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1 SOBRE A PREDICAÇÃO COMPLEXA NA ABORDAGEM TRADICIONAL E

2.7 SCs nominais

Chamamos de SC nominal o constituinte oracional que possui como predicado um nome, seja ele um substantivo (NP), encabeçado ou não por um determinante (um DP), ou um adjetivo (um AP). Estas podem ser chamadas de SCs adjetivais e constituem as SCs mais facilmente identificáveis, pois a predicação entre os dois itens, o AP e o NP (ou PRO coindexado a um NP) parece ser bastante clara. Contreras (1995), por exemplo, propõe uma divisão entre os predicados, em que apenas os predicados adjetivais e verbais constituem verdadeiras SCs.

Para Contreras (1995, p. 136-137), como os predicados adjetivais49 e verbais possuem o traço [+V], as estruturas com predicados adjetivais e verbais possuem um sujeito e são domínios opacos para ligação. No caso de predicados adjetivais, o AP contém traços de seu sujeito. A existência de um sujeito50 e de um domínio opaco51 seria evidenciada pela agramaticalidade das sentenças (149) e (151):

(148) Nós consideramos [Maria orgulhosa]

(149) *Nósi consideramos [Maria orgulhosa com nós mesmosi]

(150) Nós consideramos [Mariai orgulhosa consigo mesmai]

(151) *Nós consideramos [Mariai orgulhosa com elai]

Em (148), temos um exemplo de uma estrutura com predicado adjetival. Em (149), a anáfora [nós mesmos] está ligada ao antecedente [Nós]. Segundo o Princípio A da Teoria da Vinculação, toda anáfora deve estar ligada ao seu domínio de vinculação. Se entendermos que a estrutura oracional [Maria orgulhosa de nós mesmos] constitui o domínio de vinculação da anáfora, seria nesse domínio que ela deveria estar ligada. Entretanto, em (149), essa anáfora está ligada a um elemento que se encontra fora desse domínio. Assim sendo, de acordo com a proposta de Contreras, a agramaticalidade de (149) é explicada pela presença de um NP que ocupa a posição de sujeito [Maria] na estrutura oracional [Maria orgulhosa com nós mesmos]. A presença desse sujeito bloqueia a ligação entre a anáfora [nós mesmos] e seu antecedente [Nós], pois mostra que há uma estrutura oracional onde a anáfora deveria estar ligada. Já a sentença (150) é gramatical, pois respeita a esse mesmo princípio. Assumindo com a posição de Contreras de que se trata de uma SC com predicado adjetival, essa SC constitui um domínio, e o sujeito [Maria] está ligada a uma anáfora, [si mesma], dentro desse domínio. A agramaticalidade em (151) (em que temos uma SC com predicado

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Contreras se refere adjetivos formados a partir de substantivos, como orgulhosa e inteligente. Isto é, o autor não está se referindo apenas a adjetivos formados a partir de verbos na sua forma participial, como preocupada ou desajeitada. Na seção 2.8, sobre as SCs verbais, apresentaremos a representação de verbos no particípio como SCs verbais.

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A hipótese de que a presença de um sujeito constitua um domínio opaco é enfraquecida pelo fato de alguns dados sugerirem que a anáfora pode ser sujeito de outro constituinte oracional. É o que mostram as sentenças a seguir cuja gramaticalidade não parece ser discutível. Em (i) a anáfora se, sujeito da SC complemento [se inteligente], está coindexada ao constituinte Maria, que está fora do domínio de vinculação da anáfora. Já em (ii) a anáfora se, sujeito da SC complemento [se cantar na TV], está coindexada ao constituinte Maria, que também está fora do domínio de vinculação da anáfora:

(i) Mariai considera [sei inteligente]SC compl

(ii) Mariai viu [sei cantar na TV] SC compl 51

“O domínio de vinculação de α é o XP mínimo que contém α, o regente de α e (i) um sujeito que é distinto de α e que não contém α; ou

adjetival cujo sujeito, [Maria], está ligado ao pronome) pode ser explicada, se admitirmos que há uma estrutura oracional que constitui um domínio de vinculação onde o pronome não poderia aparecer ligado a outro elemento.52

Porém, quando os predicados apresentam o traço [-V], ou seja, no caso de predicados nominais com substantivos e preposições, não há bloqueio para anáfora - isto é, não haveria um sujeito bloqueando a ligação entre a anáfora e seu antecedente. Portanto, aos predicados nominais com substantivos e predicados preposicionais, Contreras (1995, p. 141) propõe a estrutura de um predicado complexo. Vejamos os exemplos adaptados de Contreras (1995, p. 141) de predicados com substantivos encabeçados por determinantes:

(152) Nós consideramos Maria a nossa melhor amiga (153) Joanai considera Maria a melhor amiga delai

(154) As alunasi consideram Maria a melhor amiga de cada umai

(155) *Joanai considera Maria a melhor amiga de si mesmai

(156) Joana considera Mariai a melhor amiga de si mesmai

Em (152), temos um exemplo de sentença com predicado [-V], que é [a nossa melhor amiga]. O exemplo (153) contém um pronome que, estando ligado apenas ao sujeito da sentença, não está ligado em um determinado domínio, daí a gramaticalidade da sentença. Em (154), a anáfora [cada uma] está ligada ao sujeito [as alunas], sujeito da oração.53 Essa sentença parece mostrar que, ao contrário das sentenças de (148) a (151), não há um domínio, uma estrutura oracional, no qual a anáfora deveria estar ligada. Isto é, como afirma Contreras (1995, p. 136), a categoria regente para as anáforas contidas em (155) e (156) é maior do que a categoria apresentada nas sentenças de (148) a (151). Assim sendo, em (155), o predicado encaixado [-V] não possui sujeito, ou seja, [Maria] não é o sujeito de uma estrutura oracional. Entretanto, a sentença em (155), em que a anáfora está ligada ao sujeito da oração, não parece gramatical, contrastando com (156), em que a anáfora está ligada ao constituinte [Maria], que pode ser considerado o sujeito de um determinado domínio. Vejamos outro teste.

De acordo com Contreras (1995, p. 137), sentenças com predicados [+V], que constituiriam SCs, não podem sofrer reconstrução. Isto é, quando aparecem fronteados, os

(ii) a flexão que atribui Caso Nominativo para α.” (MIOTO ET AL., 2005, p. 230)

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Asserções similares podem ser feitas em relação a estruturas cujos predicados são verbais. Essas asserções serão analisadas na seção sobre SCs verbais.

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Menuzzi e Simões (comunicação pessoal, 2009) lembram que “cada” pode ser analisado como um floating

predicados carregam traços de seus sujeitos, o que inviabiliza que esses predicados apareçam ligados a anáforas. Essa hipótese colocaria SCs adjetivais e verbais em oposição a predicados preposicionais, [-V], em que a reconstrução parece ser possível. Vejamos como ficam os exemplos acima:

(148’) [O quão orgulhosa de cada umi] elesi consideram a Maria?

(152’) [O quão amiga de cada umi] elesi consideram a Maria?

Se os predicados podem ser fronteados e ligados a anáforas, então, de acordo com Contreras, não se trata de SCs, pois os traços dos sujeitos não estariam presentes naqueles predicados. Entretanto, as duas sentenças acima parecem gramaticais, tanto (157), com predicado [+V], como (152), com predicado [-V], ainda que a aceitabilidade possa ser discutida. Diante desse contraste e por questões de generalidade, trataremos ambos os tipos de estruturas com predicado nominal como SCs nominais.

Passemos para a análise de SCs verbais.