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Sinistralidade e medidas para a sua resolução em outros países

No documento TD Manuel José Serra da Fonseca (páginas 39-44)

PARTE I – A sinistralidade rodoviária e as campanhas de prevenção

1.2. O contexto internacional

1.2.2. Sinistralidade e medidas para a sua resolução em outros países

Quando se perspetiva a situação da sinistralidade rodoviária num raio de abrangência que ultrapasse a realidade nacional, europeia e dos Estados Unidos da América, os números e o contexto assumem uma relevância e uma significância alarmantes: de acordo com a Organização Mundial de Saúde (WHO, 2009) a sinistralidade rodoviária provoca por ano, a nível mundial, 1,3 milhões de vítimas. O mais preocupante é que desse número, cerca de 90% são provenientes de países com baixos e médios rendimentos. Paralelamente, calcula-se que entre 20 e 50 milhões de pessoas ficam feridas (e, pelo menos, temporariamente incapacitadas) em consequência deste tipo de

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acidentes, que correspondem a uma das três principais causas de morte não natural, entre indivíduos na faixa etária dos 5 aos 44 anos. De acordo com esta instituição, se não forem tomadas medidas urgentes capazes de inverter a tendência verificada, a sinistralidade rodoviária – atual nona causa de morte não natural no mundo – poderá ascender à quinta posição em 2030, com 2,4 milhões de vítimas por ano (figura 2).

Figura 2 – Comparação de causas de morte no mundo 2004-2030 (Fonte: WHO, 2009)

Também o fator económico assume proporções catastróficas. Estima-se que a sinistralidade rodoviária tenha uma repercussão económica entre 1% e 3% do Produto Interno Bruto de cada país e que poderá ascender a 500.000 milhões de dólares (WHO, 2009).

A Organização Mundial de Saúde tem vindo a monitorizar a problemática da sinistralidade rodoviária a nível mundial, identificando causas e recomendando procedimentos a diversos países, com particular relevância desde 2004, altura em que foi publicado o "World report on road traffic injury prevention" (onde se revela que em 2002, morreram 1,18 milhões de pessoas vítimas da sinistralidade rodoviária, metade dos quais entre os 15 e os 44 anos de idade e que a então décima posição ocupada pela sinistralidade rodoviária, como principal causa de morte no mundo, poderia ascender à

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terceira posição em 2020). Posteriormente, com o objetivo de caracterizar o contexto da segurança rodoviária a nível mundial, esta instituição publicou em 2009 o primeiro "Global status report on road safety", uniformizando metodologias de análise entre os dados dos estados-membros com a intenção de os comparar. Este relatório evidenciou duas realidades principais: 50% das mortes provocadas pelos acidentes rodoviários ocorrem entre os utilizadores "vulneráveis das vias" (ciclistas, motociclistas e peões) e apenas 15% dos países apresentam uma legislação global sobre os principais fatores de risco em matéria de segurança rodoviária.

Em março de 2010, a Assembleia Geral das Nações Unidas declarou o período 2011- 2020 como a "Década de ação para a Segurança Rodoviária". Por trás desta iniciativa dos países membros, está a intenção de incentivar esforços nacionais e transnacionais – nomeadamente em países com vias rodoviárias comuns – visando alterar a tendência crescente de mortos e feridos resultantes de acidentes de viação por todo o mundo. Como? Primeiro estabilizando o número previsto de vítimas e depois reduzi-lo, através da intensificação de ações postas em marcha nos âmbitos regional, nacional e mundial (serão as delegações regionais a supervisionar o processo). Atualmente está em curso a elaboração de um segundo "World report on road traffic injury prevention", com os objetivos de identificar deficiências de segurança rodoviária nos diferentes estados- membros, descrever a situação de todos os países e avaliar as mudanças ocorridas desde a publicação da primeira versão deste documento em 2004 e servir de referência às ações a desenvolver no período compreendido entre 2011-2020.

No conjunto das medidas identificadas como exemplo de boas práticas, onde é feita referência às melhorias obtidas na engenharia rodoviária, na construção automóvel, nas ações de legislação, fiscalização e penalização por parte das autoridades e no incremento dos transportes públicos, a Organização Mundial de Saúde (2009) sublinha a importância das campanhas de sensibilização destacando a sua função essencial de divulgação e consciencialização junto das populações.

Ainda assim, Elvik (2009) afirma que existe pouca pesquisa direcionada para a criação de modelos de observação do efeito combinado (integrado) das várias medidas de prevenção de rodoviária. O modelo mais comum assume que os efeitos são independentes e que não são alterados quando outras medidas são introduzidas. Face a

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esta realidade, o autor sugere que os resultados poderão ser excessivamente otimistas e recomenda investigação adicional no sentido de serem criados modelos de análise mais sofisticados.

Paralelamente, refere-se que nos últimos 50 anos foram realizados grandes progressos, em termos de promoção de uma condução segura, devido em grande parte a questões de natureza tecnológica, como a introdução de sistemas de segurança passiva (de que são exemplo os airbags) ou ativa (como o sistema de travagem com ABS). No entanto, sublinha Lee (2008), a questão comportamental será sempre o fator determinante: as consequências do excesso de álcool e de velocidade, da fadiga, da distração e da condução agressiva, podendo ser atenuadas pela evolução tecnológica (que deverá progressivamente permitir a monitorização do comportamento de condução), continuam a assumir-se como um dos pilares essenciais da problemática em estudo.

Adicionalmente, refira-se o caso da Finlândia como um exemplo de sucesso na redução sustentada da sinistralidade rodoviária, através de medidas capazes de combinar e integrar as vertentes políticas, económicas, sociais, tecnológicas, ambientais e legislativas. No entanto, Katko (2006) afirma que a evolução positiva verificada nos últimos 35 anos e a posterior estagnação dos resultados pode significar que, em termos mais elementares, foi feito tudo o que havia para fazer na área de prevenção. Ou seja, quando o objetivo passa para "apenas" 250 vítimas mortais por anos, os desafios e a complexidade passam a ser muito maiores, nas palavras do autor: "(...)improving traffic safety will be relatively more difficult in the future because relatively simpler means have already been introduced."

Sendo o objetivo deste primeiro capítulo a abordagem do fenómeno da sinistralidade rodoviária apontando para a sua caracterização no contexto nacional, europeu e mundial, poder-se-á concluir o mesmo referenciando que a sinistralidade em análise, em Portugal, tem sofrido uma redução progressiva na última década, mas não de forma transversal a todo o tipo de acidentes. Na Europa e nos Estados Unidos da América, apesar do número de vítimas ser ainda considerável, assiste-se a um planeamento estratégico e integrado em termos de medidas de intervenção. De acordo com a Organização das Nações Unidas, tal situação não é verificável na maioria dos países, o

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que desperta para a premência de implementação de políticas de intervenção e resolução.

Assim, tanto a nível nacional como na conjuntura internacional, são reconhecidas melhorias na problemática em análise, mas é assumido um longo caminho a percorrer, nuns casos rumo à redução da sinistralidade rodoviária, noutros rumo à consolidação dessa redução e noutros, ainda, rumo à sua sustentabilidade.

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No documento TD Manuel José Serra da Fonseca (páginas 39-44)