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Sobre o conservadorismo funcionalista

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CAPÍTULO II: Folkcomunicação e teoria social funcionalista

1. Características funcionalistas

1.3. Sobre o conservadorismo funcionalista

Existirem interpretações afirmando que o funcionalismo é uma teoria conservadora, contrária a mudanças e defensora do status quo, é bastante comum. Esse ajuizamento normalmente leva em consideração a ideia de que observar a sociedade enquanto estrutura equilibrada (e sem questionar o funcionamento e a existência dela) formada por instituições fortes é ser favorável à defesa do mundo tal como se apresenta.

Nos encontramos aquí con la falla principal del funcionalismo: su ninguna preocupación por transformar el orden social vigente: “Lo que importa es facilitar el funcionamiento del sistema existente, sin enjuiciar nunca su validez, cualquiera que sea su peligro para el futuro de la sociedad y para la integridad del hombre”. La única integridad considerada por el funcionalismo, es la integridad del hombre del sistema37. (PICCINI, MATTELART & MATTELART, 1976, p.19)

O vínculo existente entre o funcionalismo e o positivismo dá força a essa interpretação. Indo a Augusto Comte, por exemplo, percebemos suas marcas nas obras de Durkheim, como o organicismo e por trabalhar com a ideia de um estado “normal” da sociedade. Quando lemos tal termo, é possível que o tomemos como o regular, o conforme à

37 Tradução livre: “Encontramos aqui a principal falha do funcionalismo: seu nenhum interesse para transformar

a ordem social vigente: 'o que importa é facilitar o funcionamento do sistema existente, sem julgar nunca sua validade, qualquer que seja o perigo para o futuro da sociedade e para a integridade do homem'. A única integridade considerada pelo funcionalismo é a integridade do homem do sistema”.

norma, ou como o modelar; o que se mostra em acordo a várias passagens de Comte, como quando ele diz que o objetivo da sociedade é chegar ao estado “normal”, isso consistindo em uma situação na qual o grupo social está bem organizado, em que a existência e as atividades humanas estão regularizadas, com o egoísmo sendo subordinado ao altruísmo (o querer bem a outrem, o que permite a ligação entre as pessoas), em que cada classe (mulher, sacerdócio, patriciado e proletariado) exerce sua função38 e na qual “cada indivíduo e cada grupo [...] desempenha suas tarefas específicas sem deixar de prestar atenção para o bem comum, mantendo sentimentos generosos e perspectivas gerais sobre a realidade em uma atividade pacífica” (LACERDA, 2010, p.103).

Elaborando o que seria uma boa sociedade, Comte trabalha com a diferenciação de classes, com a mulher ocupando funções referentes à moral, os sacerdotes à ordem intelectual, o patriciado voltado às questões materiais e o proletariado à providência geral. Essas classes existiriam conforme pudessem ajudar a “Humanidade”, com os patrícios, por exemplo, devendo observar a providência material, enquanto que os proletários deveriam “fiscalizar e retificar os poderes humanos” (COMTE, 1978, p.194). Não sendo um sistema igualitário, mas hierárquico, como explica Lacerda (2010, p.443):

Na verdade, como vimos, o igualitarismo no sistema comtiano é rejeitado não apenas por questões teóricas e lógicas mais amplas, mas também porque das perspectivas moral e política ele não é aceitável: moralmente, o igualitarismo impede ou combate o desenvolvimento das excelências morais, assim como das intelectuais e práticas: o desenvolvimento social é ao mesmo tempo causa e consequência das diferenças, vale dizer, das desigualdades

sociais; por fim, a busca da igualdade baseia-se na inveja dos inferiores a

respeito dos superiores, isto é, no egoísmo individualista. Em termos políticos, o igualitarismo não é aceitável no sistema comtiano porque ele pressupõe a negação da liberdade, ou melhor, das liberdades: enquanto a igualdade só pode ser obtida mediante pressão e força – material e espiritual –, a liberdade permite que a sociedade desenvolva-se e que cada ser humano possa escolher o que lhe julgar mais adequado.

No estado “normal” os indivíduos aceitariam as regras, porém, conforme Lacerda (2010, p.106-107), o Estado não obrigaria os cidadãos a aceitarem-nas: “cada indivíduo deve por sua própria vontade aceitar esses valores e princípios; por outro lado, ao submeterem-se a tais valores e princípios, os indivíduos não diminuem a capacidade de livre decisão e escolha, mas adotam critérios para direção e avaliação do comportamento”.

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“[...] em que o patriciado realiza suas funções de administradores da riqueza material, ao passo que o proletariado é capaz de manter suas famílias e executar suas funções gerais de fiscalização dos poderes sociais”. (LACERDA, 2010, p.103).

Durkheim também trabalha com a ideia de um estado “normal” (com algumas diferenças) e, além disso, trata do estado “patológico”. Para ele (embora tenha a postura de “cientista puro”, afirmando que o bem e o mal não existem aos olhos da ciência), a sociologia deveria trabalhar para o aperfeiçoamento social, defendendo, dessa forma, a diferenciação entre o normal, que são as características médias de uma sociedade, e o patológico, que é o que foge da normalidade. Por exemplo, o crime é algo comum, mas taxas muito elevadas, se comparadas com outras sociedades de mesmo grau evolutivo, podem transformá-lo em anormalidade.

A diferenciação entre normal e patológico se faz necessária, porque o sociólogo, para Durkheim, tem que ter um parâmetro do que é comum e o que não é. Ele toma o exemplo do médico, que teria como padrão de saúde os tipos gerais das pessoas conforme a idade e o sexo, e teria, à mão, taxas que determinam se algum organismo se encontra em situação saudável ou não. Da mesma maneira, diz Durkheim, o sociólogo também deve saber qual é o tipo médio social para a realidade estudada, para, assim, conseguir definir se há uma patologia ou não. O crime é outro exemplo para o estudioso, tido como normal dentro de determinada variação, e ele possui a capacidade de ajudar na evolução social. Durkheim (2002, p.61-62) cita o exemplo de Sócrates, afirmando que a violação por ele cometida, que resultou em sua morte, foi importante para a mudança de mentalidade nas gerações posteriores.

Para Durkheim, definir o estado normal é o objeto central da ciência social. E é essa diferenciação entre o normal e o patológico que permite ação política à sociologia durkheimiana, pois, conforme Aron (2008, p.532), “se um fenômeno é normal, não há por que querer eliminá-lo, mesmo que nos afete moralmente. Mas, se é patológico, temos um argumento científico para justificar projetos de reforma”.

A construção desses dois conceitos (normal e patológico) acaba aproximando-o de uma posição conservadora.

Não se trata mais de perseguir desesperadamente um fim que foge à medida que avançamos, mas de trabalhar com uma regular perseverança para manter o estado normal, restabelecendo-o se está perturbado, reencontrando suas condições se vierem a mudar. O dever do homem de estado não é mais empurrar violentamente as sociedades para um ideal que lhe parece sedutor, mas seu papel é o do médico: por meio de uma boa higiene, previne a eclosão das doenças, e, quando estas se declaram, procura saná-las. (DURKHEIM, 2002, p.65)

Alguns pesquisadores latino-americanos de área da Comunicação nos anos 1960/1970 também teceram muitas críticas ao funcionalismo, dizendo que suas propostas indicavam que o estado normal, que seria o capitalismo tal como existia, deveria ser mantido, assim como

que somente as modificações superficiais fossem aceitas, as que não exigissem alteração da estrutura social. Viam o funcionalismo como um meio para reforçar o status quo capitalista e para recusar modificações profundas.

Indo além desses conceitos, é possível verificar em Durkheim ideias de mutabilidade das sociedades, como ao enxergar as estruturas sociais como flexíveis e defender que indivíduos e instituições precisam se modificar, buscando aperfeiçoamento e independência das disposições existentes. A flexibilidade da estrutura social é defendida por Durkheim, com as funções dos órgãos não sendo indispensáveis, podendo haver mudanças caso a situação social reclame.

Durkheim’s conception of functionalism was highly flexible. He used it to refer to the latent (unintended) functions of institutions, which escaped human notice or intention. He also recognized that institutions could serve multiple functions and that there were functional alternatives; the same institution could serve different functions, and these functions could vary from society to society. With the development of the division of labour the tie between a given function and a given structure could become looser and more flexible – the function becoming increasingly independent of the structure39. (THOMPSON, 2003, p.84)

Heywood (2010, p.83-84) também expõe críticas à visão organicista que há em alguns funcionalistas, vinculando-a a questões conservadoras: “Os conservadores costumam ver a sociedade como coisa viva, um organismo, cujas partes funcionam juntas, assim como o cérebro, o coração, os pulmões e o fígado em um organismo humano”. Outros críticos a essa analogia, como Dahrendorf, de acordo com Lazarsfeld (1970, p.127), defenderam que as pesquisas deveriam observar os antagonismos, a partir dos quais novos objetivos sociais poderiam ser criados.

De fato, esse pensamento relacionado à organização orgânica pode ser usado por grupos que estão no poder e querem a conservação do status quo. Por outro lado, se verificarmos o uso do contexto de tal analogia por Malinowski, veremos que ela teve papel revolucionário, conforme Lazarsfeld (1970, p.125):

Para os antropólogos britânicos, o funcionalismo foi um utensílio revolucionário. Eles desejaram, na verdade, impedir os administradores coloniais de destruir as populações indígenas, desrespeitando por inadvertência alguns mecanismos do seu sistema social. Acentuaram o papel

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Tradução livre: “A concepção de funcionalismo de Durkheim era altamente flexível. Ele usou isso para se referir às funções latentes (não intencionais) das instituições, que escapam da observação humana ou da intenção. Ele também reconheceu que as instituições poderiam ter múltiplas funções e que eram alternativas funcionais; uma mesma instituição poderia servir a diferentes funções e algumas funções poderiam variar de sociedade para sociedade. Com o desenvolvimento da divisão do trabalho, a vinculação entre uma função dada e uma estrutura dada poderia tornar-se mais solta e mais flexível – a função tornando-se cada vez mais independente da estrutura”.

positivo que cada elemento desempenhava no conjunto. Nas sociedades modernas, pelo contrário, o funcionalismo reforça as tendências conservadoras; como nem tudo ocorre pelo melhor na nossa sociedade, não devemos fechar os olhos às imperfeições.

Malinowski, na parte inicial do livro The dynamics of cultural change: an inquiry into race relations in Africa ([1945] 1945), traz uma reflexão sobre as questões da mudança cultural40, verificando a ação do antropólogo funcionalista e a do “homem prático” no contato com os conjuntos sociais que, ainda, tinham pouco ou nenhum envolvimento com o desenvolvimentismo ocidental, mas que estavam em constante processo de mudança. Ele percebia as mutações que existiam nas sociedades, as quais, incentivadas pelos mais diversos contatos, eram capazes de transformar toda a organização social. Essas mudanças culturais sempre existiram e, para o autor, são induzidas por dois fatores: pela evolução independente (induzida por forças do interior da própria comunidade) ou pela difusão (que são mudanças que ocorrem pelo contato com diferentes culturas).

E no ambiente de rápidas mudanças no início do século XX, alimentadas pelas inovações técnicas, pelo desenvolvimento de empresas industriais e pela organização financeira e mercantil (MALINOWSKI, 1973, p.477), o pesquisador defendeu que o antropólogo tem um dever, uma obrigação moral, e pela citação a seguir é perceptível, também, a crítica dele sobre a forma de contato do “homem ocidental” com os “nativos”, o que ajuda, de certa forma, a afastar a generalização de que o funcionalismo é etnocêntrico:

Há uma moral em toda a vocação, inclusive na do cientista especializado. A do antropólogo consiste em ser um intérprete verdadeiro e leal do nativo. Não se trata apenas de um dever de gratidão pelos favores recebidos sob a forma de informação, boa vontade e generosidade – ainda que isto também possa colocar o estudioso da humanidade primitiva sob uma obrigação específica. É uma prova do fato de que o pesquisador de campo compreende ou deveria compreender as condições sob as quais as raças nativas vivem. Ele deve tornar-se apto a mostrar com clareza aos comerciantes, missionários e exploradores as necessidades reais dos nativos e em que eles mais sofrem pela pressão da interferência europeia. Não há dúvida de que o destino das raças indígenas no processo de contato com a invasão europeia tem sido trágico. Falamos eloquentemente da “difusão da civilização ocidental”, de “dar aos nativos os benefícios de nossa própria cultura”, do “duplo mandato” e do “encargo do homem branco”. Na realidade, o historiador futuro terá que registrar que os europeus, no passado, às vezes exterminaram populações inteiras nas ilhas; que eles expropriaram a maior parte do patrimônio das raças selvagens; que introduziram a escravidão sob uma forma especialmente cruel e perniciosa; e que mesmo que mais tarde a tenham abolido, trataram os negros expatriados como párias e réprobos. (MALINOWSKI, 1973, p.480)

40 “Mudança cultural é o processo pelo qual a ordem existente de uma sociedade, isto é, sua civilização social,

O etnocentrismo não está conectado especificamente a um modo de pensar funcionalista ou a autores que possam ser ligados a essa corrente. No século XIX, os antropólogos evolucionistas, com o discurso de que existiam etapas evolutivas das sociedades, com umas sendo evoluídas e outras primitivas, com estas devendo chegar ao patamar daquelas, acabaram justificando o colonialismo. Mas pesquisadores como Malinowski e Franz Boas, com a introdução do trabalho de campo, defendendo que esse tipo de pesquisa devia ser realizada pelos antropólogos, caminharam por caminhos diferentes dos seus colegas evolucionistas.

O antropólogo ganhou papel ativo nas pesquisas, tendo como consequência dados colhidos de maneira mais confiável e metódica. A ação desse funcionalismo na Antropologia Cultural resultou em um respeito maior pela cultura do outro, com o etnocentrismo e o racismo perdendo força, não de maneira fácil e rápida, nas visões da população em geral e dos acadêmicos. O antropólogo culturalista Franz Boas, que conforme Durham (1984, p.IX) faz parte da linha funcionalista nos Estados Unidos, defendeu, no livro A mente do ser humano primitivo (de 1911 – embora tal temática tenha sido tema de preocupação para o autor desde o fim do século XIX), a igualdade de raças, indo contra a ideia corrente da superioridade do branco sobre o negro. Em prefácio escrito em janeiro de 1938, Boas (2011, p.7-8) fala sobre a dificuldade em adotar uma postura não racista e não etnocêntrica no meio científico, como pode ser notado na longa mas importante citação abaixo:

A primeira exposição de algumas das conclusões a que se chega no livro foi feita numa palestra proferida pelo autor [Franz Boas] quando era vice- presidente da Seção de Antropologia da associação Norte-americana para o Progresso da Ciência, em 1895. Desde essa época o tema continua sendo uma de suas maiores preocupações. O resultado de seus estudos tem sido uma certeza sempre maior em suas conclusões. Não existe uma diferença fundamental nos modos de pensar do ser humano primitivo e do civilizado. Uma estreita relação entre a raça e a personalidade nunca foi estabelecida. O conceito de tipo racial como é comumente utilizado até mesmo na literatura científica é enganador e requer uma redefinição, tanto lógica como biológica. Embora, ao que parece, grande número de estudantes norte- americanos de biologia, psicologia e antropologia está de acordo com estes pontos de vista, o preconceito popular, embasado na tradição científica e popular anterior, sem dúvida não diminuiu, porque o preconceito racial continua sendo um fator importante na nossa vida. Ainda pior é a sujeição da ciência ao preconceito ignorante existente em países dirigidos por ditadores. Tal controle estendeu-se particularmente a livros que tratam do tema da raça e da cultura. Já que não se permite publicar nada que seja contrário aos caprichos e preconceitos ignorantes da panelinha governante, não pode existir uma ciência fidedigna. Quando um editor, cujo orgulho costumava estar no número e no valor de suas obras científicas, anuncia em seu catálogo um livro que procura demonstrar que a mescla de raças não é

prejudicial, mas o retira quando toma o poder um ditador; quando grandes enciclopédias são reescritas de acordo com dogmas prescritos; quando cientistas não ousam publicar ou são proibidos de publicar resultados que contradizem doutrinas prescritas; quando outros, com o objetivo de promover seus próprios interesses matérias, ou cegados por emoções incontroladas continuam cegamente no caminho traçado, não se pode depositar nenhuma confiança em suas afirmações. A supressão da liberdade intelectual proclama a morte da ciência.

Malinowski mostra uma postura séria diante da cultura do outro, advoga que o cientista jamais pode distorcer os fatos e deve analisar os sentimentos e pensamentos dos nativos. Em Argonautas ele defende que o outro deve ser entendido em seu próprio contexto e fecha o livro com um discurso a favor da tolerância entre os homens:

Ao captar a visão essencial dos outros, com a reverência e verdadeira compreensão que se deve mesmo aos selvagens, estamos contribuindo para alargar a nossa própria visão. Não podemos chegar à sabedoria final socrática de conhecer-nos a nós mesmos se nunca deixarmos os estreitos limites dos costumes, crenças e preconceitos em que todo homem nasceu. Nada nos pode ensinar melhor lição nesse assunto de máxima importância do que o hábito mental que nos permite tratar as crenças e valores de outro homem do seu próprio ponto de vista. E mais: nunca a humanidade civilizada precisou dessa tolerância mais do que agora, quando o preconceito, a má vontade e o desejo de vingança dividem as nações europeias, quando todos os ideais estimados e reconhecidos como as mais altas conquistas da civilização, da ciência e da religião, são lançados ao vento. A Ciência do Homem, em sua versão mais refinada e profunda, deve levar-nos a um conhecimento assim, à tolerância e à generosidade, baseados na compreensão dos pontos de vista dos outros homens. (MALINOWSKI, 1984, p.370-371)

Robert K. Merton, em Funções manifestas e funções latentes ([1948] 1968), exibiu várias críticas aos postulados funcionais de autores anteriores a ele, como o da unidade funcional da sociedade, do funcionalismo universal e o da indispensabilidade, e também abordou os questionamentos de o funcionalismo ser orientado ao cientista social conservador.

A aceitação dos três postulados citados no parágrafo anterior pode levar ao entendimento de que o funcionalismo é conservador, mas Merton discorda delas, como ao dizer que é um erro enxergar todas as estruturas sociais como indispensáveis:

De maneira semelhante a qualquer outro sistema de pensamento, que se limite com a teleologia, embora evite atravessar a fronteira daquele estranho e improdutivo território, a análise funcional em sociologia é ameaçada por uma redução ao absurdo, desde que adote o postulado de que todas as estruturas sociais são indispensáveis ao preenchimento de necessidades funcionais notórias. (MERTON, 1968, p.105)

Merton anui que a sociedade possui uma estrutura de funcionamento, mas mostra que elas podem ser disfuncionais, ou seja, abrem espaços para mudanças. Para ele (1968, p.106- 108), a análise funcional é flexível e não alimenta a manutenção do status quo, assim como, por outro lado, não é radical à maneira de LaPiere (apud MERTON, 1968, p.105), o qual defendia que “o ponto de vista funcional aplicado ao comportamento coletivo, sem dúvida, afrontara todos aqueles que acreditam que as estruturas sociopsicológicas tenham valores intrínsecos”.

O fato de que a análise funcional pode ser encarada por alguns como inteiramente conservadora, e por outros como intrinsecamente radical, surge que talvez ela não seja inerentemente uma coisa, nem outra. Sugere que a análise funcional pode não implicar em nenhum compromisso ideológico intrínseco, embora, como outras formas de análise sociológica, ela possa estar imbuída de uma extensa variedade de valores ideológicos. Ora, não é esta a primeira vez que se atribuem significações ideológicas diametralmente opostas a uma orientação teórica da ciência social ou da filosofia social.

Aspectos conservadores podem se fazer presentes no funcionalismo, assim como em outros métodos e/ou teorias sociais, pois, como exemplo, há aspectos conservadores no materialismo dialético. Merton criou um quadro comparativo entre as orientações ideológicas do funcionalismo e do materialismo dialético, explicando o que elas têm de conservadoras e de radicais, e explanando, por fim (observar trecho em negrito), qual é a real atitude de um analista funcional. Abaixo, seguem quatro pontos (de sete) destacados pelo autor norte- americano (1968, p.106-108):

QUADRO 1: Materialismo dialético x Análise funcional

As orientações ideológicas do materialismo dialético

As orientações ideológicas comparáveis, da análise funcional

Em sua forma mistificada a dialética tornou- se moda na Alemanha, porque pareceu transfigurar e glorificar o estado de coisas existente.

Os três postulados: unidade funcional, universalidade e indispensabilidade, compreendem um sistema de premissas, as quais inevitavelmente conduzem a uma glorificação do estado de coisas existente. Porque ela considera cada forma

desenvolvida historicamente como em

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