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Uma característica notada por Fernández (2000) menciona que, diferentemente das sentenças-si, as sentenças-cuando, para serem condicionais, não podem ser contrafactuais, (381). O mesmo ocorre em português, (382).278

Espanhol

La gente habría sido generosa [*cuando]/[si] hubiera sido capaz de (381)

compartir.

(FERNÁNDEZ, 2000, pp. 207-208)

Português

[*Quando]/[Se] o jogador não tivesse forjado o pênalti, meu time teria (382)

sido campeão.

As sentenças-quando/cuando temporais-condicionais precisam trazer uma condição provável de ocorrência do evento e não uma hipótese de ocorrência do evento, por isso a distinção entre (383) e (384):

a. Quando estuda, tira boas notas. (383)

b. Se estuda, tira boas notas.

a. Quando estudar, tirará boas notas. (384)

b. Se estudar, tirará boas notas.

Fernández faz uma última ressalva a respeito das temporais-condicionais para o espanhol. O sintagma nominal da sentença-cuando condicional deve ser não específico, como em expresso em (385)a/(386)a, contrariamente a (385)b/(386)b:

a. Cuando el heredero al trono no es inteligente, es probable que tenga (385)

problemas con el ejército.

b. *Cuando el actual heredero al trono no es inteligente, es probable que tenga problemas con el ejército.

a. Cuando el paciente no presenta los síntomas característicos, no (386)

podemos hablar de un caso de viruela.

b. *Cuando este paciente no presenta los síntomas característicos, no podemos hablar de un caso de viruela.

(FERNÁNDEZ, 2000, p. 208)

O português parece apresentar o mesmo comportamento, conforme mostram os dados em (387).

a. Quando o/um paciente relata desconforto depois da cirurgia, é preciso (387)

investigar a causa.

b. *?Quando estes/os atuais alunos relatam maus-tratos por parte da polícia, o delegado deve investigar.

Nota-se que as versões com se/si são gramaticais em ambas as línguas:

a. Se estes alunos não vieram para a aula, é por que não interesse. (388)

b. Si estos alumnos no han venido a clase, es que no tienen interés.

Parece que a distinção entre sentenças condicionais e temporais-condicionais está relacionada a que estas mostrem a genericidade do evento, o que as condicionais per si nem sempre garantem.

4.7 SENTENÇAS ATEMPORAIS, GENÉRICAS E TEMPORAIS-

CONDICIONAIS

Parece-nos que existe uma relação intrínseca, no que diz respeito à temporalidade, entre as sentenças temporais-condicionais e as sentenças when-clauses atemporais mencionadas por Declerck (1997) e ilustradas em (389), abaixo, uma vez que aquelas sentenças também são atemporais.

De acordo com Declerck, existem alguns contextos que favorecem a leitura atemporal da when-clause, WC: (i) a WC relativa restritiva modificando o substantivo case/caso, (389)a; (ii) o conectivo when com sentido de in case when/em um caso quando ou in that/those cases when/na(s) aquele(s) casos quando, (389)b/c; (iii) nas sentenças adversativas, (389)d e, por fim, (iv) em determinadas sentenças com caráter especificacional, (389)e.

a. This is what usually happens in cases when the divorced woman has (389)

no income of her own.

‘Isto é o que geralmente acontece em casos quando a mulher divorciada não tem renda própria.’

b. You can’t ask one carrier to underwrite on social grounds when/ in

cases when that might destroy it in the marketplace.

‘Você não pode pedir a uma operadora para assegurar com base em razões sociais quando/nos casos quando isso poderia destruí-la no mercado.’

c. There are many stone circles – we call them standing stones even

when/ in those cases when they are recumbent.

‘Há muitos círculos de pedra – nós as chamamos pedras de pé/menir mesmo quando/naqueles casos quando elas estão reclinadas.’

d. Sometimes he has a very unfortunate manner. People think he’s being hostile when he’s not really.

‘Às vezes ele tem modos muito inapropriados. As pessoas pensam que ele está sendo hostil quando ele realmente não está.’

e. The only case in which a widow gets so high a pension is when she has more than three children.

‘O único caso em que uma viúva consegue uma pensão alta é quando ela tem mais do que três crianças.’

Apesar de o autor não discutir amplamente o tema, afirma que para sentenças do tipo de (389)e, when/quando pode ser substituído por if/se. Para esse autor, o uso alternativo desses termos não produz diferença de significado:

a. If/When the market surges, holders can make that much more profit (390)

[…]. But if/when the market moves against the fund, investors lose more than other junk holders [...].

‘Se/Quando o mercado oscila, os acionistas podem torná-lo muito mais lucrativo [...]. Mas se/quando o mercado direciona-se contra o capital, os investidores perdem mais do que quaisquer outros acionistas.’

b. Children are orphans if/when their parents are dead. ‘Crianças são órfãs se/quando os pais delas estão mortas.’

(DECLERCK, 1997, p. 44)

O nosso ponto é que as sentenças temporais-condicionais poderiam ser um subtipo da sentença atemporal, mas não o contrário, já que nem toda sentença atemporal pode ser temporal-condicional. Outra forma de enxergar as sentenças temporais- condicionais é enquadrando-as dentro do grupo das sentenças genéricas.

De acordo com Müller (2003, p. 153), sentenças genéricas são uma forma de expressar regularidades ou leis gerais. A autora, entre outros, afirma que há dois modos de se expressar genericidade. A primeira é por meio de expressões de referência a espécies, que nas suas palavras são expressões nominais com comportamento de nomes próprios de espécies (conforme Carlson (1977a/b)); a segunda é por meio de sentenças genericamente quantificadas, em que a expressão da genericidade ocorre em razão de um quantificador genérico prender variáveis sob seu escopo (a esse respeito, a autora cita o estudo de Krifka et al. (1995)).

As expressões de referência a espécies fazem referência a todos os indivíduos da classe e não a cada indivíduo da classe particularmente. Em (391)a/b, telefone e mico leão dourado remetem a toda a classe. Parece-nos que as sentenças-quando/cuando em (297), (298) e (299) são desse tipo, bem como a sentença em (392) do mesmo estilo, ou pode ser que a relação entre elas seja de algum modo bastante estreita:

a. Graham Bell inventou o telefone. (391)

b. O mico leão dourado é raro.

(MÜLLER, 2003, p. 153)

Rinocerontes quando provocados são muito agressivos.

(392)

As sentenças genericamente quantificadas generalizam sobre entidades, estados e eventos particulares. Conforme Müller (2003, p. 153), essa é uma propriedade da sentença e não do sintagma nominal. Tais sentenças são parafraseáveis com o acréscimo de advérbios como geralmente, que indicam a regularidade do evento, conforme (393)a. Ponderamos que as sentenças-quando/cuando também poderiam se enquadrar nesse tipo, (394).

a. Italiano (geralmente) gosta de vinho. (393)

b. GENx (x é italiano, x gosta de vinho).

c. “Geralmente, se é italiano, então gosta de vinho.”

(MÜLLER, 2003, p. 153)

a. Quando em Brasília chove, (geralmente) faz frio. (394)

b. Quando chove muito, (geralmente) essa rua alaga.

Segundo Farkas e Sugioka (1983), o próprio quando/cuando parece funcionar como um quantificador genérico ou advérbio de quantificação como sempre que. Pensando que a interpretação da sentença é dada composicionalmente, mediante a codificação do tempo/aspecto e da relação de uma causa associada a um efeito, supomos que os contrastes translinguísticos descritos neste capítulo entre sentenças temporais e temporais-condicionais têm uma expressão na estrutura oracional. Para explicar essa ocorrência, seria admissível supor que, como postulado para as sentenças genéricas, deve haver uma espécie de operador genérico, GEN, com escopo sobre a sentença temporal-condicional de quando/se e cuando/si (CARLSON, 1979; KRIFKA, 1988, KRIFKA et al., 1995; FARKAS; SUGIOKA, 1983; MÜLLER, 2003). Essa abordagem encontra respaldo também em Heim (1982), que levantou a hipótese de que indefinidos genéricos (Criança precisa de atenção) e sentenças condicionais podem ser investigados de maneira semelhante (Uma festa de casamento custa

caro/Necessariamente, se x é uma festa de casamento, x custa caro). Tendo tais colocações em vista, é plausível esperar que uma análise comum que englobe as ocorrências de quando/cuando e se/si é possível.

As sentenças temporais-condicionais do tipo que discutimos expressam leitura de causa e efeito, têm sentido genérico e estão restritas a ocorrerem no tempo/aspecto presente/pretérito (imperfectivo). Essa caracterização deve ser obedecida simultaneamente na formação na sentença, ou seja, devem ser dadas de forma composicional. Parece existir, portanto, uma correlação entre a propriedade da genericidade, a expressão modo-temporal da sentença e a formação de sentenças temporais-condicionais.

4.8 SÍNTESE DO CAPÍTULO

Este capítulo abordou a polissemia de quando/cuando. Dedicamo-nos a discutir os casos em que o termo denota tanto temporalidade quanto condicionalidade. Vimos que na sentença temporal-condicional a substituição de quando/cuando por se/si faz com que a sentença não sofra drástica mudança de sentido e que há a possibilidade de ocorrência de ambos os termos nas orações que denotam propriedades de espécies, sentenças médias, sentenças iterativas/habituais, etc. Nesse sentido, orações temporais- condicionais teriam subclassificações. Nosso foco de análise são as orações que denotam uma relação de causação.

Abordamos o fenômeno a partir da descrição de suas propriedades, apresentando os trabalhos que discutiram esse tema em diferentes linhas teóricas. Neves (2000) enfatiza que os tempos presente e pretérito (imperfeito) favorecem a leitura genérica da sentença temporal-condicional. Gouveia et al. (2001) afirma que essa nuance condicional de quando é percebida pelos falantes. Pante e Maceis (2009) mostraram que a polissemia de quando é vista na diacronia da língua. Bezerra e Meireles (2009) destacam a propriedade da leitura de causação que as sentenças temporais-condicionais refletem. Ramos e Silva (2012) evidenciaram a grande ocorrência de sentenças-quando com denotação condicional sob a forma temporal presente/presente. Para o espanhol, trouxemos o trabalho de Alcalá-Alba (1983), que aponta contextos para a ocorrência da sentença temporal-condicional, como o dos provérbios.

Com base na literatura e nas propriedades das orações temporais-condicionais de causa e efeito, supomos que a formação dessas sentenças possui duas restrições: uma restrição de leitura por conta do evento que descreve, uma relação entre uma causa associada a um efeito; e uma restrição de tempo/aspecto, posto que a sentença temporal- condicional tem caráter genérico e requer um tempo/aspecto que vincule essa noção, como o presente e o pretérito (imperfeito). Hipotetizamos a plausabilidade de se pensar em um operador genérico com escopo sobre a oração temporal-condicional, que daria conta da interpretação da sentença de forma composicional. Relatamos ainda os contrastes entre as sentenças temporais e as condicionais prototípicas e as temporais- condicionais.

Por fim, a sentença temporal-condicional abre o espaço para uma discussão suscitada por Declerck (1997), que vinculou a tipologia das sentenças-quando/cuando a um determinado sistema temporal, conforme foi apresentado no Capítulo 1. No próximo capítulo, traremos esse debate a partir da formação das sentenças temporais propriamente.

CAPÍTULO 5

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TIPOLOGIA DAS ORAÇÕES-QUANDO/CUANDO:

SENTENÇAS ADVERBIAIS TEMPORAIS

5.1 INTRODUÇÃO

E

ste capítulo tratará da oração adverbial temporal, tendo como referência a relação temporal com a oração matriz/principal e o contraste entre o português e o espanhol na codificação morfofonológica dessa relação. O objetivo da seção 5.2 é investigar propriedades sintáticas e semânticas que essas sentenças aportam. Na seção 5.3, mostramos que as orações-quando/cuando (OQs/OCs) canônicas são distintas em vários aspectos das OQs/OCs narrativas. Na seção 5.4, trazemos questões concernentes ao sistema modo-temporal, com atenção particular às sentenças adverbiais temporais prototípicas e distinções que português e espanhol esboçam, com implicações para a realização sintática das categorias envolvidas.