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O CÉREBRO DO HOMEM

3.1. O Sistema Emocional

Após uma ligeira introdução a alguns sistemas básicos de funcionamento do cérebro, torna- se necessário abordar o modo como este importante sistema nos pode ditar o comportamento (in) consciente, levando-nos a tomar decisões em função do equilíbrio biológico corporal. Este com- portamento, sempre em função do nosso bem-estar, abrange não só as necessidades mais básicas do nosso corpo como sistema biológico, mas também algumas faculdades mais complexas em que o nosso comportamento sociocultural já estará envolvido.

Segundo José António Jáuregui, antropólogo espanhol, em “The Emotional Computer” (JÁUREGUI, 1995), o sistema emocional do cérebro é o mais preciso e complexo sistema infor- mativo do corpo humano. Ele não só nos informa do estado atual do corpo, como também nos dá ordens específicas de como reagir perante determinadas situações, incentivando operações neces- sárias à alteração de um estado físico, ou situação potencialmente danosa, que poderá prejudicar o bom funcionamento do organismo. O sistema emocional é um sistema de grande precisão que serve de ligação entre o nosso sistema nervoso e o sujeito, informando-o também da urgência e intensidade com que este deverá executar determinada reação. (JÁUREGUI, 1995, pg. 6) Esta relação entre o sujeito e o computador neural4 funciona de forma unidirecional: o sujeito não

exerce controlo algum sobre o sistema nervoso, mas este controla as suas emoções e por isso o

2 Adaptação da expressão em inglês: conscious awareness.

3 Em biologia a transdução refere-se à conversão de uma forma de energia numa outra forma de energia. Neste caso, a transdução

sensorial refere-se à conversão da energia dos estímulos sensoriais em sinais elétricos. Retirado de “Encyclopedia Britannica”.

seu comportamento consciente.

Como diz Jáuregui, o sistema emocional informa o sujeito das “vontades” do cérebro:

“The neural computer will send us millions and millions of messages, letting us know when and how we ought to expel a gas, make love, eat, laugh, cry, live, and even execute ourselves, always and on every occasion by means of the same channel: the emotions.” (JÁUREGUI, 1995, pg. 6)

De certo modo, o sistema emocional funciona de modo coercivo sobre o sujeito: as ordens do sistema nervoso são transmitidas sob a forma de desconforto5, informando e pressionando o in-

divíduo através de um sistema de recompensa em que o cumprimento das ordens do sistema emo- cional é recompensado com uma sensação de prazer que varia qualitativa e quantitativamente de acordo com as características da demanda. Por outro lado, se o sujeito escolher não as cumprir, o grau de incidência do estímulo emocional aumentará, provocando uma sensação crescente de des- conforto. Só assim se pode assegurar o correto funcionamento e manutenção do corpo, pois o ser humano vive em constante busca de prazer. Esta premissa é corroborada por Sigmund Freud em “O Princípio do Prazer” (FREUD, 1955) e desenvolvida no apêndice d. O Princípio do Prazer.

José Jáuregui, em “The Emotional Computer”, metaforiza este processo relacionando-o com um ato de negociação entre o sistema nervoso e o sujeito, em que o sistema emocional de- sempenha o papel de mediador. Numa situação hipotética, quando o sistema nervoso deteta uma temperatura ambiente baixa, o sujeito é informado desta condição através da sensação de frio, induzida pelo sistema nervoso. (ver figura 12) É aqui que começa a negociação: o sistema emo- cional propõe ao sujeito parar com este desconforto se este procurar um espaço de temperatura mais elevada. Quando o sujeito concorda com o negócio, é-lhe dada uma recompensa emocional que varia de intensidade em proporção direta com a gravidade da situação primordial que o ori- ginou.6 (JÁUREGUI, 1995)

“The more important the task, either for the body or society, the higher the emotional salary that will be paid, or the more intense the pleasure offered and provided.” (JÁUREGUI, 1995, pg. 8)

5 Adaptado do termo inglês: pain.

6 Jáuregui introduz nesta exposição uma nova hipótese algo desconcertante: o prazer não existe, só o desprazer e a sua variação gradual. Se desenvolvermos o raciocínio anterior segundo esta premissa, podemos chegar à conclusão que “não há prazer depois de comer, apenas a ausência de fome”. Teoria defendida de forma semelhante por Sigmund Freud. Ver apêndice d. O Princípio do Prazer

Fig. 12 - desenhos

representativos de vários factores capazes de fazer variar o conforto do indivíduo.

O sistema emocional "pressiona" o indivíduo a procurar situações de maior conforto, mesmo para satisfazer a mais básica demanda.

“We must become aware of the different colors and shades of the emotional spectrum. It is this qualita- tive variety of feelings which allows the neural computer to clearly inform the subject about what exact- ly he ought to do, and where, when, how, and how often he ought to do it.” (JÁUREGUI, 1995, pg. 134)

Deste modo, o sistema emocional é um sistema que faz parte do equipamento neural gover- nado pelas suas próprias leis e mecanismos que não podemos controlar. É na procura quotidiana do prazer, em que o sujeito se insere na expectativa de um recompensa emocional, que está a origem e o propósito das ações humanas. A própria experiência espacial do homem na Arquitetura estará sujeita às demandas da procura de satisfação inerente a possessão de um corpo biológico. Como diz Jáuregui:

“For the human being, the ultimate relevance of all sounds, images or thoughts, and of all external realities (objects and people), is defined for him by his own feelings. What really matters to the human being are the feelings that his neural computer hands over to him, along with every image, taste, color, smell or sound derived from a given object or person.”(JÁUREGUI, 1995, pg. 30)

Podemos por isso concluir que o cérebro faz parte de um grande sistema dinâmico do qual faz parte o corpo e o mundo exterior. (O’SHEA, 2005, pg. 3) Damásio corrobora com as seguintes palavras:

“Quando afirmo que o corpo e o cérebro formam um organismo indissociável, não estou a exagerar. De facto, estou a simplificar demais. (…) O organismo constituído pela parceria cérebro-corpo interage com o ambiente como um conjunto, não sendo a interação só do corpo ou só do cérebro.” (DAMÁSIO, 2011, pg. 98)

Nos subcapítulos seguintes, explicar-se-á o modo como esta relação intrínseca entre o cor- po (e cérebro) e o mundo exterior se manifesta ao nível do comportamento básico do ser humano e em relações mais complexas inerentes à vida em sociedade.