• Nenhum resultado encontrado

CAPÍTULO III: A Sala de Leitura como expressão das condições materiais existentes nas escolas da rede municipal de São Paulo

SOBRE A ESCOLA

A escola localiza-se há aproximadamente 12km de distância da PUCSP. A escola é antiga, fundada na década de 60. Sua estrutura física necessidade de reparos. Localiza-se num bairro de classe média no Jardim Bonfliglioli e é cercada por prédios. A sala de leitura foi fundada em 2003.

ENTREVISTA

Bom, o objetivo maior da sala de leitura é formar leitores. Então, a ideia da sala é essa. É o objetivo maior. Então, aqui o espaço é de incentivo pra eles lerem, gostarem de ler e ter uma leitura significativa porque também não adianta só ler por ler, né? Então, esse é o maior objetivo da sala de leitura.

Como eu entrei faz pouco tempo na sala e eu sou de Artes, né? Sou de outra área, então eu cheguei aqui então pra mim tudo aqui é muito novo... Então estou construindo um jeito de fazer... errando... fazendo diferente, né? Ai nesses cinco meses já deu pra ver que é muito trabalho que tem que ser feito, muita coisa precisa ser feita, principalmente porque eu peguei a sala de leitura depois de um trabalho muito bom de duas professoras que se aposentaram. Elas ficaram muitos anos aqui na sala de leitura. Então a sala tinha a cara delas... dessa dupla... e ficou sem professor durante algum tempo... seis meses. Nesses seis meses a organização que tinha na sala, o gênero de prateleira foi um pouco (risos) acabou desorganizando, acabou bagunçando. Eu sei que encontrei a sala bagunçada, né? O acervo que eu não conheço, sem ter nenhuma instrução porque as outras professoras saíram, e... foi eleita uma pessoa, essa pessoa não assumiu... coisas burocráticas. E a professora tinha até passado alguma coisa pra essa professora que acabou não assumindo. Então, eu encontrei uma sala de leitura que precisa reformular, organizar os livros, tá bastante bagunçada a questão do gênero, a faixa etária, tem essa questão da organização, da limpeza dos livros.

A limpeza dos livros tá... eu estou há três semanas com rinite, sinusite por causa do livro e a gente ainda não conseguiu estabelecer uma limpeza, como isso vai ser feito. O pessoal daqui da limpeza é terceirizado, não quer limpar enfim... tem essas coisas sobre a sala, o aspecto físico.

Não tem uma biblioteca, é junto. Toda escola municipal vai ter uma sala de leitura com um acervo, o professor da sala de leitura tem que cuidar desse acervo, fazer os empréstimos de livros e planejar as aulas.

Eu trabalho por projeto. Então eu estava trabalhando por projeto, agora eu comecei os empréstimos de livros, mas, por exemplo, é... no fim do ano... foi quando eu assumi a sala eu não sabia muito bem o que fazer e como fazer, ai a gente trabalhou, como eu tenho recursos de multimídia, eu tenho projetor, eu tenho computador, eu tenho DVD, eu tenho som. A primeira coisa que eu fiz foi trabalhar com eles “A fantástica fábrica de chocolate”. O livro a gente leu junto, eu leio em voz alta e depois a gente assistiu o filme, assistiu as duas versões: a mais antiga, a mais nova e eles produziram um livro com ilustrações no final. Eles produziram um livrinho contando agora a versão deles e com ilustração. Foi esse o projeto de fim de ano.

Aí começou as aulas, eu comecei a trabalhar “Alice no país das Maravilhas” de 1ª e 2ª série, o livro com os desenhos e de 3ª, 4ª a 5ª série “Heróis e Guerreiros”, né? Então, os livros “Dom Quixote” é...outros livros de heróis como “Hércules”, mitologia grega. Então quando eu não tenho muitos exemplares eu tiro Xerox e dou pra eles lerem. Daí a gente lê junto e isso também é uma coisa que tá dentro das expectativas da sala de leitura, vários tipos de leitura, leitura compartilhada, leitura em voz alta, leitura sozinho, né? A leitura da professora pra sala, a leitura deles. Então existe vários tipos de leituras dentro da sala.

Nesse trabalho dos heróis casou com a professora da 4ª série porque ela tá trabalhando o Hércules. O trabalho de Hércules... então a gente fez uma parceria, mas normalmente eu trabalho por mim mesma. Eu que cuido (do planejamento). A gente tenta fazer um planejamento junto, por exemplo, vai trabalhar conto ai as professoras me falam que vão trabalhar conto e eu tento trabalhar também, mas eu não consegui ainda nos encaixar junto porque muitas vezes não tenho tempo por conta do empréstimo, né? Enquanto faço o registro coloco um vídeo ou falo que é hora de fazer leitura silenciosa.

Eu trabalho com o Ensino Fundamental I, é até a 5ª série. Tem o D., outro professor que fica com 6ª, 7ª e 8ª e com o EJA no noturno. Ele começou agora, começou depois de mim. Só que o D. é professor de Língua Portuguesa, ele tem mestrado em Literatura, ele assim... eu tenho idéias de trabalhar a leitura, mas não sou uma especialista nisso, né? Não sei “Nossa! O autor tal!”, eu sei porque tem umas coisas que eu gosto. Antes eu era professora de Artes, fiquei dois anos.

Eu que me candidatei (a vaga de professor de sala de leitura). É... na verdade foi uma coisa, teve um incentivo do pessoal da escola, é “Ah porque você é de Artes, tem tudo a ver.” Então acabei me candidatando e me interesso muito por literatura, né? Gosto bastante. Não sou uma especialista, mas gosto bastante. Eu também não queria continuar professora de Artes aqui. Não tem nenhuma sala específica, tem que fica carregando os materiais pra lá e pra cá. Aqui os alunos têm uma aula, uma vez por semana, 45 minutos.

Voltando pro projeto... e depois do projeto dos Heróis e da Alice, eles criaram um personagem. Fizeram um desenho do personagem. A gente leu Alice, mas não finalizou direito, mas acho que vai ficar por ai mesmo. A gente leu o livro, fez o

desenho, criou o personagem, fez umas coisas e agora comecei a emprestar livros pra eles levarem. Então tá sendo bacana. Eles vem, eles escolhem, eu separo, tá separado mais ou menos por faixa etária, né? Separo esses livros infantis com as letras maiores com ilustração pra 1ª e 2ª série. Ai tem os maiores pra 3ª e 4ª, né? Então fica mais ou menos dividido assim por faixa etária. E 5ª série eu deixo eles mais ou menos livres porque eles têm mais liberdade para olharem as prateleiras. A idéia é de deixar eles com uma autonomia de saber onde é que tá e eles mexerem. (O que poderia ser melhorado) Ah... Eu acho que tem bastante coisa da dinâmica, de como lidar com eles. Tem salas que eu consigo já deixar, que nem hoje a gente teve devolução de livro. Ai é um trabalho burocrático que eu preciso fazer, né? Devolução, ver quem devolveu, marcar. Enquanto eu estava marcando, eles estavam trabalhando com a revista “Recreio”. Então eu distribuí a revista, eles leram e fizeram jogos. Não é toda semana que eu leio para eles. Tô tentando mesclar. Antes eu estava direto, eu lia alguma coisa dentro do projeto, lia uma história e depois a gente fazia uma atividade pra essa história, né? Então agora eu to tentando fazer que eles leiam mais e chegar num ponto em que eles lerem.

A gente tentou fazer uma roda que a gente chama de roda de biblioteca. Tentei fazer com a 3ª série, mas não deu certo. Eles tinham que contar o que eles leram, né? Então todo mundo, cada um contar um pouco do que leu. Nossa, eles travaram total, não conseguiram falar o que leram.

E eu queria ter mais esse é... esse cotidiano, de ir, de eles lerem, eles contarem ou tentar trazer pra fora de alguma forma. Na escrita já tentei várias vezes, mas ai é... da própria coordenadoria de ensino eles querem que a gente foque mais na leitura, na coisa oral, não fica tanto na escrita.

Então eu to tentando trazer essa coisa da roda de biblioteca, essa coisa de contarem o que leram, trocar livros entre si. Então é isso que eu to tentando agora com esse empréstimo de livros. Tenho muita coisa, tenho a idéia de trabalhar com fantoche com os pequenos.

Os pequenos é complicados. Os pequenos de 1ª e 2ª série é o que tenho mais dificuldade pra prender a atenção deles. É difícil. Eles chegam aqui eles querem ficar mexendo. Essa coisa do comportamento pega bastante no trabalho.

Tem bastante aspecto positivo. Desse pouco tempo, desses cinco meses pra cá eu vejo que eles estão um pouco mais soltos na hora de falar sobre o livro na hora por mais que tenha essa entrave que eu acho que tem que melhorar. Eu acho que na escrita eu vejo que melhorou. Quando eu peço para eles escreverem uma coisa sobre os livros eu vejo que tem melhoras.

Se eu pegar coisa que eu tenho no começo do ano e agora eu vejo que melhorou e com o tempo tem algumas turmas que estão bem familiarizadas com o espaço, que gostam, chegam aqui e querem ler e falam “Vamos levar livro! Vamos levar livro!”. Estão começando com esse hábito, mas tem algumas que precisam mais.

Nem todos lêem. Tem na 3ª série, em cada série tem dois ou três, cada série tem um pouco. A gente tem a sala de apoio pedagógico que alguns freqüentam, tem o SAP pra problema de aprendizagem.

Perto das outras escolas a gente está bem colocado e perto da nossa diretoria que é região do Butantã a gente tá bem, mas perto do esperando, se a gente for pegar o esperado ai a gente vê que em algumas coisas a gente não tá tão bem assim não. A questão da leitura, da escrita apesar de que perto do resto tá bom, mas a Matemática a gente tá bem fraco. Mas também desde que eu to na prefeitura, fazem cinco anos, eles chegam com muito programa Ler e Escrever, tem curso, tem estagiária que fica dentro da sala tudo voltado pra alfabetização, o resto não foi trabalhando. Eu acho que por isso, foi investido, é investido na coisa do ler e escrever. Eu acho que por isso tem bastante material, tem bastante pressão pra atingir as metas. Tem pressão. Nós queremos também, os professores aqui eu vejo que estão preocupados com isso. A gente quer atingir metas e quer que eles lêem. Em breve eles farão um simulado para treinarem a prova.

(Sobre a clientela) Misturada. Quando eu vim pro J. falavam que aqui era uma escola mais de elite, né? Perto das outras. Realmente... quando eu entrei era uma pessoal mais do bairro, né? Do bairro aqui é um bairro bom. Realmente nós temos alunos de uma classe média, só que começou a vir, a gente tem alunos que vem de abrigo, nós temos alunos especiais, temos alunos que começaram a vir de outras escolas, que começaram a dar problema em outras escolas e vieram pra cá. Então começou a misturar bem... misturar bem.

(Trabalho com os outros professores) Tem as reuniões porque a gente tem na prefeitura horas pra fazer isso com a coordenação, mas tem professores que não participam porque eles tem a jornada menor. Eu participo e faço planejamento sozinha. No começo do ano a gente fez reunião pedagógica e numa das reuniões pedagógicas foi pra fazer planejamento e a gente meio que comenta a idéia que teve e ai faz sozinho mesmo tentando o que eu conversei com as professorar colocar no meio, mas eu tenho total independência.

O trabalho que é feito aqui é terminado aqui e aqui não continua nada do que fez na sala de aula.

O trabalho aqui é muito inicial, né? Tô aprendendo muita coisa, to vendo como trabalhar, testando muita coisa, por exemplo, eles falam pra gente focar na leitura, só na leitura, mas não dá só pra ficar na leitura.

Eu tenho que fazer duas, três coisas diferentes em 45 minutos. Numa aula, três coisas diferentes. Daí eu leio, passo um videozinho e dou um desenho ou peço pra fazer algum jogo ou alguma coisa. Não dá pra ficar só na leitura, né? E porque eu acho que é uma questão de que com o tempo eu vou cativando e chegar no dia que eles vão chegar aqui abrirem um livro, lerem, a gente ler, mas é... é uma coisa que vai conquistando.

A sala também, com o tempo vai criar um trabalho né? Agora tá bem no começo. A idéia é abrir cada vez mais pra funcionários A gente não divulgou “Olha, pode pegar livros!”, se vier a gente abre uma fichinha. Se alguém da comunidade chegar aqui e quiser pegar também pode, a gente também abre uma fichinha, mas ainda não foi divulgado isso, porque a gente tá caminhando ainda aos poucos, começamos a emprestar agora pros alunos. Então agora que está acontecendo os primeiros empréstimos e olha que a gente tá em maio. Tem essa parte burocrática de ter a idéia de como vai fazer, de bolar uma ficha. Como que a gente vai controlar? O que que vai na ficha? Quanto tempo vai durar o empréstimo? Por exemplo, a criança pequena, até os de 4ª série... numa semana eles já lêem tudo. Com o D. é 15 dias... 1 mês. Então a gente tá ajustando essas coisas, uma vez por semana a gente se encontra toda quinta-feira nessa reunião de professores. Eu venho de manhã ai a gente se reúne e conversa sobre isso, sobre o trabalho, o que tá acontecendo. Teve reunião com todos os professores de sala de leitura e a gente

vê que mais da metade entrou agora, então mudou a cara do professor de sala de leitura e a gente tá tendo um curso uma vez por mês da prefeitura que daí reúne todos os professores e a gente tem frequência de ponto e uma vez por mês. A gente tem esses encontros que tá mais voltado pro ciclo II. Tá trabalhando gênero, crônica, ficção científica. São títulos, o que é esses gêneros, como trabalhar na sala de aula ai a gente tem um monte de tarefa pra fazer.

Eu não consegui entrar no esquema do curso. O D. tá fazendo, mas o meu é ciclo I, eu poderia tá fazendo, na 3ª série, 4ª série, mas não tava dentro do previsto. Então começou o curso e falam: “Você tem que trabalhar isso!”. Então calma! Eu já tinha planejado outra coisa. Então estou dando outro encaminhamento, to fazendo o meu planejamento, fazendo o que dá.

Eu leio em voz alta, quando leva livro pra casa eu peço pros irmãos dos alunos que não sabem ler pra ler pra eles, a mãe, o pai. Mas um dos meninos, o R., chegou com os livros na mão e disse “Oh professora, eu não li.”, e eu falei “Mas você não pediu ajuda pra ninguém?” e ele não soube explicar o porque. Então fiz uma observação no R. e vou ver como consigo trabalhar com ele. Tem o C. da 5ª série, ele não lê, não escreve. Trabalhei com ele com recorte. O livro da “Fantástica fábrica de chocolate” como ele que não escrevia eu trabalhei o recorte. Ele ia cortando e recortando e fez o livro dele. Mas com a sala assim... a sala tem 38 alunos, acaba ficando sozinho. Eu tenho que colocar eles sentados em grupos e eu não consigo dar conta... não consigo mesmo. Mesmo 35 alunos é muito nunca tem menos que 30 alunos então é muito porque tem o barulho. E eu formei grupos, então eles têm grupo já pré-estabelecidos. Na 1ª e 2ª série eu ainda não consegui fazer mais com os outros eles já tem o grupo e o lugar na mesa que tem que ficar. Esse grupo às vezes dou dois textos então eles lêem juntos, um lê pro outro, então é uma maneira do que não lê tá integrado. Então um vai lendo pro outro. Eu tenho aluno especial também, igual a J., não dá pra dar atenção. Não dá.

Acervo de 20 mil livros e desse acervo eu to verificando que tem muitos bem rasgadinhos, porque é uma escola bem antiga. Eu não aceito doações por enquanto porque eu não sei ainda o que tenho. É bom porque com o empréstimo faz os livros circularem. Aí vou conhecendo os títulos.