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MAPA XI – Mapa da Área Especial de Estudo da Galheta – AEEG

3. ASPECTOS SOCIOECONÔMICOS

3.4 O BEM ARQUEOLÓGICO E SUAS IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS

3.4.4 Turismo arqueológico

Como última implicação econômica atribuída ao patrimônio arqueológico, destacamos o setor turístico, que entre os anos de 1999 e 2009 teve sua receita cambial mais que triplicada no Brasil, segundo dados do Ministério do Turismo (2010: 05). Para o estado de Santa Catarina, no ano de 2009 foram gerados mais de seis bilhões de reais em receita, contabilizando os valores gastos pelos visitantes e os investimentos estruturais no setor e em serviços correlatos, conforme estudos da Secretaria Estadual de Turismo, Cultura e Esporte27 (2009: 07; 2012: 05).

Antes de abordamos diretamente a participação do patrimônio arqueológico no turismo, cabe uma breve introdução a respeito do tema. Sancho (2001: 38) apresenta a definição da atividade turística elaborada pela Organização Mundial do Turismo (OMT), no ano de 1994: “o turismo compreende as atividades que realizam as pessoas durante suas viagens e estadas em lugares diferentes ao seu entorno habitual, por um período consecutivo inferior a um ano, com finalidade de lazer, negócios ou outras”. Segundo interpretação do Ministério do Turismo (2006: 03), os deslocamentos turísticos atendem a diferentes fins, de maneira que é possível segmentá-los em diversas categorias, “a partir dos elementos de identidade da oferta e também das características e variáveis da demanda”. O documento do ministério distribui o turismo em doze classes, sendo uma delas o turismo cultural. O segmento é composto pelas “atividades turísticas relacionadas à vivência do conjunto de elementos significativos do patrimônio histórico e cultural e dos eventos culturais, valorizando e promovendo os bens materiais e imateriais da cultura”.

27 Os estudos da Secretaria Estadual de Turismo, Cultura e Esporte para o ano de 2009 não levaram em

consideração os meses de julho, agosto, outubro de dezembro, de maneira que os valores podem ser revistos em publicações futuras.

104 O debate acerca do turismo cultural permeia o cenário internacional já há algumas décadas. No ano de 1976, foi elaborada a Carta do Turismo Cultural, por iniciativa do Conselho Internacional de Monumentos e Sítios (ICOMOS). A atividade é assim descrita:

O turismo cultural é aquela forma de turismo que tem por objetivo, entre outros fins, o conhecimento de monumentos e sítios histórico- artísticos. Exerce um efeito realmente positivo sobre estes tanto quanto contribui – para satisfazer seus próprios fins – a sua manutenção e proteção. Esta forma de turismo justifica, de fato, os esforços que tal manutenção e proteção exigem da comunidade humana, devido aos benefícios socioculturais e econômicos que comporta para toda a população implicada.

Em complemento à descrição fornecida pela Carta do Turismo, Veloso e Cavalcanti (2007: 156) citam a definição do segmento pela ótica da OMT, organização da qual o Brasil é integrante. Transcrevem os autores que “o turismo cultural é uma modalidade de turismo que se concentra no patrimônio cultural de um país e de seu povo, retratado em seus monumentos e sítios históricos, sua arquitetura tradicional, seus artefatos, eventos, realizações culturais e artísticas”.

As instituições citadas interpretam o patrimônio arqueológico como pertencente ao grupo de objetos contemplados pelo turismo cultural, por considerarem os vestígios materiais pretéritos símbolos da diversidade etnológica dos povos, atraindo o fluxo de turistas em busca de intercâmbios culturais. Beni (2007: 473, 482), entretanto, adota uma segmentação mais técnica e especializada, ao conceituar turismo cultural e turismo arqueológico como categorias independentes, embora correlatas. Em relação à primeira, assim define: “refere-se à afluência de turistas a núcleos receptores que oferecem como produto essencial o legado histórico do homem em distintas épocas, representado a partir do patrimônio e do acervo cultural, encontrado nas ruínas, nos monumentos, nos museus e nas obras de arte”. Quanto ao turismo arqueológico, classifica-o como a “denominação dada ao deslocamento de pessoas a sítios arqueológicos, escavações e cavernas com inscrições e pinturas rupestres com acompanhamento obrigatório de guia especializado”.

Seja categorizado como segmento específico do turismo, ou como pertencente a outros segmentos, o turismo arqueológico é identificado como uma atividade relevante ao setor, pois incentiva os fluxos populacionais e a difusão do patrimônio cultural internacionalmente. Ademais, possibilita a geração de renda e destinação de recursos à proteção dos próprios bens visitados. Conforme palavras de Bastos (2002: 125), o turismo arqueológico é

105 uma alternativa de preservação que deve ser levada em consideração sempre que possível, pois é fonte permanente de recursos, de empregos e de envolvimento comunitário, além de exigir constante manutenção da base dos recursos culturais arqueológicos, categoria chamada de turismo arqueológico sustentável, pois procura sobretudo preservar o objeto de visitação.

Ainda que seja comum a associação do turismo arqueológico às grandes estruturas arquitetônicas, como ocorre em países como Itália, Grécia, Egito e Peru, Scatamacchia (2005: 81) afirma que a proeminência dos bens não é condição obrigatória ao desenvolvimento da atividade. A autora destaca a atratividade de estruturas históricas de menor porte, como engenhos e ruínas de fortalezas, e de bens materiais pré-históricos, como artes rupestres e sambaquis. Interpretamos também como objetos de contemplação os ambientes naturais associados às estruturas patrimoniais citadas, que permitem a compreensão dos modos de vida das culturas visitadas.

Diante da variedade de conjuntos arqueológicos, Veloso e Cavalcanti (2007: 159) listam a gama de possibilidades para aproveitamento econômico no setor turístico:

Os produtos turísticos relacionados ao patrimônio arqueológico podem ser apresentados sob diversas formas, tais como:

ƒ Rotas temáticas;

ƒ Espetáculos e celebrações de recreação histórica de caráter mais participativo;

ƒ Apresentações de gastronomia como a gastronomia de povos antigos;

ƒ Possibilidades de se alojar em hotel que conserva vestígios arqueológicos;

ƒ Festivais de teatro clássico em sítios arqueológicos; ƒ Cine arqueológico;

ƒ Comemorações associadas a personagens e acontecimentos; ƒ Sítios arqueológicos integrados às cidades Patrimônio da

Humanidade;

ƒ Arqueologia industrial que pode englobar visitas a minas e complexos minerários;

ƒ Viagens temáticas; ƒ Visitas subaquáticas;

ƒ Desenvolvimento, por empresas privadas de reconstruções históricas, de gostos, sabores e odores de qualquer época ou de transporte no tempo;

106 A exploração do patrimônio arqueológico para fins turísticos, ainda que possível a diferentes estruturas, deve se orientar por algumas premissas básicas, que garantam a preservação dos bens, a democratização do acesso e a viabilidade da atividade. Mais uma vez, recorremos às palavras de Bastos (2007: 54):

Não há como transformar verdadeiramente o patrimônio cultural arqueológico em veículo de desenvolvimento turístico sustentado, sem antes garantir a ele os atributos necessários da apropriação pública, uma vez que os bens arqueológicos por definição são bens de alcance social.

Nossa contribuição vem no sentido de enunciar os princípios básicos que entendemos ser um instrumento sustentável de desenvolvimento turístico. Alguns quesitos se mostram no fundamento desta proposição:

a) Reinterpretação do patrimônio cultural arqueológico no cotidiano, geração de ocupação, renda e demarcação dos espaços turísticos;

b) Apropriação do espaço e da concepção do lugar pela população local;

c) Análise do patrimônio cultural arqueológico e estudo do espaço cultural através do tombamento, registro, cadastro, restauro, reconstrução, reutilização e ressignificação;

d) Interpretação do patrimônio cultural arqueológico ambiental na sustentabilidade do diferencial turístico.

Pela concepção do autor, a exploração turística dos bens arqueológicos in situ depende fundamentalmente da apreensão do patrimônio pela população, enquanto objeto de geração de conhecimento e referência simbólica cultural. Para tanto, é necessária a adoção de medidas para garantia da preservação dos bens, o que requer a ação de profissionais capacitados, entre outras funções, ao cadastramento e demarcação dos sítios, e disponibilização dos dados existentes ao grande público. Posição semelhante é defendida por Pardi (2007: 308), segundo a qual “os impactos possuem uma grande variedade de feições, inimagináveis para o leigo, o que torna indispensável a participação de especialistas, sem os quais o turismo em sítios fica sensivelmente prejudicado, se não inviabilizado”.

Como se percebe, a temática arqueológica possui implicações econômicas que podem se ramificar por caminhos diversos, influenciando as formas de uso e mercantilização do solo, instalação de empreendimentos públicos e privados, ordenamento jurídico, estratégias de mercado e geração de renda. Seja para aperfeiçoar as ações que se valem do patrimônio arqueológico, ou para adequação às normativas legais, sociedade civil, governos e entidades privadas podem dispor do cadastro territorial multifinalitário como ferramenta de

107 incorporação dos conjuntos arqueológicos às rotinas mercadológicas e tributárias. Tradicionalmente, embora não exclusivamente, o cadastro territorial é aproveitado para fins econômicos, de maneira que os conceitos e proposições metodológicas derivados do tema podem vir a ser de grande préstimo, como nos mostra o tópico seguinte.