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3 O SISTEMA PROGRESSIVO DE EXECUÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE

3.1 O sistema progressivo

A legislação brasileira prevê a possibilidade de execução da pena de prisão em três regimes penais distintos: o regime fechado, o regime semiaberto e o regime aberto, determinando que os mesmos são comunicáveis entre si, mediante progressões ou regressões. Ao disciplinar deste modo adota o sistema progressivo de execução da pena privativa de liberdade que, inspirado no sistema progressivo inglês, determina que a pena se cumpra em diferentes etapas, distintas e sucessivas.

Sendo o sistema de execução penal progressivo, e contando com três diferentes tipos de regimes, é possível que gradualmente e com a presença de alguns requisitos possa o apenado alcançar a progressão de regime, avançando para um regime mais brando do que aquele em que este se encontra. O apenado também poderá, ao contrário, regredir para regimes mais rigorosos.

Após a declaração da sentença condenatória e fixado o regime inicial de cumprimento é possível a progressão para regime menos gravoso com o passar do tempo. Nos crimes comuns a progressão se dará com 1/6 da pena executada, segundo dispõe do art. 112 da LEP. Já para os crimes elencados na lei 8072/90, que dispõe sobre os crimes hediondos e equiparados, o direito à progressão de regime é alcançada após o cumprimento de 2/5 da pena, se o condenado for primário ou 3/5 da pena se for reincidente, contados a partir da data-base ou data de início do cumprimento da reprimenda.

Importante atentar que o tempo não é o único requisito para a obtenção da progressão, consoante ao o que dispõe o art. 33 do código penal em seu parágrafo segundo:

Art. 33. § 2º as penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência de a regime mais rigoroso. BRASIL, Código Penal, 11. ed. São Paulo, Saraiva.

Portanto para a progressão de regime é necessário o requisito objetivo que é o lapso temporal, e também do requisito subjetivo que é o comportamento carcerário e existe a possiblidade de que seja realizado o exame criminológico, requisitos que serão apresentados brevemente.

Mirabete e Fabrini (2012, p. 246) chamam o requisito subjetivo de mérito, nas seguintes palavras “[...] como também do mérito, que significa merecimento, aptidão, capacidade, do condenado, que deve indicar sua compatibilidade com o regime menos rigoroso”.

Ocorre que antes das alterações trazidas pela Lei 10.792/2003 o requisito subjetivo era atestado obrigatoriamente pelo exame criminológico, que era realizado pela Comissão Técnica de Classificação, tal disposição estava no art. 6º e dizia o que segue:

Art.6º. A classificação feita por Comissão Técnica de Classificação que elaborará o programa individualizador e acompanhará a execução das penas privativas de liberdade e restritivas de direitos, devendo propor, à autoridade competente, as progressões e regressões dos regimes, bem como as conversões.

Conforme lição de Marcão (2009, p. 122):

No que toca ao requisito subjetivo, antes da Lei n. 10792/2003, quando então se exigia expressamente a comprovação de mérito (grifos do autor) e o exame criminológico era obrigatório para a progressão do regime fechado ao semi-aberto, sendo facultativo deste para o aberto, vários fatores eram utilizados para sua aferição.

Entretanto, com as alterações, a Comissão acabou por perder as atribuições que lhe eram concedidas e que tinham um condão importante no tocante a progressão de regime, hoje o requisito subjetivo é feito pelo atestado de conduta carcerária, que é elaborado pelos diretores das casas prisionais, e neste atestado consta se o condenado teve um bom comportamento, se cometeu faltas graves, ou se trabalhava internamente.

O atestado de conduta carcerária então é mera análise de como o condenado se comporta dentro do cárcere, não importando se ele é ou não perigoso, ou se dispõe das características previstas no exame criminológico, como a capacidade de suportar frustrações ou de conviver em sociedade.

Segundo Pimentel citado por Marcão (2009, p. 124):

Ingressando no meio carcerário o sentenciado se adapta, paulatinamente, aos padrões da prisão. Seu aprendizado nesse mundo novo e peculiar, é estimulado pela necessidade de se manter vivo e, se possível, ser aceito pelo grupo. Portanto, longe de estar sendo ressocializador (grifos do autor) para a vida livre, está, na verdade, sendo socializado (grifos do autor) para viver na prisão. É claro que o preso aprende rapidamente as regras disciplinares na prisão, pois está interessado em não sofrer punições. Assim, um observador desprevenido pode supor que um preso de bom comportamento é um homem regenerado, quando o que se dá é algo inteiramente diverso: trata-se de apenas um homem prisonizado (grifos do autor).

A partir disso, torna-se um jogo de manipulação ou de interesses, tanto dos agentes penitenciários em manter a ordem do estabelecimento penal, quanto dos presos, que sabem que um “bom comportamento” (grifo nosso), pode lhes auferir a progressão de regime.

Conforme esclarecimento dado ao assunto feito por Marcão (2009, p. 124):

Bom comportamento carcerário é o comportamento daquele que se põe de forma ajustada aos regramentos de disciplina do estabelecimento prisional; bem por isso não há cogitar, no momento da elaboração do “atestado” (grifos do autor), sobre eventual propensão à reincidência, consciência e arrependimento quanto ao delito pelo qual foi recolhido preso.

Segundo entendimento da 1ª turma do Supremo Tribunal Federal citado por Marcão (2009, p. 124):

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal já decidiu de forma contrária ao tratar o assunto “entendeu-se que o aludido art. 112 da LEP, em sua nova redação, admite a realização facultativa do exame criminológico, desde que fundamentada e quando necessária à avaliação do condenado e de seu mérito para a promoção a regime mais brando. Ressaltou-se ainda, que esse exame pode ser contestado, nos termos do § 1º do próprio art. 112, o qual prevê a instauração de contraditório sumário. A partir da interpretação sistemática do ordenamento (CP art. 33, § 2º, e LEP, art. 8º), conclui- se que a citada alteração não objetivou supressão a supressão do exame criminológico para fins de progressão do regime, mas, ao contrário, introduziu critérios norteadores à decisão do juiz para dar concreção ao princípio da individualização da pena. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o Writ por considerar não ter havido modificação substancial das exigências legais para a concessão de tal benefício”.

Portanto em casos determinados, havendo requisição do Ministério Público pode além do atestado de conduta carcerária, haver a necessidade de realização de exame criminológico para que o apenado usufrua da progressão de regime.

Este também é o teor da Súmula Vinculante nº 26, do Supremo Tribunal Federal, que dispõe o que segue:

Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8-072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.

É importante ressaltar que a progressão de regime somente pode ocorrer de maneira gradual de modo que o apenado que se encontra em regime fechado poderá apenas progredir para o regime semiaberto e deste para o aberto, sendo vedada assim, a denominada progressão por salto como leciona Marcão (2009, p. 126):

O condenado que cumpre pena no regime fechado não pode progredir diretamente para o regime aberto. Para obter a progressão, deverá antes, cumprir um sexto de sua pena no regime semi-aberto (grifos do autor), e demonstrar a satisfação de seu mérito, preenchendo assim os requisitos objetivo e subjetivo.

A competência para conceder ou não a progressão de regime é do juízo das execuções criminais, de acordo com determinação do art. 66 da Lei de Execução Penal, alínea b. Além disso, faz-se necessária a prévia oitiva do representante do Ministério Público e da defesa do sentenciado para que seja deferido o benefício da progressão de regime, de acordo com que leciona Marcão (2009 p. 127):

Para cuidar da matéria agora de forma expressa, a lei nº 10.792, de 1º de dezembro de 2003, acrescentou ao art. 112 da Lei de execução Penal Um § 1º, dispondo que a decisão sobre a progressão de regime será sempre motivada “e precedida de manifestação do Ministério Público e do defensor”.

Logo, verifica-se que há grande fiscalização acerca do instituto, para que não ocorram erros de qualquer parte. O Ministério Público, na maioria das vezes atuando de maneira fiscalizadora atentando-se para que o apenado cumpra de maneira correta o que é determinado pela lei. E a defesa, atuando de maneira a assegurar ao sentenciado seus direitos.

Importante atentar para o art. 75, § 1ª do Código Penal:

Art. 75 - O tempo de cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos

§ 1º - Quando o agente for condenado a penas privativas de liberdade cuja soma seja superior a 30 (trinta) anos, devem elas ser unificadas para atender ao limite máximo deste artigo. (BRASIL, Código Penal, 11. ed. São Paulo. Saraiva).

Este dispositivo determina que, apesar das penas privativas de liberdade aplicadas possam ultrapassar 30 anos, o limite para a execução será este. Deste modo quando o apenado possui diversas condenações por crimes distintos e estes somarem mais de trinta anos, as penas deverão ser unificadas.

De acordo com o que leciona Marcão (2009, p. 131):

De considerar, entretanto, que “a unificação da pena em trinta anos atém-se tão somente à delimitação do quanto de pena a ser cumprida pelo sentenciado, não podendo esse patamar ser considerado para a concessão de quaisquer dos benefícios na lei de execuções penais, uma vez que estes serão regulados pelo total da pena imposta antes da unificação.

Portanto, para a progressão de regime prisional, o condenado a pena superior a trinta anos, deverá cumprir 1/6 ou 2/5 do total da pena imposta, antes da unificação das penas. Importante então é informar o entendimento da Suprema Corte citada por Marcão (2009, p. 131):

O STF tem entendimento firmado no sentido de que a unificação tem o efeito exclusivo de limitar a duração do cumprimento da pena privativa de liberdade em trinta anos, não podendo servir de parâmetro para outros benefícios da execução penal. tanto que a respeito do tema expediu a súmula 715, com o seguinte teor: “a pena unificada para atender ao limite de trinta anos de cumprimento, determinado pelo art. 75 do Código Penal, não é considerada para a concessão de outros benefícios, como o livramento condicional ou regime mais favorável de execução.

Logo se o condenado possuir, por exemplo, uma condenação de 100 anos, para a obtenção da progressão de regime é necessário que ele cumpra 1/6 da pena se o crime não for hediondo.

Uma questão de relevância e que interrompe o prazo de contagem para a obtenção da progressão de regime é a prática de falta grave na execução da pena, determinado como Procedimento Administrativo. Após o cometimento da falta grave começa-se nova contagem do lapso temporal a partir da nova data-base que será a data da prática da falta.

Como leciona Marcão (2009, p. 128):

Cometida a falta grave pelo condenado no curso do cumprimento da pena privativa de liberdade, inicia-se a partir de tal data a nova contagem da fração de um sexto da pena como requisito objetivo da progressão.

Marcão (2009, p.128) cita ainda decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:

A compreensão de tal conclusão vem bem elucidada no v. Acórdão do Tribunal de justiça do Estado de São Paulo< de que foi relator o eminente Desembargador BITTENCORT RODRIGUES, onde restou consignado: “se o condenado, que praticar falta grave, estiver no regime fechado, não se podendo fazê-lo regredir para o regime mais severo, inexistente, sujeitar-se-á ao efeito secundário da regressão, ou seja, à interrupção do tempo, para efeito de progressão, devendo cumprir mais um sexto do restante da pena a partir da falta grave, para obtê-la”.

Marcão (2009, p. 128) também menciona a decisão do Supremo Tribunal Federal em que se discutiu o tema:

A 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal já teve oportunidade de tratar da matéria e decidir no mesmo sentido, conforme ementa que segue. “em caso de falta grave, é de ser reiniciada a contagem do prazo de 1/6, exigido para a obtenção do benefício da progressão no regime de cumprimento da pena. Adotando-se como paradigma, então, o quantum remanescente da pena. Em caso de fuga, este prazo apenas começa a fluir a partir da recaptura do sentenciado. Entendimento contrário implicaria tornar despidas de sanção as hipóteses de faltas graves cometidas por sentenciados que já estivessem cumprindo a pena em regime fechado. De modo que não seria possível a regressão no regime (sabido que o fechado já é o mais severo) nem seria reiniciada a contagem do prazo de 1/6. Conduzindo ao absurdo de o condenado, imediatamente após sua recaptura, tornar a pleitear a progressão prisional com apoio em um suposto „bom comportamento‟ (grifos do autor). Habeas corpus indeferido”

Importante mencionar também algumas hipóteses de regressão de regime. Tais hipóteses estão previstas no art. 118 da LEP que determina:

Art. 118. A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado:

I - praticar fato definido como crime doloso ou falta grave;

II - sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime (artigo 111).

§ 1° O condenado será transferido do regime aberto se, além das hipóteses referidas nos incisos anteriores, frustrar os fins da execução ou não pagar, podendo, a multa cumulativamente imposta.

§ 2º Nas hipóteses do inciso I e do parágrafo anterior, deverá ser ouvido previamente o condenado. BRASIL, Lei de Execuções Penais, 11. ed. São Paulo, Saraiva.

A prática de falta grave e o cometimento de crime doloso são os mais corriqueiros no dia a dia forense, logo são as situações que mais provocam regressão de regime dos sentenciados.

As faltas graves estão previstas no art. 50 da Lei de Execuções Penais e deverão ser apuradas mediante procedimento administrativo disciplinar. A falta grave caracteriza-se por uma conduta adversa daquela esperada pela administração da casa prisional, como por exemplo, possuir telefones celulares, portar drogas, portar armas que possam ofender a integridade física de qualquer pessoa. Segundo Marcão (2009, p. 152):

Caracterizam falta grave: provocar acidente de trabalho; descumprir, no regime aberto, as condições impostas, e inobservar os deveres de obediência ao servidor e respeito a qualquer pessoa com quem deva relacionar-se, e de execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas.

A prática de fato definido como crime doloso também provoca a regressão de regime, entretanto, o crime não precisa estar com a sentença transitada em julgado.

Existe ainda a possibilidade de regressão de regime pela condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime e está disposto no art. 111 da Lei de execuções penais.

Em outras palavras o condenado a diversas penas pode a partir da soma destas ser regredido de regime se a pena não for compatível com o regime em que este se encontra.

Conforme explica Marcão (2009, p. 153):

Assim, “as penas aplicadas em um ou mais processos contra o mesmo réu serão executadas pelo resultado das condenações somadas, devendo a mais grave ser cumprida primeiro‟, pois, segundo o disposto no art. 76 do Código Penal, “no concurso de infrações, executar-se-á primeiramente a pena mais grave”.

É de extrema importância atentar para o direito a ampla defesa e ao contraditório em casos de regressão de regime.

A regressão de regime prisional é medida judicial de intensa gravidade que afeta os destinos da execução e revela-se extremamente danosa aos interesses do condenado. De tal sorte, antes de sua efetivação é imperioso proceder à oitiva deste, permitindo- lhe o exercício pleno de sua mais ampla defesa, observando, ainda o contraditório constitucional. O desrespeito a tais princípios acarreta flagrante e odioso constrangimento ilegal.

Logo se observa a obrigatoriedade da instauração de uma audiência com a apresentação das teses do Ministério Público e da defesa do acusado antes da decisão proferida pelo juízo da execução penal.

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