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Ou seja, situações de dois ou múltiplos lados nas quais há uma transação entre os usuários

direito da concorrência

35 Ou seja, situações de dois ou múltiplos lados nas quais há uma transação entre os usuários

do lado de preço zero e aqueles do lado pago, por meio de uma plataforma.

36 NEWMAN, John M. Antitrust in zero-price markets: foundations. University of Pennsyl- vania Law Review, v. 164, p. 149-206, 2015. Disponível em: https://scholarship.law.

cada produto (ou grupo de produtos análogos) em que os consumidores decidem dedicar quantidade ou qualidade determinada de atenção em tro- ca do produto.

No caso de cálculo de market share, pode-se considerar o volume de vendas/quantidade de usuários, no lugar do valor. No entanto, ainda que tal ferramenta ajude a dimensionar o mercado, ela é limitada, já que não com- preende todos os aspectos relevantes da competição. Não abrange as variá- veis de difícil expressão numérica, particularmente importantes em merca- dos de preço zero, como a qualidade. Adotando a premissa de Evans acerca da definição do mercado relevante, segundo a qual haveria um único mer- cado de atenção no universo de marketing on-line, seria possível medir o poder de mercado do Facebook e da Google com base no preço que cada um cobra pelo espaço e pelo tempo de anúncios publicitários?

De forma similar, o SSNIP poderia ser adaptado, substituindo a variável preço por custo, resultando no small but significant non-transitory increase

in cost (SSNIC). Conforme explorado supra, consumidores de produtos e

serviços preço zero não os obtêm de forma gratuita, na medida em que o pagamento pode ser substituído por dados, tempo e atenção. Além da difi- culdade de mensurar com precisão qualitativa e quantitativamente os dados, o tempo e a atenção que consumidores trocam para obter bens de preço zero, tal solução encontra o desafio adicional de atribuir um valor numérico a tais variáveis, o qual pode variar conforme cada usuário. Isto é, o valor que se dá à privacidade do nome, do CPF ou do endereço e que se dá à aten- ção por cinco segundos de publicidade ou 20% da tela ocupada por banners com anúncios é altamente subjetivo.

Há que se considerar, ainda, especialmente para mercados digitais, a análise da chamada concorrência dinâmica. Dessa forma, não seria conside- rado apenas um retrato estático da rivalidade atual em certo mercado, e sim seu possível desenvolvimento futuro, considerando concorrência potencial. Na concorrência potencial, a atração de clientes pela oferta a preço zero de um produto representa papel relevante, vez que são características de tais mercados a inovação e mudanças constantes. Deve-se atentar, porém, para que essa análise seja fundamentada e cuidadosa, de forma a evitar o exercí- cio de futurologia.

Verifica-se, portanto, que, apesar de haver limitações para as soluções abordadas, é imperativo que se reconheça sua importância. Dado que zero-

-price markets apresentam características peculiares, nem sempre identifi-

cadas em mercados com preços positivos, os mecanismos aqui abordados podem, ao menos, oferecer um reflexo mais próximo da realidade competi- tiva desses mercados.

Conclusão

A concepção tradicional de mercado, que envolve agentes econômicos buscando oferecer produtos e serviços pelo maior preço possível e consu- midores objetivando adquiri-los pelo menor preço possível, tem sido desa- fiada pelo crescimento de modelos de negócio diferentes, especialmente em economias digitais.

Trata-se dos chamados zero-price markets, nos quais agentes econômi- cos não exigem pagamento de valor monetário pelos produtos e serviços ofertados. Apesar da ausência de preço positivo, porém, tais mercados não deixam de ser concorrencialmente relevantes. Isso porque não se trata de bens gratuitos, na medida em que há outros fatores que não o preço deseja- dos pelas empresas e pagos pelos consumidores, como custos de atenção e informações pessoais. Da mesma forma, em plataformas de múltiplos la- dos, outros grupos de usuários podem pagar para que certos consumidores tenham acesso gratuito a determinadas funcionalidades.

Mercados que atuam com preço zero possuem particularidades, espe- cialmente no que diz respeito a mercados relacionados. Verifica-se que um agente econômico pode agir de forma perfeitamente racional, bus- cando a obtenção de lucro, e ainda assim não exigir preço positivo pelo produto ou serviço. Isso é possível em razão da interdependência com bens relacionados para os quais se exige pagamento, tornando a estraté- gia de precificação a zero economicamente viável em caso de bens com- plementares, mercados de dois ou múltiplos lados e produtos e serviços

freemium/pro.

Todos esses fatores – ausência de preço positivo, pagamento por meio de valores não pecuniários e existência de mercados relacionados – implicam desafios para a análise concorrencial de zero-price markets. Não apenas as

ferramentas analíticas tradicionais deixam de funcionar, como também há a necessidade de avaliação conjunta de mercados distintos (porém inter-rela- cionados) e de variáveis de difícil expressão numérica e/ou objetiva.

Faz-se necessário, portanto, que o direito da concorrência esteja atento para o crescente desenvolvimento de tais mercados e que, quando necessá- ria sua análise, sejam empreendidos esforços redobrados, de forma a consi- derar as possíveis variações em relação aos mercados tradicionais em que são cobrados preços positivos. Dessa forma, com o reconhecimento das implicações das particularidades do preço zero para o antitruste, poderão ser testadas e desenvolvidas ferramentas que avaliem adequadamente sua dinâmica competitiva.

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