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1. CARACTERÍSTICAS BÁSICAS DA COMUNICAÇÃO ON LINE

1.4 SOBRE A INTERATIVIDADE

Para alguns autores a web é um meio naturalmente interativo pelo fato de que, ao contrário das mídias tradicionais, a comunicação na web só se realizar a partir da interferência e escolhas do leitor. Esta característica, aliada às capacidades de processamento da informação do computador, faz com que a Internet provoque debate ligando interação e interatividade.

Lemos (2007), em artigo on line, sugere que seja delimitada a interatividade como ação dialógica entre homem e técnica separando a da interação social, em que estariam as relações entre pessoa e pessoa. A partir de sua colocação pode-se dividir esta circunstância em três aspectos fundamentais: a interação entre usuário e máquina, usuário e publicação (conteúdo) e usuário e outras pessoas, sejam elas usuários ou autores.

Lévy, diferenciando o virtual e o atual, o possível e o realizado, argumenta que a interação pode ser reativa, fechada, programada, predeterminada, cujo parâmetro é mecânico,

tipo estímulo-resposta, ou mútuo-aberta, sujeita ao acaso, à interferência dos atores, construída durante relação de permanente negociação e troca:

A interatividade assinala muito mais um problema, a necessidade e um novo trabalho de observação, de concepção e de avaliação dos modos de comunicação, do que uma característica simples e unívoca atribuível a um sistema específico. (LÉVY, 1999, p. 82).

O autor realça a necessidade de uma teoria da comunicação que analise especificidades da comunicação interativa. Ele acaba por montar um quadro baseado em dois eixos centrais para a análise dos meios de comunicação e seu grau de interatividade, em perspectiva que inclui os dispositivos de comunicação e o grau de envolvimento que eles permitem com a mensagem.

Primo (on line, 1998) fala na predominância de processos multi-interativos e não de um modelo de interatividade único. Na construção de significados e práticas produtivas da informação, nas relações estabelecidas na comunicação pela web, no uso de mecanismos como o e-mail ou os fóruns de discussão, há traços do aspecto reativo e também mútuo, provocando o desenvolvimento de estratégias que incluem o consumo de informações personalizadas, ao contrário do tipo de relacionamento de caráter massivo dos meios tradicionais. Também a abertura de canais que estimulam o diálogo entre profissionais e leitores e entre os próprios leitores, como fóruns de discussão sobre as notícias, sugestões de pauta, debate sobre ética, serviços, entre muitas possibilidades.

Estes relacionamentos se materializam pelas interfaces. “A interface contribui para definir o modo de captura da informação oferecida aos atores da comunicação. Ela abre, fecha e orienta os domínios da significação, das utilizações possíveis de uma mídia”. (LÉVY, 1993, p. 181).

O design, na lógica hipertextual, na condição de organizador e ao mesmo tempo parte da informação, é básico na construção discursiva, da mesma maneira como as noções de páginas, capítulos, índices, sumários, cadernos e vinhetas são fundamentais em outros meios como o rádio, o jornal, a revista ou o livro.

Assim, nesta amplitude de instâncias que podem ser lidas como interface, algumas interessam mais por sua influência nos processos de comunicação, em especial no direcionamento destas ‘interações’ desenvolvidas na comunicação on line, particularmente na

forte elemento político, como condicionante de um processo que pode aproximar ou afastar o usuário da informação desejada.

A Internet não apenas comunica, mas se transforma na experiência. Rifkin (2007) faz um paralelo entre a cultura desenvolvida pelo hipertexto com a da escrita, principalmente depois do advento da imprensa. Acredita que o ciberespaço funciona como um palco, pois não é apenas um meio que exibe, mas se relaciona com o público de forma inclusiva, incorporando-o no ambiente para que possa atuar dentro dele. Idéia próxima às considerações de Marshall MacLuhan.

Isto apenas significa que as conseqüências sociais e pessoais de qualquer meio – ou seja, de qualquer uma das extensões de nós mesmos – constituem o resultado do novo estado introduzido em nossas vidas por uma nova tecnologia ou extensão de nós mesmos (MACLUHAN, 1974, p. 21).

Para ele, cada meio constitui um ambiente cognitivo que se torna o próprio conteúdo da mensagem: “o meio é a mensagem”. Vale ressaltar que o pensamento de MacLuhan está longe de ter aceitação unânime. Cohn, por exemplo, critica a postura do teórico canadense ao não considerar adequadamente o conteúdo: “Assim, um jornal veicula mensagens de modo significativamente diverso daquele de um aparelho de rádio, e essas diferenças são independentes do conteúdo das mensagens emitidas” (COHN, 1977, p. 365).

Castells, por sua vez, considera a mensagem o ponto central que vai estruturar a relação do usuário com o meio, pois, entre as características apontadas por ele, existe a flexibilidade da Internet. Se ela constitui-se em um meio mais aberto, de linguagem híbrida e maleável, a ponto de se tornar a própria experiência a relação com o usuário, é construída no conjunto de dispositivos que aciona.

A análise das coerções exercidas na gestão das relações envolvidas nos processos comunicativos da Internet não pode deixar de lado os valores disseminados que a mensagem veiculada na rede sustenta. Seria pressupor que os processos cognitivos instaurados neste meio são essencialmente abertos, que ocorre indistintamente, ‘universalização sem fechamento’, usando os termos de Lévy (1999).

Por ora, analisando as características básicas da comunicação on line, chegamos à conclusão de que se constituiria em ambiente propício para ampliar a participação civil nos negócios públicos. Entendemos o entusiasmo dos primeiros que se debruçaram sobre esta questão, e análise da nova ordem cultural nascente. As perspectivas, de fato, eram alvissareiras. Era de pressupor que a participação civil nos negócios públicos iria se

intensificar até pela multiplicação da quantidade de informação já circulante na sociedade amplamente midiatizada. Mais ainda agora, quando o processo segue em ritmo de aceleração contínua, como destaca Trivinho:

Até o final da década de 50, a velocidade interna das redes não havia atingindo o máximo de seu potencial. Não havia, ainda, transmissões de TV ao vivo a longas distâncias internacionais, fato que só se tornou possível com o lançamento de satélites artificiais, a partir dos anos 60. Em 1965, com o advento do primeiro satélite estacionário de telecomunicação comercial, as redes encontraram a dimensão do instantâneo em nível mundial. Desde então, passam a se nutrir do potencial máximo da velocidade, desencadeando-se assim a sua progressiva saturação. O advento da informática, na década de 70, incrementa ainda mais essa situação: sucessivas versões de computadores, cada vez com recursos mais sofisticados, acoplados ou não ao funcionamento das mídias convencionais, sacramentam a velocidade como vetor da tecnocultura fin-de-siècle. (TRIVINHO, 1998, p. 22).

No entanto, nesta perspectiva da velocidade e da circularidade incessante, críticas como a de Jean Baudrillard ressoam: “Estamos num universo em que existe cada vez mais informação e cada vez menos sentido”. (BAUDRILLARD, 1991, p. 103).

Embora todas as perspectivas otimistas da influência da comunicação on line, da Internet, sobre a cultura e comunicação há de se ter cautela.

As novas tecnologias da mídia, da imprensa de Gutenberg à eletrônica de hoje, sempre foram demolidoras. Há, contudo, uma diferença na transição atual. Anteriormente, as inovações da mídia se desenvolviam lentamente, a intervalos de muitos anos: havia tempo para a adaptação das novas técnicas às realidades sociais existentes. Em contraste agora testemunhamos a convergência simultânea de vasta gama de tecnologias de mídia. O período concedido para selecionar suas implicações políticas e econômicas foi reduzido dramaticamente. (DIZARD, 1998, p. 110).

A comunicação on line, a Internet, como foco da comunicação, por fazer a convergência midiática – a verdadeira multimídia, devido às suas características, faz crer num espaço em que reina a interatividade, por obedecer à lógica hipertextual e, com isso, tornar-se meio mais intuitivo, capaz de respeitar a singularidade humana. Naturalmente, mais democrática, portanto. Naturalmente, um instrumento capaz de desenvolver uma cultura com esta característica, suficiente para diminuir o déficit democrático. Da teoria à realidade o caminho é um tanto quanto longo, porém. Barramos na primeira dificuldade que é a baixa participação democrática. O sistema de práticas, instituições e valores da política contemporânea se constituem num problema à medida que se constata a distância de um

padrão de democracia considerado ideal. E esta é apenas uma das inúmeras dificuldades, como veremos nos próximos capítulos.

Outra questão relevante é saber se estariam os poderes públicos preocupados em aproveitar todo o potencial oferecido por esta nova mídia para promover a participação popular e aprimorar a democracia. Ao optarmos por uma pesquisa empírica sobre alguns portais públicos tivemos em mente responder a esta dúvida. Imaginamos que um olhar sobre o que está sendo produzido possa sinalizar qual o caminho traçado em relação ao uso da Internet. Entender até que ponto esta nova tecnologia poderia representar um avanço no sistema democrático, se constituindo num vetor de emancipação. Mas e se estiver ocorrendo o contrário? Neste caso, entendemos oportuno uma análise que levante os principais entraves e as consequências que poderão advir. Seria ingênuo postular qualquer análise que não levasse em conta a questão ideológica. E, assim sendo, é ingênuo acreditar que uma tecnologia gerada sob a égide do capital e manipulada por agentes deste sistema, possa carregar em seu bojo um ideal libertário, de emancipação. Longe disso configura-se mais próximo a um instrumento de regulação. Nos últimos anos verifica-se um aumento drástico do acesso à produção científica e tecnológica, com os países de baixa industrialização ocupando, na divisão internacional do trabalho, o lugar de produtores de commodities agrícolas, de semiprocessadores industriais, expressando baixos valores agregados e submissão ao atraso e à onerosa dependência decorrente dessa posição. Crescem, também, as desigualdades de renda e de padrão de consumo no interior das sociedades afluentes.

Antes da análise sobre estas questões que preocupam e da nossa tentativa de provar que a Internet, ao contrário do que tem sido amplamente festejado por alguns autores e teóricos, está criando um abismo entre os cidadãos, ampliando a exclusão de uma grande maioria nas decisões e influências sobre o poder, entendemos oportuno, mesmo que de forma simplificada, abordar alguns aspectos sobre a democracia, e a questão da participação popular, sabendo, obviamente, que considerações sobre o tema, serão sempre genéricas, tendo em vista as inúmeras interpretações. No próximo capítulo fazemos estas considerações. Os modelos relacionados no próximo capítulo serão usados como referenciais para a pesquisa empírica e mediremos a participação popular e os vetores de emancipação através das indicações destes sistemas.