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2. CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA

2.2. Sistema de Gestão da Qualidade em Empresas Construtoras

Conforme mencionado no item 2.1, algumas empresas construtoras vêm se empenhando na implementação de SGQ. Conforme Mendes e Picchi (2008), a exigência do mercado, principalmente por meio de exigência governamental, e a busca interna por processos de

4 Por exemplo, num contexto econômico favorável, os profissionais das incorporadoras e construtoras não devem

gestão mais eficientes são as principais motivações para o início do processo de busca pela qualidade.

Picchi (1993) propõe uma metodologia de uso de conceitos relacionados aos sistemas da qualidade, originários em sua maioria de outros setores industriais. A tese inclui um exemplo de manual da qualidade para uma empresa construtora de edifícios. Segundo o autor, os profissionais e empresas de construção de edifícios no Brasil vinham demonstrando interesse cada vez maior pelos assuntos relacionados à qualidade, num processo irreversível. Estes assuntos vêm sendo discutidos durante um tempo considerável.

Em continuidade aos estudos relacionados à qualidade, Souza (1997) realiza uma proposição de metodologia específica para desenvolvimento e implantação de SGQ, com base nas normas ISO 9000 e nos conceitos da qualidade total. Um dos objetivos do autor é adequar os preceitos gerais da ISO 9000 para o âmbito das empresas construtoras.

Conforme Silva e Souza (2003), “o sistema de gestão da qualidade faz parte do sistema global de gestão de uma empresa, e estabelece política e objetivos relacionados à qualidade, bem como um conjunto de mecanismos e instrumentos de gestão que permite atingir estes objetivos e demonstrá-los”.

Corroborando a idéia de Picchi (1993) relacionada ao interesse pela qualidade, Paladini (2007) afirma que, a partir de meados dos anos 90, as empresas têm buscado a implantação e certificação de SGQ. Este movimento, conforme Paladini (2007), teve por base a série de normas ISO 9000 e posteriormente, o PBQP-H (Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade no Habitat).

A ISO (International Organization for Standardization) é uma federação internacional, que congrega organismos de vários países. Trata-se de uma organização não governamental criada em 1947, cujo propósito é desenvolver e promover normas e padrões mundiais que traduzam o consenso dos diferentes países. Estas normas e padrões são elaborados para facilitar a troca de bens e serviços e desenvolver a cooperação no âmbito intelectual, científico, tecnológico e econômico (HERNANDES E JUNGLES, 2003). Segundo Chini e Valdez (2003), a ISO 9000, uma série de padrões de gestão da qualidade internacional podem ser aplicadas em diferentes tipos de empresas para obter melhorias na qualidade de procedimentos e produtos.

O PBQP-H é um instrumento do Governo Federal, cuja meta é organizar o setor da construção civil em torno de duas questões principais: a melhoria da qualidade do habitat e a modernização produtiva. Ele é estruturado em projetos, um deles é o Sistema de Avaliação da Conformidade de Serviços e Obras (SiAC) (PBQP-H, 2008).

Existem também programas da qualidade no âmbito dos estados, como o QUALIHAB (Programa da Qualidade na Habitação Popular) no estado de São Paulo. Este programa tem o objetivo de garantir a qualidade da habitação de interesse social, entregue pela CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo) à população. Outro exemplo é o Pará Obras no estado do Pará, que busca a melhoria da qualidade e produtividade na realização de obras públicas. Este programa segue as diretrizes do PBQP-H, é baseado nas normas NBR ISO 9000.

Muitos esforços têm sido empregados pelas empresas na busca por níveis mais elevados de qualidade e produtividade, num processo de atualização e revisão de práticas tradicionais de trabalho (LORDSLEEM JÚNIOR e BARROS, 2003). O SGQ é um apoio a esta busca. Passada uma euforia inicial pela certificação apenas do SGQ, surgem outros desafios: a manutenção do certificado e a melhoria contínua do sistema (LORDSLEEM JÚNIOR, 2007). Diversos autores, tais como Hernandes e Jungles (2003), Chini e Valdez (2003), Depexe e Paladini (2007), Figueiredo e Andery (2007), Lordsleem JR. et al. (2007), Maués e Salim Neto (2007) e Mendes e Picchi (2008) enumeram os benefícios e as dificuldades de se implantar e manter um SGQ em uma empresa construtora. Dentre as dificuldades, tem-se:

• o elevado custo da certificação; • a burocracia intrínseca ao SGQ; • a produção excessiva de documentos;

• a apropriação de procedimentos fornecidos por empresas de consultoria, que, freqüentemente, não são adequados à cultura administrativa e operacional da empresa construtora;

• a implementação de um efetivo controle de processos;

• a elaboração e implementação de procedimentos de execução e inspeção de atividades construtivas nos canteiros de obras;

• a falta de tempo dos profissionais, que acumulam múltiplas tarefas;

operacional;

• o baixo nível de escolaridade dos funcionários;

• a falta de credibilidade nos benefícios que possam ser alcançados através do SGQ.

Por outro lado, segundos os autores mencionados, os benefícios da implantação de um SGQ são evidentes, dentre os quais pode-se citar:

• o aumento da competitividade da empresa perante o mercado; • a credibilidade junto ao cliente;

• a participação em licitações;

• a melhoria no fluxo de informações dentro da empresa;

• melhor capacitação e melhor desempenho nas atividades que subsidiam a realização do projeto do produto;

• uma melhor definição de funções e responsabilidades, que permite a descentralização na tomada de decisões;

• um melhor domínio da tecnologia construtiva empregada, já que há implementação de procedimentos de execução e controle das atividades construtivas;

• a possibilidade de racionalização dos processos construtivos;

• um diagnóstico eficiente dos pontos fracos e oportunidades de melhoria nos processos administrativos e técnicos nos canteiros;

• a melhoria da qualidade do produto final; • o aumento da produtividade da mão-de-obra; • as mudanças na cultura organizacional da empresa;

• a melhoria nas condições de trabalho dos funcionários, que podem ser motivados através de treinamentos;

• acesso a mercados internacionais.

O movimento em busca da qualidade exige um grande esforço das empresas construtoras para vencer as dificuldades apresentadas e consolidar os benefícios advindos de um SGQ. A partir da observação destes benefícios para as empresas construtoras, as empresas de projeto, de acordo com Melhado e Cambiaghi (2003), têm sido pressionadas a darem sua contribuição ao movimento pela qualidade. Alguns autores como Fabricio, Melhado e Baía (2000), Grilo et al. (2003), Andery, Arantes e Vieira (2004) e Ferreira e Salgado (2007) discutem a respeito das motivações que levam as empresas de projeto a implantar um SGQ, dentre eles pode-se citar:

• a preocupação de seus proprietários com a melhoria e organização dos processos da empresa;

• a organização das rotinas de trabalho;

• o incentivo de clientes (incorporadora/construtora) já certificados ou participantes de programas de implantação da qualidade similares;

• a diferenciação da empresa no mercado;

• a tendência do mercado e a modernização da empresa.

Em muitos casos, o SGQ em uma empresa de projeto não é considerado um fator de diferenciação no mercado, ou seja, os contratantes não consideram a certificação na seleção e na remuneração dos projetistas (ANDERY, ARANTES e VIEIRA, 2004; FERREIRA e SALGADO, 2007).

Além disso, mesmo que os contratantes tenham SGQ certificado, agem de forma oposta aos preceitos da qualidade, exigindo o desenvolvimento dos projetos em tempo insuficiente para amadurecer idéias, conceitos e simulações (MELHADO E CAMBIAGHI, 2003).

Segundo Melhado e Cambiaghi (2003):

Os sistemas de gestão da qualidade, no setor de projetos e consultoria, são pouco reconhecidos e agregam muito pouco valor por ocasião da escolha e contratação de empresas de projeto, prevalecendo, na maior parte dos casos, o menor preço e fatores de relacionamento.

Apesar disto, conforme estudos realizados por Ferreira e Salgado (2007), as empresas mantêm o SGQ, pois o consideram como uma ferramenta para a organização do processo de desenvolvimento do projeto.

Vários autores (FABRICIO, MELHADO e BAÍA, 2000; GRILO et al., 2003; ANDERY, ARANTES e VIEIRA, 2004 e FERREIRA E SALGADO, 2007) enumeram as dificuldades de implantar e manter um SGQ em uma empresa de projeto. Assim, pode-se citar:

• o elevado custo da certificação;

• os requisitos normativos que parecem ser desnecessários, pois impactam pouco na qualidade do sistema de gestão e na própria qualidade do projeto;

• a falta de recursos humanos e materiais para a elaboração dos procedimentos e implementação do sistema;

• a falta de tempo dos profissionais envolvidos, seja para redigirem procedimentos ou para receberem os treinamentos exigidos;

• a resistência das pessoas à mudanças nas rotinas de projeto e ao controle e monitoramento de seus trabalhos;

• a padronização dos processos e subseqüente disseminação na empresa; • a conciliação da padronização de procedimentos e atividade criativa.

Esta última limitação, de acordo com Fabrico, Melhado e Baía (2000), é particularmente verdadeira quando os padrões são utilizados pela primeira vez e quando o projetista não participa da discussão e elaboração dos procedimentos que deve seguir. Segundo os autores, a aparente dissociação entre padronização de procedimentos e criatividade pode ser solucionada à medida que o projetista é envolvido e motivado na gestão da qualidade e a partir do entendimento do projeto como um processo interativo, criando procedimentos que respeitem esta característica.

No entanto, diversos benefícios advindos do SGQ em uma empresa de projeto podem ser enumerados, tais como: (FABRICIO, MELHADO e BAÍA, 2000; GRILO et al., 2003; ANDERY, ARANTES e VIEIRA, 2004 e FERREIRA E SALGADO, 2007):

• a possibilidade de re-estruturação do processo de projeto; • o aumento do domínio sobre os processos da empresa;

• a melhoria na gestão da informação e na comunicação entre os envolvidos no processo de projeto ;

• o registro de alterações, validações, requisitos advindos das reuniões de coordenação e compatibilização de projetos;

• um diagnóstico mais preciso das situações de retrabalho, dos “gargalos” na elaboração dos projetos, do tempo despendido na elaboração e dos custos associados;

• a transparência e confiabilidade das informações;

• a introdução de ferramentas de coordenação do processo de projeto entre as várias especialidades;

• os padrões para gerar, armazenar e recuperar informações, tanto em documentos físicos como em arquivos digitais;

• a atribuição de responsabilidades clara e precisa, que permite gerar uma relação de habilidades mínimas exigidas para cada função da empresa e que servem como base para contratação de novos funcionários;

• o estabelecimento de planos formais de treinamento dos profissionais;

• uma melhor qualidade no processo de projeto, que permite uma melhor qualidade do projeto-produto;

• a introdução de uma cultura de melhoria contínua.

Diante das dificuldades e benefícios mencionados, foi criado, no âmbito do PBQP-H, o SiAC- Projetos, que “possui caráter evolutivo, estabelecendo estágios de avaliação da conformidade progressivos, segundo os quais os sistemas de gestão da qualidade das empresas de projeto são avaliados e classificados” (CARDOSO, CAMBIAGHI e MELHADO (2008).

O SiAC-Projetos prevê a implementação em etapas de nove processos documentados, que compõem o SGQ definido no referencial normativo. Os processos são:

• P1 Caracterização da empresa e de seus processos de planejamento e de gestão da qualidade;

• P2 Gestão das relações com os clientes (contratante e usuários finais); • P3 Gestão da documentação;

• P4 Gestão da Comunicação (interna ou externa); • P5 Gestão de competências e recursos;

• P6 Gestão do processo de projeto; • P7 Terceirização;

• P8 Gestão da satisfação dos clientes (contratantes e usuários finais); • P9 Avaliação e melhoria.

Este referencial normativo procura estimular e incluir as empresas de projeto no movimento da qualidade, na tentativa de facilitar a implantação de um SGQ, uma vez que foi elaborado considerando as peculiaridades deste tipo de empresa. Diante destas peculiaridades, o item 2.3 relaciona o processo de projeto e o empreendimento, esclarecendo os limites desta pesquisa.