completas.

Assunção (2010: 65) lista 43 sítios no município de Laguna, classificando 21 deles na categoria intermediária e 09 como bem preservados, sendo o restante destruído, totalmente destruído ou não verificado. Farias (2009: 39) apresenta detalhado relato de 51 sítios no mesmo município. Seus escritos indicam a ocorrência de 24 sítios mapeados e/ou topografados, sendo destes 20 definidos como de alto grau de integridade, 03 de grau médio e apenas um de grau baixo.

Mesmo havendo diferenças entre os estudos, a leitura das obras permite a conclusão de que Laguna abriga grande quantidade de sítios, e em estados variados, que vão desde um alto grau de impacto a exemplares praticamente intactos. Entretanto, o processo de destruição dos bens arqueológicos por ação humana vem de longa data. A Figura 15 apresenta uma foto do ano de 1972, pertencente ao Professor Rohr, onde se visualiza a exploração do sambaqui da Carniça I:

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Figura 15: Extração de conchas do sambaqui Carniça I, registrada por Alfredo Rohr. Fonte: OSCIP Manoa Expedições, 2011.

O uso indiscriminado das reservas conchíferas existentes nos sítios perdurou até o ano de 1961, quando foi promulgada a Lei 3.924, restringindo o acesso aos bens arqueológicos para fins industriais.

Imagens referentes aos anos de 2009, 2010 e 2012 ilustram as atuais condições de integridade do conjunto arqueológico de Laguna. A Figura 16 apresenta o sambaqui do Peralta, localizado no morro de mesmo nome, no centro da cidade:

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Figura 16: Residência construída sobre o lençol conchífero do sambaqui do Peralta. Fonte: arquivo IPHAN SC, 2012.

O sítio encontra-se em avançado estágio de degradação, em função da ocupação sobre os remanescentes arqueológicos. Sua proximidade com o núcleo do município tornou-o suscetível ao processo de densificação urbana, mesmo sendo a área protegida pela legislação ambiental federal.

Não é correto considerar, entretanto, que somente os sítios contíguos ao centro urbano são destruídos ou descaracterizados. A Figura 17 apresenta o conjunto de sambaquis da Carniça, localizado na comunidade de Campos Verdes, entre o canal da Barra e o início da Lagoa de Santa Marta:

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Figura 17: Sambaquis da Carniça (ao fundo), em área cercada destinada à criação de animais. Fonte: Estudo Preliminar para o Plano Diretor de Laguna, 2009.

Campos Verdes abriga a maior concentração de sambaquis de Laguna listada até o momento, e suas terras são utilizadas para uso residencial e agrícola. Até a década de 2000, a região abrigou fazendas de carcinicultura, desativadas após a proliferação de patologias entre as espécies de camarão. Atualmente, a cultura de arroz predomina sobre a paisagem, com plantações instaladas nas margens dos principais corpos d’água da região. Ademais, os sítios catalogados encontram-se às margens da Estrada Geral de Campos Verdes, principal conexão do local com a BR-101. A via atua como eixo de atração para o desenvolvimento urbano, tornando mais preocupante a situação do já impactado conjunto arqueológico.

O último exemplo de degradação não é causado por pressões urbanas ou rurais, mas pela prática de atividades de lazer não monitoradas. A Figura 18 mostra o sambaqui do Cabo de Santa Marta I, imponente sítio localizado na via de aceso à região do Farol de Santa Marta, nas cercanias do promontório de mesmo nome. Segundo Farias (2009: 39), apresentando estado de conservação entre 25% e 75%, o sítio vem sendo severamente impactado pela ação de motociclistas em disputas de motocross, além do uso do declive para a prática do sandboard.

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Figura 18: Sambaqui de Santa Marta I, com sulcos resultantes das atividades de motocross e sandboard. Fonte: arquivo IPHAN SC, 2010.

Panorama semelhante é verificado em outros exemplares, como o Ipoã e os demais sítios dos conjuntos Lagoa dos Bixos22 e Santa Marta. A liberdade de locomoção e possibilidade de contemplação da paisagem sobre os montes tornam os sítios atraentes à população, que acaba por danificá-los através de pisoteamento, uso de veículos e descarte de lixo em lugares inapropriados, entre outros.

Ainda há, contudo, sítios de matriz em melhor estado de conservação, como alguns exemplares do conjunto da Galheta. O tópico seguinte se dedica à descrição pormenorizada dos bens arqueológicos existentes em nossa área de estudos, completando o capítulo de caracterização do recorte espacial adotado na pesquisa.