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CAPÍTULO II CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM ADOTADA NO TRABALHO

2.5. Sobre o ensino: as sequências didáticas

Os estudos do Grupo de Genebra pautam-se no seguinte postulado: o de que é possível ensinar a escrever textos e a exprimir-se oralmente em situações públicas escolares e extra-escolares. Nesse sentido:

Criar contextos de produção precisos, efetuar atividades ou exercícios múltiplos e variados: é isso o que permitirá aos alunos apropriarem-se das noções, das técnicas e dos instrumentos necessários ao desenvolvimento de suas capacidades de expressão oral e escrita, em situação de comunicação diversas (DOLZ, et.al., 2004, p.96).

Sendo assim, a escola deveria desenvolver um conjunto de atividades que de fato pudessem garantir que os educandos se apropriarem dos gêneros do discurso, orais e escritos. Esse conjunto de atividades organizadas de maneira sistemática em torno de um gênero discursivo, dá-se o nome de sequência didática.

Uma sequência didática tem, precisamente, a finalidade de ajudar o aluno a dominar melhor um gênero de texto, permitindo-lhe, assim, escrever ou falar de uma maneira mais adequada numa dada situação de comunicação

(DOLZ, et. al., 2004, p.97).

Segundo os autores, os gêneros discursivos que produzimos diferenciam-se uns dos outros de acordo com as condições em que foram produzidos. Dessa maneira, em

situações semelhantes, escrevemos textos com características semelhantes, conhecidos de e reconhecidos por todos, e que, por isso mesmo, facilitam a comunicação (id. ibid., p. 97).

Os pesquisadores ainda indicam que uma sequência didática deveria ser realizada sobre um gênero que o educandos não dominam, ou que o realizam de maneira insuficiente, as sequências permitiriam assim, o acesso às práticas de linguagem novas ou dificilmente domináveis. A seguir apresentaremos as etapas de uma sequência didática.

Primeiramente acontece a apresentação da situação, trata-se na verdade de uma exposição de uma projeto de comunicação, é portanto, o momento em que a turma constrói uma representação da atividade de linguagem a ser executada. É aqui que a atividade ganha significação, pois trata-se de uma situação em que se reflete sobre o que escrever, como escrever, para quem escrever e que forma assumirá a produção.

A partir dessa discussão os educandos realizam a produção inicial, oralmente ou por escrito. A primeira produção tem um papel central na regulação de todas as etapas da sequência didática, tanto para educandos quanto para educador, pois ela permite a visualização do ponto em que a turma se situa, revelando as dificuldades e o direcionamento das próximas atividades.

A produção inicial é compreendida como o primeiro lugar da aprendizagem, pois trata-se de uma atividade direcionada e realizada conscientemente. Educador e educando possuem o ponto de encontro, delimitando o que será trabalhado nos próximos módulos.

Os módulos constituem-se da instrumentalização dos educandos para superar os problemas encontrados e visualizados na primeira produção. É interessante sinalizarmos que a sequência didática vai do complexo para o simples, para posteriormente retornar ao complexo, produção final.

Na produção de textos, os educandos se deparam com níveis diferentes de dificuldades, como: a representação da situação de comunicação, a elaboração dos conteúdos, o planejamento e a realização do texto. É por esse motivo que os módulos devem trazer o maior número de atividades variadas possíveis, podendo permitir aos educandos a observação e análises de textos, podendo ser colocado em evidência os aspectos de funcionamento dos mesmos.

O educador pode sugerir atividades simplificadas de produção de textos, facilitando a concentração dos educandos em um único aspecto da elaboração de um texto, como por exemplos as atividades de revisão textual focada em um único aspecto.

Será nos módulos que a elaboração de uma linguagem comum entre educador e educando ocorrerá para que se possa falar dos textos, criticá-los e melhorá-los.

Os educandos vão construindo, progressivamente, conhecimentos sobre os gêneros. Esses conhecimentos são mobilizados durante a prática de revisão do próprio texto ou uma melhor antecipação do que se deve fazer frente a uma produção oral. Esses conhecimentos podem ser listados e afixados em cartazes, como um momento de síntese, antes da produção final, cada módulo é finalizado com um registro, chamado pelos autores de capitalização das aquisições.

É na produção final que o educando colocará em prática os conhecimentos conquistados nos módulos. A produção final deve ser compreendida pelo educador como uma avaliação somativa, pois significa um investimento nas aprendizagens compartilhadas durante os módulos.

Dolz, et. al. (2004), também esclarecem alguns princípios teóricos que orientam a adoção das sequências didáticas. Quanto ao aspecto pedagógico, o uso das sequências didáticas possibilita a avaliação formativa, regulando o processo de ensino e aprendizagem, verifica-se também uma motivação do educando para escrever ou tomar a palavra, uma vez que desde o início, parte-se do pressuposto de que as atividades realizam- se em um contexto de interação entre quem escreve e quem lê; há também a diversificação de atividades, contribuindo para a maximização das aprendizagens, respondendo às exigências atuais da diferenciação do ensino.

Quanto aos aspectos psicológicos, o texto é tomado em sua complexidade, incluindo a representação da situação de comunicação, a relevância consiste no fato de que:

[...] o procedimento visa transformar o modo de falar e escrever dos educandos, no sentido de uma consciência mais ampla de seu comportamento de linguagem em todos os níveis (por exemplo: escolha de palavras, adaptação ao público, colocação da voz, organização do conteúdo etc) (DOLZ, et. al., 2004, p. 109).

Com relação aos aspectos linguísticos, utiliza-se de instrumentos que permitem compreender as unidades de linguagem, bem como favorece a reflexão sobre o uso da língua de maneiras diversificadas, ela não é abordada como objeto único, que funciona

sempre de maneira idêntica (id. ibid., p. 109). Sendo assim, o procedimento favorece a

reflexão sobre os usos dos gêneros discursivos, o educando, portanto, reflete sobre quais estruturas textuais e com quais meios linguísticos participará da interlocução.

Diante disto, a utilização das sequências didáticas oferecem aos educandos instrumentos precisos para melhorar suas capacidades de escrever e falar, favorecem, portanto, o desenvolvimento de uma relação consciente e voluntária.

O trabalho com as sequências didáticas insere-se na perspectiva textual, sendo assim, é proposta uma série de atividades de observação, de manipulação e de análise de unidades linguísticas. Como afirmam os autores:

Assim, o trabalho será centrado, por exemplo, nas marcas de organização características de um gênero, nas unidades que permitem designar uma mesma realidade ao longo de um texto, nos elementos de responsabilidade enunciativa de modalização dos enunciados, no emprego dos tempos verbais, na maneira como são utilizados e inseridos os discursos indiretos (id. ibid., p. 114).

Dessa maneira as reflexões relativas à sintaxe da frase, à morfologia e a ortografia, não são tomadas como objetos do procedimento, embora apareçam como questões pertinentes e até podendo ser abordadas ao longo dos módulos. Os erros cometidos e presentes nas produções dos educandos constituem um forte indício para o educador, pois sinalizam pontos importantes a serem trabalhados, é o que se pode dizer da ortografia.

Levando-se em consideração que um dos pontos-chave das sequências didáticas são a revisão e a reescrita de textos, espera-se que nesses momentos alguns

aspectos relacionados ao texto sejam trabalhados, por exemplo: a incoerência do conteúdo, organização geral deficiente, falta de coesão entre as frases, inadaptação à situação de comunicação, etc.

Entretanto, uma revisão fina, do ponto de vista estritamente ortográfico, é necessária. Porém, ela deve ser realizada na versão final do texto. Deve- se insistir, particularmente, na importância dessa higienização ortográfica nos textos que serão lidos por outros, seja na sala de aula, seja fora dela

(DOLZ, et. al., 2004, p. 118).

Desta forma, o educador poderá elaborar diversas estratégias de colaboração para que a revisão ortográfica seja realizada.

Já delineamos, no contexto de realização de nossa pesquisa, as exigências da sociedade informacional, configuração social na qual a leitura e a escrita são práticas capazes de garantir minimamente a participação social, uma vez que a demanda essencial é a capacidade de lidar com a informação, ou seja, utilizar e agir sobre a informação.

Assim como a leitura, a produção de textos é uma prática social. Segundo Bräkling (2003), em várias circunstâncias da vida escrevemos textos para diferentes interlocutores, com distintas finalidades, organizados nos mais diversos gêneros, para circularem em vários espaços sociais.

Cada ocasião de escrita implica no reconhecimento das finalidades – para que escrevemos; dos interlocutores – para quem escrevemos; do lugar de circulação – onde; e dos gêneros do discurso – de que forma assumirá a produção.

Dessa forma, cada situação de escrita envolve o reconhecimento das condições que determinam a produção dos discursos, representados pelos elementos postos acima e também do reconhecimento do lugar do qual se escreve, pois desempenhamos diferentes papéis na vida social, porém, na situação de produção textual a um que se sobressai em função do lugar de circulação de nosso discurso e dos interlocutores a que se destina.

Tivemos a oportunidade de compreender, com base em Bakhtin (2004) que os gêneros do discurso são formas de enunciados produzidos historicamente e que se encontram disponíveis na cultura, podendo ser utilizada em cada manifestação verbal – quer seja escrita ou oral – em função do que se deseja dizer.

Portanto, saber selecionar o gênero para organizar o seu discurso implica conhecer suas características para avaliar sua adequação às finalidades colocadas para a situação comunicativa, ao lugar de circulação, e a todo o contexto de produção determinado (BRÄKLING, 2003, p.06).

Compartilhamos da hipótese de que a principal dificuldade vivenciada por educadores no tocante à qualidade da produção textual de seus educandos refere-se à desconsideração, por parte do contexto escolar, das condições que determinam a produção escrita - reconhecimento do gênero à situação de interlocução: o quê, porque, para quem e como escrever.

Verifica-se assim, que saber produzir discursos textualmente envolve diferentes conhecimentos:

a) discursivos: relativos às características do discurso, como conhecimento do gênero no qual o texto será organizado, do contexto de produção, dos interlocutores da produção;

b) pragmáticos: relativos às especificidades da situação de comunicação e às diferentes práticas sociais de escrita;

c) textuais: relativos à linearidade do texto, em si, como sintaxe, pontuação, coesão e coerência;

d) gramaticais;

e) notacionais: relativos ao sistema de escrita (BRÄKLING, 2003, p.07).

Além desses conhecimentos, saber escrever envolve também o domínio de alguns procedimentos:

a) saber planejar o que se vai escrever em função das características do contexto de produção colocado;

b) saber redigir o que foi planejado;

c) saber revisar o que foi escrito – durante o processo mesmo de escrita e depois de finalizado;

d) saber reescrever o texto produzido e revisado (id.ibid.)

Sendo assim, acreditamos que os gêneros do discurso, bem como os conhecimentos e procedimentos que envolvem a prática da produção textual devem ser

ensinados na escola, objetivando o desenvolvimento das capacidades discursivas, orais e escritas dos educandos.

Temos apresentado até aqui uma proposta de trabalho, baseada na sequência didática elaborada pela equipe de pesquisadores do Grupo de Genebra como uma alternativa para o impasse gerado a partir da definição de que o gênero é objeto de ensino da língua e de que as práticas de produção textual na escola devem ser redefinidas em função da atividade de interlocução, na qual se privilegia a interação real entre escritor e leitor dos textos produzidos.

Sendo assim, apresentaremos a seguir uma sessão destinada à função do educador neste processo, na qual será resgatado o seu papel primordial, o de mediador entre os educandos e os conhecimentos socialmente construídos.