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A saúde no contexto das linhas diretivas da Política Externa Brasileira de 1995-

4 DA ANÁLISE DOS MODELOS DE COOPERAÇÃO INTERNACIONAL À

4.5 A saúde no contexto das linhas diretivas da Política Externa Brasileira de 1995-

Considerando as diretrizes da política externa brasileira e os governos brasileiros entre 1995 e 2016, a política externa brasileira no governo do Presidente Fernando Henrique buscou a autonomia pela integração, ou seja, o país procurou uma “autonomia mais articulada com o meio internacional” no intuito de ter “voz ativa” e maior participação nas questões mundiais (PUENTE, 2010. p, 218).

Lampreia (1998, p.11-3) destaca que no período do governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso observou-se a criação e a institucionalização do MERCOSUL, a adesão ao Tratado de Não-Proliferação Nuclear (TNP) e a decisão de submeter ao Congresso a aceitação da competência jurisdicional da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Esses movimentos do país produziram repercussão política do meio internacional, traduzido, por exemplo, no caso da adesão ao TNP, e no convite do G887 para que o Brasil participasse junto com os membros do grupo de países mais ricos do mundo, das discussões para uma solução

87 G8: Agrupamento político formado por oito países com elevado grau de industrialização, Alemanha, França,

Itália, Reino Unido, Japão, Estados Unidos Canadá e Rússia. O grupo se reúne anualmente para discutir assuntos como crescimento econômico e gerenciamento de crises mundiais, segurança internacional, energia e terrorismo. Disponível em http://www.cfr.org/international-organizations-and-alliances/group-eight-g8-industrialized- nations/p10647. Acesso em 25/12/2016

sobre as tensões no sul da Ásia após os testes nucleares da Índia e do Paquistão no ano de 1998.

Outras características da política externa no governo Fernando Henrique foram a participação em forças de paz das Nações Unidas em diversos continentes, a participação ativa em Fóruns multilaterais e fortalecimento de relações bilaterais (LAMPREIA, 1998, p. 15). Nesse tocante, pode-se citar a participação brasileira nas negociações para o acordo TRIPS e Saúde Pública, que culminaram na Declaração de Doha sobre o tema em 2001.

Referências à cooperação técnica entre países em desenvolvimento no discurso diplomático do Presidente e Chanceleres no período do governo do Presidente Fernando Henrique são referidas como poucas por Puente (2010, p.223). Para o autor, a pouca presença do termo nos discursos não significa que a cooperação não existisse, mas que a temática tenha sido “ofuscada” pela temática da integração regional.

Quando presentes, três temas aparecem de forma recorrente do discurso diplomático do governo do Presidente Fernando Henrique: a preocupação com o combate à epidemia de HIV/AIDS, o meio ambiente e a educação (PUENTE, 2010, p. 230). Como assinala o autor, o Presidente fez menção à cooperação entre os países em desenvolvimento como meio de combater a epidemia, ao discursar na III Conferência de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) em Maputo, em julho de 2000 (PUENTE, 2010, p. 230).

Considerando o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, projetos na área de saúde encontraram-se fortemente alinhados às diretrizes da política externa brasileira do período, que em linhas gerais podem ser consideradas a seguir:

Revitalização e ampliação do MERCOSUL; intensificação das relações com a América do Sul; aumento da presença e da cooperação com países africanos, com resgate do papel tradicional da África na Política Externa brasileira; busca de relações maduras com os Estados Unidos; perseguição do diálogo e da aproximação com países do sul, mas também com outras áreas (Oriente Médio e países Árabes); prosseguimento na defesa das Nações Unidas e proposta de ampliação no número de membros permanentes no Conselho de Segurança, com postura mais assertiva da candidatura do Brasil nesse contexto; prosseguimento e intensificação da participação nos foros multilaterais, sobretudo econômico, com a articulação de coalizões com países emergentes, com vistas à defesa de interesses comuns (PUENTE, 2010, p.221).

Lima (2005, p. 11-2), analisando a política externa dos dois governantes, ressalta que no campo da diplomacia econômica não houve mudanças significativas entre os dois governos, pois no governo do Presidente Fernando Henrique houve destaque para as mesmas questões ressaltadas no contexto das linhas diretivas do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Vizentini (2014, p. 50), sobre a política africana no governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, refere que a aproximação brasileira no período não se resumiu ao interesse do país em obter apoio de países do Continente para o pleito brasileiro a um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, mas para a formação de um grupo coeso que pudesse atuar em prol de seus interesses nas negociações políticas e comerciais junto a Organizações Internacionais, como a Organização Mundial do Comércio.

Ainda sobre a política africana do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Vizentini (2014, p. 51) refere que esta buscou potencializar a atuação internacional de países do Continente. Para esse contexto, destacam-se iniciativas como a criação do Fórum IBAS, a promoção das Cúpulas América do Sul-África e América do Sul-Países Árabes, a revitalização da CPLP e da ZOPACAS (Zona de Paz e Cooperação no Atlântico Sul). No campo econômico houve aumento de investimentos brasileiros em países do Continente, perdão da dívida de vários países, e apoio financeiro por meio do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. A cooperação técnica entre Brasil e países africanos também é referida pelo autor, destacando o mesmo, que as bem sucedidas práticas em várias áreas, inclusive de combate à epidemia de AIDS no país, atraíram a atenção de outros países, funcionando isto como um fator que gerou demanda por cooperação.

Flemes e Saraiva (2012, p. 224) destacam que o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva “trouxe um novo perfil para a política externa brasileira”. Os autores fazem referência à articulação presidencial com setores autonomistas do Itamaraty, que defendiam “uma projeção mais autônoma e proativa do país na política internacional, visando a revisão das instituições internacionais e a aproximação com países emergentes que teriam características comuns com o Brasil”. Nesse sentido, a aproximação entre África do Sul, Índia e Brasil culminou com o Fórum IBAS, em 2003, e a aproximação entre Brasil, África do Sul, Índia, China e Rússia culminou com a criação do Fórum informal BRICS, em 2008, participando a África do Sul como membro do Fórum a partir de 2011.

Outro aspecto importante da política externa do período se refere à pluralização de atores no processo de formulação de política externa, no contexto da cooperação Sul-Sul. Nesse sentido, outros Ministérios passaram a ser mais atuantes nas formulações e ações de cooperação tais como os Ministérios da Saúde, Ciência e Tecnologia e da Agricultura (PINHEIRO e MILANI apud FLEMES e SARAIVA, 2012, p. 225)88.

88 PINHEIRO, L. & MILANI, C.R.S. (orgs.) Política externa brasileira. As práticas da política e a política das

O governo da Presidente Dilma Rousseff, que sucedeu o do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apresentou tanto mudanças, quanto continuidade na orientação política quando se compara ao governo anterior. Flemes e Saraiva (2014, p. 228) referem que, ao menos no nível do discurso, “a disposição de manter a trajetória revisionista nas instituições internacionais e a atuação nos foros multilaterais com o perfil de representante dos países do Sul” se manteve, mantendo-se também a variedade de atores envolvidos na política externa já presentes desde o governo anterior, e a visão autonomista de representantes que permaneceram nas principais posições do Itamaraty.

No entanto, a autora ressalta que a visão de “projeção global do país e a construção de uma liderança na região não teve continuidade” (SARAIVA, 2014, p. 27). No contexto da América do Sul, Saraiva (2014) faz referência à manutenção do interesse do país pelo MERCOSUL, mas de não ter havido continuidade da articulação existente no governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no sentido do país construir uma liderança regional (SARAIVA, 2014, p. 32-4). Para Flemes e Saraiva (2014, p. 228), na América do Sul o governo brasileiro trabalhou para romper com a oposição argentina e construir uma posição de consenso no interior da região.

No que se refere à continuidade, Saraiva (2014) ressalta que o país manteve a preferência por negociações multilaterais no sistema internacional, o posicionamento de não intervenção militar e a preferência pela solução diplomática de controvérsias. No que tange aos agrupamentos inter-regionais, houve avanços no BRICS, com assinatura de acordos, particularmente no campo financeiro, como a criação do Banco dos BRICS para dar suporte a iniciativas com o desenvolvimento de infraestrutura nos países do agrupamento. No caso do IBAS, foco maior foi registrado no contexto do Fundo IBAS e da interação das respectivas sociedades civis (SARAIVA, 2014, p. 30).

A cooperação brasileira com o continente africano manteve destaque, embora Saraiva (2014, p. 30) faça referência que houve diminuição no estabelecimento de novas iniciativas. Exemplo dessa observação se traduz no levantamento de projetos e atividades isoladas no segmento saúde do governo da Presidente Dilma Rousseff entre os anos 2011 e 2015. Nos dados relativos à cooperação para o combate ao HIV/AIDS nesse período, foram executados e concluídos apenas oito projetos na área de HIV/AIDS, existindo ainda três em execução (ABC, 2016b).

A saúde foi um tema que esteve presente na política externa dos três governantes brasileiros entre 1995 e 2016, mas como ressalta Puente (2010), a temática parece ter estado mais presente, no âmbito do discurso, durante o governo do Presidente Luiz Inácio Lula da

Silva, quando comparado ao governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso. A existência de ações concretas na área foi verificada a partir do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, estendendo-se as mesmas para o governo da Presidente Dilma Rousseff.

A concretização de ações na área a partir do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi resultado de todo o processo histórico do Estado brasileiro no combate à epidemia de HIV/AIDS no país que se iniciou ainda nos anos 1980, quando surgiram os primeiros casos da doença no mundo. A cooperação brasileira na área iniciada nos anos 2000 reflete o amadurecimento das ações do Estado no combate à epidemia dentro de suas próprias fronteiras e que puderam, a partir desse período, ser internacionalizadas no contexto da cooperação para o desenvolvimento internacional.