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CAPÍTULO 1 – REVISÃO DA LITERATURA

1.9 O SAMBA

1.9.2 Samba de Roda: Patrimônio Imaterial da Humanidade

Desde 2004, o Samba de Roda foi considerado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional- IPHAN - como patrimônio imaterial. O ritmo e a dança tiveram a sua candidatura ao Livro do Tombo lançada em 4 de outubro de 2004. O Samba-de-Roda foi registrado como ―Patrimônio Imaterial‖, em 25 de novembro de 2005. Foi realizada uma ampla pesquisa sobre a história do samba pelo Departamento de Patrimônio Imaterial do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN. Reconhecer o Samba-de- Roda como Patrimônio foi importante tanto para a cultura popular, quanto para a cultura do Recôncavo da Bahia, berço do samba-de-roda. O samba do Recôncavo baiano tem seu ponto forte na cidade de Santo Amaro da Purificação, nela foi criada a Casa de Samba do Recôncavo que está no antigo Solar Subaé, construído no século XIX e também considerado como Patrimônio Histórico Nacional (do Brasil).

O Samba de Roda, segundo Zeferino (2008), é reconhecido como uma manifestação cultural de grande importância histórica, pois muito contribuiu e contribui para a Cultura brasileira e, de acordo com o Dossiê do IPHAN (2006), para seus praticantes tem o papel de retratar as tradições centenárias trazidas ao Brasil pelos africanos escravizados e é o resultado de um processo de trocas interculturais. Mas, apesar de ser uma atividade com traços culturais africanos, segundo o Dossiê, ele também traz elementos próprios dos europeus, como o uso de determinados instrumentos musicais.

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O samba constitui-se numa reunião de um grupo de pessoas para a performance de um repertório musical e coreográfico. Os participantes reúnem-se em círculo, daí a origem do nome samba-de-roda; tem o acompanhamento por instrumentos musicais e os cantos são estróficos e silábicos, de caráter responsorial e repetitivo que são tirados por um solista e acompanhado pelos demais participantes. Os homens têm a função de tocar, exceto ‗o prato com a faca‘ que é específico das mulheres, conforme figuras 2 e 3, assim como a função de sambar. As estrofes são relativamente curtas; a coreografia é feita dentro da roda, de forma variada.

Figura 2: Tocadores.

Figura 3: Mulher tocando ―prato com faca.‖ Fonte: Dossiê IPHAN (2006).

O passo mais conhecido do samba de roda é o miudinho com movimento feito, sobretudo, da cintura para baixo e consiste num quase imperceptível sapatear para frente e para trás, com os pés quase colados ao chão, e o movimento correspondente dos quadris. Este movimento, para as sambadeiras, comunica-se às outras partes do corpo simultaneamente, e neste passo, há a evolução para frente, para trás, para os lados, dependendo da vontade da sambadeira. A roda-de-samba pode acontecer em qualquer espaço, aberto ou fechado, e tem um caráter inclusivo.

Segundo Döring (2002), o samba chula é mais complexo musicalmente do que o samba- de-roda, parece ter sua origem e presença, quase que exclusivamente, na região de Santo Amaro e em poucos outros lugares do Recôncavo da Bahia. Ele é um samba de viola, no qual a viola é tocada de maneira característica com tonalidades determinadas, afinações das cordas, técnicas e acentos rítmicos específicos. O canto se apresenta como uma quadra que é chamada

chula e geralmente consta de 2 a 4 versos que são cantados pelo cantor principal sem serem repetidos pelo coro.

Existem situações em que o cantador pára de cantar, se por acaso, alguém que desconhece as regras do samba chula entra numa roda enquanto eles estão cantando. E, no momento oportuno, na roda só pode entrar uma sambadeira por vez e, Sr. Primeiro28, sambador de Santo Amaro, em entrevista concedida no dia 15 de abril de 2010 diferencia o samba da seguinte forma: O samba chula é cantado em dupla acompanhado por viola e

pandeiro, e durante o tempo em que a dupla está cantando, as sambadeiras não podem e não devem sambar. Se eles levarem uma hora cantando, a sambadeira vai levar uma hora sem sambar, depois que o canto termina, a sambadeira tem a obrigação de sair se comunicando com todo mundo. Eles param de cantar e tocam apenas a percussão, o pandeiro e a viola, momento que elas, as sambadeiras, começam a sambar e o tempo procede da mesma forma com os tocadores. Se elas levarem uma hora sambando não podem reclamar, pois na roda de samba respeita-se o direito um do outro.

Além disso, segundo Nunes (2002, p. 54), no samba chula29,

[...] as sambadeiras mantêm a coluna vertebral ereta, os dois joelhos semiflexionados, com ambos os braços relaxados e soltos, descansando-os ao longo do corpo. O peso do corpo é distribuído na sola dos pés, entre os dedos e os calcanhares. O movimento dos quadris também é contínuo e proveniente do ritmo produzido pelos pés.

Há ainda o samba amarrado e para Sr. Primeiro, [...] Samba amarrado é bem lento, é

idêntico ao samba chula. Também é cantado em dupla, todos se conhecem, têm na língua, têm no pé, têm na memória, têm na mente, sabem o que quer dizer samba de roda.

Samba de roda, samba duro, segundo Nunes (2002), é samba feito somente por homens. Acontece quando não há mais a participação das mulheres na roda de samba e caracteriza-se pela aceleração do ritmo, passando para samba corrido.

28 Sambador de Santo Amaro

29Chula segundo Cascudo citado por Nunes, seria ―canto seresteiro ou de salão cordial‖ Luís Câmara Cascudo. p.

Samba corrido é comunicativo, pode participar mais de uma pessoa, homens e mulheres também podem estar juntos, pois neste samba, cada um quer mostrar o que sabe, as meninas, principalmente, para mostrar o rebolado.

O samba de roda não possui um período específico para acontecer, mas existem momentos em que é indispensável. No início das apresentações públicas, estava ligado a festas católicas populares, que, no Recôncavo, são associadas as tradições religiosas afro- brasileiras. No mês de setembro, nas festas dos Santos Cosme e Damião, sincretizados como os orixás iorubanos gêmeos, os Ibeji; nos cultos aos Caboclos, entidades espirituais cultuadas no contexto afro-brasileiro; após as festas de candomblés de rito nagô ou angola. Na Ilha de Itaparica, acontece no período da manhã, depois de uma noite inteira de festa para os eguns, entidades espirituais relacionadas aos ancestrais; na cidade de Cachoeira, no mês de agosto, na festa da Boa Morte.

Na cidade de Santo Amaro, na festa de Nossa Senhora da Purificação e, conforme descreve Nunes (2002), na Festa do Bembé do Mercado, conhecida também como Festa do 13 de maio ou Festa dos Pretos. Esta festa que teve início em 1888, inicia-se três dias antes do 13 de maio, no mercado municipal de Santo Amaro da Purificação. Ainda de acordo com o autor, nesta festa, ―os adeptos da religião e do culto do candomblé se reúnem para cantar e dançar, culminando no último dia com oferendas a Oxum, mãe das águas doces‖. Hoje, ―[...] traz em seu contexto sambas de caboclo contando com a presença de mães, pais e filhos de santo e sendo semantizada como uma prática de resistência e respeito às diversas etnias existentes na região do recôncavo‖ (NUNES, 2002, p. 92).

Segundo Pinto (1990, p. 106 apud Dossiê IPHAN, 2006, p. 21),

No Recôncavo, o samba sem dúvida tem uma posição especial. É significante a ligação que o samba consegue entre todas as faixas etárias e entre os sexos, como também o fato de que formas de samba são ligadas, de uma ou outra maneira, a quase todas as espécies culturais importantes, e que têm um papel importante nas demais datas festivas, sejam elas religiosas, rituais ou de outra natureza.