• Nenhum resultado encontrado

O princípio da individualização e o sistema progressivo de execução das penas privativas de liberdade

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "O princípio da individualização e o sistema progressivo de execução das penas privativas de liberdade"

Copied!
69
0
0

Texto

(1)

UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

JAQUES ANDRÉ MALLMANN

O PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO E O SISTEMA

PROGRESSIVO DE EXECUÇÃO DAS PENAS

PRIVATIVAS DE LIBERDADE

Ijuí (RS) 2013

(2)

JAQUES ANDRÉ MALLMANN

O PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO E O SISTEMA

PROGRESSIVO DE EXECUÇÃO DAS PENAS

PRIVATIVAS DE LIBERDADE

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia.

Orientadora: Msc. Ester Eliana Hauser

Ijuí (RS) 2013

(3)

AGRADECIMENTOS

Deus, acima de tudo, pela vida, força e coragem.

A minha orientadora Eliana Ester Hauser pela sua dedicação e disponibilidade.

A Família por toda jornada acadêmica e a todos que colaboraram de uma maneira ou outra durante a trajetória de construção deste trabalho, meus sinceros agradecimentos.

(4)

“Enquanto existir direito penal, é necessário que haja alguém que se encarregue de estuda-lo e analisa-lo racionalmente para convertê-lo em instrumento de mudança para uma sociedade mais justa e igualitária.”

(5)

RESUMO

O presente trabalho de pesquisa monográfica faz uma análise do sistema progressivo de execução da pena, voltada para a finalidade da pena e sua eficácia nos dias atuais. Discute brevemente o histórico das penas privativas de liberdade até chegar à atualidade, mostrando os regimes de cumprimento da pena privativa de liberdade e suas características. Aborda também como ocorre a progressão de regime dentro da Lei de Execuções penais e as mudanças que ocorram durante na legislação durante a história apontando alguns julgados importantíssimos para o atual modelo seguido pelos juízos de execução de nosso país, relaciona ainda os requisitos para que o corra a progressão. Ademais disso, apresenta críticas ao sistema progressivo de execução da pena privativa de liberdade e seu ideal ressocializador, mostrando algumas possibilidades de mudança.

Palavras-Chave: Individualização da pena – execução penal – penas privativas de liberdade

(6)

ABSTRACT

The present research monograph analyzes the progressive system of execution of the sentence, turned to the purpose of punishment and its effectiveness today. Briefly discusses the history of custodial sentences until the present day, showing the regimes of imprisonment and custodial characteristics. It also discusses how the regime progression occurs within the criminal Executions Act and the changes that occur during the legislation during the story pointing out some judged critical to the current model followed by the execution of judgments of our country, still lists the requirements for the run progression. Besides that, the system offers criticisms progressive implementation of deprivation of liberty and its ideal resocializing, showing some possibilities for change.

Keywords: Individualization pen - criminal enforcement - custodial sentences –

(7)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 7

1 A PRISÃO COMO PENA E O SISTEMA PROGRESSIVO DE EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE ... 9

1.1 A privação de liberdade como pena: antecedentes históricos ... 9

1.2 As teorias legitimadoras da pena ... 14

1.3 A privação de liberdade na legislação brasileira ... 18

1.3.1 Antecedentes ... 18

1.3.2 Espécies de privação de liberdade no Brasil ... 21

1.3.3 A finalidade da pena de prisão segundo a lei de execuções penais e a crise do ideal ressocializador ... 22

2 O PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA NO ÂMBITO DO DIREITO PENAL BRASILEIRO ... 25

2.1 Antecedentes ... 25

2.2 O princípio da individualização da pena e sua aplicação no direito penal brasileiro . 27 2.3 A individualização da pena na fase de execução ... 34

3 O SISTEMA PROGRESSIVO DE EXECUÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E A INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA NA FASE EXECUTIVA ... 38

3.1 O sistema progressivo ... 38

3.2 Regimes de execução da pena privativa de liberdade ... 45

3.2.1 Regime fechado ... 45

3.2.2 Regime semiaberto ... 47

3.2.3 Regime aberto ... 50

3.3 Progressão de regime nos crimes comuns e nos crimes hediondos ... 51

3.4 Críticas ao sistema progressivo de execução da pena: questões teóricas e operacionais ... 54

CONCLUSÃO ... 64

(8)

INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como tema a pena privativa de liberdade e o seu sistema progressivo de execução. Na atualidade a prisão tem sido utilizada como a principal forma de punição e, em que pese à previsão legal de penas alternativas, que tem crescido de forma significativa assim como o número de pessoas encarceradas não só no Brasil como também no mundo.

A Lei de Execuções Penais (LEP) declara, em ser art. 1º que o objetivo da execução da pena é oferecer condições para a harmônica integração social do apenado, incorporando deste modo o ideal ressocializador como meta da execução penal. Para isso propõe um sistema progressivo de execução da pena proposto, que determina que o apenado deverá passar por distintas fases durante a execução da pena, podendo chegar a uma condição de maior liberdade a medida em que se mostrar “ressocializado” No entanto, a realidade demonstra que este ideal não se concretiza, pois os apenados, em geral, aperfeiçoam sua carreira criminosa quando passam pela prisão.

Tendo em vista esta realidade, o trabalho propõe-se a analisar de forma detalhada o princípio da individualização da pena na fase executiva, analisando, de forma crítica o sistema de execução da pena de prisão consagrado na legislação brasileira.

Para tanto, será abordado o princípio da individualização da pena em suas fases legislativa, judiciária e em especial na fase executiva que possui extrema importância para a aplicação da pena privativa de liberdade e atua de maneira essencial dentro do sistema progressivo de execução dando embasamento legal para diversas decisões dos tribunais superiores e causa grandes debates entre os principais doutrinadores do direito penal.

(9)

Abordará a finalidade da pena de prisão, que segundo a Lei de Execução Penal, é a ressocialização do sentenciado, abordando a crise deste ideal tendo em vista os atuais resultados desta legislação, que não estão sendo satisfatórios tanto quanto se desejava com a sua promulgação. E ainda serão apontados novos paradigmas e soluções para a aplicabilidade da pena privativa de liberdade, sob uma ótica diferente da apresentada pela Lei de Execução Penal.

O trabalho apresentará ainda as teorias legitimadoras da pena, quais sejam a teorias absoluta ou retributiva, a teoria relativa ou preventiva, e a teoria mista ou unificadora com principal enfoque para a relativa e preventiva que visa a ressocialização do sujeito e com a finalidade de que este retorne ao convívio social.

Abordará também a privação de liberdade na legislação brasileira seus antecedentes, ou seja, as formas de prisão nos códigos penais anteriores. Espécies de prisão na legislação brasileira quais sejam, reclusão, detenção e ainda a prisão simples, hoje pouco aplicada após a criação da lei dos Juizados Especiais Criminais no ano de 1999. A partir disto distinguir estas espécies de penas. Também analisar a finalidade da pena de prisão e a sua execução no âmbito da lei de execuções penais e ainda a crise do sistema ressocializador.

Em um segundo momento o trabalho apresenta o princípio da individualização da pena e o sistema progressivo de execução da pena privativa de liberdade no Brasil. Analisam-se os regimes penais e as principais regras dos sistemas fechado, semiaberto e aberto e ainda as características e as principais diferenças da progressão de regime nos crimes comuns e nos crimes considerados hediondos determinados pela Lei 8072 de 25 de julho de 1990.

E em um momento final apontam se críticas ao sistema progressivo de execução da pena com olhares para questões teóricas e também operacionais apontando as principais dificuldades com destaque para as dificuldades da função ressocializadora do sujeito.

(10)

1 A PRISÃO COMO PENA E O SISTEMA PROGRESSIVO DE EXECUÇÃO DAS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

O objetivo do presente estudo é analisar a pena de prisão historicamente e atualmente apresentando e discutindo a aplicação e execução desta forma de pena na legislação brasileira, bem como entender como começaram a ser aplicadas as primeiras penas e após chegar aos atuais dispositivos legais que determinam a atuação do aplicador da Lei.

1.1 A privação de liberdade como pena: antecedentes históricos

A pena está ligada intrinsicamente ao cotidiano do ser humano desde seus primórdios Maggiore (apud GRECO, 2011, p. 127) diz que:

A pena – como impulso que reage como um mal ante o mal do delito – é contemporânea do homem; por este aspecto de incoercível exigência ética, não tem nem princípio nem fim na história. O homem, como ser dotado de consciência moral, teve e terá sempre, as noções de delito e pena.

Inicialmente a pena era tratada pelo homem como uma retribuição, com requintes da autotutela, em que a resposta ao delito era de cunho vingativo, era uma resposta da vítima, ou de seus parentes, amigos etc. Não se buscava apenas punir, mas sim fazer com que o delinquente sofresse de igual forma o dano causado à vítima.

Como lecionam Maria José Falcón Y Tella e Fernando Falcón y tella (apud GRECO, 2011, p. 127):

Durante milênios o castigo dos atos criminais se levava a cabo mediante a vingança privada. A intervenção da coletividade se dava somente para aplacar a cólera de um deus que se supunha ofendido. Se produzia uma identificação delito-pecado, ideia que-informará durante anos de forma decisiva toda a fisionomia penal. Nesta evolução o talião supôs um tímido intento a fim de superar a absoluta arbitrariedade com que se aplicava a pena anteriormente.

A lei de talião onde figurava o tão conhecido ditado “olho por olho” ou “dente por dente” é considerada um avanço na história da pena, pois, já trazia mesmo que de forma inadequada a noção de proporcionalidade na aplicação da pena (GRECO, 2011, p.127).

(11)

Após a lei de talião a sociedade passou a organizar a pena e começou a utilizar a chamada composição, como leciona Maggione (apud GRECO, p 127):

Ao transformar-se o talião em composição, se realiza o processo subsequente. Assim, o agravo já não se compensa com um sofrimento pessoal, senão com alguma utilidade material, dada pelo ofensor. O preço do resgate, e já não mais o da vingança, está representado pela entrega de animais, armas, utensílios ou dinheiro.

A partir deste momento histórico a sociedade abandonou em parte a vingança privada e passou a buscar outros meios de pena para aqueles que praticassem delitos. Uma das principais novidades foram os danos patrimoniais ao transgressor da lei, deixando de lado aquela ideia da pena com caráter retribuidor e vingativo, a pena então passou a consistir em uma retribuição mediante dinheiro e bens em geral.

Ao passar dos anos surge a figura do árbitro, ou seja, um terceiro, que não tem interesse em relação no litigio e seu resultado, e possui papel fundamental no momento de demonstrar quem possui a razão. A atribuição normalmente era dada aos sacerdotes, em virtude de sua ligação direta com Deus, ou aos mais velhos, aquelas pessoas que possuem vasta experiência e conhecem a sociedade e seus costumes (ROGÉRIO GRECO, 2011).

O Estado então chama para si a responsabilidade de não somente resolver esses conflitos, como também de aplicar a pena correspondente ao mal praticado pelo agente. As modalidades de penas foram variando ao longo dos anos, e a privação da liberdade, como pena principal em virtude da prática de um fato criminoso, é relativamente recente (ROGÉRIO GRECO, 2011).

Na idade média a pena de prisão era utilizada somente como uma preparação para as penas corporais, o delinquente então apenas ficava preso até que sofresse a aplicação da pena que era, açoites, mutilações, desmembramentos e até a morte.

Entretanto durante este período começou-se a pensar a aplicação da pena privativa de liberdade como uma pena de fato. Trocando-se então a pena custódia pela pena de prisão. E pode-se dizer que quem começou a aplicação da pena privativa de liberdade foi no direito canônico da igreja católica.

(12)

Schecaira e Corrêa (2002, p. 33) Junior dizem que:

Trata-se da prisão eclesiástica usada no Direito canônico e que consistia na reclusão, em um mosteiro, de sacerdotes infratores, ou ainda como castigo aos hereges. Tinha a finalidade de fazer com que o recluso meditasse, refletisse e se arrependesse da infração cometida. Cárcere como penitência e meditação, o que originou a palavra “penitenciária”, usada até hoje.

A prisão como pena veio também devido à necessidade econômica, o capitalismo tornou essa pena essencial, devido ao crescimento da criminalidade no continente europeu. Devido ao grande número de réus fez-se necessário criar um novo sistema de penas, e a pena privativa liberdade gerou uma evolução da sociedade daquela época no sentido de humanidade, pois anteriormente os meios utilizados eram extremamente aterrorizantes e fora de qualquer principio de direitos humanos.

É o que lecionam Schecaira e Corrêa (2002, p. 35):

O surgimento da pena privativa de liberdade deu um fim à crise da pena capital, que se demonstrava incapaz de reduzir a criminalidade, além de ser, em alguns casos, completamente inoperável devido ao excessivo número de réus. Daí porque a célebre ideia que conceituava a prisão como “a pena das sociedades civilizadas”.

No Brasil a pena de prisão começou a ganhar força com a proclamação da República em 15 de novembro de 1889, e no ano também foi criado o código penal de 1890. Neste ato foram abolidos crimes com pena de galés, além de reduzir a 30 anos o cumprimento da prisão perpétua, instituir a prescrição das penas e estabelecer o desconto, na pena privativa de liberdade, do tempo de prisão preventiva (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002).

No ano de 1891 a Constituição da República estabeleceu a abolição da pena de galés e do banimento judicial, a pena de morte também foi abolida com exceção da legislação militar em tempo de guerra, determinada pelo art. 72 § 21.

A partir deste momento a pena era exclusivamente baseada na privação de liberdade, distinguindo a prisão celular, a reclusão, a prisão com trabalho obrigatório e a prisão disciplinar aos menores de 21 anos, de acordo com a gravidade da infração (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002).

(13)

No ano de 1937 com o denominado surgimento do Estado Novo ocorrem mudanças no cenário político, e estas mudanças influenciam diretamente a legislação penal.

Com a nova constituição outorgada neste ano os poderes autoritários e militares instituíram o fechamento do Congresso Nacional e crimes políticos, alguns inclusive recebendo a pena de morte como sanção.

O sistema de penas permaneceu com sua base firmada na pena de prisão (reclusão e detenção), além da multa e as penas acessórias como a publicação da sentença, a interdição temporária e a perda da função pública. (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002)

Após o fim da 2ª Guerra Mundial no ano de 1946 foi promulgada a até então mais Democrática Constituição Federal, ela trouxe direitos e liberdades individuais e proibiu a pena de morte, o banimento, o confisco e a pena de caráter perpétuo (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002).

De acordo com o que lecionam Schecaira e Corrêa (2002, p. 44):

Limitou-se o poder punitivo do Estado e consagrou-se, formalmente, a individualização e a personalidade da pena. Nesse contexto, a Lei 3.274/1957 declarou a necessidade da individualização da pena, da classificação dos delinquentes, da separação dos condenados em relação aos presos provisórios, além do oferecimento de trabalho assalariado aos presos, educação moral, intelectual, física e profissional, e assistência social aos sentenciados, egressos, suas famílias e familiares.

Em 1984 ocorreu uma profunda alteração na parte geral do Código Penal de 1940 e foi levada a termo pela Lei 7209 de 11.07.1984, ela foi extensa e realizada com ampla discussão acerca da parte teórica e democrática. Esta lei aboliu as penas acessórias e o sistema do duplo binário, sendo este substituído pelo sistema vicariante, ou seja, aplicando-se apenas a pena criminal, ou apenas a medida de segurança, sendo a última aplicável somente aos inimputáveis. (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002).

Uma grande e importante alteração após a reforma ocorreu no art. 32 que elencou as penas cominando a privação de liberdade, a restrição de direitos e a pena pecuniária, que são aplicadas atualmente no nosso sistema. Ainda foi criado o sistema progressivo de

(14)

estabelecimento mais ou menos rigoroso, de acordo com a conduta do apenado no cumprimento da pena. O livramento condicional e o sursis visam o mesmo fim. (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002).

René Ariel Dotti (apud SCHECARIA e CORRÊA JÚNIOR, 2002, p. 46):

Ao analisar o Anteprojeto de revisão da parte Geral do Código Penal, ressalta cinco pontos fundamentais no que concerne ao sistema de penas, quais sejam: o repúdio à pena de morte, a manutenção da prisão, a criação de novas penas patrimoniais, a extinção das penas acessórias e a revisão das medidas de segurança o autor mencionando, após destacar os avanços da reforma penal perpetrada, lamenta a não-utilização da reparação do dano à vítima como pena criminal, através da chamada pena de “multa reparatória”. De fato, o caráter publicístico da indenização à vítima não pode ser negado, tendo em vista que tal medida promove o desejado restabelecimento do equilíbrio jurídico e social perturbado pela infração, não obstante o evidente e inevitável reflexo histórico da antiga “composição”.

A Lei 9.714/98 reformou o sistema de penas após catorze anos da Reforma Penal de 1984, e uma década após a promulgação da Constituição Federal de 1988, ela inaugurou de forma pouco técnica e bastante precipitada, um novo sistema de penas na legislação nacional (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002).

A Lei mencionada modificou o art. 43 do Código Penal e estabeleceu um novo rol de penas restritivas de direitos, as penas são a de prestação pecuniária, perda de bens e valores, prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, interdição temporária de direitos, limitação de fim de semana, vetada a pena de recolhimento domiciliar (inciso III). Na modalidade de interdição temporária de direitos foi acrescentada a proibição de frequentar determinados lugares (art. 47, IV, do Código Penal – Nova Redação). (SCHECAIRA; CORRÊA JÚNIOR, 2002).

Atualmente, em que pese a existência de penas pecuniárias e restritivas de direitos, a prisão apresenta-se como a principal forma de sanção no Brasil, pois sua aplicabilidade é muito mais efetiva do que a das demais sanções previstas em lei.

Observando os dados da evolução da população carcerária brasileira este fenômeno é facilmente constatável, uma vez que, apesar do avanço da legislação no sentido da aplicação de penas restritivas de direitos, a prisão se fortalece como forma de punição, pois a massa carcerária cresce de forma significativa no país nas últimas décadas.

(15)

Conforme dados do Ministério da Justiça, no ano de 1994 o número de presos era de 129.169 (cento e vinte nove mil cento e sessenta e nove) e a média de 88 (oitenta e oito) presos por 100.000 (cem mil) habitantes. Em 2005, onze anos depois o número de presos era de 361.402 (trezentos e sessenta e um mil quatrocentos e dois), e a média de 196 (cento e noventa seis) para 100.000 (cem mil) habitantes. Já no ano de 2012 a massa carcerária encontra-se em 549.577 (quinhentos e quarenta e nove mil quinhentos e setenta e sete) totalizando 288 (duzentos e oitenta e oito) por 100.000 (cem mil) habitantes.

Percebe-se assim o grande crescimento da massa carcerária em pouco tempo pode-se assim dizer, dando conta de que o sistema adotado pela legislação brasileira não está conseguindo frear o aumento da criminalidade.

1.2 As teorias legitimadoras da pena

A doutrina penal aponta três grandes teorias que procuram justificar ou legitimar a aplicação das penas, especialmente a pena privativa de liberdade. São elas a teoria absoluta ou retributiva, a teoria relativa ou preventiva e a teoria mista ou unificadora.

A teoria absoluta ou retributiva é que atribui para a pena uma finalidade única que é a de retribuir ao transgressor da Lei penal o mal que ele causou a sociedade com um mesmo mal, retirando-lhe então um bem jurídico, como por exemplo, a liberdade.

A teoria absoluta atribui à pena um caráter retributivo, ou seja, a sanção penal restaura a ordem atingida pelo delito. Essa repristinação, pretendida pelos adeptos da teoria absoluta, ocorre com a imposição de um mal, isto é, uma restrição a um bem jurídico daquele que violou a norma. Com, efeito a teoria absoluta encontra na retribuição justa não só a justificativa para a pena (legitimação da intervenção penal), mas também a garantia de sal existência e o esgotamento de seu conteúdo. Assim, todos os demais efeitos (intimidação, correção, supressão do meio social) não guardariam qualquer relação com a natureza da pena. (GRECO, 2011, p. 130).

Por se tratar de uma teoria onde a aplicação da pena visa um único fim, ela enfrenta grandes críticas dos doutrinadores. Claus Roxin (apud GRECO, 2011, p.130) diz que:

[...] não se pode admitir este fundamento, pois se trata de um mero ato de fé, que prescinde, pois, de racionalidade. A retribuição compensadora, ademais, não é consentânea com o Estado Democrático de Direito – que respeita a dignidade humana-. Pois é impensável que alguém possa pagar um mal cometido com um segundo mal, que é a expiação através da pena.

(16)

Paulo Queiroz (2001) afirma que esta teoria, que baseia a legitimidade da pena numa concepção absoluta, como um fim em si mesmo, não pode ser aceita em um Estado Democrático de Direito. Para este autor:

Semelhante argumentação [...] por supor um conceito absoluto de Estado, de Justiça, de Moral e de Direito é, evidentemente incompatível com o perfil dos Estados Modernos – Estados funcionais (ou instrumentais) – que encontram limites constitucionais intransponíveis, em especial na dignidade da pessoa humana. Por consequência [...] não responde o direito penal a nenhum propósito transcendental ou metafísico-absoluto, enfim.

A teoria relativa ou preventiva é uma teoria que veio para contestar o entendimento das teorias absolutas, estas surgiram com a intenção de criar uma finalidade instrumental para a pena. Seus efeitos são de prevenção geral e especial e hoje possuem dois sentidos, qual seja o negativo e o positivo.

Queiroz (2001) observa que as teorias relativas são teorias finalistas, porque não vêm a pena como um fim em si mesma, mas como um meio a serviço de determinados fins, que devem ser úteis. A pena serviria, portanto, para prevenir futuros delitos e não para retribuir ao infrator.

Rogério Greco (2011) explica que para a teoria da prevenção geral, em seu sentido negativo, a pena deve produzir efeitos de intimidação sobre a generalidade das pessoas, atemorizando os possíveis infratores a fim de que estes não cometam quaisquer delitos.

Entretanto esta finalidade cria um clima de terror, pois a pena é aplicada com a intenção de inibir a sociedade da pratica de novos delitos, porém ao fazer isso o Estado não estaria apoiado na culpabilidade nos dizeres de Rogério Greco (2011, p. 131):

[...] a pena não está apoiada na culpabilidade, mas se restringindo a uma ação de intimidação através da punição exemplar daquele que cometeu o ato ilícito. Tal ideia não pode prosperar em um Estado Democrático de Direito. O art. 59 caput, do CP estabelece que o juiz deve observar a culpabilidade do agente na fixação da sanção penal, ou seja, a culpabilidade deve observar a culpabilidade do agente na fixação da sanção penal, ou seja, a culpabilidade deve limitar e condicionar a aplicação da pena, pois se caracteriza como verdadeiro limite e pressuposto desta.

Criticando a teoria da prevenção geral negativa, Queiroz (2001, p.50) diz que esta pode conduzir ao Estado de Terror, pois:

(17)

[...] desde que se aceite que o fim, de intimidação geral, justifica a intervenção penal, e desde que não lhe delimite a âmbito do atuação, tal doutrina tende claramente a um Estado de terror, que se valerá da pena sempre que isso lhe parecer politicamente conveniente.

A prevenção geral também possui o sentido positivo ou de integração. Segundo estas concepções a pena teria a função de fortalecer os valores ético-sociais trazidos pela norma, numa suposta finalidade educadora.

Dentro da teoria da prevenção geral positiva iniciou-se uma divergência entre os doutrinadores, surgindo portanto uma subdivisão na mesma, surge então uma teoria denominada de fundamentadora defendida por Welzel Jackobs dentre outros, e a denominada limitadora sustentada por Hassemer e Roxin. Sobre esta subdivisão da teoria da prevenção geral positiva Schecaira e Corrêa Junior (2002, p. 132) dizem o seguinte:

A prevenção geral positiva limitadora contrasta com a fundamentadora na medida em que define a finalidade da pena, acrescentando um sentido limitador ao poder punitivo do Estado. Enquanto para a teoria fundamentadora o fim pretendido com a imposição da pena é, unicamente, a confirmação da norma e dos valores nela contidos, para a teoria limitadora esta finalidade da pena deve ser restringida pelos princípios da intervenção mínima, da proporcionalidade, da ressocialização, da culpabilidade etc. o direito de punir do Estado não pode ir além desses princípios, sob pena de se tornar um poder arbitrário, impondo de maneira coativa, determinados padrões éticos.

A teoria especial positiva possui influência primordial dentro da Lei de Execuções Penais, uma vez que esta teoria baseia-se na reintegração e ressocialização do sujeito que se encontra no cárcere à sociedade.

De acordo com o que leciona Bitencourt (2012, p. 110) “A teoria da prevenção especial procura evitar a prática do delito, mas, ao contrário da prevenção geral, dirige-se exclusivamente ao delinquente em particular, objetivando que este não volte a delinquir”.

Para esta corrente de pensamento, a pena então deve ter uma função dupla. Ela deve além de coibir as condutas delituosas com a cominação de sanções, em um segundo momento atentar ao sentenciado de forma que aconteça a sua reintegração e ressocialização ao meio social.

(18)

[...] A necessidade de pena, segundo Von Liszt, mede-se com critérios preventivos especiais, segundo os quais a aplicação da pena obedece uma ideia de ressocialização e reeducação do delinquente, à intimidação daqueles que não necessitem ressocializar e também para neutralizar os incorrigíveis. Essa tese pode ser sintetizada em três palavras: intimidação, correção e inocuização (grifos do autor).

Percebe-se que este modelo foi utilizado na elaboração da nossa Lei de Execuções Penais, uma vez que esta é a finalidade da nossa pena, ressocializar o apenado.

Então como ensina Bitencourt (2012, p. 112): “[...] Ao mesmo tempo que com a execução da pena se cumprem os objetivos de prevenção geral, isto é, de intimidação, com a pena privativa de liberdade busca-se a chamada ressocialização do delinquente”.

É uma ótica interessante a atuação desta teoria da pena, entretanto ela sofre com algumas críticas pelos doutrinadores, vejamos.

Bittencourt (2012, p. 112):

As contribuições da tese da prevenção especial não evitam, contudo, as argumentações contrárias que lhe são endereçadas, sob vários pontos. Os fins da prevenção especial seriam ineficazes ou seriam anulados – argumenta-se – diante daquele delinquente que, apesar da gravidade do fato delitivo por ele praticado, não necessite de intimidação, reeducação ou inocuização, em razão de não haver a menor probabilidade de reincidência, o que, nestes casos, levaria à punibilidade do autor.

Em outras palavras, os críticos desta teoria acreditam que um condenado mesmo que por um crime perverso ou hediondo, possa nunca mais voltar a praticar um crime. Uma vez que, este não necessita de uma reeducação, então, não faria sentido reeduca-lo, bastando tão somente que lhe seja aplicada a sanção penal relativa ao fato delituoso.

Surgem decorrentes da combinação das correntes já abordadas às denominadas teorias mistas ou unificadoras e nos dizeres de Schecaira e Corrêa Junior (2002, p. 134):

[...] Criticam-se tais teorias sob o argumento de que representam, no mais das vezes, pura justaposição das diversas teorias destruindo a lógica imanente a cada concepção, como também aumentando o âmbito de aplicação da pena, convertendo a reação penal estatal em meio utilizável para sanar qualquer infração à norma. Esta concepção unificadora quebraria a ideia de que o Direito Penal deve ser utilizado como ultima ratio. Argumenta-se ainda, contra a teoria unificadora a impossibilidade

(19)

de se misturar uma teoria que nega fins à pena (retributiva) com outras que atribuem fins a ela (preventivas).

Estas teorias explicam a aplicabilidade da sanção penal no direito e regem a pena privativa de liberdade em seu contexto individual e social.

1.3 A privação de liberdade na legislação brasileira

O objetivo principal do trabalho é estudar a pena de prisão com atenção para a legislação brasileira. E para isso é essencial fazer um estudo histórico dos códigos penais anteriores e das modalidades de penas já aplicadas em nosso país, para assim chegar ao que se aplica atualmente e poder tecer algumas críticas ao que se pode ser aplicado futuramente.

1.3.1 Antecedentes

No ano de 1890, a partir do Decreto 774/1890 foram promulgadas algumas normas do Código penal de 1890.

No código penal de 1890, segundo Rogério Greco (2011), a pena conservou um caráter instrumental no sentido de repressão e prevenção da sociedade, ficaram instituídas penas baseadas exclusivamente na privação de liberdade do sujeito. Dentre elas estão a prisão celular, a reclusão, a prisão com trabalho obrigatório e a prisão disciplinar aos menores de 21 anos, conforme a gravidade do delito.

Art. 43. As penas estabelecidas neste Código são as seguintes: a) Prisão Celular;

b) Banimento; c) Reclusão;

d) Prisão com trabalho obrigatório; e) Prisão disciplinar;

f) Interdição;

g) Suspensão e perda do emprego público, com ou sem inabilitação para exercer outro;

h) Multa.

(BRASIL, Código Penal, 1890).

A prisão celular era cumprida em estabelecimento especial, em uma cela única, onde o detento ficava isolado dos demais. Já a pena de reclusão era cumprida em fortalezas, praças de

(20)

guerras ou presídios militares. Já a pena de prisão disciplinar era cumprida em estabelecimentos industriais e destinada aos menores de 21 anos de idade.

A progressão de regime vinha disciplinada no art. 56 do Código Penal o qual dispunha o seguinte:

Art.50. O condenado a prisão Celular por tempo excedente de seis anos e que houver cumprido metade da pena, mostrando bom comportamento, poderá ser transferido para alguma penitenciaria agrícola, afim de ali cumprir o restante da pena.

§ 1º Si não perseverar no bom comportamento, a concessão será revogada e voltará a cumprir a pena no estabelecimento de onde saiu.

§ 2º Si perseverar no bom comportamento, de modo a fazer presumir emenda, poderá obter livramento condicional, com tanto que o restante da pena a cumprir não exceda de dois anos. (BRASIL, Código Penal, 1890)

Importante atentar para as características do Código Penal de 1890, que já previa o livramento condicional, constante no art. 51 daquele código:

Art.51. O livramento condicional será concedido por ato do poder federal, ou dos Estados, conforme a competência respectiva, mediante proposta do chefe do estabelecimento penitenciário, o qual justificará a conveniência da concessão em minucioso relatório.

Paragrafo único. O condenado que obtiver livramento condicional será obrigado a residir no lugar que for designado no ato da concessão e ficará sujeito à vigilância da policia. (BRASIL, Código Penal, 1890)

Diante destes apontamentos acerca do Código Penal de 1890 chega-se a conclusão de que muitas normas são parecidas com o que existe atualmente em nosso ordenamento jurídico.

Entretanto em 1937 com mudanças na área política ocorreram profundas alterações na legislação penal, estas importantíssimas tendo em vista a finalidade da pena.

Diante de um poder autoritário cria-se uma nova constituição, que altera profundamente a pena, entrando em cena novamente a pena de morte, que havia sido banida com o Código anterior.

Este período foi turbulento em se tratando de direitos individuais e quanto à aplicabilidade da pena, como leciona Schecaira e Corrêa Junior (2002, p. 43):

(21)

Este governo, que anos mais tarde entraria na guerra em auxilio aos Aliados, neste momento histórico coloca sua legislação em situação análoga à do Estado nazista alemão. Com, efeito, a Lei Alemã de 28.06.1935 alterou o Código Penal germânico, estabelecendo que, se o fato não se pudesse aplicar nenhuma norma, deveria o agente ser punido com a norma que melhor lhe fosse aplicável. Assim como no Brasil, a lei criava delitos através de evasivas em que qualquer conduta poderia ser tipificada, desde que contraria à vontade da “nação alemã”, vale dizer, do governo.

Sabe-se que naquela época o congresso nacional foi fechado em virtude dos interesses políticos da época. E durante este período, fora criado um novo Código Penal, em 1940 mais precisamente em 31 de Dezembro daquele ano. O Código Penal teve como principal relator Nélson Hungria.

O sistema de penas teve como base principal a privação da liberdade do indivíduo, e teve como principais características o tecnicismo jurídico e um certo desprezo pela criminologia, esta que ficou afastada das discussões até meados da década de 70. (SCHECAIRA; CORRÊA JUNIOR 2002)

A pena de prisão fica então caracterizada por duas modalidades a reclusão e a detenção, além das penas alternativas como a multa.

Outro marco para a legislação penal pátria aconteceu no ano de 1946 a partir da promulgação de uma nova Constituição Federal, esta denominada como a mais democrática delas até então.

Esta constituição aboliu as penas com caráter perpétuo, o banimento, o confisco, embora possibilitasse ao legislador estabelecer o sequestro e o perdimento no caso de enriquecimento ilícito por meio de função pública.

Nos dizeres de Shecaira e Corrêa Junior (2002, p. 44):

Limitou-se o poder punitivo do Estado e consagrou-se, formalmente, a individualização e a personalidade da pena. Nesse contexto, a Lei 3.274/1957 declarou a necessidade da individualização da pena, de classificação dos delinquentes, da separação dos condenados em relação aos presos provisórios além do oferecimento de trabalho assalariado aos presos, educação moral, intelectual, física e profissional, e assistência social aos sentenciados, egressos, suas famílias e familiares da vítima.

(22)

No ano de 1984 ocorreu uma grande reforma na parte geral do código de 1940 e foi levada a termo pela Lei 7.209, de 11.07.1984.

A reforma em si ocorreu democraticamente com discussões jurídicas densas, nesta época também dentro das ciências jurídicas já se discutiam novamente a criminologia e foi dada uma maior importância para a política criminal.

De acordo com o que lecionam Schecaira e Corrêa Junior (2002, p. 46):

O art. 32 do CP, depois da reforma, elencou as penas cominando a privação da liberdade, a restrição de direitos e a pena pecuniária. Na tentativa de mitigar os efeitos negativos da prisão, que ainda predominam no sistema, criou-se o regime progressivo de estabelecimento mais ou menos rigoroso, de acordo com a conduta do sentenciado no cumprimento da pena. O livramento condicional e o sursis visam ao mesmo fim.

Anos mais tarde com a reforma do sistema de penas que ocorreu em 1998 dez anos após a promulgação da atual Constituição Federal de 1988, através da Lei 9714/98 que trouxe um novo sistema de penas alternativas. Referida lei ampliou o rol das penas alternativas e também a possibilidade de sua aplicação. Até então as penas restritivas de direitos eram aplicadas, em caso de crimes dolosos, em substituição a pena privativa de liberdade, quando esta não ultrapassasse 1 ano. A partir de 1998 o critério temporal foi ampliado e a legislação passou a autorizar a substituição de penas privativas de liberdade, de até 4 anos, por penas restritivas de direitos, desde que presentes outros requisitos previstos no art. 44 do Código Penal.

Esta trouxe uma importante reforma em virtude de a Constituição de 1988 exigir uma atualização no sistema de penas. A alteração ocorreu no art. 43 do Código Penal que passou a conter um novo rol de penas restritivas de direitos.

1.3.2 Espécies de privação de liberdade no Brasil

Atualmente no Código Penal Brasileiro contamos com três espécies de penas privativas de liberdade: a detenção e a reclusão e ainda a prisão simples, que, porém é aplicada unicamente às contravenções penais e seu cumprimento se dá em regime especial,

(23)

devendo ocorrer a separação dentre os condenados a um delito com pena de reclusão ou detenção.

O art. 33 do código penal em seu caput determina como devem ser cumpridas as duas modalidades:

Art. 33. A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção em regime semiaberto ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. (Brasil, Código Penal, 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2011)

Ao analisar o art. 33 também se determinam algumas distinções óbvias acerca dos dois institutos da reclusão e da detenção, uma tem a aplicabilidade em crimes considerados mais graves, como é o caso da reclusão e a outra para crimes considerados menos graves, que é o caso da detenção.

O legislador de 1984 neste sentido, segundo a doutrina, não se deteve em seguir os conceitos modernos de direito penal, que não mais fazem a distinção entre reclusão e detenção, por serem tão próximas e de difícil determinação. “É possível afirmar, portanto, que não existe diferença ontológica entre estas duas espécies de penas privativas de liberdade” (SHECAIRA; CORRÊA JUNIOR, 2002, p. 193).

1.3.3 A finalidade da pena de prisão segundo a lei de execuções penais e a crise do ideal ressocializador

A finalidade da pena de prisão para a Lei de Execuções Penais de 1984 é a ressocialização e a reeducação do apenado, tendo em vista o caráter que ela aplica nas condições de execução da pena.

Os benefícios como a remição da pena em virtude de trabalho ou estudo realizado pelo apenado durante a execução da pena são características do ideal ressocializador, o bom comportamento carcerário como requisito subjetivo para progressão de regime são indícios de que a ressocialização é de fato o objetivo principal da Lei.

(24)

Art. 1º. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. (BRASIL, Código Penal, 12. ed. São Paulo: Saraiva, 2011)

Nos dizeres de Schmidt (apud CARVALHO, 2003, p. 250):

[...] Resta bem evidente, portanto, a opção de nosso legislador, no sentido de que a sanção penal fixada na sentença condenatória será cumprida com uma finalidade específica, qual seja, a de proporcionar condições para a “harmônica integração social” do condenado e do internado (prevenção especial positiva – ressocialização). Nesse sentido é notório o fundamento pedagógico adotado pelo legislador penal no que se refere à pretensão executória, característica esta notada em inúmeros outros incidentes da execução da pena, tais como, remição (art. 126), as recompensas (arts. 55 e 56) etc.

Então é expresso na legislação de que a finalidade principal é a ressocialização e reintegração do condenado e do internado a sociedade.

Isso faz pressupor que vivemos eu uma sociedade sem problemas sociais e com oportunidades para todos os cidadãos decidirem sobre que caminho seguir sua vida, e logo o apenado seria um ser perverso e indisciplinado ao olhos de uma sociedade perfeita e sem problemas, e a partir dai o Estado procura reeducar o condenado.

Conforme leciona Schmidt (apud CARVALHO, 2003, p. 251):

[...] Isso pressupõe, em primeiro lugar, uma capacidade de estigmatização suficiente para que possamos fazer com que a sociedade seja vista como uma união de pessoas boas, educadas, enquanto o criminoso, um ser perverso e indisciplinado (grifo do autor) [...].

A Lei de Execuções Penais possui a finalidade de tornar o preso, um cidadão bom, disciplinado, obediente, urbano, respeitador, socializado, trabalhador, capaz de perceber seus erros, solidário, grato e por fim, higiênico.

Schmidt (apud, CARVALHO, 2003, p. 253) diz que:

[...] Afirmar-se que sanção penal deve reeducar – ao menos nos termos de nossa Lei de Execução Penal – requer a admissão de que o Estado, quase como um pai em relação ao filho, possa impor ao condenado uma moral social que se reputa correta [...].

(25)

E é a partir deste ideal da Lei de Execuções Penais que surge a crise do ideal ressocializador, pois seria inconstitucional exigir que uma pessoa tivesse que se adequar ao o que deseja o Estado, tal exigência somente seria possível em caso de a conduta de um individuo afetar a liberdade de outro.

Logo, não é finalidade de um ordenamento jurídico determinar as crenças, costumes ou ideais das pessoas, mas sim determinar o que uma pessoa pode ou não fazer dentro da sociedade, ou seja, os seus atos, eles não podem ferir a liberdade ou integridade de outra pessoa.

Schmidt (apud CARVALHO, 2003, p. 250) leciona o que segue:

Segundo Kant, estas leis da liberdade, ao contrário das leis de natureza, chamam-se morais. Se afetam somente ações meramente externas e a sua conformidade com a lei, chamam-se jurídicas; mas exigem também que elas mesmas (as leis) devam ser os fundamentos de determinação das ações, então são éticas, e se diz, portanto, que a coincidência com as primeiras e a legalidade, enquanto a coincidência com as segundas, a moralidade da ação. O ordenamento jurídico não tem por fim o espírito das pessoas, mas sim a sua atuação no meio social em que elas vivem (grifo nosso).

A Constituição Federal prevê no art. 5º os direitos e garantias individuais e em seus artigos o direito à “manifestação do pensamento” (inciso IV), e a “liberdade de consciência ou de crença” (inciso VI e VIII).

Schmidt (apud CARVALHO, 2003, p. 259) diz que:

A tolerância determinada em nossa Constituição possui ampla repercussão no curso da execução penal e, mais especificamente, no capítulo os deveres, dos direitos e da disciplina. A Lei de Execução Penal não pode determinar o dever de o preso ser um cidadão bom, disciplinado, obediente, urbano, respeitador, socializado, trabalhador, capaz de perceber seus erros, solidário, grato e por fim, higiênico, mas sim o direito de ele, se assim desejar, buscar o melhor caminho para que a sua personalidade adeque-se a estes valores que, só por estigmatização os presos não possuem. Nesse sentido, somente podem ser determinados deveres aos presos em situações em que uma conduta exteriorizada lese, ou detenha a potencialidade concreta de lesar, o direito de outro preso ou de um cidadão qualquer.

Então esta é a crise que enfrenta o ideal ressocializador da Lei de Execuções penais. Não pode uma legislação determinar o modo de pensar de um cidadão, isto veda direitos e garantias fundamentais presentes na Constituição Federal.

(26)

2 O PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA NO ÂMBITO DO DIREITO PENAL BRASILEIRO

O presente capítulo abordará o princípio da individualização da pena, demonstrando como este se efetiva em todas as fases do dinamismo penal. Para isso se fará uma análise detalhada do papel dos princípios e sua distinção com as regras, evidenciando a importância daqueles no processo de interpretação e aplicação da lei penal.

2.1 Antecedentes

Nos tempos longínquos da Idade Média eram aplicadas penas com um caráter cruel e brutal e, sobretudo de maneiras completamente arbitrarias e de acordo com o que desejava a tirania medieval.

Talvez se o ser humano tivesse atitudes coerentes e éticas em todas as áreas e não fosse tão adepto à corrupção, poderíamos aplicar a pena para cada caso concreto, fazendo a medida do mal praticado por alguém a outra pessoa e aplicar a pena de acordo com o mal sofrido pela vítima. Entretanto não podemos padecer desta discricionariedade tendo em vista a natureza humana.

E a partir deste pensamento que surge a necessidade de determinar os crimes e suas sanções com a finalidade de dar segurança jurídica e garantir os direitos fundamentais ao cidadão.

Nos dizeres de Bitencourt (2011, p. 661):

A primeira reação do Direito Penal moderno ao arbítrio judicial dos tempos medievais foi a adoção da pena fixa, representando o “mal justo” na exata medida do mal “injusto” praticado pelo delinquente. Na verdade, um dos maiores males do Direito Penal anterior ao iluminismo foi o excessivo poder dos juízes, exercido arbitrariamente, em detrimento da justiça e a serviço da tirania medieval.

O direito penal, portanto precisava criar confiança perante a sociedade e acima de tudo precisava retirar o sujeito que viesse a cometer um crime da insegurança jurídica em que se

(27)

encontrava no momento, devido ao arbítrio que era concedido ao juiz no momento da aplicação da pena.

Para isso evidentemente era necessário subtrair o arbítrio dos juízes no momento da aplicação da pena determinando e especificando o crime em Lei e cominando a pena respectiva a ser aplicada ao agente infrator. O entendimento de Beccaria e Montesquieu era de que ao juiz caberia apenas aplicar a Lei e não interpreta-la.

O Código Penal Francês de 1791 consagrou a ideia e passou-se de um sistema aberto na dosagem da pena para um sistema que rigorosamente determina a aplicação.

Entretanto nos dizeres de Bitencourt (2011, p.661):

Mas logo se percebeu que, se a indeterminação absoluta não era conveniente, também a absoluta determinação não era menos inconveniente. Se a pena absolutamente indeterminada deixava demasiado arbítrio ao julgador, com sérios prejuízos aos direitos fundamentais do indivíduo, igualmente a pena absolutamente determinada impediria o seu ajustamento, pelo juiz, ao fato e ao agente, diante da realidade concreta.

A partir deste momento as legislações evoluíram para a indeterminação relativa onde o legislador deixou um resquício do arbítrio, deixando a livre dosagem da pena pelo juiz, entretanto este deveria seguir a Lei do Código Penal Francês de 1810 que fixou os limites para a dosagem da pena e os seus limites.

De acordo com o que leciona Bitencourt (2011, p. 662):

Essa concepção foi o ponto de partida para as legislações modernas, fixando os limites dentre os quais o juiz deve – pelo princípio do livre convencimento – estabelecer fundamentalmente a pena aplicável ao caso concreto.

No Brasil seguiu-se esse sistema no Código Penal de 1940 de acordo com Mirabete e Fabrini (2012, p. 285):

No Brasil, estabeleceu-se, de início, um sistema de penas do simetricamente preestabelecidas, com os respectivos graus fixados previamente na lei. No código de 1940, porém institui-se um critério em que o juiz exerce relativo arbítrio na fixação da pena, dosando-se de acordo com diversas circunstâncias entre um mínimo e um máximo cominados abstratamente para cada delito. Tal sistema, mais acertado,

(28)

possibilita ao julgador faculdade controlada de escolher a sanção mais adequada ao delinquente sem esquecer a gravidade objetiva do crime ou suas consequências particulares. Esse critério tem por base o estabelecimento de determinadas circunstâncias que tornam o fato mais, ou menos grave.

Então neste sistema observa-se uma medida intermediária, pois, o Juiz não goza de uma liberdade para fixar a pena, pelo fato de a cominação legal estar prevista na legislação. Por outro lado, o magistrado goza de liberdade para julgar de acordo com o que decidir observando em todo caso o que a Lei o permitir.

2.2 O princípio da individualização da pena e sua aplicação no direito penal brasileiro

Para que se possa analisar o princípio da individualização da pena é necessário, antes de tudo, compreender qual a importância dos princípios no sistema jurídico e quais as diferenças que existem entre estes e as regras.

Referindo-se aos princípios Boschi (2002, p. 31) observa que:

Os princípios, daí, na positividade jurídica, ao mesmo tempo em que guiam o interprete na busca da compreensão do sistema de relações, sustentam, como os pilares de um edifício, o arcabouço jurídico, viabilizando, também, o sentido de totalidade característico de todo o sistema.

Conforme o ensinamento de Figueiredo Dias, os princípios jurídicos, desse modo, “exprimem os valores preferenciais e os bens prevalentes em dado momento, numa certa comunidade”, dando “sentido à multidão de normas” e permitindo à dogmática “explicar” e “compreender” os problemas do direito, caminhando com segurança “ao encontro de sua solução”.

Compreende-se, hoje, que os princípios influem diretamente no ordenamento jurídico, conforme nos ensinam Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 92):

No estágio atual da ciência do Direito, converge-se para a ideia de que os princípios não podem ser considerados (grifos do autor) apenas como meras aspirações (grifos do autor) ou vagas diretrizes (grifos do autor), pois contêm inegável força normativa (grifos do autor).

Logo, os princípios funcionam de maneira essencial e primordial dentro do sistema jurídico, estabelecendo os valores fundamentais e ditando direitos e garantias que devem ser dadas aos indivíduos ou ainda propondo restrições que as regras devem obedecer ou seguir. Como explicam Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 92):

(29)

Entende-se, nesse sentido, que o sistema jurídico, no que tange às normas que o compõem, compreende um conjunto de princípios e regras, equilibradamente distribuídos, sendo aqueles núcleos e estas, os satélites que gravitam ao seu redor. Aos princípios, portanto, incumbe servir como a expressão primeira dos valores fundamentais incorporados em nossa sociedade por intermédio da Constituição, atuando como molde a exprimirem o ideal de justiça; e às regras corresponde a tarefa de propiciar certeza e conferir segurança jurídica na atuação cotidiana.

Importante salientar que uma regra imposta pela lei deve estar adequada aos princípios gerais de direito ou princípios constitucionais, se caso uma lei estiver em desacordo com algum princípio esta lei poderá ser revogada ou ser declarada inconstitucional. Isto demostra que os princípios estão posicionados hierarquicamente superiores às regras.

Conforme lição de Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 92):

[...] já que os princípios, por constituírem a expressão inicial dos valores fundamentais que informam determinado ramo jurídico, encontram-se em patamar superior às regras, de tal modo que um aparente confronto entre ambos deverá ser solucionado em favor daqueles.

Então, ocorrendo uma divergência entre uma norma e um princípio, deverá a norma ser alterada de tal maneira que seja interpretado o litígio conforme determinação do princípio em análise.

Princípios e regras possuem distinções importantíssimas entre si como, pois “[...] os princípios constituem a expressão de valores ou finalidade a serem atingidas, enquanto as regras descrevem condutas a serem observadas mediante proibições ou autorizações” (RIOS e ESTEFAM, 2012 apud LENZA p. 92).

Os princípios quanto ao seu ao modo de aplicação se diferem das regras. Como nos ensinam Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 93): “as regras são aplicadas mediante subsunção, é dizer, a adequação do fato concreto ao modelo abstrato”.

Já os princípios segundo Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 92): “são aplicados positivamente, como orientação a ser seguida, ou negativamente, para anular uma regra que os contradiga”.

(30)

Tais apontamentos realizados pelos autores evidenciam ainda mais a importância dos princípios para o ordenamento jurídico, especialmente nas situações em que existam entendimentos divergentes entre os tribunais, sobre a aplicação das regras Tal como é o caso citado por Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 94):

Cite-se, exemplificativamente, o princípio da dignidade da pessoa humana, o qual foi utilizado pela jurisprudência para conceder ao sentenciado o regime albergue-domiciliar (art. 117 da LEP) em razão da inexistência de casa do albergado na Comarca onde deveria cumprir a pena (aplicação positiva).

O acórdão referido foi proferido pela 7ª Câmara Criminal TJ/RJ e foi transcrito nas seguintes palavras segundo citação feita por Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 92):

O condenado não pode ser prejudicado pela displicência Estatal, quando não institui casa de albergado, conforme estabelecido nos arts. 93 a 95 da LEP. No ponto, o princípio da dignidade da pessoa humana assume primazia no sopesamento com a legalidade, até porque trata-se de uma solução excepcional.(AEP. 2009.076.00745-RJ, Rel. Des. Siro Darlan de Oliveira, julgado em 20.09.2009)

Os princípios possuem uma esfera de aplicabilidade geral, eles podem ser aplicados em diferentes momentos históricos e se aperfeiçoando conforme a evolução social que vive a sociedade, como referencia Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 95):”Os princípios, portanto, contam com a possibilidade de serem interpretados de acordo com o momento histórico e social, tornando-se mais duradouros.”

Um importante exemplo de aplicação dos princípios na esfera do Direito Penal foi no caso da lei dos crimes hediondos que não possibilitava a progressão de regime, determinado que a pena deveria ser cumprida em regime integralmente fechado, entretanto este entendimento perdurou durante um lapso temporal e hoje já não mais vigora, por força dos princípios constantes da Constituição Federal, especialmente o princípio da individualização da pena.

De acordo com Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 95):

O Supremo Tribunal Federal considerou, durante dezesseis anos (1990 a 2006). Que o princípio da individualização da pena não impedia a fixação de regime prisional integralmente fechado em crimes hediondos e equiparados (como dispunha o art. 2º §1º, da Lei n. 8072/90, antes da alteração promovida pela Lei n. 11.464/2007).

(31)

Vários foram os julgados nesse sentido. Valendo registra que a matéria chegou a ser objeto de súmula.

O entendimento do STF, na época, era completamente diverso do que se vê nos tempos atuais, vejamos, portanto, uma decisão dada pela Suprema Corte:

Constitucional. Penal. Processual Penal. Habeas Corpus. Crime Hediondo. Regime Fechado. Lei 8072/90. Art. 2º, § 1º. Constitucionalidade. 1. A Inconstitucionalidade do art. 2º, § 1º da Lei 8072/90, foi repelida pelo Plenário desta Corte no Julgamento o HC 69.657.2. Enquanto não modificado esse entendimento, subsiste a constitucionalidade do referio dispositivo legal, devendo prevalecer a jurisprudência da Casa, no sentido de que a pena por crime previsto no art. 2º § 1º da Lei 8072/90 deverá ser cumprida integralmente em regime fechado. 3. Não se estende aos demais crimes hediondos a admissibilidade de progressão no regime de execução da pena aplicada ao crime de tortura (Súmula STF n. 698). 4 ordem denegada (STF, HC 86.647, Rel. Min. Ellen Gracie, 2ª Turma, julgado em 04.10.2005, DJ 25.11.2005, p.34).

Ocorre que, como dito anteriormente, os princípios possuem a característica de serem interpretados diferentemente com o passar dos anos e de acordo com as mudanças da sociedade, e no ano de 2006 o STF passou a entender o caso de maneira diversa daquela julgada em 2005. Vejamos de acordo com o que lecionam Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 96):

Em 2006, porém, a Corte Suprema reviu sua posição, passando a interpretar o princípio da individualização da pena de maneira mais ampla e garantista, a ponto de declarar, incidenter tantum (grifos do autor), no julgamento do HC 82.959 (DJ 01.09.2006), a inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8072/90 (em sua redação original).

Após esta nova intepretação dada a Lei dos Crimes Hediondos houve alterações que passaram a prever apenas o regime inicialmente fechado com possibilidade de progressão de regime mesmo para os crimes hediondos e equiparados. Ressalvados, casos específicos onde em decisão recente, ano de 2012, foi aplicado o regime semiaberto para o cumprimento de pena por delito hediondo.

Os princípios têm a função de clarear o ordenamento jurídico, pois, toda vez que ocorrer algum tipo de divergência sobre a aplicabilidade de uma lei, a utilização deles se torna indispensável para verificar se há algum abuso de poder ou violação de direitos constitucionais anteriormente assegurados pela constituição.

(32)

Conforme lecionam sobre a função dos princípios Rios e Estefam (2012 apud LENZA p. 97):

Há igualmente uma distinção funcional entre princípios e regras. Muito embora compartilhem a função regulativa, consistente na aptidão de solucionarem casos concretos (embora de maneira diferente), diferem quanto à função hermenêutica, exclusiva dos princípios. Somente este têm condição de dirimir dúvidas interpretativas e propiciar o esclarecimento de determinada disposição normativa. É o que ocorre, particularmente, com o processo penal, com o princípio do favor rei (grifos do autor), muitas vezes empregado para sinalizar, diante da omissão legislativa, no sentido de uma interpretação favorável ao réu.

Analisadas a importância dos princípios e sua diferenciação com as regras faz-se necessário compreender, de forma, mais detalhada o princípio da individualização da pena que é objeto do presente estudo. Para Boschi (2002, p.65):

[...] o princípio da individualização das penas (art. 5º, inc. XLVI, da CF), a expressar o valor indivíduo (grifos do autor), impede que se ignorem as diferenças, individualiza-se a pena, aliás, precisamente, porque cada acusado é um (grifos do autor), e cada fato se reveste de singularidades próprias e irrepetíveis.

Ao pronunciar-se sobre o princípio da individualização da pena Nucci (2004, p. 31) observa que:

[...] individualizar significa tornar individual uma situação, algo ou alguém, quer dizer particular o que antes era genérico, tem o prisma de especializar o geral, enfim, possui o enfoque de, evitando a estandartização, distinguir algo ou alguém, dentro de um contexto.

Trata-se de um princípio consagrado na Carta Constitucional de 1988, que em seu art. 5 º XLVI dispõe o que segue:

Art. 5º XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes:

a) Privação ou restrição de liberdade; b) perda de bens;

c) multa;

d) Prestação social alternativa;

e) Suspensão ou interdição de direitos. (BRASIL; Constituição Federal, 11. ed. São Paulo. Saraiva, 2011).

(33)

Este princípio possui um condão humanístico, eis que tem a função de resguardar direitos ao ser humano que transgredir normas penais, determinando as espécies de penas aplicáveis, todas compatíveis com a ideia de dignidade humana.

A Constituição diz que a lei regulará a individualização da pena e para isso foi instituída a Lei de Execuções Penais ou LEP como alguns doutrinadores a chamam. A Lei 7210, de 11 de Julho de 1984 então institui parâmetros para que após a sentença o apenado a cumpra e traz direitos e garantias ao preso, que deverão ser observados durante a execução da pena.

Para a doutrina a individualização da pena opera-se em três momentos distintos, quais sejam a individualização legal (também chamada cominação), a individualização judicial (por meio da qual se aplica a pena ao caso concreto) e a individualização executiva (que deverá ser observada durante a fase de execução da pena). Segundo Bitencourt (2011. p 662):

Essa orientação, conhecida como individualização da pena, ocorre em três momentos distintos: individualização legislativa – processo através do qual são selecionados os fatos puníveis e cominadas as sanções respectivas, estabelecendo seus limites e critérios de fixação da pena; individualização judicial – elaborada pelo juiz na sentença, é a atividade que concretiza a individualização legislativa que cominou abstratamente as sanções penais, e, finalmente, individualização executória, que ocorre no momento mais dramático da sanção criminal, que é o do seu cumprimento.

Na fase legislativa o legislador cria a sanção penal determinando a pena mínima e máxima para o tipo penal. Trata-se da elaboração de Lei para sua posterior aplicação. Barros (2001, p. 112) leciona que “todo processo de individualização, de adequação da pena ao fato e à pessoa concreta, está limitado pelos princípios da legalidade, da necessidade e da proporcionalidade”. Legalidade nada mais é do que o fato estar previsto em lei anteriormente à prática do fato-crime. E proporcionalidade é a adequação entre a pena aplicada e o crime praticado.

Com precisão no assunto Nucci (2012, p. 173) leciona que:

a) individualização legislativa: o primeiro responsável pela individualização da pena é o legislador, afinal, ao criar um tipo penal incriminador inédito, deve-se estabelecer a espécie de pena (detenção e reclusão) e a faixa na qual o juiz pode mover-se (ex.: 1 a 4 anos; 2 a 8 anos; 12 a 30 anos).

(34)

A individualização judicial ocorre na sentença penal condenatória, momento em que, depois de seguidos todos os trâmites do processo penal se chega ao momento de aplicar a pena ao caso concreto.

Para Nucci (2012, p. 173) trata-se da concretização da pena abstrata por meio da sentença penal condenatória:

b) individualização judicial: na sentença condenatória, deve o magistrado fixar a pena concreta, escolhendo o valor cabível, entre o mínimo e o máximo, abstratamente previstos pelo legislador, além de optar pelo regime de cumprimento da pena e pelos eventuais benefícios (penas alternativas, suspenção condicional da pena etc.).

Nesta fase o réu acusado, julgado e condenado pela infração penal terá sua pena definida, cabendo ao magistrado fixa-la na sentença. Trata-se do processo de dosimetria da pena.

As penas privativas de liberdade são individualizadas na sentença, por meio do sistema trifásico proposto no art. 68 do Código Penal. Para sua dosimetria o juiz deverá fixar a pena base, observando as circunstâncias judiciais do art. 59; a seguir deverá fixar a pena provisória, considerando a presença de circunstâncias agravantes e atenuantes e, por fim, deverá fixar a pena definitiva, fazendo incidir as causas de aumento e diminuição de pena. Neste processo serão consideradas as circunstâncias objetivas e subjetivas que se fizeram presentes na prática delitiva e que servirão para a individualização da pena, tornando-a adequada ao crime praticado.

Barros (2001, p. 116) diz o que segue:

A individualização judicial da pena vem limitada pelo princípio da legalidade e pelo princípio da culpabilidade. O princípio da legalidade vincula o juiz à lei quanto a tipicidade do fato e o quantum da pena, enquanto o princípio da culpabilidade vincula o juiz a determinar a pena de acordo com a culpabilidade individualizada.

Importante frisar que nesta fase o juiz tem certa discricionariedade para aplicar a pena em seus limites mínimo ou máximo, e ainda determinar qual será o regime inicial de cumprimento da pena, é claro sempre seguindo a o princípio da legalidade, onde tudo deve estar previsto em lei.

(35)

2.3 A individualização da pena na fase de execução

A individualização da pena na fase executória ocorre após ser declarada a sentença pelo juiz de direito. Nucci (2012, p. 173) menciona que a individualização executória é a terceira etapa da individualização e:

[...] se desenvolve no estágio da execução penal. a sentença condenatória não é estática, mas dinâmica. Um título executivo judicial, na orbita penal, é mutável. Um réu condenado ao cumprimento da pena de reclusão de doze anos, em regime inicial fechado, pode cumpri-la exatamente em doze anos, no regime fechado (basta recusar-se a trabalhar etc.) ou cumpri-la em menor tempo, valendo-se de benefícios específicos (remição, comutação, progressão de regime, livramento condicional etc.).

Na fase executiva a individualização da pena se fará mediante a observação dos parâmetros estabelecidos pela Lei de Execuções Penais. Este processo já se inicia na sentença condenatória, quando é definido o regime inicial de execução da pena, uma vez que cada regime possui, como se verá mais adiante, regras próprias de execução.

A observância ao princípio da individualização da pena também consta no art. 8º da lei de execuções, que prevê que no inicio da execução da pena os condenados ao regime fechado deverão ser submetidos ao exame criminológico. O exame criminológico é uma espécie de analise médica, psicológica e social do condenado que tem por objetivo definir qual o melhor atendimento que se dará à este durante a execução da pena, tendo em vista a necessidade de sua ressocialização.

De acordo com o que leciona Nucci (2012, p. 184) este exame:

[...] concede maior atenção à maturidade do condenado, sua disciplina, capacidade de suportar frustrações e estabelecer laços afetivos com a família ou terceiros, grau de agressividade, visando à composição de um conjunto de fatores, destinados a construir um prognóstico de periculosidade, isto é, sua tendência a voltar à vida criminosa.

O exame criminológico, pois, estampa de maneira objetiva, a necessidade de se individualizar a pena na fase da execução, atentando-se para as características de cada apenado.

Referências

Documentos relacionados

Nesse mesmo período, foi feito um pedido (Processo do Conjunto da Avenida Rio Branco, no Rio de Janeiro nº 860-T-72) pelo Instituto dos Arquitetos do Brasil e pelo Clube de

Ainda que a metastização cerebral seja condição rara em caso de neoplasia com localização primária no intestino, em casos de exceção em que tal invasão se verifica por parte

insights into the effects of small obstacles on riverine habitat and fish community structure of two Iberian streams with different levels of impact from the

A versão reduzida do Questionário de Conhecimentos da Diabetes (Sousa, McIntyre, Martins & Silva. 2015), foi desenvolvido com o objectivo de avaliar o

Realizar a manipulação, o armazenamento e o processamento dessa massa enorme de dados utilizando os bancos de dados relacionais se mostrou ineficiente, pois o

Este questionário tem o objetivo de conhecer sua opinião sobre o processo de codificação no preenchimento do RP1. Nossa intenção é conhecer a sua visão sobre as dificuldades e

Fonte: Elaborado pela autora com base no documento MEC, INEP: Programas e Políticas Federais que utilizam os dados do Censo Escolar Orientações de preenchimento. Não apenas como

(firma, número de identificação fiscal e sede ou, no caso de agrupamento concorrente, firmas, números de identificação fiscal e sedes), tendo tomado inteiro e perfeito conhecimento